8.3.07

Portugal não reconhece aos EUA legitimidade para críticas

Maria João Guimarães, in Jornal Público

Relatório de direitos humanos do Departamento de Estado admite que as suas próprias acções estão sob escrutínio. Borat é mencionado entre as vítimas

O Governo de Lisboa "não reconhece legitimidade ao Departamento de Estado norte-americano para fazer comentários sobre os direitos humanos em Portugal", disse à Lusa uma fonte do Ministério da Administração Interna, numa reacção aos reparos do relatório de direitos humanos do Departamento de Estado. Washington diz que há problemas com a violência da polícia sobre os detidos, nota más condições nas prisões e as prisões preventivas demasiado longas e menciona o tráfico de estrangeiros e mulheres.

No seu documento, o Departamento de Estado não analisa as acções norte-americanas, nomeadamente a polémica prisão de Guantanamo. Mas afirma que os EUA "levam os seus direitos humanos a sério". E ainda: "Reconhecemos que estamos a escrever este relatório numa altura em que o nosso próprio registo e as acções que temos levado a cabo para responder aos ataques terroristas contra nós têm sido questionados". A afirmação foi feita na introdução do relatório, mas não passou despercebida, já que é raro o reconhecimento por parte de Washington de que o modo como respeita os direitos humanos é questionado.

Mas esta assunção não evitou que a China reagisse às críticas - por prisões de jornalistas, perseguições religiosas e esforços por controlar o acesso dos cidadãos à Internet. "Aconselharíamos a América a preocupar-se mais com os direitos humanos no seu próprio país", afirmou o porta-voz do Ministério chinês dos Negócios Estrangeiros, citado pela Reuters.

O relatório elege a violência no Darfur como a pior violação de direitos humanos em 2006. O documento não hesita em dizer que acontece um genocídio na região sudanesa (um termo geralmente evitado pelos Governos europeus), culpando tanto as forças governamentais e as milícias ligadas a Cartum como os grupos rebeldes pela violência - algo raro, já que, nota a Reuters, as críticas são por norma guardadas para as forças governamentais e milícias.

O Cazaquistão foi também mencionado no relatório, e teve mais atenção o facto de a personagem Borat ter sido mencionada entre as vítimas da falta de liberdade de expressão (foi-lhe negado o domínio "kz" do site que tinha criado) do que o assassínio do político da oposição Altynbek Sarsenbaiuly. Também o Iraque, invadido pelos EUA em 2004, foi alvo de críticas por causa dos esquadrões da morte com ligações ao Governo, raptos e tortura. A Rússia também foi apontada pela crescente "erosão da responsabilidade do Governo", e na Tchetchénia continuam a ser levadas a cabo "violações graves dos direitos humanos", quer pelas forças russas, quer pelas forças de segurança tchetchenas.