3.4.09

Governo fez aumentar número de reformados obrigados a entregar declaração de IRS de 2007

Vítor Costa, in Jornal Público

Ministério das Finanças aplicou lei de forma retroactiva e levou maior número de pensionistas a terem de entregar declaração de imposto


O número de reformados obrigado a entregar declaração de IRS aumentou substancialmente face ao ano anterior devido a alterações legislativas aprovadas pelo Governo e à interpretação feita pelos serviços da Direcção-Geral dos Impostos (DGCI).

Esta é uma das razões que terão estado na base de muitos pensionistas que em 2007 não entregaram a declaração de imposto referente ao rendimento recebido em 2006 tenham sido surpreendidos esta semana com notificações da DGCI onde foram avisados que, caso não regularizassem a situação, teriam de pagar uma coima.

As alterações legislativas foram desenhadas na segunda metade de 2006 através de dois diplomas diferentes: um decreto-lei (238/06) que, segundo as Finanças, tinha por objectivo simplificar e dar maior transparência ao sistema fiscal; e a lei que aprovou o Orçamento do Estado (OE) para 2007. Antes de esta legislação ser aprovada, o Código do IIRS dispensava da entrega da declaração de rendimento todos os pensionistas que recebessem uma pensão anual inferior ao valor anual do salário mínimo nacional. No entanto, o DL 238/06, publicado em Dezembro, veio alterar a situação e passou a estabelecer que ficavam dispensados de entregar a declaração os pensionistas que recebessem uma pensão inferior ao valor da dedução específica também prevista no Código do IRS.

A partir daqui as dúvidas instalaram-se. A primeira, para saber qual das regras se aplicava, ou seja, qual seria o limite a partir do qual era obrigatório entregar a declaração de IRS referente aos rendimentos obtidos em 2006: a referência ao valor anual do salário mínimo nacional (5402,6 euros), ou ao valor da dedução específica (7500 euros em 2006). Apesar de o DL 238/06 estabelecer que apenas produzia efeito a partir de 1 de Janeiro de 2007, a DGCI entendeu que já em 2006 deveria vigorar o limite da dedução específica. E fê-lo assumindo que se tratava de uma norma meramente processual e, como tal, com base na Lei Geral Tributária (artigo 12.º, n.º 3) poderia ser logo aplicada. Ou seja, os pensionistas que em 2006 auferiram rendimentos inferiores a 7500 euros não tiveram de entregar declaração de rendimentos em 2007.

Para que não restassem dúvidas, o manual que a DGCI disponibilizou na sua página de intranet aos funcionários estabelecia que deveria ser este o procedimento a adoptar.
O problema veios depois. Ao mesmo tempo que era aprovado o DL 238/06, também era aprovado o OE para 2007. E neste diploma, a dedução específica passou dos 7500 euros de 2006 para 6100 euros em 2007. Ou seja, um pensionista que em 2006 recebeu, por exemplo, 6200 euros de pensão, no ano seguinte não teve de apresentar declaração, mas se este mesmo pensionista, em 2007, recebeu, os mesmos 6200 euros, em 2008 já tinha de apresentar a declaração de IRS.

Face a estas alterações, não deveriam ter sido avisados os contribuintes nesta situação? "No que concerne à informação prestada pela DGCI, é de salientar que as instruções de preenchimento dos modelos a que se refere o artigo 57.º do Código do IRS (modelo 3 e respectivos anexos) a entregar em 2008 (aprovados pela Portaria n.º 1632/2007, de 31 de Dezembro) já referiam expressamente a alteração dos valores relevantes para a dispensa da entrega da declaração", diz fonte oficial do Ministério das Finanças.

120 mil notificações

Tal como o PÚBLICO noticiou na passada terça-feira, a DGCI enviou em Março 120 mil notificações a contribuintes que não entregaram a sua declaração de IRS em 2008, referente aos rendimentos de 2007. Destas declarações, o PÚBLICO sabe que a maioria corresponde a reformados e, entre estes, haverá muitos que, não estando obrigados a apresentar declaração sobre os rendimentos auferidos em 2006, também se julgavam dispensados no ano seguinte.

O Ministério das Finanças diz que das 120 mil notificações, não há apenas situações de reformados, mas não diz quantos dos 120 mil estão nessa situação, já que "ainda não há valores finais, uma vez que as notificações ainda estão a ser enviadas", sublinha a mesma fonte oficial.

As Finanças adiantam ainda que esta situação não é diferente do que aconteceu em anos anteriores, garantindo que em relação aos rendimentos de 2006 (declaração que deveria ter sido entregue em 2007) foram feitas 117.922 notificações; em relação aos rendimentos de 2005 foram feitas 86.086; relativamente a 2004 foram feitas 105.559; em relação a 2003, 166.916; em relação a 2002, 107.000; em relação a 2001, 87.033 e em relação a 2000, foram feitas 58.899 notificações.

50
É o valor da coima mínima a que os faltosos estão sujeitos. No entanto, como a maioria dos notificados não terá imposto a pagar, não há prejuízo efectivo para o Estado e as coimas poderão ser anuladas, segundo as Finanças.