Inês Correia, in Observatório do Algarve
A disparidade entre os mais ricos e os mais pobres do país é um sinal de alerta, considera o presidente da AMI. Só no Algarve os cinco por cento de cidadãos mais ricos detêm o correspondente à riqueza de 60 por cento dos mais pobres.
Fernando Nobre, presidente da Assistência Médica Internacional (AMI), falava ao Observatório do Algarve à margem da apresentação do seu livro “Gritos contra a indiferença”, quinta-feira, em Faro.
Para este médico, habituado a correr o mundo, “a disparidade entre os mais ricos e os mais pobres do país, sendo muito superior à média europeia, é um sinal de alerta”.
O clínico aponta uma maior participação cívica, envolvendo cidadãos, empresas, o Estado e associações como o primeiro passo para a erradicação da pobreza.
“Nós temos de nos empenhar porque se não poderia desenvolver-se no país o que se está a desenvolver noutras partes do mundo: são verdadeiras bombas sociais”, explica Fernando Nobre.
“Perante a complexidade dos problemas, perante uma globalização profundamente acelerada e com tendência, enfim, muito financeira, é bom que todos nós tomemos consciência para, se possível, irmos contra a maré”, acrescenta.
“Para diminuir os conflitos temos de diminuir a desigualdade”, conclui.
Recorde-se que Rui Fernandes, dirigente da DORAL do PCP, em declarações ao jornal Barlavento, descrevia a existência de uma realidade escondida no Algarve, referindo-se aos índices de pobreza.
O dirigente comentava, em entrevista, que, no que respeita à repartição espacial do Valor Acrescentado Bruto (VAB) e do emprego, no quinquénio que terminou em 2004, a região situava-se entre as três últimas, com 4,1 por cento e 4 por cento, respectivamente.
O Algarve é uma das regiões onde o fosso entre ricos e pobres é mais expressivo. Facto agravado com o progressivo afastamento da média da União Europeia.
Gritos de alerta
O mais recente livro de Fernando Nobre, “Gritos contra a indiferença”, é uma colectânea de textos e comunicações realizados pelo autor ao longo da sua carreira.
A decisão de reunir os textos e publicá-los, segundo Fernando Nobre, prende-se com o facto de ter chegado ao “Outono da vida” e querer que um dia mais tarde os filhos saibam porque é que andou tão ausente.
Cirurgião de profissão, este médico que ingressou nos Médicos Sem Fronteiras e fundou a AMI em Portugal, luta pelos direitos humanos e decidiu “gritar contra a indiferença”.
“Indiferença é a trave mestra que justifica muitos dos desvarios que vou observando por esse mundo fora”, justifica.
Ao Observatório do Algarve, Fernando Nobre confidenciou que não foi fácil seleccionar os textos a incluir na obra.
“Por um lado não posso estar a inventar causas e temas todos os dias, necessariamente aplica-se um pouco aquele lema ‘água mole em pedra dura tanto dá até que fura’”, revela divertido o autor que acrescenta serem inevitáveis as repetições em algumas abordagens: “tudo o que se trata é falar de valores, de direitos humanos e de cidadania. São esses os gritos que vou espalhando pelo país”, conclui.