6.10.15

Pobreza dispara com mudança de critérios do Banco Mundial

Por Eduarda Frommhold, in Dinheiro Vivo

O Banco Mundial prepara-se para aumentar para 1,90 dólares por dia o rendimento abaixo do qual a população mundial é considerada pobre.

Atualmente a linha de pobreza está fixada em 1,25 dólares por dia em paridade do poder de compra. Ou seja, considerando o poder de compra equivalente a essa quantia em cada país.

A subida para 1,90 dólares (cerca de 1,70 euros) representaria um aumento de cerca de 50% do rendimento considerado mínimo para subsistir, o que a concretizar-se deverá engrossar as estatísticas da pobreza mundial em muitas dezenas de milhões.

Pelas contas do Banco Mundial, 1,1 mil milhões de pessoas em todo o mundo vivem em pobreza extrema, com menos de um dólar por dia. Ou seja, cerca de um sexto da população mundial. Enquanto outros 2,7 mil milhões vivem em pobreza moderada, com menos de dois dólares por dia.

É difícil prever com exatidão quantas pessoas mais entrarão para as fileiras da pobreza com a alteração do Banco Mundial. Mas quando no início do ano os seus investigadores testaram um limiar de pobreza de 1,92 dólares, o salto foi de 148 milhões. O Leste da Ásia foi o mais atingido com a população abaixo da linha de pobreza quase a duplicar.

O Banco Mundial deverá anunciar a alteração, que está a ser preparada há quase dois anos, antes das suas reuniões anuais em Lima, no Peru, no início de Outubro. E será a maior revisão em 25 anos do valor fixado para a pobreza, desde que a instituição com sede em Washington, nos Estados Unidos, subiu, em 1990, de um dólar para 1,25 dólares por dia o seu critério para a linha da pobreza no globo ainda atualmente em vigor.

Em entrevista ao Financial Times, o presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, justificou a decisão com a necessidade de uma atualização dos critérios para melhor aferir a pobreza no mundo, face aos novos dados sobre o poder de compra. E garantiu que o novo limiar foi "muito bem analisado" pela equipa da instituição especializada na pobreza.

Mas coloca-se um problema. Um dos principais objetivos do Banco Mundial é o combate e erradicação da pobreza no mundo. A meta para acabar com "a extrema pobreza em todos os lugares" foi fixada pela própria instituição liderada por Jim Yong Kim em 2030. Isto é daqui a apenas 15 anos. Uma tarefa tanto mais difícil quanto mais pobres entrarem para as estatísticas.

Esta sexta-feira mesmo, os líderes mundiais estarão reunidos na sede da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova Iorque, nos EUA, para se comprometerem com 17 novos "objetivos de desenvolvimento sustentável", destinados a orientar a política de desenvolvimento para os próximos 15 anos, onde se inclui, logo à cabeça, a erradicação da pobreza até 2030.

Na região da Europa e Ásia Central, o Banco Mundial aponta para uma fatia de 5% da população que vive com menos de 1,25 dólares por dia. Uma percentagem que mais do que triplicou desde 1990 até 2011.

Em Portugal, o limiar do rendimento abaixo do qual se considera que uma família se encontra em risco de pobreza é de 60% do rendimento médio nacional por adulto, que é o mesmo valor convencionado pela Comissão Europeia para todos os países da União Europeia.

Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), este valor era em 2013 de 4937,00 euros anuais em Portugal, o que equivale a 411,42 euros por mês. Abaixo, portanto, dos 4969,00 euros por ano (414,00 euros por mês) que se registavam em 2008, no ano da crise económica e financeira despoletada pela falência do Lemon Brothers no final desse ano.

Ainda de acordo com o INE, a taxa de risco de pobreza em Portugal antes de qualquer transferência social (pensões ou apoios sociais)subiu de 42,5% em 2010, antes do pedido de ajuda financeira à UE e ao FMI, para 47,8% em 2013, meses antes da saída "limpa" do programa de ajustamento.

Por outro lado, a taxa de intensidade da pobreza também se agravou, passando de 23,2% em 2010 para 30,3% em 2013, segundo números ainda provisórios.


Morrem 50 mil pobres por dia em todo o mundo

Todos os anos, cerca de 18 milhões de pessoas no mundo morrem devido a razões relacionadas com a pobreza, o que dá uma média de 50 mil pessoas por dia, na maioria mulheres e crianças.

O Banco Mundial estima que mais de 800 milhões de pessoas estão subnutridas e o combate torna-se cada vez mais difícil em clima de desaceleração económica generalizada, em que impera a contenção dos gastos públicos e quando muitos países atravessam ainda períodos de grande austeridade.

Segundo um relatório da Cáritas, Portugal foi, dos sete países da União Europeia mais atingidos pela crise, aquele em que o risco de pobreza e exclusão social mais aumentou em 2014, à frente da Grécia, Chipre, Roménia, Irlanda, Itália e Espanha.