Rita Siza, in Público on-line
Oitavo Relatório sobre a Coesão Económica, Social e Territorial na União Europeia comprova o sucesso do investimento dos fundos estruturais na redução das disparidades, particularmente nas regiões menos desenvolvidas do Leste da Europa. No Sul, onde o impacto da pandemia foi mais agudo, há muitas regiões “encalhadas numa armadilha de desenvolvimento”.
O recurso à flexibilidade na distribuição dos fundos estruturais, logo que rebentou a pandemia de covid-19, permitiu agilizar os apoios aos sectores mais expostos e acelerar a resposta de emergência das autoridades nacionais, regionais e locais no combate à crise sanitária, social e económica, revela o 8.º Relatório sobre a Coesão Económica, Social e Territorial na União Europeia, divulgado pela Comissão Europeia, esta quarta-feira, em Bruxelas.
Segundo o documento, os dois pacotes de apoio que foram lançados na Primavera de 2020 designados como Iniciativa para o Investimento em Resposta ao Coronavírus (CRII, na sigla em inglês), garantiram uma liquidez imediata que permitiu às regiões da UE enfrentar o desafio pandémico e as suas consequências imediatas, através da flexibilização das regras e do aumento para 100% da taxa de co-financiamento das despesas dos vários programas da política de coesão, bem como do alargamento do âmbito do Fundo de Solidariedade da UE.
Portugal beneficiou de um financiamento de 1,8 mil milhões euros ao abrigo do CRII: uma parte desse montante era correspondente a verbas da política de coesão que não tinham sido executadas e seriam perdidas, e a outra eram despesas que já estavam contratualizadas mas puderam ser reafectadas para suportar os custos de acções urgentes no sector da saúde, na manutenção de postos de trabalho e no apoio a pequenas e médias empresas.
Além do redireccionamento das verbas disponíveis no Fundo de Coesão, Fundo Social Europeu e Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, a Comissão ainda integrou a política de coesão no seu pacote global de recuperação “Próxima Geração UE”.
“Como parte do fundo de recuperação, o React-EU forneceu um montante adicional de 50,6 mil milhões de euros (…) que permitiu que as regiões e cidades continuassem a investir no seu crescimento durante a preparação do actual período de programação (2021-2027) e proporcionou uma rede de segurança muito necessária às pessoas vulneráveis, cuja situação se tornara ainda mais precária em resultado da pandemia”, lê-se no documento.
O novo Relatório sobre a Coesão — este é um exercício que a Comissão Europeia realiza a cada três anos para avaliar a evolução do desenvolvimento regional e da convergência entre os Estados-membros, tendo em conta indicadores como a prosperidade, a taxa de emprego, os níveis de educação, o estado das infra-estruturas e a governação — permite retirar algumas conclusões preliminares sobre o impacto da pandemia.
“O excesso de mortalidade entre Março de 2020 e finais de 2021 foi significativamente mais elevado nas regiões menos desenvolvidas (17%) do que nas regiões mais desenvolvidas (12%) e nas regiões de transição (11%)”, indica um resumo do estudo.
Quanto ao impacto económico da pandemia, sentiu-se de forma mais aguda nas regiões do Sul da Europa onde existe “uma dependência mais elevada do turismo e dos serviços de proximidade”. Em comparação com 2019, verificou-se uma quebra de 90% nas pernoitas de turistas depois de Março de 2020, quando a UE se fechou no primeiro grande confinamento.
Mas olhando para a realidade pré-pandemia, e perspectivando já os desafios a que a política de coesão terá de responder nos próximos anos, a principal conclusão que se retira do relatório apresentado esta manhã em Bruxelas é que o investimento dos fundos estruturais da UE produz resultados concretos em termos da promoção da convergência entre os Estados-membros.
“Ao traçar as áreas em que os Estados-membros e as regiões precisam de fazer mais e melhor, o relatório permite-nos aprender com as lições do passado para estarmos mais bem preparados para os desafios do futuro”, diz a comissária para a Coesão e Reformas, Elisa Ferreira, que já retirou as suas próprias conclusões da leitura do documento.
“Precisamos de acelerar a adopção e implementação dos programas da política de coesão para 2021-2027, para que possamos continuar a apoiar as regiões na recuperação da pandemia, colher todos os benefícios da transição para uma Europa verde e digital, e produzir resultados no crescimento a longo prazo”, referiu.
De acordo com o estudo, o financiamento comunitário contribuiu para uma redução das disparidades territoriais e sociais, particularmente nas regiões menos desenvolvidas do Leste da Europa, que “têm vindo a alcançar o resto da UE, levando a uma redução substancial da diferença do PIB per capita” (a diferença entre os 10% das regiões menos desenvolvidas e os 10% das regiões mais desenvolvidas da UE diminuiu 3,5%).
“Isto deve-se a uma transformação estrutural, nomeadamente uma mudança do emprego para fora da agricultura e para sectores de maior valor acrescentado”, explica o documento. No entanto, nos Estados-membros onde o crescimento económico tem sido mais rápido, também têm aumentado mais as desigualdades a nível interno, por causa do desequilíbrio significativo entre as capitais e regiões metropolitanas e o resto do país.
Ao mesmo tempo, assinala o estudo, “muitas regiões menos desenvolvidas e em transição no Sul e Sudoeste da Europa sofreram uma estagnação ou declínio relativo, e estão encalhadas numa armadilha de desenvolvimento”. Foram as regiões mais afectadas pela crise de 2008, e que estão mais necessitadas de “reformas do sector público, de uma mão-de-obra mais qualificada e de uma capacidade de inovação mais forte”.
O relatório nota ainda que o risco de pobreza e exclusão social se mantém elevado na UE, onde é possível encontrar “bolsas de privação” persistente mesmo em regiões prósperas.
“Enquanto 17 milhões de pessoas foram retiradas da pobreza entre 2012 e 2019, actualmente uma em cada cinco pessoas ainda se encontra em risco de pobreza ou exclusão social na UE”, lê-se nas conclusões. Agora que a Europa começa a emergir da crise pandémica, que fez crescer em cinco milhões o número de pessoas vulneráveis, “devem ser feitos todos os esforços para retomar a tendência de redução da pobreza”, recomenda.