28.8.23

Qual o impacto da Estratégia de Integração Cigana? Avaliação lançada com inquérito online

Ana Cristina Pereira, in Público

Equipa encarregada de fazer avaliação externa da Estratégia Nacional para a Integração das Comunidades Ciganas quer escutar pessoas ciganas


Já ouviu falar na História do povo cigano na comunicação social ou nas redes sociais? Como cigano/a, considera que tem a mesma oportunidade de encontrar trabalho que outras pessoas? E de arrendar uma casa?

Eis algumas das questões que fazem parte do inquérito lançado este mês pela equipa incumbida de fazer a avaliação externa da Estratégia Nacional para a Integração das Comunidades Ciganas, coordenada por Inês Barbosa, investigadora do Instituto de Sociologia da Universidade do Porto. Deve ser preenchido apenas por pessoas ciganas maiores de 18 anos e residentes no território nacional.


O inquérito está online. A ideia é, até 31 de Outubro, obter uma amostra de pelo menos 380 pessoas. “O tempo é muito limitado.” Só começou a trabalhar no final de Julho a​ equipa, da qual faz parte a socióloga Manuela Mendes, co-autora do Estudo Nacional sobre as Comunidades Ciganas. “Não será muito fácil.”


Há várias perguntas sobre o impacto da estratégia cessante. E sobre políticas específicas, como os Planos Locais de Integração das Comunidades Ciganas, o Projecto de Mediadores Municipais Interculturais, o Programa Operacional para a Promoção da Educação, o Programa de Apoio ao Associativismo Cigano.

A equipa também fará 18 entrevistas: 11 mediadores/as ciganos/as, dirigentes associativos, activistas e sete representantes de entidades como a Direcção-Geral de Educação, a Direcção-Geral de Saúde, o Núcleo de Apoio às Comunidades Ciganas, o Observatório das Comunidades Ciganas.


Dinamizará ainda seis grupos focais, com investigadores, representantes institucionais, técnicos de acção social e educativa, dirigentes associativos... Cada um terá um tema, associado aos eixos estratégicos: educação, saúde, habitação, emprego, discriminação e exclusão social, desigualdade de género.


Avaliação de 2018 levou a revisão

Embora a estratégia venha de 2013, a avaliação incidirá apenas sobre o período 2018/2022. Houve uma avaliação externa em 2018, feita por uma equipa do Cesis — Centro de Estudos para a Intervenção Social.


A referida avaliação apontava para uma taxa de execução de 94,1%. Dois eixos tinham largamente superado as expectativas — ultrapassavam os 270% o da saúde e o transversal, que diz respeito a mediação, valorização da história e cultura, combate à discriminação, igualdade de género. Os outros três eixos mantinham-se muitíssimo abaixo do esperado — habitação (3,6%), educação (10,2%), formação e emprego (34,5%).


A estratégia foi então revista e alargada até 2022. O novo prazo terminou sem que se tivesse feito sequer a avaliação. O Governo decidiu então prorrogar a vigência até ao final de 2023.


“Estamos a partir com mais perguntas do que respostas”, diz Inês Barbosa. “Temos material fornecido pelo Alto Comissariado para as Migrações, mas vamos tentar ao máximo que as pessoas possam dar os seus contributos", prossegue aquela socióloga. “Os relatórios de execução são baseados em números. Vamos tentar perceber a distância entre o que está no papel e a tradução prática, o reflexo na vida concreta das pessoas.”

Não interessa só o quadro geral. “Queremos perceber particularidades e vulnerabilidades relacionadas com o género, a idade, o concelho de residência em áreas como a habilitação, a educação, a formação, o emprego.”

Os dados que existem, por exemplo, sobre educação e habitação, mostram que o país não é todo igual. “A ideia é estabelecer prioridades e pensar em medidas com efeitos concretos, ajustáveis, sustentáveis e flexíveis. Temos zonas com problemas muito específicos. Não há uma receita igual para todos. Temos de ter medidas flexíveis e ajustadas aos contextos.”

Qual o impacto da Estratégia de Integração Cigana? Avaliação lançada com inquérito online
Portugal partirá atrasado para a nova geração de estratégias nacionais. Em Outubro de 2020, a Comissão Europeia lançou um novo plano para apoiar a população cigana. Nessa altura, instou os Estados-membros a apresentarem as suas estratégias até Setembro de 2021.


O processo já começou. As nove associações ciganas mais activas — Associação Letras Nómadas, Associação de Mulheres Ciganas, Ribaltambição, Sendas e Pontes, Silaba Dinâmica, Raízes Tolerantes, Associação Cigana de Coimbra, Costume Colossal e Agarrar Exemplos — até prepararam uma lista de propostas. Enviaram-na à ministra adjunta e dos Assuntos Parlamentares, Ana Catarina Mendes.

No plano da educação, sugerem por exemplo que os manuais escolares façam “menção à história e cultura cigana, não de uma forma folclórica, mas com factos”. E que se procure aumentar a representatividade nas escolas onde há um número relevante de alunos ciganos, nomeadamente contratando técnicos operacionais de etnia cigana.

Entendem que não só a presença dos mediadores interculturais deveria ser alargada (nas escolas, mas também em hospitais e centros de saúde), como as suas competências deveriam ser reconhecidas. “É urgente a aprovação do estatuto de carreira do mediador intercultural devido à precariedade que enfrentam.”



No plano do emprego, recomendam, por exemplo, que se estabeleçam protocolos para “garantir a incorporação de estagiários ciganos” e a “integração de ciganos em postos de trabalho”. Reclamam “programas dirigidos à formação e emprego das comunidades ciganas que passem por incentivos fiscais simbólicos a empresas que promovam o emprego das pessoas ciganas”.


Sobre a habitação, não faltam propostas. Falam, por exemplo, em “seleccionar zonas de pobreza extrema para requalificação/integração/realojamento habitacional, retirar as famílias ciganas de acampamentos ou outro tipo de habitação não condigna e oferecer condições mínimas de habitação”. E na criação de “bolsas de habitação pública disponível em prédios públicos e privados para arrendamento em cada quarteirão”.

Qual o impacto da Estratégia de Integração Cigana? Avaliação lançada com inquérito online
Para promover a cidadania e a não discriminação, sugerem também várias medidas, incluindo “uma campanha publicitária contra o racismo e a xenofobia, de forma a promover a reflexão e a empatia”. Para esta até deixam uma ideia: “Uma jovem a comprar roupa numa loja e a ser vigiada pelo segurança."