Raquel Martins, in Público
Provedora de Justiça recebeu 96 queixas por atraso nas pensões no primeiro semestre e em 17% dos casos a demora é superior a dois anos.
A Pensão na Hora permitiu acelerar o processo de atribuição das reformas, mas o gabinete da provedora de Justiça, Maria Lúcia Amaral, continua a receber queixas por atrasos do Centro Nacional de Pensões (CNP). No primeiro semestre do ano foram recebidas 96 queixas, algumas das quais dizem respeito a pessoas que esperam há mais de dois anos pela sua pensão.
Os dados solicitados pelo PÚBLICO ao gabinete de Maria Lúcia Amaral permitem concluir que na maior parte dos processos analisados (93%) o atraso é inferior a dois anos, mas 17% das queixas dizem respeito a pedidos pendentes há mais de dois anos, e numa das situações a espera é superior a quatro anos.
O facto de ter entrado em funcionamento um novo modelo de tratamento das queixas, com a criação de uma unidade dedicada à apreciação preliminar das solicitações dirigidas à provedora de Justiça antes da abertura de um processo de queixa, dificulta a comparação com o período homólogo de 2022. O único dado disponível dá conta de 399 queixas relacionadas com pensões de velhice, antecipadas e unificadas recebidas ao longo de todo o ano passado.
Fonte oficial do gabinete de Maria Lúcia Amaral reconhece que a Pensão na Hora, criada em Fevereiro de 2021, “parece indiciar uma evolução positiva nos atrasos dos tempos de decisão”.
Este mecanismo permite atribuir uma pensão provisória a quem reúne as condições para isso, e mais tarde, após a análise pormenorizada do processo, o valor será ajustado. Inicialmente, não estavam abrangidas as pensões que incluem períodos de descontos no estrangeiro, no regime público, em regimes especiais ou as pensões antecipadas, mas no ano passado estas situações passaram a ser incluídas.
De acordo com o Instituto da Segurança Social (ISS), em 2022 foram atribuídas 37.788 pensões automáticas, o que representa 51% das pensões de velhice deferidas, apesar de o valor atribuído não ser definitivo.
Não obstante estes avanços, no relatório que enviou recentemente à Assembleia da República, a provedora de Justiça continua a alertar para o facto de que a morosidade de alguns serviços da Segurança Social é “um dos maiores obstáculos à efectivação dos direitos de protecção social, comprometendo o princípio da eficácia das prestações sociais e colocando em risco os grupos mais vulneráveis”.
E dá como exemplo o atraso do CNP na atribuição de pensões e de outras prestações, frequentemente superior a dois anos. E acrescenta dois exemplos: o caso de um pedido apresentado em 2016, tendo a pensão apenas sido atribuída em Janeiro de 2023, o que se traduziu no pagamento de um montante acumulado de mais de 35 mil euros; e a demora na apreciação de um pedido de recálculo de pensão de velhice apresentado em 2017 e que só em 2022 foi corrigido.
Outro problema identificado tem que ver com a falta e articulação entre serviços. A provedora cita, a este propósito, “a deficiente e insuficiente” articulação entre o CNP e a Caixa Geral de Aposentações nos processos de atribuição das pensões unificadas.
“Continuam a evidenciar-se problemas com a totalização de períodos contributivos, a aplicação da taxa de bonificação em ambas as parcelas que integram a pensão unificada e a comunicação das respectivas parcelas da pensão para cálculo final da mesma (com atrasos muito significativos, sobretudo, nas comunicações do CNP à CGA)”, lê-se no relatório de 2022.
De uma forma geral, essas preocupações mantêm-se em 2023, como precisou ao PÚBLICO fonte oficial do gabinete de Maria Lúcia Amaral.
Tempo médio baixou para 54 dias em 2022
A contabilização do tempo médio de atribuição das pensões esteve envolta em polémica nas últimas semanas.
A 8 de Agosto, o Jornal de Negócios dava conta de um aumento geral dos tempos médios da decisão de atribuição das pensões, com um acréscimo de 31 dias em 2022 (de 120 em 2021 para 151 em 2022). Esses dados tinham por base o relatório de actividades do ISS publicado no seu site.
Esse relatório foi entretanto retirado e substituído por uma nova versão que dá conta de uma redução de 40 dias (de 94 em 2021 para 54 em 2022) e, de acordo com as explicações do ISS, os novos números resultam do facto de incluírem o tempo de atribuição da Pensão na Hora, que é automática.
“O Instituto da Segurança Social procedeu à actualização do relatório de actividades de 2022, dado que a versão preliminar do mesmo continha imprecisões nos dados relativos ao tempo médio de deferimento das pensões. Nessa versão preliminar não foram considerados os dados dos deferimentos automáticos da Pensão na Hora, que em 2022 representaram 51% dos deferimentos”, lê-se numa nota divulgada dois dias depois.