28.2.22

Ucrânia. Guerra pode gerar cinco milhões de deslocados

José Pedro Frazão , Marta Grosso , Cristina Nascimento, in RR

O diretor-geral da Organização Internacional das Migrações das Nações Unidas, António Vitorino, defende na Renascença o cessar-fogo imediato por ser determinante para organizar a ajuda aos refugiados.

O diretor-geral da Organização Internacional das Migrações das Nações Unidas (OIM) diz ser muito importante perceber a duração do conflito na Ucrânia, pois disso depende a quantidade de deslocados que a União Europeia terá de acolher.

“Temos vários cenários e tudo depende da dimensão da operação militar e da duração do conflito. Por isso, a questão fundamental neste momento é parar e criar condições para um cessar-fogo. As Nações Unidas têm um cenário em que uma intervenção militar desta natureza, em vários locais, pode gerar mais de cinco milhões de deslocados”.

Nesta segunda-feira, Rússia e Ucrânia reuniram-se para conversações de paz junto à fronteira com a Bielorrússia, sem que, contudo, tivessem parado os combates.

Enquanto se aguardam notícias desta reunião, uma das prioridades imediatas vai para o acolhimento dos muitos milhares de ucranianos que continuam a deixar o país e que nesta altura já são mais de 500 mil.

Em entrevista à Renascença, António Vitorino explica de que forma está essa ajuda a ser articulada. Na Polónia, por exemplo, o processo parece estar a correr bem. Já na Moldávia, que também tem fronteira com a Ucrânia, a capacidade de ajudar não é tão grande – a Moldávia precisa de ajuda para ajudar.

Dentro da própria Ucrânia, o diretor-geral da OIM fala em “duas situações completamente distintas: temos pessoas nas zonas mais afetadas pela operação militar, com muita dificuldade de movimentos” e “temos movimentos noutras zonas menos impactadas pelo conflito, com pessoas que aproveitam essa circunstância para poderem tentar sair da Ucrânia e ir para países limítrofes”.

“O nosso cálculo neste momento é que deve haver cerca de 200 mil pessoas internamente deslocadas”, avança António Vitorino, lembrando que “ainda existem na Ucrânia mais de dois milhões de pessoas deslocadas internamente por causa das operações militares russas na Crimeia e na zona de Luhansk e Donetsk, desde 2014”.

Na Moldávia não existem capacidades de acolhimento, pelo que já está em curso uma operação para transportar tendas, sacos-cama, cobertores...

Além disso, há indicação que muitas pessoas fugiram para a Rússia. “Temos nota de que houve um fluxo relevante, de cerca de 100 mil pessoas, que abandonaram sobretudo a região do Leste da Ucrânia e o grande Donbass em direção à Federação Russa e os relatos que nos chegam é que também aí há necessidades humanitárias”, indica.
A maior preocupação de Vitorino

“O setor que mais me preocupa neste momento é o hospitalar”, afirma António Vitorino. “Obviamente, num cenário de conflito que envolva vítimas civis, isso vai ser um esforço extraordinário sobre os hospitais ucranianos”, explica.

O diretor-geral a OIM dá um exemplo: “os Médicos Sem Fronteiras deixaram de operar na Ucrânia, porque consideram que não têm condições de segurança para prosseguirem com as suas operações”.

A falta de condições deixa o país mais vulnerável no cuidado a prestar à vítimas da guerra.

Os Médicos Sem Fronteiras deixaram de operar na Ucrânia, porque consideram não ter condições de segurança

Parar a guerra para poder acudir as pessoas

A ONU mantém as suas estruturas na Ucrânia. “A decisão do secretário-geral [António Guterres] foi de que todas as agências ficavam na Ucrânia e continuavam a operar na Ucrânia”, informa.

A OIM é uma delas e até aumentou “a presença no território ucraniano, exatamente para estarmos preparados para responder às necessidades que resultam da guerra”.

“Temos cerca de 400 colaboradores na Ucrânia, que estão em vários pontos do território ucraniano, mas neste momento temos a capacidade de intervenção bastante limitada por causa do conflito militar”, lamenta.

É fundamental parar o sofrimento das pessoas

António Vitorino explica que as Nações Unidas “estão concentradas num conjunto de pontos identificados como pontos de convergência das agências, para estarmos isentos de sermos considerados alvo no conflito militar. Mantemos um relacionamento muito direto com as autoridades ucranianas, mas também se impõe que tenhamos medidas de precaução para não expor os nossos colaboradores aos riscos da guerra”.

Agora, reforça o português, o mais importante é o cessar-fogo. “É fundamental para parar o sofrimento das pessoas e para que nós possamos acudi-las como precisam”.


ENTRE TURISTAS E APARTAMENTOS DE LUXO, HÁ UMA “FAVELA” NO CORAÇÃO DE LISBOA

Alexandra Correia, José Carlos Carvalho, in Visão

Em pleno centro histórico, rodeado por todos os lados de apartamentos para “estrangeiro pagar”, existe um bairro que cai de velho e de podre, onde há famílias que vivem sem casa de banho, debaixo de um teto de lata. Fomos conhecer a Quinta do Ferro, na Graça

Matilde Cunha, 72 anos, sai da porta da frente da sua casa na Rua B e entra na porta ao lado, que dá para um pequeno logradouro. Vai à “casa de banho”. Tem lá uma pia e um pote de plástico onde faz as necessidades. Para tomar banho, aquece a água no fogão e lava-se numa bacia. Ela, o marido e dois filhos.

Na casa de tabique, o chão está a abater, há buracos nas paredes e humidade por todo o lado. Pela pequena habitação de dois quartos pagam 90 euros mensais ao senhorio: a Câmara Municipal de Lisboa. Matilde vive ali há 52 anos, mas só recentemente é que entrega a renda à autarquia; durante anos, pagou-a a um senhorio falso, que lhe passava um “recibo à mão”.

Mãe a quem foram retiradas três filhas: “Foram 15 anos de tortura. Simplesmente sou pobre”

Joana Gorjão Henriques (Texto) e Miguel Madeira(Fotografia), in Público on-line

Em 2007, Piedade Manteigas e Nuno Freitas viram os serviços sociais retirarem-lhes as três filhas, a mais nova com seis meses. Agora, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos condenou Portugal a pagar uma indemnização. Em 2019, Estado ainda tentou que desistisse da queixa com 13 mil euros, mas não aceitaram. Especialistas falam da necessidade de supervisão e formação na assistência social, Governo não comenta. E agora, como será com as filhas?

No dia em que Piedade Manteigas e Nuno Freitas deixaram de ter as três filhas à sua guarda, foram chamados pela assistência social ao posto da GNR de Vendas Novas para “assinar uns papéis”. Era 31 de Outubro de 2007, tinham ido ao supermercado. Longe de saber o que se iria passar, levaram-nas com eles: B., com três anos, R., com 23 meses e E., com apenas seis meses. “Havia mais de 40 guardas, foi o cenário mais horrível”, descreve Piedade. “Tiraram-me a bebé das mãos. Estava ao meu colito, agarraram-me nela e eu fiquei no chão. Fui como uma criminosa. Desmaiei”, conta Piedade Manteigas em sua casa, num bairro social em Vendas Novas, Alentejo. Piedade lembra que ainda dava de mamar à filha mais pequena.

Depois desse dia, os pais alegam que estiveram um mês sem saber para onde tinham ido as meninas. Elas seriam acolhidas numa instituição a mais de 50 quilómetros de casa, a Chão dos Meninos, em Évora. Foi aí que as três crianças viveram até à decisão do Supremo Tribunal ter validado a medida decretada pelo Tribunal de Montemor-o-Novo de inibição do exercício das responsabilidades parentais, em Outubro de 2014. Ou seja, nesse dia cessaram os laços familiares.

De cabelo apanhado, olhos grandes que se enchem de lágrimas muitas vezes ao longo da conversa, Piedade Manteigas relata o que foi a sua vida e a do marido desde esse dia. “Tive fama de ser péssima mãe. Foi isso que durante muitos anos julguei: ‘não presto como mãe’.”

"Foi o cenário mais horrível. Tiraram-me a bebé das mãos. Estava ao meu colito, agarraram-me nela e eu fiquei no chão. Fui como uma criminosa"

Desde então que a vida deste casal gira à volta do processo. Com o sexto ano de escolaridade, 48 anos, Piedade teve alguns trabalhos, mas neste momento está de baixa porque tem problemas cardíacos. Sofre de ataques de pânico. “Dizem que é normal porque são muitos anos. Há alturas que me vou abaixo. Tenho o desgosto igual a ter perdido um filho”, comenta.

Aos 45 anos, e com a quarta classe, Nuno sofreu recentemente um acidente de trabalho que o lesionou, obrigando-o a usar uma muleta. Passou a entrevista de pé, sentado tem dores. Logo agora que tinha conseguido um trabalho em que ganhava cerca de mil euros. “Lá vamos nós ter que depender outra vez delas”, lamenta Piedade Manteigas com as mãos na cabeça. Elas são as assistentes sociais.

Tenho o desgosto igual a ter perdido um filho

Esta semana, porém, chegou uma vitória. Ao fim de 15 anos sem a guarda das filhas e mais de sete sem saber nada delas, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) condenou o Estado a pagar-lhe uma indemnização de 13 mil euros e 6150 euros de custas judiciais, concluindo que as autoridades portuguesas “ignoraram as suas obrigações de assegurar a manutenção da relação familiar” entre a família e as filhas.

Em nenhuma fase do processo foram mencionadas situações de violência, maus-tratos ou abuso sexual das três crianças. Pelo contrário, o tribunal notou “bastantes” sinais de afecto dos pais para com as filhas.

O TEDH afirmou que as decisões de colocar numa instituição e de adopção “não se basearam em razões suficientes capazes de as justificar”. Sustenta: “Em nenhuma fase do processo foram mencionadas situações de violência, maus-tratos ou abuso sexual” das três crianças. Pelo contrário, o tribunal notou “bastantes” sinais de afecto dos pais para com as filhas. A decisão portuguesa, critica o TEDH, não se poderia basear em questões materiais. Este tribunal sublinhou ainda que as visitas familiares ao centro de acolhimento foram restringidas e criticou o facto de o tribunal português não ter acedido “a nenhum dos pedidos feitos” pelo casal para as filhas passarem férias ou feriados na casa da família. Critica mais: “O tribunal nunca considerou aplicar uma medida de protecção menos restritiva, apesar de a situação material da família ter melhorado.”

Antes disso, em 2019, reconhecendo que o procedimento interno não cumpria com a jurisprudência do Tribunal Europeu, o Estado português chegou a apresentar uma proposta de indemnização dos mesmos 13 mil euros por danos morais para que desistissem da queixa. Não aceitaram. A questão nunca foi o dinheiro. “Nunca pedimos um cêntimo”, diz Piedade.

Sorrindo, Piedade Manteigas comenta: “Estou feliz porque houve justiça.” Foram anos de “tortura”: “Tive uma condenação de 15 anos e não fiz nada. Não matei ninguém, não espanquei ninguém. Simplesmente sou pobre. Continuo a ser pobre? Continuo. Mas sei cuidar dos meus filhos.”

Mas esta decisão não altera o que antes os tribunais decidiram em relação a quem já foi adoptado. Da mais velha, que está prestes a fazer 18 anos, recebeu notificação do Tribunal da Amadora a afirmar que tinha sido adoptada; mas da mais nova, que terá 14 anos, não houve qualquer notificação. Porém, Paula de Deus, que dirige a instituição Chão dos Meninos, diz ao PÚBLICO que as duas meninas foram adoptadas em 2015. A filha do meio, agora com 16 anos, é a única que ainda está numa instituição e sobre quem ainda se pode reverter a decisão judicial.

"Roubaram” as filhas

A sala da casa de Piedade e Nuno está impecavelmente arrumada. Têm plantas, dois sofás, alguns quadros, um armário com livros e muitas fotografias das filhas e dos filhos.​ Piedade e Nuno conheceram-se em Almada, onde nasceu a mais velha, mas foram para Vendas Novas onde Piedade crescera e tinha família, que nunca a apoiou.

Ela tinha um filho mais velho com autismo, que estava numa instituição por os pais não terem condições para cuidar dele. Nuno não conseguia encontrar emprego. Nessa altura já estavam sob acompanhamento dos serviços sociais por questões financeiras, “para estimulação das crianças” e “gestão doméstica”, conforme refere a sentença.

Viviam com o Rendimento Social de Inserção. Piedade tomava conta das filhas em casa, enquanto Nuno fazia uns biscates. Segundo as contas da mãe, as técnicas teriam feito cerca de quatro visitas ao longo de um ano antes da retirada das filhas. O casal vivia “fechado” com medo que lhes “tirassem as meninas”, conta Piedade. A Segurança Social queria que a filha mais velha, então com três anos, fosse para a creche, mas Piedade considerava que podia tomar conta dela. Queria que Nuno arranjasse emprego. Assinalou problemas de higiene em casa, que o casal corrigiu. E um dia, sem eles saberem porquê, “roubaram” as suas filhas.

A partir daí, todos os anos Piedade dizia para si própria: “É só esperar mais um ano.” Depois mais um ano. E mais outro. E outro. Visitavam as filhas a 50 quilómetros de distância, levando o filho mais pequeno que entretanto nascera para conhecer as irmãs. As meninas não percebiam por que é que ele estava com os pais e elas ali.

Até que, em 2012, apareceu a decisão do Tribunal de Montemor-o-Novo​ de retirada para adopção. “Foi aí que o meu mundo acabou.”

Na sentença encontra-se a referência constante às questões financeiras da família como motivo para a institucionalização das filhas. Apesar de reconhecer os laços afectivos fortes entre ambos, este tribunal português acusa a família: “não revelam capacidade de trabalho nem vontade de trabalhar, persistindo em subsistir exclusivamente à conta de subsídios

Na sentença encontra-se a referência constante às questões financeiras da família como motivo para a institucionalização das filhas. Apesar de reconhecer os laços afectivos fortes entre ambos, este tribunal português acusa a família: “Não revelam capacidade de trabalho nem vontade de trabalhar, persistindo em subsistir exclusivamente à conta de subsídios”, “interiorizaram um modo de vida subsídio-dependente” ou “não lograram desenvolver competências para assegurar o regresso à família das suas filhas, mantendo hábitos antigos, nomeadamente, desinteresse por desenvolver profissão ou actividade”.

A juíza critica ainda o casal por ter tido mais um filho, N., hoje com 13 anos. N. sempre viveu com os pais, apesar de nos primeiros seis anos de vida ter tido a ameaça da institucionalização.

Isso causou perplexidade na família: por que é que, tendo reconhecida capacidade para educar o filho, não lhes foi reconhecida a mesma para as três meninas? “Se eu soube dar educação a este menino, não podia dar às outras também?”, questiona a mãe que, ainda na maternidade, se amedrontava com a hipótese de lhe levarem o filho como fizeram com as filhas.

O tribunal acusa mesmo estes pais de usar “em seu favor a circunstância de, ao seu filho mais novo, ter sido aplicada medida de apoio junto dos pais”.

Depois da sentença do Supremo em 2014, Piedade pensava: “'Onde me vou agarrar?’ Telefonei para tudo o que era sítio. Liguei para o Papa Francisco, para França, para a União Europeia, liguei para a Procuradoria-Geral da República. Liguei para advogados. Ninguém queria aceitar o meu caso.” Chegou à advogada Elsa Maria Ferreira, porque o marido tinha tratado da guarda do filho mais novo. “Disse-lhe que não tinha dinheiro. E andámos as duas nisto estes anos.” Recorreram ao TEDH em 2015.

A instituição rejeitou o pedido do pai de visitar as meninas ao domingo uma vez que no dia estipulado, terça-feira, estava a trabalhar: à família acusada de não querer integrar-se profissionalmente é recusada a visita no dia de descanso.

"Vamos tirar os filhos todos aos pobres?”

Quando leu a decisão do tribunal, a advogada ficou “logo com vontade de a ajudar”. “É uma crueldade muito grande. Constatei o que nos diz o acórdão do TEDH: não há violência, maus tratos, abusos, a única coisa que se aponta é o aspecto económico. Existe debilidade financeira. E o Estado faz o quê? Retira as filhas. Então vamos tirar os filhos todos aos pobres? O Estado financia as instituições, mas não ajuda os pais para manter as famílias?”

Mesmo que houvesse falhas na família, questiona, por que é que não foi aplicada uma medida de acompanhamento?

Tentativas de contacto com as crianças boicotadas pela instituição, técnicas da Segurança Social que escrevem relatórios onde deturpam a realidade e têm uma conduta persecutória, criando nos pais sentimentos de revolta, medo, ansiedade, ausência de direito ao contraditório: estas são algumas das críticas da advogada feitas ao processo. “Esta família ficou à mercê das ingerências arbitrárias dos poderes públicos​”, comenta.

Dá exemplos, como os sucessivos pedidos da família para passar épocas festivas com as filhas – negadas pela instituição – e a forma como rejeitaram o pedido do pai de visitar as meninas ao domingo numa altura em que no dia estipulado, terça-feira, estava a trabalhar: à família acusada de não querer integrar-se profissionalmente é recusada a visita no dia de descanso.

Sobre este pedido feito em Dezembro de 2009, apesar da intervenção do tribunal, a Chão dos Meninos recusou aceder deixando um intervalo de meses entre a primeira solicitação dos pais e a efectivação da visita. A instituição queria que se restringisse ao primeiro domingo de cada mês (mas o Ministério Público opôs-se). Com poucos rendimentos, gastavam 50 euros a cada domingo em que tinham de percorrer 50 quilómetros de transportes. “Esta família nunca teve um único dia com as filhas.”

Durante este período, Piedade pediu várias vezes para ver as filhas e não deixavam. Enviou cartas ao tribunal, sem resposta. “Nunca pude levar as minhas filhas a um café, a um parque”, lamenta. “Nas reuniões era horrível, humilhavam a gente.” Repete: “Não fiz nada, eu simplesmente sou pobre. Posso ter errado, mas nunca criámos confiança porque eles ameaçavam sempre com as crianças, então a gente não reage muito bem. Chegavam aqui as técnicas a casa e diziam para tirar as fotografias das minhas filhas porque elas já não eram minhas!”

Paula Deus, actual responsável da Chão dos Meninos, responde ao PÚBLICO que as crianças são supervisionadas por equipas multidisciplinares e que, apesar de reconhecer que “nunca estão bem numa instituição”, há “factores de risco e de perigo” nas famílias que fazem com que isso seja necessário. Opta por não explicar quais foram esses factores neste caso concreto – diz que está em causa a privacidade das crianças –,​ nem quer justificar as acusações feitas pelo lado da família sobre o processo. Afirma: “As famílias têm direito a recorrer das decisões tomadas e é fundamental existir esse princípio.”

Também não posso agora ser a rainha disto tudo e fazer o que me apetece: vamos fazer tudo como manda a lei. Vamos fazer tudo com muita cautela.

A decisão do TEDH foi uma vitória, mas não total. Mexendo nas mãos, com o rosto para baixo, Piedade não sabe nada da filha mais nova. A filha do meio está numa instituição no Norte: como atingiu os 15 anos sem ser adoptada, em Dezembro de 2020 a família foi notificada para se pronunciar sobre as medidas de promoção e protecção; aguarda que seja reposta a legalidade e seja possível a reunificação familiar.

A menina precisa de acompanhamento devido a problemas do foro mental. “Porque é que foi uma criança normal até aos oito anos e vão-me entregar uma criança doente, o que é que se passou aqui?”, questiona, com a voz mais forte de indignação.

Têm tido contacto telefónico com esta filha. Relatam um processo de aproximação lento, acompanhado pelos técnicos “excelentes” da instituição. Primeiro enviaram fotos para ver se ela se recordava dos pais. Depois perguntaram se queria falar ao telefone.

“Ligava e ela não estava preparada. Um dia liguei e a enfermeira disse: ‘Espere lá um bocadinho’. Esperei e ouço assim: ‘Mãe’. E eu disse:’ Filha, és tu?’”, conta emocionada, fazendo uma pausa e engolindo em seco. “Já não a ouvia há oito anos. Ao fim de oito anos ouvir uma filha a dizer ‘mãe’... é complicado.” Também Piedade sente que precisa de se preparar para ir ver a filha. “Tenho que ir muito forte.”

Quanto à mais velha, tem informação de que está bem tratada, que “a família é de excelentes pessoas”. “Faço questão que a família contacte comigo para agradecer o que fizeram. Imagino aquela família com isto, foi uma bomba que lhes caiu... Estou-me a pôr no lugar deles, devem estar em pânico. Mas eu não vou fazer nada. Vou dizer: ‘Estás bem, não peço que saias daí, só quero que nos venhas visitar.’”

No armário onde estão as fotografias das filhas e do filho há umas com os rostos mais próximos, outras em molduras onde estão a pousar de um lugar mais distante. Da mais nova há várias com sorriso largo. Piedade vai ao seu quarto em tons rosa, e traz um quadro cheio de mais fotos das filhas. Os dois rapazes perguntam várias vezes pelas irmãs, conta. O mais novo ficou tão feliz com este desfecho –​ só quer ver as irmãs ao fim de oito anos de silêncio. “Penso que não vai levar 15 anos!”, comenta Piedade, já com sorriso. “Mas também não posso agora ser a rainha disto tudo e fazer o que me apetece: vamos fazer tudo como manda a lei. Vamos fazer tudo com muita cautela.”

Da Segurança Social queria um pedido de desculpas, especialmente das técnicas. “Sabe quem me vai dar a indemnização? Pessoas que trabalham anos como você, vão pagar o erro deles. É uma injustiça.”

Para o dinheiro da indemnização –​ “que não é meu, é das filhas e não é nada para aquilo que sofreram” –​ tem um plano: guardar para estudarem. “Para serem alguém na vida e não como os pais, que não estudaram e não tiveram um emprego estável”, comenta.
Supervisão e formação

Esta é a segunda vez num espaço de sete meses que o TEDH condena Portugal por retirar crianças a uma mãe. Em Julho, condenou o Estado por retirar há quase dez anos os filhos gémeos de uma mãe, criticando a forma limitada como a mãe podia visitar os filhos. Também em 2016, o TEDH condenou Portugal a pagar 15 mil euros a Liliana Melo, a quem foram retirados sete filhos. E há o caso de Ana Maximiano, que ficou seis anos sem ver as filhas e colocou as técnicas da Segurança Social em julgamento.

Rita Lobo Xavier, professora na Faculdade de Direito da Universidade Católica do Porto e especialista na área da família, desconhece os pormenores deste caso mas recorda isso mesmo, que “já não é a primeira vez que os juízes do TEDH ficam com a convicção de que os nossos tribunais e serviços da Segurança Social desistem das famílias das crianças por razões económicas, chegando a mencionar discriminação”. Sublinha: “Parece ser necessária formação dos profissionais que trabalham nestas áreas para o facto de as carências materiais não serem fundamento, por si só, para a separação dos filhos dos seus pais.”

A especialista diz que o problema não está na lei portuguesa, que “prevê que as medidas a aplicar respeitem o princípio da prevalência da família (princípio que traduz a prioridade que é atribuída ao desenvolvimento da criança no seio da família, devendo apoiar-se a família para que reúnam as condições necessárias para o cumprimento das suas funções)” e consagra “o princípio da intervenção mínima”, ou seja, implica que “seja apenas a necessária para garantir a promoção dos direitos e a protecção da criança e do jovem em perigo”.


Também Guilherme de Oliveira, fundador do inactivo Observatório Permanente de Adopção do Centro de Direito da Família da Faculdade de Direito de Coimbra, refere a questão dos meios e de pessoal, e a falta de supervisão dos envolvidos no processo, dos técnicos no terreno. “Também não se pode pedir ao Ministério Público ou aos juízes que vão às casas”, comenta. “Mas essa supervisão está a falhar e não vejo maneira de resolver.” Reconhece que a pobreza é “uma velha questão nestes casos”, e que “compromete tudo”: “Sempre ouvi dizer que é mais caro pôr uma criança numa instituição do que subsidiar uma família. Há famílias que não sabem fazer uma sopa. Retira-se quando há afecto, só não há competências?”

​O PÚBLICO enviou na quinta-feira ao Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS) várias questões sobre este caso: foi aberto algum inquérito às técnicas que tomaram decisões? De que forma o sistema fiscaliza este tipo de situações? Que procedimentos pode adoptar para que não se repitam? O MTSSS responde apenas que não lhe compete pronunciar-se sobre o caso em questão, que se encontra em sigilo. “O Instituto de Segurança Social (ISS) apenas realiza assessoria técnica de um processo judicial. O ISS é dotado de mecanismos de supervisão e fiscalização para este tipo de processos”, afirma, sem explicar nem especificar quais são.

Crianças que vivem próximo de áreas verdes têm melhor desempenho cognitivo


Estudo no Porto mostra que crianças que vivem a uma distância de até 800 metros de espaços verdes públicos apresentaram um maior QI aos dez anos.

Investigadores do Instituto de Saúde da Universidade do Porto (ISPUP) concluíram que as que vivem mais próximas de espaços verdes apresentam um “melhor desempenho cognitivo”, num estudo que envolveu mais de 3800 crianças da Área Metropolitana do Porto.

O estudo, publicado na revista Science of the Total Environment, visava compreender “qual a importância da exposição a espaços verdes e azuis [água] no desenvolvimento cognitivo das crianças” aos dez anos, explica um comunicado do instituto da Universidade do Porto. Para avaliarem se existia uma correlação, os investigadores realizaram um estudo longitudinal que incluiu 3827 crianças, residentes na Área Metropolitana do Porto e que participam na coorte Geração XXI, do ISPUP.

Na investigação foi tida em conta a “densidade de vegetação”, através de imagens de satélite, bem como a distância a pé da residência e da escola das crianças aos espaços verdes urbanos e espaços azuis. A avaliação foi realizada quando as crianças completaram quatro, sete e dez anos.

Os investigadores mediram o quociente de inteligência (QI) aos dez anos, usando o índice de inteligência Wechsler, e concluíram que “as crianças que viviam a uma distância de até 800 metros de espaços verdes públicos, como parques e jardins, apresentaram um maior QI aos dez anos”.

Quanto a exposição a espaços azuis e inteligência, os investigadores “não encontraram uma associação”.

“O estudo veio reforçar a importância dos espaços verdes no desenvolvimento cognitivo das crianças”, salienta no comunicado Diogo Almeida, o primeiro autor do artigo. “Seria importante que, em termos de planeamento urbano, se considerasse melhor a disponibilidade de espaços verdes, sobretudo perto das áreas residenciais”, considera, lembrando que tal beneficiaria a “inteligência das crianças” e se reflectiria “em adultos mais saudáveis e competentes”.

A investigação, intitulada Residential and school green and blue spaces and intelligence in children: The Generation XXI birth cohort, foi desenvolvida ao abrigo do projecto EXALAR XXI, financiado pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), através do Programa Operacional Competitividade e Internacionalização e por fundos nacionais através da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).


Alterações climáticas: “Meias medidas já não são uma opção”, alerta IPCC

Claudia Carvalho Silva, in Público on-line

Com um planeta mais quente, as medidas terão de ser cada vez mais fortes. O IPCC apresentou esta segunda-feira um relatório que é sobre “as consequências da inacção” num mundo em que as alterações climáticas já afectam milhões de pessoas.

As alterações climáticas são uma ameaça gigante para o nosso bem-estar e para um “planeta saudável” e “é agora claro que mudanças pequenas, marginais e reactivas não serão suficientes”, alerta o Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC). O novo relatório feito pelo Grupo de Trabalho II do IPCC foi apresentado na manhã desta segunda-feira e indica que são precisas (mais) medidas urgentes para nos adaptarmos aos efeitos das alterações climáticas, em simultâneo com um corte nas emissões de gases com efeito de estufa para impedir que o planeta continue a aquecer. Chegámos a um ponto em que não se pode continuar a pensar só a curto prazo. “Meias medidas já não são uma opção”, assevera o presidente do IPCC, Hoesung Lee.

“As nossas acções de hoje definirão como as pessoas se adaptam e como a natureza responde aos riscos crescentes causados pelas alterações climáticas”, lê-se nas conclusões do relatório. Nas próximas duas décadas e com um aumento da temperatura global de 1,5 graus Celsius, as ameaças serão uma realidade e são “inevitáveis”. Se o aumento da temperatura for superior – mesmo que temporariamente –, alguns destes impactos serão irreversíveis.

Apesar de muitos indicadores serem alarmantes, ainda há esperança: as acções que limitem o aquecimento global a 1,5 graus Celsius “reduziriam substancialmente as perdas e danos previstos” – “mas não os poderão eliminar a todos por completo”.

Dependência dos combustíveis fósseis é um “beco sem saída”

O secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmou na conferência de imprensa virtual desta manhã que metade da humanidade está agora a viver na zona de perigo das alterações climáticas. O relatório é sinal do “sofrimento humano”, de uma “catástrofe” que se avizinha.

Diz que os combustíveis fósseis estão a “esganar” a humanidade e que a dependência destes recursos nos deixa vulneráveis a crises e a choques geopolíticos. “Os combustíveis fósseis são um beco sem saída para o planeta, para a humanidade e para as economias”, afirmou Guterres, dizendo que a adaptação pode salvar vidas. Mas há urgência.

Na mesma conferência de imprensa, a directora executiva do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, Inger Andersen, manteve o tom: “Estamos numa emergência à espera de um desastre”, afirmou, dizendo que as medidas têm sido “demasiado fracas”. “A natureza pode salvar-nos – mas só se a salvarmos primeiro.”

Certo é que, a cada subida da temperatura global, as medidas tornam-se menos eficazes. Existem “grandes lacunas” entre o esforço que está a ser feito por uns e a adaptação que é necessária para se responder ao ritmo a que galgam as alterações climáticas. Sem nunca esquecer que tudo está interligado: o clima, a biodiversidade, as pessoas.

De resto, os riscos das alterações climáticas já são conhecidos: haverá mais ondas de calor, mais seca, mais cheias – que já estão a desafiar os limites dos animais e das plantas, causando a morte e extinção de espécies, incluindo árvores e corais. Não é um problema do futuro: “É inequívoco que as alterações climáticas já estão a prejudicar os sistemas humanos e naturais.”

3,6 mil milhões vivem em zonas vulneráveis

O relatório sublinha também que as alterações climáticas interagem com outros riscos: a população mundial está a aumentar, há um consumo de recursos excessivo e insustentável, há cada vez mais pessoas a morar nas cidades e as desigualdades e pobreza permanecem. Como acontece noutros contextos, quem sofre mais são as populações mais vulneráveis. O IPCC estima que cerca de 3,3 a 3,6 mil milhões de pessoas vivem em contextos altamente vulneráveis às alterações climáticas. Os riscos para as sociedades estão a aumentar, incluindo quem vive em zonas costeiras.

O grupo de trabalho alerta que os impactos e os riscos estão a ser cada vez mais “complexos e difíceis de gerir”. Há fenómenos causados pelas alterações climáticas que passarão a acontecer com mais frequência e em simultâneo. “O aumento de extremos climáticos levou a alguns impactos irreversíveis, enquanto os sistemas naturais e humanos são levados além da sua capacidade de se adaptarem.”

O diagnóstico vai sendo feito nas linhas do relatório. As alterações nos ecossistemas aumentam o risco de doenças nos animais e nas pessoas. Há mais alturas perigosas de risco de incêndios florestais e a área ardida é cada vez maior. Também “as condições de seca se tornam mais frequentes em muitas regiões, afectando negativamente a produção agrícola e de energia das centrais hidroeléctricas”. Foi o que aconteceu em Portugal neste mês de Fevereiro.

Estes perigos estão a tornar-se evidentes “em todas as regiões” do planeta, desde “o fundo do oceano até ao topo das montanhas mais altas”, assim como em cidades e zonas rurais – e a magnitude destes impactos “é maior do que se estimava anteriormente”, revela este documento do IPCC. O aumento das temperaturas faz com que os animais e as plantas tendam a migrar em direcção aos pólos, para altitudes mais altas ou para águas mais profundas. “Muitas espécies estão a atingir o limite das suas capacidades de se adaptarem às alterações climáticas”, lê-se. As que não conseguirem ficam em risco de extinção.

Qualquer atraso adicional numa acção global concertada fará com que percamos a oportunidade de assegurar um futuro habitável Hans-Otto Pörtner, vice-presidente do IPCC

Como se pode resolver esta ameaça à vida e à biodiversidade? “É preciso uma acção ambiciosa e acelerada para nos adaptarmos às alterações climáticas” – tudo isto enquanto se fazem “cortes profundos” nas emissões de gases com efeito de estufa. Por enquanto, denuncia o relatório, as medidas têm sido tomadas de forma desigual pelos países.

“Qualquer atraso adicional numa acção global concertada fará com que percamos a oportunidade de assegurar um futuro habitável”, garante o vice-presidente do IPCC, Hans-Otto Pörtner​, citado em comunicado. Salvaguardar a biodiversidade e os ecossistemas é essencial. As decisões que se tomarão nesta próxima década ditarão a resiliência climática, mas tudo isto será limitado “se as emissões de gases com efeito de estufa actuais não diminuírem rapidamente”.

Uma das soluções é restaurar ecossistemas danificados, já que os meios saudáveis conseguem enfrentar melhor as alterações climáticas. A natureza é a nossa melhor aliada, já que consegue absorver e armazenar carbono. Já certas práticas humanas são vistas como inimigos: o uso intensivo e pouco sustentável de recursos naturais, uma urbanização crescente, desigualdades sociais, e as perdas causadas por eventos extremos e por uma pandemia. O IPCC refere que há milhões de pessoas por todo o planeta que sofrem já o impacto da escassez de água e de alimentos.

Quem fica em risco não somos só nós – é o futuro. Para o IPCC, é preciso uma resposta coordenada: estes desafios precisam de uma resposta de todos, dos governos à sociedade, ao sector privado e à comunidade científica e escolar, desenvolvendo também “parcerias com grupos tradicionalmente marginalizados”, como os jovens, as mulheres, minorias étnicas e comunidades locais. As alterações climáticas são um desafio global, mas muitas das respostas devem ser locais, refere o grupo de trabalho.

O relatório, intitulado Alterações Climáticas 2022: Impactos, Adaptação e Vulnerabilidade, era para ser apresentado em Setembro de 2021, mas a pandemia atrasou o processo. É a segunda vez que o IPCC apresenta um relatório destes de forma virtual. O IPCC tem três grupos de trabalho e este segundo dedica-se aos impactos, adaptação e vulnerabilidade das alterações climáticas.

As cidades em risco

As cidades têm um lugar especial neste relatório. É nas cidades que vive mais de metade da população mundial e é lá que muitos dos impactos das alterações climáticas se fazem sentir, como as ondas de calor, as tempestades e outros fenómenos mais lentos, como a subida do nível médio da água do mar. “As zonas quentes estão a ficar mais quentes e está a reduzir-se drasticamente o tempo que as pessoas podem passar ao ar livre.”

Quem vive nas cidades sofre também com uma qualidade do ar mais fraca. Tudo isto pode afectar a saúde mental de quem lá vive – mas também a saúde física, podendo causar mortes.

Nas cidades em que há maiores níveis de pobreza e pouco planeamento urbano, o risco é maior. Ainda assim, estas malhas urbanas podem também ser uma oportunidade: há que apostar em “edifícios mais verdes, segurança no abastecimento de água potável e de energias renováveis, sistemas de transportes sustentáveis que conectem as áreas urbanas e rurais”, resume Debra Roberts, também vice-presidente do IPCC. Tudo isto poderá contribuir para uma “uma sociedade mais inclusiva e mais justa”.

Na Europa, as medidas em curso não estão a ser suficientes

Na parte do relatório dedicada à Europa, fica claro que o mundo actual (que já está 1,1ºC mais quente) está a afectar os sistemas humanos e naturais no continente. Os efeitos já são visíveis, incluindo nas ondas de calor e secas que se tornaram mais frequentes. Em Portugal, 2022 está a ser um dos piores anos de seca e um dos mais secos. Com o aumento de temperaturas, haverá também um maior número de mortes e de pessoas com complicações de saúde.

“Em muitas partes da Europa, as medidas de adaptação existentes e planeadas não são suficientes para evitar o risco”, lê-se no documento do IPCC, sobretudo com a subida da temperatura global perto ultrapassar os 1.5ºC em relação aos níveis pré-industriais. Este risco pode levar a uma perda de habitats e de ecossistemas, falhas na produção agrícola e até a um racionamento de água durante as secas no sul da Europa.

O IPCC refere precisamente que as zonas a sul da Europa serão as mais afectadas do continente e que haverá perdas significativas na produção agrícola na maior parte da Europa. A escassez de água agravará este cenário. No Sul da Europa, aliás, “mais de um terço da população estará exposta à escassez de água”, se as temperaturas subirem 2ºC. Isto também afectará as indústrias que estão dependentes da água e da energia hidroeléctrica.

A subida do nível médio da água do mar é outro dos riscos identificados na Europa. Os danos causados pelas inundações costeiras poderão ser dez vezes mais frequentes até ao final do século. “A subida do nível do mar representa uma ameaça da existência de comunidades costeiras e da sua herança cultural, sobretudo depois de 2100”, lê-se.

As soluções passam por uma melhor gestão da água, repensar a forma como se rega na agricultura, uma melhor gestão dos incêndios florestais, sistemas de aviso para inundações, e também intervenções em edifícios para se enfrentar as ondas de calor.

Como “barreira” a estas medidas está o pouco financiamento, “um reduzido sentido de urgência” e também “falta de liderança política”. É urgente deixar de pensar a curto-prazo, ressalva o IPCC. E há que pensar a nível local: “O sucesso da adaptação dependerá do nosso conhecimento de quais as opções de adaptação são fazíveis e eficazes num contexto local”.

Preço do gás natural sobe 26% e petróleo agrava valorização

Rosa Soares e com agências, in Público on-line

Os contratos de futuros do Brent segue a subir 5,03%, para quase 103 dólares por barril. E as bolsas europeias voltaram a negociar em queda.

A subida dos preços de energia é uma das consequências directas para a economia europeia decorrentes da invasão russa na Ucrânia e das sanções impostas à Rússia pela União Europeia e outros países.

O gás natural TTF (Title Transfer Facility) para entrega em Março subiu, esta segunda-feira, 26% para 115 euros por megawatt/hora (MWh). O preço do gás natural havia disparado 30% na sequência dos desenvolvimentos iniciais na fronteira ucraniana e esta valorização acentuada explica-se pelo facto de a Rússia ser o principal exportador de gás natural da Europa.

Também as cotações do petróleo estão em forte subida e nem o arranque de negociações para a paz está a travar a subida. Depois de uma subida de 4%, o Brent, a referência para a Europa, subia 5% às 11h20, para 102,90 dólares por barril, o que corresponde a um máximo desde 2012. Já o crude WTI, que é referência para os Estados Unidos, também seguia a agravar a subida para 5%, negociando nos 96,20 dólares.

As bolsas europeias continuam a negociar em queda, com as maiores desvalorizações a acontecer na praça de Paris (-2,86%), mas também na alemã (-2,20%), ou na de Londres (-1,1%).

A bolsa de Lisboa apresenta a menor queda europeia, a cair 0,17%, depois de ter iniciado a sessão a perde 1,7%.

A queda das bolsas europeias é explicada pela exposição de alguns bancos europeus à Rússia, pelo impacto da retirada de bancos russos do sistema Swift, plataforma electrónica de transacções financeiras mundiais, e ainda na sequência dos problemas de bancos russos presentes na Europa.

O Banco Central Europeu (BCE) alertou, nesta segunda-feira, que o Sberbank Europe, uma unidade do Grupo Sberbank SBER.MM da Rússia, e duas outras subsidiárias sob sua supervisão, “estão falidas ou na iminência de falir”.

Também a Autoridade do Mercado Financeiro da Áustria avançou com medidas em relação ao Sberbank Europ, nomeadamente a limitação de levantamentos a 100 euros por dia, por cliente, e ainda a suspensão de transferência e pagamentos.

A Deutsche Boerse, a gestora da bolsa alemã, anunciou a suspensão da negociação de vários títulos de empresas russas com efeito imediato, entre eles o VTB Bank VTBR.MM e o Sberbank.

Na Rússia, a Bolsa de Valores de Moscovo não abriu e assim se manterá ao longo do dia de hoje, anunciou o banco central do país, admitindo que os mercados de acções, derivados e cambial possam reabrir esta terça-feira, 1 de Março.

Rendimento Básico Incondicional, uma ideia do séc. XVI que interessa à Europa do séc. XXI

Pedro Manuel Magalhães, in Público on-line

Num tempo de incerteza provocado pela guerra na Ucrânia, 200 cidadãos reuniram-se neste fim-de-semana para debater a economia e o emprego na Conferência sobre o Futuro da Europa. O Rendimento Básico Incondicional foi um dos temas abordados.

A ideia não é nova e remonta ao século XVI, mas a pandemia da covid-19 reacendeu o debate: é possível a todo o cidadão ter direito a um rendimento mensal, pago pelo Estado, só pelo simples facto de estar vivo? Na Conferência sobre o Futuro da Europa (CoFoE), que este fim-de-semana, em Dublin, reuniu cerca de 200 pessoas num painel dedicado ao tema “Uma economia mais forte, justiça social e emprego / Educação, cultura, juventude e desporto/ Transformação digital”, o Rendimento Básico Incondicional (RBI) esteve presente e não foi propriamente uma novidade. Nos relatórios já publicados sobre a iniciativa dinamizada pelas instituições europeias, é referido que “é importante tomar medidas em matéria de segurança social para alcançar a justiça social” e que o RBI é o mecanismo mais frequentemente sugerido para que a “Europa seja mais inclusiva e socialmente justa”.

Num dos relatórios, o participante Ronald Blaschke escreveu que o RBI “é a forma de assegurar a oportunidade de cada pessoa participar na sociedade”. A sua mensagem, também publicada na plataforma online da CoFoE e aprovada por mais de 300 cidadãos registados, explicou, ponto por ponto, a ideia da sigla: “O RBI é universal — é pago a todos, independentemente da idade, descendência, local de residência ou profissão, individual — toda a gente tem direito ao rendimento, seja qual for o agregado familiar, e é incondicional — é um direito humano e legal e não depende de quaisquer pré-condições, como ter emprego remunerado”.

Para o alemão, o RBI deve ser elevado para “proporcionar um padrão de vida decente, que atenda aos padrões sociais e culturais do país onde está”, propondo que o valor líquido do subsídio esteja acima do limiar da pobreza determinado pela União Europeia, ou seja, 60% do rendimento equivalente ao líquido médio nacional.

O RBI dava uma série documental

No Parlamento Europeu, um dos rostos mais defensores da medida é português. O eurodeputado Francisco Guerreiro, da Aliança Verde Europeia, eleito pelo PAN — entretanto desfiliou-se —, lançou uma série documental “RBI: Um caminho de Liberdade”, que explica, em doze episódios, o que é a medida, convidando várias personalidades portuguesas e estrangeiras a falar sobre o assunto. “É uma ideia que quer tornar simples o debate sobre o que é o RBI. Tem vários participantes, como o Carlos Moedas, de diferentes quadrantes políticos e de outras áreas da sociedade”, diz ao PÚBLICO Francisco Guerreiro.

O eurodeputado acredita que o RBI, numa fase inicial, deveria ser implementado a nível nacional. Depois de ter encomendado um estudo à Marktest, no qual se concluiu que 76% dos inquiridos são a favor de ter um rendimento extra ao salário, Francisco Guerreiro lançou outro estudo, elaborado pelo professor da Universidade do Minho Roberto Merrill, no qual é sugerida a criação de uma experiência-piloto do RBI em Portugal: “O que se propõe é um projecto que inclua duas a três mil pessoas, com um rendimento de 540 euros, durante um período entre dois a três anos, sob a alçada de uma comissão técnica e científica. A nível orçamental, a experiência seria feita com recurso a uma verba alocada no Orçamento do Estado.”

Para a defesa desta prestação social, Francisco Guerreiro argumenta que existem alguns projectos-piloto que indicam que o RBI “cria mais emprego, melhora a saúde mental e que há um retorno de 9 euros por cada euro investido”.

Ao PÚBLICO, o mentor do estudo lançado por Francisco Guerreiro, Roberto Merrill, presidente da Associação pelo Rendimento Básico Incondicional Portugal (RBIP), diz que o RBI é uma boa medida porque “é um instrumento eficaz na luta contra a pobreza e, mais do que isso, dá liberdade às pessoas de escolherem a vida que querem”. E acrescenta que o RBI, ao contrário do Rendimento Social de Inserção (RSI), é “incondicional, ou seja, não obriga os cidadãos a procurar emprego ou formação, e não é distribuído em função do agregado familiar”.

Sobre as experiências-piloto que já ocorreram em países como a Alemanha, a Finlândia, os Estados Unidos, o Canadá ou o Brasil, Roberto Merrill sublinha que se verificam “imensos resultados benéficos” nos participantes, como “um sentimento de maior confiança nas instituições, maior sentido de empoderamento, mais autonomia, e melhor saúde”, apontando ainda virtudes na dimensão laboral: “Com o RBI, as pessoas podem mudar para um emprego que corresponda mais às suas ambições ou podem passar de trabalhar a tempo inteiro para part-time, tendo mais tempo para estar com os filhos ou estudar”.

A produtividade seria afectada com o RBI? E como seria pago?

Os críticos ao RBI identificam lacunas na prestação social, como a dificuldade de a financiar e a potencial promoção do desemprego ou de redução na produtividade. Aponta-se a Finlândia como exemplo. O país nórdico adoptou uma experiência-piloto, entre 2017 e 2018, reunindo dois mil cidadãos desempregados com um subsídio mensal de 560 euros. No fim, apesar de relatórios apontarem a uma subida dos níveis de bem-estar, o impacto do RBI na procura de novo emprego foi marginal. Para Francisco Guerreiro, a experiência na Finlândia fracassou porque envolveu apenas desempregados que “já antes recebiam um tipo de apoio social”. “Esperaram que o rendimento acabasse durante os dois anos da experiência e continuaram a sua vida”, diz.

Roberto Merrill refere que, apesar de ter sido “mediatizada com má”, a experiência na Finlândia “correu bem, segundo dizem os cientistas sociais responsáveis pelo projecto”. O docente compreende a ideia de que o discurso da falta de produtividade no trabalho e o aumento do desemprego sejam argumentos utilizados pelos críticos, mas defende que “no debate empírico, os resultados às experiências ao RBI dizem o contrário”. E assinala que “ainda não foi feita uma experiência-piloto de grande escala” que possa incluir não apenas desempregados, mas “pessoas que têm um bom emprego e que com o RBI podiam trabalhar menos e ir viver para o campo, por exemplo”. Só assim, diz, poderia haver “argumentos empíricos para a crítica do RBI”. “De outro modo, a crítica é só especulativa”, acrescenta.

Sobre o financiamento da prestação, Roberto Merrill lembra que em Portugal “não há riqueza comum nem fundo soberano” e que a única forma de pagar o RBI a mais de 10 milhões de pessoas seria a mesma com que se paga “a saúde e a educação”, ou seja, através da “redistribuição da riqueza”. Sendo o RBI universal e distribuído a todos os cidadãos ou residentes legais em Portugal, “os mais ricos pagariam mais impostos e perdiam dinheiro em vez de o ganhar”.

Segundo as contas de Roberto Merrill, o RBI custaria “3,5 mil milhões de euros anuais, cerca de 1,5% do PIB nacional”. “Não é nenhuma fortuna”, defende. Já Francisco Guerreiro assinala que o RBI seria financiado através da extinção das prestações sociais não contributivas abaixo do valor estabelecido para o RBI, argumentando ainda que, “ao nível líquido, uns vão sempre beneficiar mais do que outros”. Aponta também que, em Portugal, há “18 mil milhões de euros anualmente perdidos para a corrupção e 45 mil referentes à chamada economia paralela que podiam ser alocados para o RBI”.
312 Os cidadãos registados na plataforma da CoFoE e que apoiaram a proposta feita por Ronald Blaschke que defendia a adopção de um Rendimento Básico Incondicional por toda a União Europeia. 

Ainda assim, o eurodeputado diz que “não se pode apenas falar em custos brutos” quando se fala do RBI. “Um dos grandes benefícios de ter um rendimento constante é o de dar estabilidade económica e mental às pessoas. O RBI investe nas pessoas e daria retorno”, argumenta, assinalando que os principais beneficiários da medida seriam os cidadãos das “classes média e média baixa”.
A Europa ainda não estará preparada para discutir o RBI

Roberto Merrill fez parte da iniciativa de cidadania europeia que levou o tema do RBI para a Comissão Europeia em 2013 e Francisco Guerreiro tem o objectivo de recolocar o assunto em discussão no mesmo organismo, mas ambos concordam que o subsídio tem ainda de ser discutido em cada um dos estados-membros antes de entrar em sede única.

De facto, a União Europeia ainda debate a proposta relativa a salários mínimos adequados em cada país. Ao PÚBLICO, a eurodeputada do PCP, Sandra Pereira, diz que até essa proposta da UE “é nefasta” porque atendendo aos indicadores para o salário mínimo europeu — 60% da remuneração bruta mediana e de 50% da remuneração bruta média de cada país — só traria vantagens para “os grandes patrões em Portugal e na UE”.

Sobre o RBI, a eurodeputada membro da Comissão do Emprego e Assuntos Sociais rejeita a implementação da proposta em Portugal e na UE porque não é a favor de que “o Estado deva entregar um cheque, de igual valor, a cada cidadão e fugir às suas responsabilidades na redistribuição da riqueza e no atenuar das assimetrias socio-económicas”.

Para Francisco Guerreiro, o debate sobre o salário mínimo “não anula o debate sobre o RBI”, mas refere que as instituições europeias e os seus decisores políticos rejeitam discutir a medida porque, acredita, “há um claro receio de que se comprove o benefício do RBI, o que retira a plataforma política a alguns partidos, tanto à esquerda como à direita, que têm as ideias e as respostas do costume”. O eurodeputado defende que as métricas de desenvolvimento humano devem passar a ser “qualitativas e não quantitativas”.

“Ainda continuamos a medir o progresso da sociedade através do PIB e a narrativa política ainda está muito assente no crescimento contínuo. Isso esbarra na ideia de perspectivar uma diferente distribuição da riqueza e de reorganizar o modelo fiscal e o estado social”, diz o ex-PAN.

Que mensagem deixaria se estivesse na Conferência sobre o Futuro?

Francisco Guerreiro

O eurodeputado que foi eleito pelo PAN em 2019 e que entretanto passou a independente, lembra a guerra na Ucrânia e diz que, “com o que se está a passar actualmente, se fosse à CoFoE diria aos restantes membros do painel que a independência energética seria um dos parâmetros fundamentais para a estabilidade política”. Paralelamente, o eurodeputado da Aliança Verde Europeia manifestaria a defesa pelo “debate e a implementação de projectos-piloto sobre o RBI para garantir que os estados sociais se repensassem, fazendo com que se empoderasse e capacitasse os cidadãos a decidir a sua vida”.

Roberto Merrill

Já o professor da Universidade do Minho, aproveitaria para insistir em lançar para discussão a ideia de Philippe Van Parijs para o financiamento do RBI: “Uma proposta de financiamento de um euro dividendo e a distribuição de um mínimo de 200 euros via União Europeia, com o restante valor do RBI a ser financiado pelos próprios países”.
Sandra Pereira

Crítica do RBI, a eurodeputada do PCP deixaria como recomendação “o rompimento com a deriva neoliberal e federalista da União Europeia, que tem imposto a países como Portugal a estagnação económica, baixos salários, escassez de investimento, precariedade, dependência económica e financeira externas, desemprego, desindustrialização, debilitação dos sectores agrícolas e piscícolas”.

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COM O APOIO 

O projeto foi cofinanciado pela União Europeia no âmbito do programa de subvenções do Parlamento Europeu no domínio da comunicação. O Parlamento Europeu não foi associado à sua preparação e não é de modo algum responsável pelos dados, informações ou pontos de vista expressos no contexto do projecto, nem está por eles vinculado, cabendo a responsabilidade dos mesmos, nos termos do direito aplicável, unicamente aos autores, às pessoas entrevistadas, aos editores ou aos difusores do programa. O Parlamento Europeu não pode, além disso, ser considerado responsável pelos prejuízos, directos ou indirectos, que a realização do projecto possa causar


EAPN: Debate incide sobre as Cartas Sociais Municipais

in Reconquista 

A Rede Europeia Anti Pobreza vai realizar um conjunto de encontros regionais sobre a Transferência de Competências de Ação Social para as Autarquias.

Encontro decorre dia 3 de março na plataforma Zoom

A Rede Europeia Anti Pobreza (EAPN) vai realizar um conjunto de encontros regionais sobre a Transferência de Competências de Ação Social para as Autarquias, com o objetivo de ouvir as entidades sociais, as autarquias e demais atores do processo de elaboração e divulgação das Cartas Sociais Municipais, no âmbito do Decreto-Lei n.º 55/2020, de 12 de agosto.

O encontro regional A Dimensão Social no Poder Local, direcionado à região Centro, decorre dia 3 de março, na plataforma zoom, com início às 14H30. Todos os interessados podem participar, pois a inscrição é gratuita, mas obrigatória.

A EAPN explica que cabe aos órgãos dos municípios a competência para criar este instrumento, incluindo o mapeamento de respostas existentes ao nível dos equipamentos sociais, para acompanhamento de situações de risco e carência social, para assegurar o serviço de atendimento e de acompanhamento social e para a implementação da componente de apoio à família para crianças que frequentam o ensino pré-escolar da rede pública.

O objetivo destas sessões é refletir em conjunto “sobre os impactos no combate à pobreza em resultado das mudanças introduzidas nos modelos de governação por via deste processo de transferência para as autarquias e de que forma essas mudanças podem resultar em novas ações que alterem os paradigmas de combate à pobreza sob o escopo da recentemente aprovada Estratégia Nacional de Combate à Pobreza”.

O bairro de casas pré-fabricadas onde 28 famílias ciganas começam uma nova vida

Por Elisabete Rodrigues, in Sul Informação

Uma equipa técnica da autarquia acompanha no terreno o realojamento e integração das famílias, numa relação de proximidade

«Esse é o pedido de adesão para ter a senha de acesso ao Portal das Finanças. Assim, não tem de ir lá, trata tudo no computador, nós ajudamos. Agora vamos pedir a senha do acesso à Segurança Social», explicava Dina Barradas, uma das técnicas do gabinete de apoio à comunidade cigana do Vale da Arrancada, em Portimão, a uma das novas moradoras.

Uma mulher cigana mais nova, ao lado de uma mais velha, vestida de preto da cabeça aos pés, segurava o papel com a senha apontada. «Não vou perder isto, fique descansada», dizia, em resposta a Dina Barradas.

O gabinete de apoio conta com três técnicas – Dina Barradas, Paulo Vasco e Joana Pedro – e fica instalado numa casa pré-fabricada, quase igual às que foram construídas no terreno do Vale da Arrancada, entre Setembro do ano passado e Janeiro deste, para alojar as 28 famílias ciganas que, durante três décadas, viveram no bairro de barracas clandestinas em pleno centro da cidade de Portimão, ao lado do mercado e do cemitério.

As casas modulares são brancas, mas têm barras com as cores da bandeira cigana: azul como o céu, verde como a terra, vermelho como as suas carroças. Lá naquele sítio já moravam outras cinco famílias, a que se juntaram agora mais estas 28, num total de mais de uma centena de pessoas.

Vera Frederico, de 41 anos, e o seu marido João Negrão, de 32 anos, são dois dos novos moradores e esperam, muito aprumados, à porta da sua casa nova que chegue a vereadora Teresa Mendes e o vice-presidente da Câmara Álvaro Bila, bem como técnicos vários da autarquia e a jornalista do Sul Informação.

A D. Vera não tem papas na língua e diz: «da casa não reclamo, mas da rua sim. Quando chove, isto fica tudo cheio de água e de lama. Aqui à frente parece uma piscina. O que nos vale é que não tem chovido quase nada, senão não sei como seria».

A vereadora, que tem também o pelouro da Ação Social, diz: «vai ser tudo tratado, só que demora algum tempo. Tem que ter paciência».

Por seu lado, o vice-presidente Álvaro Bila, que conhece bem os novos moradores já que, antes de ser eleito para a Câmara, foi durante anos presidente da Junta de Freguesia de Portimão, garante que «as ruas vão ser pavimentadas». Voltando-se para a jornalista diz: «vamos melhorar as condições do exterior, até para que os novos moradores percebam que isto tem de estar tudo limpo e arranjado».

A D. Vera abre a porta da sua casa, deixando ver a sala de entrada, que também é cozinha e o sofá onde ainda dormem dois dos seus filhos. Mostra com orgulho as paredes da sala, que ela e o marido forraram com um material a imitar azulejos cinzentos brilhantes. A cozinha está muito arrumada.

«A casa tem três quartos, mas eu tenho quatro filhos, uma delas já tem 23 anos. Tive de comprar umas caminhas, mas também dormem na sala».

Apesar do aperto, garante: «aqui estamos muito melhor. Lá não tínhamos estas condições, aqui temos uma cozinha como deve ser. quartos, casa de banho. É pequena, mas tem tudo».

João Negrão, o marido, sorridente mas de poucas falas, concorda: «lá era uma barraca, era muito diferente».

Os filhos mais novos de Vera ainda andam da escola. Depois de ter enviuvado, casou-se com o João, mas ainda não tiveram filhos. «A vida está difícil para ter mais filhos», desabafa, olhando para os meninos que dormem aconchegados no sofá cama.

João acrescenta: «há aí zonas onde não se vê crianças, mas nos nossos bairros há sempre muitas. O cigano gosta de crianças, de filhos».

Tanto João como Vera (e os seus filhos) recebem Rendimento Social de Inserção (RSI), mas estão ambos inscritos no IEFP, embora nunca tenham sido chamados para nenhum emprego. João diz que vai fazendo «uns biscates, sempre que aparece alguma coisa». Vera tirou um curso de costura no IEFP e está esperançada que a chamem: «posso ir para uma casa fazer bainhas ou arranjos, posso trabalhar num hotel», diz. «A gente não tem aquelas grandes capacidades, é mais difícil». Nem sequer refere que dificilmente uma mulher cigana consegue um emprego, mas isso fica implícito nas reticências do seu sorriso.

Paula Pereira, chefe de Divisão de Habitação, Desenvolvimento Social e Saúde da Câmara de Portimão, que também acompanha a visita, explica que a comunidade cigana do Vale da Arrancada se ocupa com a venda ambulante ou recebe o RSI. Mas, com a pandemia, diz uma das técnicas do Gabinete de Apoio, «a venda ambulante parou e eles deixaram de ter uma fonte de rendimento importante».

Mais à frente, está outra vizinha, que teve um bebé há pouco tempo, logo que se mudou para o novo bairro do Vale da Arrancada. Mal vê a vereadora e o vice-presidente aproximarem-se, diz: «isto não é uma casa, é um contentor! Tive uma bebé, foi a primeira a nascer aqui neste bairro, e agora não tenho um quarto para ela, tem de ficar comigo».

A vereadora Teresa Mendes pergunta: «então não está aqui melhor? Lá onde estava não tinha água canalizada, nem esgotos, mas aqui tem».

Uns metros mais adiante, duas avós, uma delas com um neto ainda bebé ao colo, garantem: «Gostava mais de estar na barraca que aqui onde estou. Isto é só bonito, de resto não vale nada!»

A autarca assume que «há aqui coisas que têm ainda de ser retificadas. Os arruamentos, por exemplo, vão ser melhorados. E precisam mesmo de ser!».

Paula Pereira acrescenta: «depois de instalar aqui estas famílias, tivemos o cuidado de ir de casa em casa para ver quais os problemas existentes. Vai ser tudo retificado».

Joana Pedro é a gestora do projeto de intervenção social «(Re)Viver no meu bairro», que atua no bairro social da Cruz da Parteira, nas Cardosas e agora também no Vale da Arrancada, ou seja, em todos os locais de relojamento de famílias da comunidade cigana na cidade de Portimão.

No fundo, explica Joana, o seu trabalho é fazer «mediação», estabelecendo uma muito necessária «ponte entre a Câmara e a população cigana».

E é no âmbito desse trabalho, de que fala com entusiasmo, que está a desenvolver um ateliê de jardinagem, para que sejam os moradores do novo bairro a criar os seus próprios jardins e recantos floridos.

Por outro lado, recorda Joana, «foram as crianças que, noutro ateliê, criaram as decorações para os seus quartos, nas casas novas».

Outra das frentes em que o projeto social vai atuar é na alfabetização, esta mais virada para os adultos. «Aqui, a maior parte das pessoas não têm escolaridade, tirando os miúdos que vão à escola ou perdem o RSI».

«Vamos iniciar uma turma de alfabetização para adultos e já temos três pessoas interessadas». Uma delas é a D. Ivone, uma matriarca mais idosa, viúva e vestida de preto. «A D. Ivone até já tinha feito um curso de alfabetização há uns anos, no IEFP, mas depois não usou a aprendizagem para nada e acabou por esquecer a maior parte. Não usam e perdem. Agora diz que quer ir de novo aprender a ler e a escrever», explica Paula Pereira.

O processo começou agora, com a mudança da comunidade para o seu novo bairro, mas as aulas de alfabetização só deverão começar daqui a três meses.

Para as crianças, há apoio escolar, nas tardes de terça. quarta, quinta e sexta-feira.

Aos sábados de manhã, há atividades infanto-juvenis: ginástica, expressão plástica, criação de pulseiras, origami, música. Tudo atividades que ajudam os miúdos ciganos a desenvolver capacidades como a concentração numa tarefa ou até regras básicas de convivialidade. «Na Cruz da Parteira, já tínhamos estas atividades, que começámos agora também aqui».

E há progressos? «Sim, já se nota muitas diferenças no comportamento dos miúdos. Já dizem obrigado, com licença, têm mais cuidado com o lixo. Ainda há dias um deles, o Igor, comeu um croissant e jogou o papel para o chão. Mas foi ele mesmo a ir apanhar e disse-me: se deixo isto aqui vai parar ao mar, não é? São coisas que aqui e na escola lhes vamos ensinando».

E há por ali verdadeiros talentos: «duas crianças que moram aqui no Vale da Arrancada, o Junior e o António, de 10 e 12 anos, tocam guitarra e um deles canta muito bem. Vão às quartas-feiras ter com o Samuel ao estúdio do projeto “PorTiArtista” que temos na Cruz da Parteira», criado no âmbito da candidatura ao programa governamental «Bairros Saudáveis».

Para os adultos, em especial para as mulheres, há formações sobre coisas aparentemente triviais, mas com as quais têm de aprender a lidar, no âmbito da economia doméstica: «Como é que se limpa o exaustor, que não tinham nas barracas? Como é que se trabalha com a máquina da roupa? Como é que se paga a água e a luz ou se tira uma senha do portal das Finanças ou da Segurança Social?». Estas são, segundo Paula Pereira, algumas das coisas que é preciso ensinar…e aprender.

A chefe da Divisão de Desenvolvimento Social acrescenta que «todas estas são famílias muito numerosas, que juntam debaixo do mesmo teto várias gerações. Temos aqui três matriarcas, mulheres mais velhas, as avós, com quem os netos ficam, quando são pequenos ou quando não estão na escola. Avó que é avó faz comida de tacho para todos, nem que seja uma panela de sopa».

Todas as famílias que se mudaram para as casas préfabricadas do novo bairro do Vale da Arrancada assinaram, com a Câmara de Portimão, um contrato de comodato. Mas a água e a luz que consomem está em nome de cada família, que tem de as pagar. Uma obrigação nova a que não estavam habituadas, mas que agora estão a aprender.

Ao contrário do boato que chegou a circular nas redes sociais quando a demolição das barracas começou, em Setembro, nenhuma das famílias ciganas recebeu dinheiro – havia rumores de vários milhares de euros… – para sair das barracas e mudar-se para o Vale da Arrancada.

A vereadora Teresa Mendes salienta que foi apenas um boato, lançado em tempo de campanha eleitoral, para dar a entender que a autarquia privilegiava a comunidade cigana em detrimento dos outros municípes. «Não é verdade!», garantiu. Aliás, durante a visita ao novo bairro, seriam duas moradoras do Vale da Arrancada a pedir satisfações à autarca em relação ao dinheiro que, supostamente, a Câmara lhes havia de dar. «Nunca recebemos nada. Como é?», interpelaram as duas mulheres ciganas.

Todo o trabalho que, há pelo menos duas décadas, a Câmara Municipal de Portimão, as igrejas e outras entidades, têm feito com a comunidade cigana começa a dar bons frutos. «Temos aqui já alguns ciganos, ligados à igreja, que trabalham em supermercados, investem na educação dos filhos, que estão a fazer cursos técnico-profissionais. Um deles até já se voluntariou para vir aqui fazer atividades aos sábados», revela Paula Pereira.

Nem tudo é um mar de rosas, admite: «há mais rapazes que raparigas ciganas no 11º e no 12º ano, mas cada vez vai havendo mais. Há mesmo um cigano de Portimão que é militar da GNR», acrescenta.

«Para mudar, são precisas gerações, mas já se vai notando a diferença», conclui.

Joana Pedro explica que uma das coisas que tenta incutir aos miúdos ciganos é orgulho na sua etnia. Por isso lhes mostrou a sua bandeira, a tal cujas cores estão nas barras das casas, lhes deu a ouvir o hino, ou lhes falou dos muitos membros da etnia que são figuras públicas e reconhecidas. «Eles já tinham ouvido falar do nosso Quaresma, jogador de futebol da seleção. Mas quando eles descobriram que o jogador sueco Ibrahimović também é cigano, os miúdos passaram-se!»

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA FEZ 23 VÍTIMAS MORTAIS EM 2021

Mafalda Silva, in JUP

Os dados divulgados pelo Governo relativamente a 2021 revelam um decréscimo do número de mortes por violência doméstica: 23 homicídios, face aos 32 que tinham sido registados em 2020. As participações às autoridades daquele que é o crime mais cometido em Portugal também diminuíram - mas continuam a ser 3 por hora.

Os dados mais recentes da Comissão para a Igualdade de Género (CIG), divulgados no portal do Governo no passado dia 31 de janeiro, revelam o balanço final de 2021. No último ano foram registadas, em Portugal, 23 mortes em contexto de violência doméstica: 16 mulheres, cinco homens e duas crianças (uma do sexo feminino e uma do sexo masculino).

São valores que refletem uma diminuição face a 2020, ano em que foram assinalados 32 homicídios por violência doméstica. Da mesma forma, verificou-se um decréscimo das participações de crimes desta natureza à Polícia de Segurança Pública (PSP) e à Guarda Nacional Republicana (GNR). Se, em 2020, foram registadas 27.619 participações, contabilizou-se um total de 26.511 participações em 2021.

Por outro lado, o número de pessoas integradas em programas para agressores tem vindo a crescer nos últimos anos. No último trimestre de 2021, eram acompanhados 2937 agressores, face aos 1985 referenciados no período homólogo de 2020. De referir que o Programa para Agressores de Violência Doméstica (PAVD), criado em 2014, apenas se destina, para já, a elementos do sexo masculino em contexto de relações heterossexuais. Ao longo de 18 meses, os agressores passam por um processo que envolve acompanhamento individual e em grupo.

O número de acolhidos pela Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica era, no trimestre final de 2021, 1032. O ano de 2021 marca o início da contabilização do número de homens incluídos na rede de acolhimento – contavam-se 15, no período referido. As restantes vítimas em acompanhamento são compostas por 694 mulheres e 323 crianças.

O crime mais cometido em Portugal

Se, de facto, foi registado um decréscimo dos homicídios e ocorrências em contexto de violência doméstica, há que encarar estes dados com prudência – a violência doméstica continua a ser o crime mais cometido em Portugal. Dados recolhidos pela PORDATA relativamente a 2020 indicam que a violência doméstica contra cônjuge ou análogos corresponde a cerca de 8% dos crimes registados pela polícia. Apesar de ainda não haver dados suficientes para retirar esta conclusão relativamente a 2021, a tendência deverá manter-se: o balanço do ano revela uma média de 3 participações por hora.

Os dados revelam que quase metade das queixas relacionadas com violência doméstica têm lugar em Lisboa, Porto e Setúbal, o que reflete uma maior prevalência deste tipo de crime – ou, pelo menos, das participações – em centros urbanos. De destacar, também, o aumento da prevalência da violência doméstica contra menores. Apesar de uma média de 85% dos casos se registarem entre casais, há uma tendência crescente para o envolvimento de crianças na prática deste tipo de crimes.

O Governo divulga os dados relativos à violência doméstica de forma trimestral, através da plataforma da CIG. A PORDATA atualiza a base de dados anualmente.

25.2.22

Saúde dos portugueses agrava-se em 2021

Hermana Cruz, in JN

No ano passado, um terço da população portuguesa queixou-se de limitações na realização de tarefas devido a problemas de saúde. É o valor mais elevado desde 2016. E quase metade dos portugueses reportou sofrer de uma doença crónica. Situações que afetaram sobretudo as mulheres e os idosos, sendo justificadas por dificuldades financeiras.

Os números do Instituto Nacional de Estatística (INE) revelam que, em 2021, verificou-se um agravamento da situação de saúde dos portugueses em vários domínios, como a situação de doença ou o acesso a cuidados médicos.

Segundo revelou esta sexta-feira o INE, o ano passado 34,9% da população com 16 ou mais anos disse ter alguma limitação na realização de atividades devido a problemas de saúde. Desses 9,6% reportou um grau de limitação severo.

"Os dois indicadores registaram um acréscimo em relação aos anos anteriores, atingindo em ambos os casos as proporções mais elevadas desde 2016", sublinha o INE, especificando que a situação afetou sobretudo as mulheres (39%) e a população idosa (60,8%).

No Inquérito às Condições de Vida e Rendimento 2020-2021, o INE apurou também que 43,9% da população sofria de alguma doença crónica no ano passado. "A prevalência de doença crónica ou de problema de saúde prolongados (ou seja, que dura ou que possa vir a durar pelo menos seis meses) afetou 43,9% da população com mais de 16 anos em 2021, mais 0,7% do que em 2020 e mais 2,7% do que em 2019", acrescenta o INE, sublinhando que, mais uma vez, a situação afeta particularmente as mulheres (47%) e as pessoas idosas (71,4%).

"Por nível de escolaridade, a prevalência de doenças crónicas ou de problemas de saúde prolongados afetou 80,1% da população sem qualquer nível de escolaridade", especifica o INE, no referido inquérito.

Segundo o INE, os resultados recolhidos em 2021 permitem ainda concluir que 5,7% das pessoas com 16 ou mais anos não puderam satisfazer as necessidades de cuidados médicos. Trata-se "do segundo ano consecutivo em que se verificou o aumento do indicador, em sentido contrário à tendência de declínio que se verificava desde 2015", revela-se no estudo, onde se vinca que 30% das pessoas que não conseguiram aceder a cuidados médicos apresentou a falta de disponibilidade financeira como principal motivo.

No inquérito apurou-se ainda que 13,1% dos portugueses não conseguiram ter acesso a necessidades de cuidados dentários, "mais 1,4% do que em 2020". Também aqui "o principal motivo apontado para essa situação foi a falta de disponibilidade financeira, representando quase 70% dos casos em 2021".

Além disso, mais de um quarto da população (26,6%) referiu efeitos negativos na sua saúde mental devido à pandemia Covid-19. "Essa situação foi referida mais por mulheres (30,2%) do que homens (22,4%) e em proporções bastante semelhantes na população com menos de 65 anos (26,8%)", especifica o INE.

“Nós, ucranianos, temos de manter as portas abertas. Vamos pedir aos portugueses que também o façam”

Ana Cristina Pereira, in Público on-line

Padre ortodoxo Ivan Buhakov desdobra-se em contactos com padres católicos, que já estão a fazer um levantamento de espaços. Dá o exemplo de seminários e santas casas da misericórdia. Julga que será preciso envolver também famílias que possam acolher refugiados nas suas casas ou emprestar segundas casas

O padre ortodoxo Ivan Buhakov esteve esta quinta-feira duas vezes a protestar em frente ao Consulado da Rússia no Porto contra a invasão da Ucrânia. E estará esta sexta-feira outra vez, em frente à Câmara do Porto. “Queremos chamar a atenção de todos. O que se está a passar é uma surpresa grande, uma surpresa feia.”

Congratula-se com a atitude do Governo português, que depressa se mostrou solidário com os ucranianos. “Contarão com toda a nossa solidariedade”, disse o primeiro-ministro António Costa. “Têm sido muito bem-vindos a Portugal. E a sua família, amigos e conhecidos que queiram procurar a segurança e o destino para dar continuidade às suas vidas são também muito bem-vindos.

Desde que a guerra rebentou, na madrugada de quinta-feira, há gente a dirigir-se para as fronteiras terrestres da Ucrânia com a União Europeia. “Vai chegar muita mais gente aqui”, prevê Buhakov. “Nós, ucranianos, temos de manter as nossas portas abertas. Vamos pedir aos portugueses que também o façam.”

“Vamos precisar de muita coisa. Ambulâncias, medicamentos, comida, dinheiro” Padre ortodoxo Ivan Buhakov

Desdobra-se em contactos com padres católicos, que já estão a fazer um levantamento de espaços. Dá o exemplo de seminários e santas casas da misericórdia. Julga que será preciso envolver também famílias, que possam acolham refugiados nas suas casas ou emprestar segundas casas. Ainda antes, urge organizar meios de transporte para ir às fronteiras resgatar pessoas que estão a cruzá-las.

A guerra, para Buhakov, é muito concreta. É natural de Ternopil, uma cidade do oeste da Ucrânia, às margens do rio Seret. A mãe e a irmã, que é professora, já lá estavam. O cunhado e a sobrinha, porém, encontravam-se em Kiev. Puseram-se em fuga, de carro, às 8h e ao cair da noite ainda não tinham chegado a casa.

O cunhado e a sobrinha estariam bloqueados na estrada. A irmã evitava telefonar-lhes para que não ficassem sem bateria. Ao ir para a segunda manifestação de quinta-feira, Buhakov questionava-se se estariam bem ou entre os feridos ou mortos de que se falava nas notícias. Haveriam de entrar em casa, sãos e salvos, às 5h desta sexta-feira.
“Estamos muito preocupados”

“Estamos muito preocupados”, confessava o padre. “Vladimir Putin quer destruir tudo. Parece que quer acabar com os ucranianos. Há receio de que tome conta da produção de electricidade. Podem deixar o país sem luz.”

A manifestação da manhã fora muito improvisada. “Foram umas 20 e tal pessoas. Estava marcada para as 11h. A polícia chamou a atenção porque não havia autorização, mas não mandou ninguém embora. Eu cheguei pelas 12h. Algumas pessoas já se tinham ido embora. Estivemos lá quase até às 13h.”

No novo protesto, agendado para as 18h30 no mesmo local simbólico, na Avenida da Boavista, juntaram-se “umas 200 pessoas”. Mulheres, homens, crianças, com bandeiras e cartazes, a reclamar a paz, a exigir que o Presidente da Federação Russa ordenasse uma retirada, a cantar o hino da Ucrânia.

“Fiz uma homilia, orações, em português e ucraniano”, resumia, já na manhã deesta sexta. Ficou surpreendido com a quantidade de jovens que ali viu. “Há pessoas que vão deixar aqui a emigração e que vão para a guerra. Não podemos deixar que isto aconteça ao país.”

Outros protestos haverá no Porto. O desta sexta-feira, pelas 18h30, será junto à câmara municipal. “Já está marcada para sábado uma missa, numa igreja grande, a Igreja do Marquês, pelas 21h. Vamos juntar portugueses e ucranianos em oração.”

Parece-lhe importante começar a pensar em angariar fundos para ajudar quem vai chegar, mas também quem lá vai continuar. “Vamos precisar de muita coisa. Ambulâncias, medicamentos, comida, dinheiro.” No terreno, já há organizações sem fins lucrativos a agir. Recolhem e distribuem doações, alimentos e suprimentos médicos a ucranianos deslocados dentro do próprio país e apoiam feridos e familiares de mortos, como a Cruz Vermelha, a People in Need e a Sunflower of Peace.

Esta sexta-feira, a família de Buhakov prepara-se para o pior. A irmã está a improvisar um abrigo na garagem para amigos de Kiev. E a fazer comida abundante para e eventualidade de ficarem sem luz. Nem só os combustíveis estão já a ser racionados. “Só pode comprar o pão para o dia. São quatro pães por dia”, exemplifica. O que mais assusta é a possibilidade de ataques aéreos.


Nova versão das tabelas de IRS para os salários já está disponível

Pedro Crisóstomo, in Público on-line

Despacho do Governo foi publicado em Diário da República desta quinta-feira. Alteração às tabelas aplica-se a partir de Março. Ajuste pretende evitar que os trabalhadores com aumentos salariais fiquem com um vencimento líquido inferior ao de 2021, como estava a acontecer nalguns casos.

O despacho do Governo com as novas tabelas do IRS a aplicar aos salários a partir de Março foi publicado nesta quinta-feira no Diário da República, num suplemento à edição de quarta-feira, e, de acordo com o executivo, há uma descida da retenção na fonte para a generalidade dos trabalhadores por conta de outrem.

Depois de uma primeira correcção às tabelas relativas às pensões, o Governo decidiu fazer uma segunda alteração, desta vez nos rendimentos do trabalho dependente, para evitar que alguns trabalhadores que receberam aumentos salariais continuassem a ficar com um vencimento líquido inferior ao do ano passado, algo que estava a acontecer a quem se encontrava no limite superior de um degrau de rendimento e, com o aumento, saltou de patamar de retenção.

Para impedir que isso continuasse a acontecer, o Governo subiu os limites dos intervalos dos escalões de retenção.

Até aos 754 euros de salário bruto, não há alterações em relação às tabelas já conhecidas: os vencimentos até aos 710 euros não fazem retenção mensal; nos salários até aos 720 há uma retenção de 1,8% (para quem não tem filhos) ou de 0,2% (para quem tem um filho) ou de zero (para quem tem dois ou mais filhos); para as remunerações até aos 740 euros a retenção também não mexe, continuando a ser de 4,5% (para quem não tem filhos) ou de 0,6% (para quem tem um filho); e para os salários até aos 754 euros a taxa também continua a ser de 6,3% (contribuinte solteiro sem filhos) ou de 0,8% (um filho).

Daí para cima há um reescalonamento dos patamares. Por exemplo, na primeira versão, um vencimento de 822 euros (contribuinte solteiro e sem filhos) ficava sujeito a uma retenção mensal de 10,1%, mas, agora, com a actualização dos intervalos, passa a reter 7,9%, porque esta taxa apanha rendimentos brutos ligeiramente acima do que acontecia em Janeiro e Fevereiro.

Esse movimento de subida dos patamares das remunerações é transversal até aos rendimentos brutos mensais mais altos.

As novas orientações entram em vigor a 1 de Março, o que significa que as empresas, ao processarem os salários do próximo mês, já deverão ter de aplicar as novas tabelas.

Embora a alteração surja nesta altura, ainda não reflecte o desdobramento dos escalões que António Costa tem programado para o novo Orçamento do Estado de 2022, apurou o PÚBLICO junto de fonte do actual executivo.

No despacho, assinado pelo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, o Governo afirma que a alteração aos limites dos intervalos dos escalões são agora actualizados, permitindo “baixar a retenção na fonte da generalidade dos trabalhadores dependentes e, com isso, continuar a aproximar o montante do imposto retido ao imposto a pagar e, bem assim, prevenir situações em que aumentos salariais se possam traduzir no imediato em diminuição de remuneração líquida”.

Vejam-se alguns exemplos, a partir de simulações do Ministério das Finanças, começando com a situação de um contribuinte casado (com uma pessoa que também aufere rendimentos) e com dois filhos.

Se uma pessoa auferisse um salário bruto de 1415 euros em 2021 e tiver sido aumentada este ano em 0,9% (o valor da actualização na função pública), o vencimento bruto passou para 1427,74 euros. Com a tabela de retenção original (aquela que se aplicou em Janeiro e Fevereiro), o salário líquido era de 1062,23 euros (inferior ao líquido do ano passado, de 1065,5 euros), mas, agora, com a tabela a aplicar a partir de Março, fica com um vencimento líquido de 1076,51 euros, uma diferença de 11 euros face ao que se passava em Janeiro e Fevereiro, já não se verificando a quebra mensal em relação a 2021.

Outro exemplo, para a mesma situação familiar, mas pensando num rendimento bruto mensal de 2075 euros: em 2021, o vencimento líquido era de 1435,9 euros; este ano, com o aumento salarial, o bruto passou para 2093,68 euros, mas, na versão original da retenção, a retribuição líquida era de 1429,98 euros; só com a nova retenção não há perda mensal, já que a pessoa volta a ganhar 1453,01 euros líquidos, segundo uma simulação do Ministério das Finanças.

Veja-se a situação de um contribuinte solteiro com um filho: no caso de um salário bruto de 810 euros em 2021 (684,45 euros líquidos), o aumento salarial de 0,9% colocou o vencimento bruto nos 817 euros brutos; mas se na primeira versão o vencimento líquido era de 672,63 euros (inferior àqueles 684,45 euros líquidos do ano assado), agora, com as novas tabelas, o vencimento líquido passa para 690,61 euros.

Para um contribuinte solteiro sem filhos que ganhe este ano 1007,49 euros brutos (mais 0,9% face aos 998,5 euros do ano anterior), o vencimento líquido passa a ser de 782,82 euros na nova versão, quando, pelas tabelas de retenção do início do ano, a pessoa ficava com 774,76 euros líquidos.

Antes de corrigir as tabelas relativas aos salários, o Governo também fez uma correcção às tabelas das pensões para travar a redução em termos líquidos mensais dos valores recebidos por alguns pensionistas que foram aumentados no início do ano.

Covid-19 fez pelo menos 5,2 milhões de órfãos em todo o mundo

Clara Barata, in Público on-line

Cientistas dizem que há uma necessidade urgente de dar prioridade às crianças afectadas pela morte dos pais ou cuidadores. Adolescentes dos dez aos 17 anos são os mais afectados.

A covid-19 fez pelo menos 5,2 milhões de órfãos – perda do pai ou da mãe, ou de um cuidador, que pode ser uma avó, por exemplo – entre 1 de Março de 2020ne 31 de Outubro de 2021, diz um novo estudo publicado na revista The Lancet Child & Adolescent Health. E é sobretudo entre os adolescentes que mais ficaram órfãos: o grupo dos dez aos 17 anos representa 63,6% do total destas crianças.

É um número esmagador, considerando que as potenciais consequências para as crianças de perderem um dos pais ou o cuidador principal “são devastadoras e duradouras, incluindo serem institucionalizadas, abusos, problemas de saúde mental, gravidez adolescente e doenças crónicas e infecciosas”, enumera a equipa, que tem investigadores norte-americanos e europeus.

A epidemia de VIH-sida tornou bem conhecidas estas consequências, pelo que os cientistas fazem um apelo: “Os nossos resultados sugerem uma necessidade urgente de dar prioridade às crianças afectadas pela morte dos pais ou cuidadores na resposta pandémica. Para serem eficazes, as estratégias nacionais devem ser adequadas à idade das crianças e à circunstância da perda”, escrevem. As respostas devem incluir “programas que reforçam o apoio económico à comunidade e às famílias, e que evitem enviar as crianças para orfanatos”, salientam.

“Estimamos que uma criança tenha ficado órfã ou tenha perdido um cuidador para cada pessoa que tenha morrido em resultado da pandemia [5,9 milhões de mortos e 426 milhões de casos, segundo os últimos números da Organização Mundial de Saúde]. Isto equivale a que uma criança enfrente a cada seis segundos um risco agravado de adversidade para a vida, a não ser que tenha apoio adequado a tempo”, salienta Susan Hilis, dos Centros de Controlo e Prevenção das Doenças dos Estados Unidos, citada num comunicado de imprensa.

A equipa estima que pelo menos 3.367.000 crianças tenham ficado órfãs devido à morte de um dos pais por causa da covid-19 durante os 20 meses em apreciação, e que mais 1.833.300 crianças foram afectadas pela morte de pelo menos um dos avós, que era um cuidador principal, ou de outro familiar mais velho que vivia na mesma casa, e contribuía para o seu cuidado.

“Infelizmente, embora as nossas estimativas sejam elevadas, provavelmente ficam aquém da realidade, e prevemos que estes números cresçam à medida que fiquem disponíveis mais dados globais sobre as mortes de covid-19”, disse Juliette Unwin, do Imperial College de Londres, a primeira autora do trabalho, citada no mesmo comunicado.

Infelizmente, embora as nossas estimativas sejam elevadas, provavelmente ficam aquém da realidade, e prevemos que estes números cresçam à medida que fiquem disponíveis mais dados globais sobre as mortes de covid-19.

Por exemplo, a Organização Mundial da Saúde tem uma quantidade limitada de estatísticas precisas sobre as mortes de covid-19 em África – e os números reais podem ser dez vezes mais altos do que está a ser reportado, disse Unwin. “Isso quer dizer que os números de órfãos da covid-19 estão também drasticamente subestimados [para o continente africano]”, explicou.

Os cientistas estimam que 1.247.300 crianças africanas tenham perdido um ou dois dos pais, esse número cresce para 1,5 milhões se se considerar também a morte dos avós, se forem os cuidadores principais, ou de outros familiares mais velhos que morem na mesma casa e que contribuam para cuidar das crianças. “Mas há dados epidemiológicos que sugerem que o número total real de crianças órfãs [em África] chegou a 6,7 milhões em Janeiro de 2022”, alertou Juliette Unwin. “O nosso estudo fez estimativas até Outubro de 2021, mas a pandemia continuou por todo o mundo, o que significa que os órfãos da covid-19 continuaram a aumentar.”

Os investigadores cruzaram dados de mortalidade da covid-19 com dados relativos à fertilidade e à mortalidade infantil entre 2003 e 2020, por exemplo, para fazerem as suas estimativas. Fizeram isto para 21 países que representam 76% da mortalidade global de covid-19: África do Sul, Argentina, Alemanha, Brasil, Colômbia, Espanha, Estados Unidos, França, Filipinas, Índia, Inglaterra e País de Gales, Itália, Irão, Malawi, México, Nigéria, Polónia, Peru, Quénia, Rússia e Zimbabwe.

Durante os 20 meses do estudo, houve grandes diferenças no número de crianças órfãs, indo desde 2400 na Alemanha até 1.917.100 na Índia. Mas os países em que há mais órfãos por cada mil crianças são o Peru (8,28 por 1000) e África do Sul (7,22 por 1000).

Apesar destas grandes diferenças entre países, os adolescentes (entre os 10 e os 17 anos) foram o grupo com o maior número de órfãos por causa da covid-19, quase 2,1 milhões. Peru, África do Sul, Índia e México foram os países onde mais adolescentes ficaram órfãos por causa da covid-19. Dos zero aos quatro anos há meio milhão de órfãos, e entre os cinco e os nove anos 740 mil.


O estudo acaba por confirmar que a covid-19 tem uma mortalidade maior entre os homens, porque 76,5% das crianças que ficaram órfãs por causa da pandemia perderam o pai. Os países onde isto mais aconteceu foram, mais uma vez, Peru, África do Sul, Índia e México. Portanto, a situação mais comum é que a covid-19 tenha deixado órfãos de pai adolescentes.

“Globalmente, por cada morte por covid-19 houve, pelo menos uma criança ficou órfã devido à morte de um dos pais ou cuidador. Para regiões onde as taxas de fertilidade são mais elevadas, como África, o Mediterrâneo Oriental ou o Sudeste asiático, o número de crianças afectadas excede o número de mortes de covid-19”, escreve a equipa. “Estes dados sugerem que a rápida aceleração das campanhas de vacinação é estrategicamente necessária para proteger as crianças nestas três regiões, mas estas são as regiões que têm a mais baixa cobertura vacinal [contra a covid-19]”, salientam os cientistas.

Como parte deste trabalho, os investigadores desenvolveram uma calculadora em tempo real online que dá estimativas do número de órfãos associados à morte de cuidadores para cada país no mundo, que pode ser consultada a partir do site do Imperial College. A estimativa para Portugal é que 500 crianças tenham perdido os pais, avós que eram os cuidadores principais ou parentes residentes na mesma casa que ajudavam a cuidar deles.

ONU estima que 100 mil pessoas terão abandonado as suas casas num só dia

Ana Dias Cordeiro, in Público on-line

Portugal quer garantir condições de acolhimento “à medida que se verifiquem chegadas de cidadãos provenientes” da Ucrânia, disse o gabinete da ministra Vieira da Silva. Uma estratégia comum europeia seria desejável, refere a Plataforma de Apoio aos Refugiados.

Cerca de 100 mil ucranianos deixaram as suas casas só nesta quinta-feira depois da invasão russa, de acordo com uma estimativa da Organização das Nações Unidas (ONU). Segundo a Reuters, que cita a porta-voz do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, Shabia Mantoo, milhares de ucranianos atravessaram as fronteiras terrestres uma vez que o espaço aéreo foi encerrado para civis.

A Polónia, a Roménia e a Moldávia que terá recebido cerca de duas mil pessoas, segundo a ministra do Interior, são os destinos mais imediatos destas populações em fuga.

Neste contexto, a comissária europeia dos Assuntos Internos, Ylva Johansson, indicou que Bruxelas está pronto para, se necessário, apoiar os Estados-membros da União Europeia (UE) no acolhimento de refugiados ucranianos. Johansson agradeceu a cinco países (Polónia, República Checa, Roménia, Eslováquia e Hungria) a “vontade de proporcionar protecção imediata”.

Portugal está entre os países que se prontificaram a acolher cidadãos da Ucrânia. Na frente do apoio aos civis e população refugiada, o gabinete de Mariana Vieira da Silva disse que o objectivo era “o de garantir que as condições de acolhimento em Portugal estão preparadas à medida que se verifiquem chegadas de cidadãos provenientes desta zona”.

Em respostas ao PÚBLICO, o gabinete da Presidência do Conselho de Ministros informou estar “em curso a elaboração de um mapeamento das disponibilidades de acolhimento existentes e ofertas de emprego” em Portugal, através das entidades de acolhimento. Essa disponibilidade “está em permanente actualização”.

Entre as principais entidades de acolhimento estão o Serviço Jesuíta aos Refugiados e a Plataforma de Apoio aos Refugiados (PAR – que reúne várias instituições). Num comunicado conjunto, apelaram à “definição de uma estratégia comum [europeia] de acolhimento, de forma a responder adequadamente à situação de emergência humanitária na Ucrânia”.

As duas organizações esperam da União Europeia (UE) que garanta “uma intervenção rápida no sentido de apoiar os Estados-membros”.

Uma estratégia comum foi encontrada em 2015 quando a guerra na Síria e a situação noutros países em guerra criou uma pressão com a chegada de refugiados à Grécia e à Itália, depois da passagem pela Turquia. Polónia, Eslováquia, Hungria e Roménia fazem fronteira com a Ucrânia e são membros da UE.

A presidente da Comissão Europeia garantiu que a UE está preparada para acolher os ucranianos que fogem do país: “Esperamos que haja o mínimo possível de refugiados, mas estamos totalmente preparados para eles e para garantir que eles estão bem”, disse Ursula von der Leyen.

“Temos trabalhado durante semanas para estarmos preparados para o pior. Chegámos a essa fase de nos prepararmos para potenciais refugiados”, acrescentou.
Apoio no terreno

O começo dos ataques militares em território ucraniano levou organizações não governamentais portuguesas como a Médicos do Mundo (MdM) a iniciar “a realocação da sua equipa internacional e a protecção dos seus colaboradores na Ucrânia”.

Esta organização humanitária, a operar na Ucrânia desde 2015, tem actualmente 100 profissionais no terreno e prevê que as populações das autoproclamadas repúblicas de Donetsk e de Lugansk enfrentem agora “grandes dificuldades no acesso a cuidados de saúde e a apoio psicológico”.

Nesta região, cerca de um terço da população tem mais de 60 anos, refere a organização em comunicado. São pessoas que “necessitam de monitorização constante e acesso a medicamentos para doenças crónicas”.

A MdM disponibiliza assistência humanitária e serviços de saúde às populações vulneráveis que vivem ao longo da linha de contacto entre Lugansk e Donetsk, no leste da Ucrânia, mas esse trabalho estará de imediato, pelo menos em parte, comprometido: “Agora que as nossas unidades móveis não conseguem operar, a situação tornou-se mais difícil para estas pessoas”, refere o comunicado, indicando que mesmo antes da escalada militar desta quinta-feira, “mais de 850 mil pessoas” já se encontravam “deslocadas no território da Ucrânia”. com Ana Maia