Andréia Azevedo Soares, in Jornal Público
Portugal é o país recordista em diagnósticos positivos por milhão de habitantes:251 novos casos em 2005, um valor muito acima de outros 14 países europeus
Já sabemos há muito que, quando o assunto é o vírus HIV, não faz sentido falar em grupos de risco - mas sim em comportamentos de risco. É isto o que provam as primeiras estatísticas do Centro Europeu de Controlo e Prevenção de Doenças: as relações heterossexuais são primeira causa de infecção por HIV na Europa. Isto não significa, contudo, que o sexo desprotegido entre homossexuais e a partilha de seringas no grupo de consumidores de drogas injectáveis não tenham uma expressão preocupante nos números revelados pelo órgão da União Europeia (UE).
Calcula-se que em 2006 havia 39,5 milhões de adultos e crianças com HIV no mundo, dos quais 740 mil correspondem à Europa ocidental e central. Neste retrato da doença no planeta, Portugal não sai nada bem na fotografia. É o país recordista em novos diagnósticos positivos de HIV declarados em 2005 por milhão de habitantes: 251, um valor claramente acima de outros 14 países da Europa ocidental e central. Neste gráfico, Portugal está representado por uma linha que, embora descendente, está isolada no topo, sempre acima da fasquia dos 200 diagnósticos por milhão de habitantes.
O Reino Unido vem em segundo lugar, sempre a subir, mas sem ultrapassar o patamar dos 150 diagnósticos. Espanha e Itália ficaram de fora, países onde a sida não é uma doença de declaração obrigatória. Estímulo ao diagnósticoHenrique Barros, responsável pela Coordenação Nacional para a Infecção VIH/Sida, afirmou ao PÚBLICO que estes números "já são há muito conhecidos" e podem ser um reflexo de "uma política activa que insiste na declaração das infecções e no estímulo aos testes de diagnóstico". Isto explica, por exemplo, o crescimento brutal dos novos casos entre 2003 e 2004 - quando os diagnósticos positivos passaram a ser, por regra, declarados às autoridades de saúde.
No que toca aos novos Estados da UE, lideram a lista de novos diagnósticos positivos por milhão de habitantes a Estónia Letónia e Lituânia. Há, contudo, uma atenuante: as linhas dos três países de Leste aparecem no gráfico em queda (acentuada ou ligeira) desde 2002. As de Chipre e Malta surgem em franco crescimento desde 2004 (mais ainda no patamar entre 40 e 50 noves casos por milhão de habitantes). Há mais más notícias. Continua a crescer na Europa o número de pessoas que vivem com o vírus HIV (com ou sem sintomas). Acredita-se que cerca de 30 por cento desse total nem sequer sabem que são portadores - o que contribui para a propagação da doença de forma desproporcional.
O relatório apresentado há uma semana estima que 25 por cento dos que não sabem que estão contaminados são responsáveis por cerca de 54 por cento novas infecções. Em contrapartida, 75 por cento dos que conhecem o diagnóstico deverão estar na origem dos restantes 46 por cento dos casos. O grupo de homens que mantêm relações com parceiros do mesmo sexo ainda é considerado, pelo estudo europeu, vulnerável à contaminação pelo vírus em muitos países. Regista-se neste capítulo altas taxas de prevalência (5 a 15 por cento) e incidência (cerca de 3 por cento por ano); a presença de outras doenças sexualmente transmissíveis (sífilis, gonorreia, por exemplo) associadas à infecção por HIV, assim como a ressurgência de comportamentos sexuais de alto risco.
Acredita-se que este fenómeno esteja associado à eficácia das novas terapêuticas anti-retrovirais (que têm garantido aos doentes mais qualidade e tempo de vida), ao aparecimento de novas drogas que aumentam a potência sexual ou energia física (Viagra ou os chamados "speeds") e das novas tecnologias. "A Internet pode estar a permitir encontrar mais parceiros com o mesmo interesse, é o caso dos speed-dates", diz Henrique Barros.