5.9.10

A diversidade do desemprego

Por J. Bradford DeLong, in Jornal Público

Ouvimos hoje um número surpreendentemente elevado de quadrantes dizerem que os governos na Europa e na América do Norte, e respectivos bancos centrais, deviam desistir das políticas expansionistas que vêm seguindo para tentar criar postos de trabalho. Os críticos dos estímulos governamentais defendem que o elevado desemprego que aflige actualmente o Atlântico Norte não é cíclico mas sim "estrutural", não sendo, portanto, possível reduzi-lo através de políticas que reforçam a procura global.

Permitam-me que seja o primeiro a dizer que o desemprego estrutural é um perigo real e grave. Quando há pessoas que, noutras circunstâncias, podiam ser felizes, saudáveis e membros produtivos da força de trabalho, mas faltam-lhes aptidões, confiança, redes sociais e a experiência necessária para arranjarem um emprego em que valha a pena pagar-lhes, temos obviamente um problema. E, se o desemprego na Europa e na América do Norte se mantiver elevado por mais dois ou três anos, é altamente provável que venhamos a ter de o enfrentar. Porque nada transforma com mais eficácia um desemprego cíclico num desemprego estrutural do que o desemprego prolongado.

Mas será isso que hoje se passa? Parece-vos que, neste momento, o maior problema que as economias europeias e norte-americana enfrentam é o de um desemprego estrutural? Não é.

Lembremo-nos de como é o desemprego estrutural. A economia está em recessão e o desemprego é elevado, não devido ao afrouxamento da procura global criado por uma diminuição de gastos, mas porque factores "estruturais" deram origem a uma disparidade entre as aptidões da força de trabalho e a distribuição da procura. A estrutura da procura pelos consumidores é diferente dos empregos que os trabalhadores estão aptos a preencher.

Por exemplo, supunhamos que há muitos trabalhadores qualificados e aptos a trabalharem em construção, mas que as famílias decidiram que as suas casas têm tamanho mais do que suficiente e querem enchê-las com produtos. Isto daria origem a desemprego estrutural na medida em que os ex-trabalhadores da construção não seriam capazes de fazer coisas no sector de produção que fizessem com que valesse a pena os fabricantes contratarem-nos.

Nesse caso, esperaríamos assistir a uma recessão na construção: firmas a fechar, maquinaria sem aplicação e trabalhadores no desemprego. Mas esperaríamos também ver as fábricas a funcionar em turnos duplos -o dinheiro que não é gasto na construção tem de ir para algum lado, e há que lembrar que o problema não é falta de procura global. Esperaríamos ver os industriais a realizar feiras de emprego e, quando não aparecessem trabalhadores suficientes, esperaríamos vê-los oferecer salários mais altos para atrair os trabalhadores para as suas fábricas e depois aumentar os preços para cobrir os custos de pessoal mais elevados.

A dimensão e a duração do desemprego de ex-trabalhadores da construção podiam ser bastante significativas. Poderia exigir muito tempo conseguir dar nova formação a trabalhadores da construção e ligá-los a redes sociais em que pudessem tornar-se bons operários fabris. Poderíamos assistir a um desemprego elevado e prolongado no sector da construção e em regiões em que se tinham verificado anteriormente os maiores booms na construção.

Mas a recessão no sector da construção e o desemprego entre os ex-trabalhadores do sector seriam compensados pela exuberância do sector de produção, os preços em alta dos produtos, o trabalho extraordinário e os elevados salários dos trabalhadores da produção.

É assim o desemprego estrutural desadequado - e não é isso que temos hoje, pelo menos não na Europa nem na América do Norte. Nos últimos três anos, o emprego na construção diminuiu, mas o mesmo aconteceu com o emprego no sector de produção, no comércio grossista e retalhista, no sector de transportes e de armazenamento, no de informação, distribuição e comunicações, no sector de serviços profissionais e empresariais, no de serviços de educação, no de lazer e turismo, e no sector público. O emprego está melhor na saúde, nas empresas ligadas à Internet e, talvez, na exploração florestal e na indústria mineira.

Nos Estados Unidos, nos últimos três anos, o emprego caiu de 137,8 milhões de pessoas em Julho de 2007 para um pouco menos de 130 milhões em Julho de 2010 - uma redução de 7,9 milhões num período em que a população adulta aumentou cerca de seis milhões. O que testemunhámos não foi uma mudança na procura em sectores com falta de um número adequado de trabalhadores qualificados e produtivos, mas um declínio ao nível da procura global.

Esta situação pode muito bem vir a parecer desemprego estrutural dentro de três anos. Daqui a três anos poderemos assistir a escassez de mão-de-obra, aumento de salários e aumento de preços em sectores em expansão, a par de um desemprego elevado nos outros sectores da economia.

Mas não é esse o problema hoje. E não adianta preocuparmo-nos por antecipação.

Professor de Economia na Universidade de Berkeley