Filipa Traqueia, in SIC
O Papa Francisco discursou, esta quinta-feira, na Universidade Católica de Lisboa. Apelou aos cinco mil jovens que tivessem coragem para “deixar o conforto pessoal” e sejam “protagonistas da mudança”. Destacou a importância do conhecimento para criar uma sociedade melhor e pediu medidas concretas para “cuidar da casa comum”
“Estar insatisfeito é um bom antídoto contra a presunção de autossuficiência e narcisismo. Ser incompleto completa a nossa condição de peregrino", disse o Papa Francisco, sublinhando que "estamos no mundo, mas não somos o mundo. Somos chamados a algo mais”.
O Sumo Pontífice alertou ainda os jovens para não se deixarem levar pelas “respostas fáceis que anestesiam”, numa referência à utilização excessiva do digital e dos “ecrãs”.
“Procurai e arriscais. Neste momento histórico, os desafios são enormes e os gemidos dolorosos”, prosseguiu, referindo-se à guerra na Ucrânia.
O Papa Francisco afirmou que estamos a viver uma “terceira guerra mundial aos bocados”, mas ressalvou que não se trata "uma agonia, mas num parto” - ou seja, não é o final, mas o início. Para o líder da igreja católica, falta “coragem para pensar” de forma diferente e os jovens devem ser “protagonistas” desta mudança.
“Tende a coragem de substituir os medos pelos sonhos, não sejam administradores de medos, mas empreendedores de sonhos."
“Se o conhecimento não for acolhido como responsabilidade, torna-se estéril”
O Papa Francisco admitiu ter sido inspirado pelo discurso da reitora da Universidade da Católica de Lisboa e destacou que a Universidade “não existe para se preservar como instituição”, mas sim para “responder com coragem aos desafios do presente e do futuro”.
“A autopreservação é uma tentação, é um reflexo condicionado pelo medo que nos faz olhar para o futuro de forma distorcida”, afirma o Papa
Francisco considera um “desperdício pensar numa universidade que se comprometeu a formar as novas gerações como apenas um utensílio para perpetuar o sistema elitista e desigual do mundo, com um ensino superior que continua ser um privilégio de poucos"
“Se o conhecimento não for acolhido como responsabilidade, torna-se estéril”, prossegue, sublinhando que quem “não se esforça por restituir o que beneficiou” é porque “não compreendeu profundamente o que lhe foi oferecido”.
Para o Papa, o estudo não é “uma licença para construir o bem-estar pessoal”, mas sim “um mandato para se dedicar a uma sociedade mais justa e inclusiva, isto é, mais avançada”.
No seu discurso, o Sumo Pontífice citou uma entrevista de Sophia de Mello Breyner Andersen, onde poeta portuguesa disse querer a justiça social e Portugal e a diminuição da diferença entre ricos e pobres.
“Em nome do progresso já se abriu caminho a muito retrocesso”
A questão ambiental também foi abordada pelo Papa Francisco no seu discurso. O Sumo Pontífice defendeu que é preciso ação concreta e não apenas "simples medidas paliativas ou compromissos ambíguos”.
“Devemos reconhecer a urgência dramática de cuidar da casa comum. Isto não pode ser feito sem uma conversão do coração e uma mudança da visão antropológica que está na base da economia e da politica”, afirmou.
O Papa Francisco sublinhou ainda a “necessidade de redefinir o que chamamos progresso e evolução”, acrescentando que, “em nome do progresso já se abriu caminho a muito retrocesso”.
Dirigindo-se aos jovens, deixou um apelo: “Vós sois a geração que pode vencer este desafio e tendes todos os instrumentos científicos e tecnológicos mais avançado, mas por favor não vos deixei cair na cilada de visões parciais."
O Sumo Pontífice destacou a necessidade abrir a igreja cristã a todos, afirmando que “o cristianismo não pode ser uma fortaleza cercada de muros, que ergue baluartes contra o mundo”.
“O contributo feminino é indispensável”
O papel da mulher na economia foi também referido pelo Papa Francisco, no âmbito do anúncio do nome dado à nova cátedra da Universidade Católica - que passou a ser dedicada a Francisco e Clara. O Sumo Pontífice sublinha que “o contributo feminino é indispensável”.
“No consciente coletivo, quantas vezes acontece pensar que a mulher é um ser de segunda, que é secundária em vez de titular? O contributo feminino é indispensável”, afirma, acrescentando que na Bíblia, "a economia familiar está em grande parte nas mãos da mulher".
Francisco sublinha que a “sabedoria” da mulher torna-a “governante da casa, que não tem como benefício imediato, mas beneficia do bem estar físico e espiritual de todos”.
Deixou ainda críticas ao “mercado selvagem e da especulação”, apelando aos jovens que, através dos estudos económicos, possam “devolver à economia a dignidade que lhe compete".