4.11.09

Governo não segura défice orçamental nos próximos anos

por Rudolfo Rebêlo, Diário de Notícias

Os portugueses terão ganhos salariais de 0,8% em 2010, depois de aumentos de 5,9% este ano. Compras estagnam, com as famílias pressionadas pelo endividamento à banca. Défice orçamental será de 8% este ano e vai aumentar até 2011. Aumento na função pública agravou a despesa.

O défice orçamental explodiu. Bruxelas prevê que as despesas do ano ultrapassem as receitas em 8% da produção final (PIB) e o desequilíbrio das contas públicas vai aumentar em 2011, agarrado ao peso dos juros dos empréstimos da dívida pública. Ao estrangeiro, a dívida do País já ultrapassa os 100% da produção. Ontem, aos jornalistas, Teixeira dos Santos admitiu, pela primeira vez, que o défice de 2009 ficará acima dos 5,9% previstos em Maio.

O relatório de Outono da Comissão Europeia, ontem divulgado, explica a alta do défice das contas públicas. Para além da queda da economia - que penaliza receitas de impostos - "o aumento das despesas é o resultado", diz Bruxelas, de um forte "crescimento dos salários" dos funcionários públicos e das "despesas com prestações sociais", como o aumento do subsídio de desemprego ou apoios à formação.

O ministro das Finanças não subscreve, para já, as previsões de Bruxelas para o défice orçamental, que em 2011 levará a dívida pública para os 91% do PIB, quando em 2008 se situava em 66%. Para este ano, Teixeira dos Santos afirma "aguardar os números da execução orçamental referente a Outubro" para "afinar" as previsões do Governo.

Enquanto Bruxelas destaca a pressão dos salários e das despesas sociais, Teixeira dos Santos tem outra explicação para a trajectória negativa das contas. "O agravamento" do défice "não tem a ver com a despesa, mas com a quebra da receita" em impostos, precisa o ministro. "É a crise económica mais grave em 80 anos e por isso não é de admirar um valor alto" para o défice, diz.

O raio X à economia portuguesa revela mazelas na actividade e antecipa mossas no estilo de vida dos portugueses para os próximos dois anos. "A retoma" , destacam os serviços do Comissário, será lenta, com a economia a crescer apenas 0,3% em 2010, depois de um recuo de 2,9% este ano. A procura interna (consumo das famílias, Estado e investimento) estará estagnada. Apesar do desemprego e da perda de postos de trabalho (ver texto ao lado), os gastos das famílias em bens vão aumentar ligeiramente em 2010, puxados por um acréscimo de 0,8% de ganhos salariais reais, após este ano registar um aumento de 5,9%, explicado pela evolução salarial na Função Pública e decréscimos de preços de 1%.

Até 2011, realça o relatório de Outono da Comissão, o consumo das famílias será fraco, o que prejudica o comércio, serviços e empresas industriais. Para além do desemprego a travar o consumo, a Comissão destaca o "fardo do serviço da dívida" das famílias - muito endividadas à banca - que encolhe o rendimento disponível e impede as compras de bens. Também a banca apertou os critérios de concessão de empréstimos, o que estrangula o poder de compra.

É a fraca procura de bens - mais do que o preço do dinheiro (juros) - que destrói o investimento dos empresários. "Poucos incentivos existirão ao investimento", descreve o relatório da Comissão. O fraco consumo e a debilidade nas exportações está a cortar "rentabilidade" ao investimento. Com a procura externa a aumentar (ver tabela das importações dos principais clientes do País) os exportadores conseguirão estancar as perdas em 2010.