Ana Rita Faria, Londres, in Jornal Público
Os mercados em desenvolvimento, que lideram o crescimento, podem arrastar o mundo para nova crise, alerta a gestora de activos Schroders
Bastaram 47 anos para os mercados emergentes passarem de 20 a 70 por cento em termos de peso no crescimento económico mundial. Quando a actual crise rebentou, temia-se que fossem os mais prejudicados, mas acabaram por sair mais fortes, ao ponto de já se temer que possam ser a fonte irradiadora do próximo período de instabilidade económica global.
"A nova crise mundial poderá vir dos mercados emergentes, mas não num futuro muito próximo", diz Keith Wade, economista-chefe da Schroders, segunda maior gestora de fundos de activos do mundo. A acontecer, a história repetir-se-ia, mas ao contrário.
"Há dez anos, tivemos uma crise nos países emergentes, que criou uma bolha nos mercados financeiros do Ocidente. Desta vez, a crise foi nos países desenvolvidos e temos um excesso de liquidez a sair daqui em direcção às economias emergentes, o que poderá acabar por criar uma bolha", revela. Keith Wade considera que ainda estamos longe desse pico, mas admite que "é difícil ver o que poderá parar esse processo".
A mesma perspectiva é partilhada por Alan Conway, responsável da Schroders para os mercados de acções das economias emergentes. "Nos próximos um a dois anos, poderá ocorrer uma bolha nos mercados emergentes", estima o gestor, acrescentando que a crise fez os investidores mudarem a sua percepção de onde está o risco.
"Historicamente, dizia-se que os mercados emergentes eram arriscados e também que eram quem iria sofrer mais com a crise, mas acabaram por ser os menos afectados e saíram até mais fortes", considera o gestor, para quem as "apostas arriscadas" neste momento são as economias desenvolvidas.
"Já trabalhei 30 anos nesta área e nunca vi um investimento tão grande nos mercados emergentes como nos últimos três a seis meses", revela. Segundo Alan Conway, a Schroders é um exemplo disso, sendo actualmente um dos maiores investidores nesses novos actores económicos, com 20 mil milhões de dólares (cerca de 13,4 mil milhões de euros). No total, a gestora de fundos tinha 133 mil milhões de euros sob gestão no final de Junho passado.
"Há muito investimento a fluir para os mercados emergentes, pelo que o maior perigo é termos um boom, com o aumento das taxas de juro e da inflação, e depois uma queda, porque a maioria destes países não tem um forte controlo da política monetária e, portanto, ferramentas para conseguir abrandar a economia no momento certo", considera Keith Wade.
Perigo de contágio
O economista-chefe alerta para o efeito de contágio que isso poderá ter nos países desenvolvidos e diz que as economias emergentes terão de encontrar formas de agir directamente sobre os bancos, prevenindo o aparecimento de uma nova bolha.
Se há 40 anos os países emergentes apenas contribuíam para 20 por cento do crescimento global, graças às suas exportações para os países desenvolvidos, o cenário actual desenha-se bastante diferente. Actualmente, entre 60 e 70 por cento cabe às "novas" economias e, num futuro próximo, estas irão representar 75 por cento do crescimento global, prevê Alan Conway.