16.11.09

O imposto negativo

Manuel Esteves, in Económico

O Governo de José Sócrates prepara-se para avançar com o polémico imposto negativo (IN).

Segundo o seu programa, a intenção é " introduzir, ao longo da legislatura, um novo apoio público às famílias trabalhadoras com filhos, de modo a reduzir o risco de pobreza entre aqueles que trabalham, declaram ao fisco os seus rendimentos e têm filhos a cargo. Assim, uma família trabalhadora com filhos que tenha rendimentos inferiores ao limiar da pobreza terá o apoio público necessário à superação desta situação".

Se é uma novidade em Portugal, a discussão em torno do imposto negativo já tem barbas nos países anglo-saxónicos. Concebido nos anos 60 pelo famoso economista, Milton Friedman, a ideia é simples: os trabalhadores com rendimentos familiares inferiores a um determinado limite passam a receber um subsídio do Estado equivalente a essa diferença.

Em Portugal, os defensores do IN propõem que este se articule com o salário mínimo. No fundo, o IN estaria para o salário mínimo como o Complemento Solidário para Idosos (CSI) está para as pensões mínimas. Este foi lançado em 2005 com o argumento de que as pensões mínimas revelam fraca eficácia no combate à pobreza porque parte dos seus beneficiários não é pobre pois beneficia de outro tipo de rendimentos.

Ora, o mesmo se pode dizer do salário mínimo, que é devido a todos independentemente do rendimento da unidade familiar. E da mesma forma que o CSI implicou uma estagnação das pensões mínimas (que, em 2010, vão crescer apenas 1,25%, em média, cerca de três euros), é natural que o mesmo aconteça com o salário mínimo, contrariando a valorização dos ordenados dos trabalhadores mais pobres do país.

Mas no caso do imposto negativo, as potenciais perversões (que subsistem em qualquer prestação social) são muito maiores do que as do CSI. O IN transfere o financiamento das remunerações mínimas da entidade patronal para os contribuintes. Trata-se, na prática, de uma forma de subsidiação (à custa dos sectores mais competitivos da economia) de empresas com modelos de negócio insustentáveis e de trabalhadores pouco produtivos, adiando a tão necessária reconversão do tecido empresarial português. Se uma empresa não consegue pagar um salário de 450 euros, então deve fechar; e se um trabalhador não merece, pelo menos, 450 euros, deve ser requalificado ou então despedido.

E será que esta é a melhor forma de usar os dinheiros públicos? Se o objectivo é reduzir a pobreza e combater as desigualdades, não será preferível canalizar estes recursos para a melhoria e expansão do Serviço Nacional de Saúde e do sistema de educação público?

Com esta medida, o Governo pretende dignificar o trabalho. Porém, se é verdade que os subsídios estatais são fundamentais para a redução da pobreza, não é nada evidente que contribuam para a valorização de um trabalhador e da sua actividade profissional