20.12.10

Não há solução para a pobreza se não soubermos criar riqueza, emprego e produção nacional de qualidade

in Portal do Governo

Intervenção do Secretário de Estado da Justiça e da Modernização Judiciária no encerramento do Encontro Nacional de Organizações Não Governamentais – Direitos Humanos em Portugal com o tema «A Pobreza: Violação dos Direitos Humanos», em Lisboa

Exmo. Senhor Bastonário da Ordem dos Advogados, Dr. Marinho Pinto
Exma. Sra. Dra. Maria de Jesus Barroso,
Exmo. Senhor Vice-presidente do Conselho geral da Ordem dos Advogados e Presidente da Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados, Dr. Jerónimo Martins
Exmas. Senhoras e Senhores membros das Direcções das Organizações Não Governamentais,
Exmos. Senhores e Senhoras,

Quero em primeiro lugar felicitar a Ordem dos Advogados por, associando-se à iniciativa «2010 Ano Europeu do Combate à Pobreza e à Exclusão Social», ter promovido este encontro de debate e discussão dos Direitos Humanos em Portugal com o tema «A Pobreza: Violação dos Direitos Humanos».

O Encontro ocorre poucos dias depois de também neste lugar se ter assinalado o 62.º aniversário da Declaração Universal dos Direitos do Homem o que revela por parte da Ordem dos Advogados uma postura de porta aberta, de ligação à comunidade e de alerta e procura de soluções para situações reais de exclusão que constituem uma responsabilidade social colectiva. Significa isto que o histórico papel da Ordem dos Advogados no combate pelos Direitos Fundamentais continua a ser desempenhado com prioridade e empenhamento merecedores de público louvor, que aqui exprimo em nome do Senhor Ministro da Justiça.

Permitam-me, também, que exprima o meu regozijo por este ensejo de estar mais uma vez com pessoas e organizações que pugnam por esta causa há muitos anos, resistindo às adversidades e não desistindo de um combate de importância decisiva.

Quando foi decidido declarar 2010 Ano Europeu de Combate à Pobreza e Exclusão Social, como enorme oportunidade para alertar a Europa e o Mundo para a injustiça social não se previa com rigor o momento que vivemos.

Este Encontro tem hoje redobrada importância como meio de reflexão e participação da sociedade na definição de estratégias de combate a um flagelo que adquire novas facetas na nossa Europa.

Devemos perante o mundo e os nossos cidadãos dar exemplo do cumprimento estrito do artigo 1.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem que proclama que «Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade». E a nossa Carta Europeia dos Direitos Fundamentais – hoje com força jurídica plena graças ao Tratado de Lisboa constitui-nos no dever de garantir a todos a integração na sociedade e a possibilidade de, dignamente, realizar o seu projecto de vida.

Implementámos para isso a nível europeu e nacional um vasto conjunto de políticas públicas, manifestação importante do nosso Estado Social. A crise económica e financeira desperta nos nossos cidadãos angústia do futuro e medo de que não sejam sustentáveis os patamares de protecção atingidos e ocorra um penoso retrocesso. É nesta encruzilhada que se situa o actual debate sobre os problemas e as soluções para os enfrentar.

Em Portugal, não estão em risco as regras e princípios consagrados na Constituição da República Portuguesa que acolheu os princípios e valores da Declaração Universal. A revisão constitucional não afectará esse rico património de direitos. Esse património é uma mais-valia nos bons e sobretudo nos maus momentos. Não será ferido vale como garantia do Estado Social.

Mas a efectivação desses direitos exige medidas práticas de gestão eficaz, modernização e actualização. O Parlamento acaba de aprovar um Orçamento de Estado que pede sacrifícios aos cidadãos, em especial aos servidores do Estado por razões de interesse público. Importa que a sua execução seja rigorosa e justa. Ontem mesmo o CM aditou a essas medidas, outras de contenção, para garantir que as metas de controlo do défice público são atingidas.

Que vai acontecer às políticas de inclusão social e de combate à pobreza? Continuam a fazer parte das medidas e acções do Governo e são prioridade, agora reforçada.

O RSI, Rendimento Social de Inserção, que alguns teimavam em eliminar constitui hoje um instrumento fundamental para combater a pobreza persistente e as várias formas de exclusão.

As medidas de apoio ao acesso ao Direito são ponto essencial em tempos de crise. E há um Direito da Crise que merece mais atenção e alguns aperfeiçoamentos.

De facto, em tempos como os que vivemos, a Justiça tem de assumir a sua quota de responsabilidade e a sua intervenção não pode ser alheia à situação dos mais fracos, dos pobres e excluídos por razões económicas, sociais, de orientação, de sexo, de nacionalidade ou de etnia.

A Justiça tem de ser inclusiva. Deve acolher as diferenças. É verdade que todos somos iguais perante a lei. Mas não pode haver privilégios para os que têm meios e condições financeiras para aceder à Justiça e discriminação para aqueles que estão em situação diminuída.

Cabe-nos garantir três importantes coisas:

■Que a justiça funcione e que tenha meios e condições para actuar de forma eficaz, no nosso quadro constitucional, com total independência e imparcialidade, julgando e decidindo em nome do povo.
■Que os cidadãos se reconheçam no sistema de justiça e possam ter os caminhos de acesso ao direito e à justiça abertos e disponíveis a todos.
■Que os mecanismos do direito e da justiça se preparem e respondam à situação de crise que vivemos a nível mundial e que nos atingiu.
Por isso o Ministério da Justiça, os Tribunais, os magistrados e os advogados, os oficiais de justiça e os demais operadores do mundo judiciário devem saber ouvir os cidadãos e as suas organizações e têm de responder de acordo com as suas responsabilidades, adoptando as medidas necessárias que minorem os efeitos de uma situação económica e financeira muito complexa.

Por estas razões consideramos fundamental que o direito acompanhe a situação difícil que vivemos e não lhe volte as costas. Dispa as suas vestes formais e responda com medidas e decisões justas.

Por isso mesmo, no Ministério da Justiça:

■Pretendemos continuar e melhorar o regime de acesso ao direito.
■Consideramos essencial manter as isenções de custas e os apoios no acesso aos tribunais, designadamente através do instituto do apoio judiciário, que tem de ser revigorado.
■Damos particular atenção às situações sociais de carência resultantes do desemprego, com uma mais eficaz justiça na aplicação do direito laboral.
■Estamos a criar meios mais ágeis de apoio e de resolução das situações dos que foram atingidos pela situação económica e ficam em situação de insolvência ou não podem continuar a cumprir por exemplo o pagamento dos seus impostos.
■Recentemente aliás aprovámos legislação que permite um sistema inovador de arbitragem tributária.
■Desenvolvemos ainda os meios de resolução alternativa de litígios, mais ágeis, baratos e acessíveis, com a rede de julgados de paz e a mediação.
Não há contudo solução para a pobreza se não soubermos criar riqueza, emprego, empresas, fomentando exportações e a produção nacional de qualidade.

O Conselho de Ministros de ontem aprovou um conjunto de medidas que consideramos poder alavancar uma inflexão da situação. Temos de continuar a investir e a aplicar bem os nossos recursos. Isso significa investir em áreas da economia que podem ser competitivas, mantendo empregos e relançando, apesar da crise mundial, as bases da mudança!

Sabemos que o Estado Português e a sociedade civil estão sensibilizados e empenhados na recuperação da crise. Sabemos que vamos encontrar soluções económicas centradas no emprego e na protecção social. Não desistimos e não aceitamos a Pobreza e Exclusão social como uma inevitabilidade da condição humana!

A todos peço a continuação deste árduo trabalho de luta contra a pobreza e a exclusão social, para criarmos mecanismos que serão essenciais no combate à crise e aos seus efeitos.

José Saramago disse um dia, daquela forma desarmante com que desnudou muita cegueira e muita injustiça: «Com a mesma veemência com que reivindicamos direitos, reivindiquemos também o dever dos nossos deveres. Talvez o mundo possa tornar-se um pouco melhor». É nesse combate que devemos juntar esforços.