12.3.07

Perto de 20 por cento da população portuguesa já tem um seguro de saúde

Rosa Soares, in Jornal Público

A subscrição deste tipo de produtos tem crescido exponencialmente nos últimos anos e só não é maior por limitação do rendimento das famílias e porque o sector público presta um bom serviço
a Uma percentagem considerável da população portuguesa já tem alternativa ao Serviço Nacional de Saúde (SNS). Em 2005, existiam 1,7 milhões de apólices de seguros de saúde, o que corresponde a cerca de 18 por cento da população portuguesa. Como a actividade tem crescido a um ritmo elevado - estima-se que as novas subscrições destes produtos tenham crescido entre sete e nove por cento em 2006 - o número de apólices deve ter chegado aos dois milhões no último ano, o que significa cerca de 20 por cento dos portugueses.

Apesar de ser necessário salvaguardar que no universo dos dois milhões há seguros de vida associados aos cartões de crédito, e que há pessoas a beneficiar de mais do que um seguro de saúde, situações que não foi possível desagregar, é possível concluir que perto de 20 por cento da população portuguesa pode beneficiar de serviços de saúde privados. A oferta, por parte de empresas, de seguros de saúde aos seus funcionários, a título de remuneração complementar, também contribui para o crescente aumento de apólices existentes.

O Instituto de Seguros de Portugal divulgou recentemente os dados da actividade relativos a 2005, verificando-se que o número de apólices de acidentes e doença ultrapassam os 2,7 milhões, sendo uma fatia considerável de seguros de acidentes de trabalho.

A Associação Portuguesa de Seguros (APS) tem dados definitivos da actividade para 2006, mas em montante de prémios (o que corresponde ao valor pago pelos subscritores). Exclusivamente nos seguros de saúde, o montante atingiu os 408,4 milhões de euros, mais 9,7 por cento do que os 372,4 milhões de euros registados em 2005.

A contratação de seguros de saúde, tecnicamente designados de doença, tem vindo a registar crescimentos acima dos 10 por cento na última década, tendência interrompida nos dois últimos anos, em que o crescimento tem ficado ligeiramente abaixo dos dois dígitos.

O SNS é o melhor seguro

A procura de seguros de saúde só não é maior porque o rendimento da maioria da população portuguesa não comporta mais encargos, garantiu ao PÚBLICO uma fonte do sector, acrescentando que a situação se alteraria se fosse reduzida a carga fiscal sobre os consumidores, dando-lhes oportunidade de optar por um sistema de saúde alternativo ao público. Mas há também outra razão de peso para que não se verifique em Portugal uma corrida desenfreada a estes seguros de saúde: o serviço público, salvo situações pontuais, como as listas de espera para alguns intervenções cirúrgicas e a marcação de algumas consultas, presta um bom serviço.

Não oferece comodidade, mas oferece segurança, disse fonte de uma seguradora. Esta fonte, que pediu para não ser identificada, defendeu mesmo que o SNS é o melhor seguro de saúde, porque não deixa de atender ninguém por causa da idade, não exclui determinado tipo de doenças, não nega tratamentos a obesos, alcoólicos ou pessoas com doenças graves, não fixa montantes máximos de gastos, como fazem as seguradoras (ver textos nestas páginas).

Confrontado com esta opinião, Ramiro Martins, presidente do grupo de trabalho do ramo doença da APS, defende que não se deve diabolizar nem o Serviço Nacional de Saúde nem as seguradoras, que têm de desenvolver o seu negócio dentro de "uma engenharia racional". Este responsável, há muitos anos ligado à actividade seguradora, considera que "o serviço de saúde português é bom, mas não se deve ser cego perante as situações em que ele é menos eficaz". E considera-o menos eficaz ao nível do conforto e da rapidez de resposta em várias situações, designadamente face a doenças graves que precisam de intervenção cirúrgica.

Crédito à habitação ajudou

O forte incremento de compra de seguros de saúde coincide com o boom do crédito à habitação verificado em Portugal na última década. E isto porque os bancos, o principal canal de venda, começaram a associartaxas de juro mais baixas no crédito à habitação para quem subscrevesse vários produtos e no pacote lá ia um seguro de saúde. Da parte das empresas, começou a verificar-se uma forte procura, que foi refreada pela crise económica dos últimos anos.

Neste momento, é a procura de seguros por pessoas singulares que está a crescer. No cômputo geral, a repartição entre seguros individuais e de empresas é muito semelhante. Ao nível das ofertas, alguns pacotes de empresas conseguem ser mais abrangentes. Isto é, em alguns segmentos, como próteses e ortóteses (aparelhos para substituir membros ou órgãos e instrumentos auxiliares, como cadeiras de rodas e óculos), a mesma seguradora é capaz de os disponibilizar nos pacotes de empresa e não os contempla nos seguros individuais.

Os seguros de saúde, especialmente as opções mais baratas, apresentam muitas limitações, como a impossibilidade de realização de exames gerais, ou valores baixos para determinadas rubricas, como estomatologia (ver texto ao lado). A esta crítica, Ramiro Martins contrapõe com a componente de consumo dos clientes que, muitas vezes sem necessidade, fazem análises e mudam de óculos só porque já pagaram o seguro. É o raciocínio de que há que aproveitar, que depois se pode virar contra ele no aumento dos prémios. A este propósito, Ramiro Martins lembra que o verdadeiro seguro de saúde é o de internamento, porque ninguém quer ser operado só porque tem um seguro.