23.10.07

Com afecto Sem açúcar

Nassalete Miranda, in O Primeiro de Janeiro

“Envergonho-me um pouco desta posição” disse o senhor Presidente da República quando confrontado com os números que colocam Portugal entre os países mais pobres da União Europeia.

Espanto, distracção ou indignação?!

Como não quero crer que esteja distraído, nem que se espante, pois Cavaco Silva há muito que confessou ler jornais, só posso considerar aquela frase como um desabafo de indignação.

Mas não chega indignar-se senhor Presidente Cavaco Silva!

Como não basta mostrar-se preocupado com o abismo que separa os pobres dos ricos nem com a injustiça e a imoralidade que presidem à desigualdade na distribuição de rendimentos.

É preciso acção!

Claro que o “Estado só por si não consegue resolver estes problemas”, mas deve dar o exemplo no sentido da poupança, nas verbas a dispor para a justiça social, na firme fiscalização das empreitadas, nos milhões que são pagos anualmente a determinados consultórios de advogados, na responsabilização das derrapagens orçamentais nas obras públicas – só para dar alguns exemplos.

Não cabendo ao Chefe de Estado uma intervenção directa, cabe-lhe agir em função da esperança dos mais de dois milhões de pobres portugueses.
Os alertas serão escutados.

O País que governou durante 10 anos, está hoje mais pobre, mais triste, mais aflito, mais desesperado.

Mas acontece que um País não empobrece de um dia para o outro!

Também a pobreza de um País não se resolve só com altas conversações à mesa farta!

Há uma insensibilidade e desconhecimento do Portugal real que assusta.

O Governo de Sócrates, precisa de sair mais dos gabinetes. Não só para inaugurações com figurantes “à la page”, mas sobretudo para ver e ouvir como sobrevivem os desempregados, os idosos, os doentes em listas de espera crescentes nos hospitais, os sem abrigo.

O Governo precisa de saber, realmente, que há fome no nosso País!

Que a “miséria envergonhada” aumenta diariamente, que há centenas de milhar de cidadãos a morrer aos poucos com 6 euros, repito por extenso e a bold, seis euros, por dia!!!

É motivo de vergonha, sim, senhor Presidente.

De todos nós. É verdade! Porque todos temos tendência para virar as costas à pobreza. Mas os Governos são eleitos para alterarem as condições de vida dos cidadãos mais carenciados. E os governantes eleitos e que são pagos por todos nós, têm o dever de trabalhar no sentido de criar as condições necessárias à melhoria da qualidade de vida de quem os elegeu.

Não vejo suficientes esforços no Governo de Sócrates que alterem a curto prazo estes números! A curto prazo, que a fome e a miséria não podem aguardar pelos medidas a médio prazo!

Preocupados? Naturalmente que deverão estar!

Mas acontece que os despedimentos continuam, empresas a fechar também, os salários não acompanham a inflação, os medicamentos, a luz, a água, a alimentação estão cada vez mais caros, o endividamento e o crédito mal parado crescem na justa medida que aumentam os roubos e a marginalidade.
Cenário pessimista?


Não. Realista.

Há anos que as notícias de pobreza em Portugal fazem manchete.
Há anos que muitos de nós alertam para a desigualdade entre o desperdício governamental, o fausto de uns quantos e a fome de milhões.
Já aqui escrevi que devemos primeiro olhar para nós antes de passar o cheque a terceiros.

A solidariedade é essencial, mas deve começar pela nossa casa!
Seria demagógico sugerir que um senhor ministro tentasse “viver” com um ordenado mínimo só um mês, (já não me refiro aos seis euros por dia…) mas era capaz de ser um bom desafio…!

Nota: A propósito de pobreza: Jardim Gonçalves pagou a dívida do seu filho ao BCP – 12 milhões de euros. Coisa pouca!!!