7.11.09

Crise traz corrupção à tona

Fernando Basto, in Jornal de Notícias

Carlos Pimenta, presidente do observatório de economia e gestão da fraude


O economista explica que a crise económica facilita o aparecimento de casos de fraude e corrupção. No seu entender, é preciso que a legislação agilize os processos de investigação.

Carlos Pimenta é o presidente do Observatório de Economia e Gestão da fraude, sediado na Faculdade de Economia da Universidade do Porto. Entende que a crise económica facilita o surgimento de casos de fraude e corrupção. No seu entender, a legislação deve sofrer alterações. Contudo, defende ser fundamental que a opinião pública perceba que ninguém está acima da lei. E, por isso, alerta para a necessidade de julgamentos exemplares que devolvam ao público essa certeza.

De repente, surge mais um caso de corrupção, o "Face Oculta". A crise económica facilita o surgimento de casos como este?

Sim, na verdade as épocas de crise são excelentes para que surjam casos que estão escondidos.

Como se explica isso?

Com a crise começa a haver falta de liquidez, não há investimento, arranjar crédito é difícil. O pagamento de subornos fica mais difícil e tudo começa a aparecer mais claramente. Os sinais do que estava encoberto vêm à tona.

A imagem do Portugal dos brandos costumes é cada vez mais ténue.

Sim, isso é uma verdade na qual eu insisto. Em estudos internacionais, todos os indicadores de psicologia social aplicada à economia mostram que Portugal está numa situação de grande probabilidade de aparecimento de fraude e, nomeadamente, corrupção.

E como vê a reacção da população a esta sucessão de casos de corrupção?

Os portugueses são muito condescentes com a corrupção, consideram mesmo que algumas formas de corrupção são normais. Isto vê-se através das eleições autárquicas. Votam em candidatos corruptos só porque acham que aquilo que fazem é em benefício da terra. As pessoas julgam que se trata de um caso entre o corrupto e o corrompido. Contudo, são situações que lesam empresas e levam ao desemprego. Somos prejudicados directa ou indirectamente.

O primeiro-ministro prometeu aperfeiçoamentos legais. É esse o caminho?

Parece-me que a legislação sobre fraude e corrupção é complicada na sua aplicação e leva a uma investigação muito morosa. O mecanismo burocratiza-se. Agora, corrupção e off-shores são sempre duas coisas que qualquer governo promete combater. E depois entra o sistema da hipocrisia a funcionar e combate-se muito pouco.

A legislação não facilita a investigação?

Quando falamos em crime violento ou roubo, há uma figura evidente: o ser apanhado em flagrante delito. Quando isso acontece, fica tudo facilitado. Mas grande parte das fraudes são encobertas, por isso não há flagrante delito. Daí que a legislação não é operacional.

O ex-deputado socialista João Cravinho apresentou um pacote de medidas anti-corrupção, recorda-se?

Sim, mas nada avançou. Todas as intenções sérias de combate à corrupção devem ser repensadas e bem analisadas, procurando conhecer a opinião do Tribunal de Contas, da Polícia Judiciária e do Ministério Público. Mas é fundamental não ficar apenas pelas leis, mas operar uma mudança de consciência pública sobre esses casos através de julgamentos exemplares que mostrem que ninguém está acima da lei.

No mundo de futebol também não faltam casos para investigar.

Sim, mas a focalização devia estar nos pequenos clubes, onde o branqueamento de capitais é enorme.