Célia Marques de Azevedo, in Jornal de Notícias
"É preciso trabalhar mais tempo" para fazer avançar a competitividade europeia. No primeiro debate do estado da União Europeia, ao estilo americano, Durão Barroso elegeu ontem, terça-feira, o emprego e a resposta à crise económica como temas centrais.
O presidente da Comissão Europeia começou por dizer, perante o Parlamento Europeu, em Estrasburgo, que a Europa "está melhor" do que há um ano e que a taxa de crescimento foi mais positiva do que seria esperado - a Europa "sobreviveu ao teste", mas "o trabalho ainda não está terminado", avisou o presidente, apesar do tom optimista.
Numa primeira intervenção, que durou meia hora, Durão passou em revista os feitos da Comissão Europeia em resposta à crise económica, que monopoliza as atenções dos líderes mundiais há dois anos. Ainda como medida defensiva, recomendou mais regulação económica e regozijou-se com o facto de os ministros das finanças terem concordado, ontem, submeter os orçamentos nacionais ao escrutínio de Bruxelas antes mesmo de serem aprovados pelos parlamentos nacionais. Os "maus orçamentos tornam-nos vulneráveis", explicou.
O presidente da comissão levou para Estrasburgo uma lista de cinco pontos que vão guiar o trabalho do órgão executivo comunitário até ao fim do ano. A propósito da reforma do sistema de pensões, Durão Barroso insistiu que é preciso trabalhar durante mais tempo. Caso contrário, ficará comprometida a competitividade da União Europeia.
Pese o descontentamento social em alguns países europeus, é "altura de fazer os investimentos certos" e apostar na consolidação orçamental, disse. "Sem consolidação, não haverá estabilidade; sem estabilidade, não haverá crescimento e sem crescimento não haverá emprego", avisou.
No capítulo do emprego, o antigo primeiro-ministro português afirmou que a Europa conta de momento com quatro milhões de ofertas de emprego. Para este ano, ficou prometida a criação de um "observatório europeu de ofertas de emprego", que informará as pessoas sobre as oportunidades que existem nas diferentes zonas da Europa e sobre as competências necessárias para as desempenhar. "Apresentaremos igualmente uma proposta para um passaporte europeu de competências".
Barroso defendeu a exploração de "novas fontes de financiamento para grandes projectos de infra-estruturas europeias" a partir da emissão de obrigações de financiamento de projectos UE, juntamente com o Banco Europeu de Investimento.
Os aplausos convictos fizeram-se ouvir quando falou de direitos e liberdades cívicas. Em discurso para dentro, lembrou que os direitos fundamentais, "mesmo os das minorias" são para ser respeitados "por todos os governos", no que foi entendido como uma referência tímida às expulsões de comunidades ciganas de França.
Mais audível foi a ovação quando recriminou a sentença atribuída à iraniana Sakineh Mohammadi Ashtiani, condenada à morte por apedrejamento. "Os direitos humanos não são negociáveis. Fico consternado quando ouço dizer que Ashtiani foi condenada à morte por lapidação. Não há palavras para qualificar este acto bárbaro."
O primeiro debate sobre o estado da União acabou por ter uma plenária composta depois da polémica originada pelo facto de os deputados poderem vir a ser multados, caso não comparecessem no hemiciclo, medida que foi cancelada instantes antes do início da sessão. Com frequência, os debates em Estrasburgo têm presentes na sala muito poucos dos 736 deputados eleitos.