28.3.19

Cidadãos da UE podem não ter direitos garantidos após o Brexit

in DN

Relatório da comissão conjunta dos direitos humanos do Parlamento britânico alerta que, se a lei não for emendada, cerca de três milhões de cidadãos europeus podem ser deixados num limbo após a saída do Reino Unido da União Europeia

Os cidadãos europeus que vivem no Reino Unido podem ver-se privados de direitos após o Brexit, nomeadamente em áreas como a da liberdade de circulação, da habitação e da segurança social, alerta um relatório da comissão conjunta dos direitos humanos do Parlamento britânico esta terça-feira citado pela imprensa britânica.

O relatório da comissão interpartidária, composta por membros da câmara dos Comuns e da câmara dos Lordes, concluiu que se a proposta de lei do governo sobre imigração para o pós-Brexit não for emendada cerca de três milhões de cidadãos europeus que vivem no Reino Unido serão deixados "num limbo" após a saída do Reino Unido da UE. A comissão nota que o estatuto dos cidadãos europeus vai mudar "sem qualquer proteção legislativa para garantir esses direitos", o que levanta preocupações sobre os seus direitos humanos.

Estas conclusões derivam de uma análise feita pela comissão à proposta de lei do governo de Theresa May sobre imigração para o pós-Brexit (Immigration and Social Security Co-ordination [EU Withdrawal] Bill em inglês). Essa proposta de lei passa a considerar os cidadãos europeus como imigrantes sem direito automático à residência e trabalho, ao contrário do que acontece com a liberdade de circulação dentro da UE. Segundo o relatório, que propõe que o Executivo garanta as proteções e garantias na legislação primária, a proposta de lei na sua forma atual afirma que os direitos dos cidadãos da UE que vivem no Reino Unido serão removidos após o Brexit e que a restituição desses direitos depende da decisão do ministro do Interior de criar uma legislação secundária.

Portugueses à espera do Brexit: "Temos de agir rapidamente assim que houver acordo"
A proposta de lei, que já passou em primeira e segunda leitura na câmara dos Comuns, bem como na fase de análise pelas comissões, encontra-se atualmente na fase dos relatórios. Este é o momento em que são propostas emendas ao projeto de lei. Segue-se depois a terceira leitura, altura em que é debatido e votado o texto final a ser entregue na câmara dos Lordes. O mesmo processo acontece nessa câmara. Depois o texto ainda volta aos Comuns para exame minucioso e, se aprovado, terá processamento para consentimento real e torna-se lei.

"A proteção dos direitos humanos dos cidadãos da UE não deve desaparecer a seguir ao Brexit. Os cidadãos da UE que vivem no nosso país neste momento ficarão, compreensivelmente, ansiosos em relação ao seu futuro. Estamos a falar dos direitos de pessoas que residem no Reino Unido há anos, talvez décadas, pagando o nosso sistema de segurança social ou tendo até nascido no Reino Unido e vivido aqui durante toda a sua vida", declarou a líder desta comissão conjunta, a deputada trabalhista Harriet Harman, ex-ministra da Segurança Social de Tony Blair, citada esta terça-feira por meios de comunicação social britânicos como o Guardian, Financial Times e BBC.

"Quando se trata de direitos, prometer que tudo será tratado no futuro não é suficiente, deve ser uma garantia, e é por isso que a comissão reinseriu as garantias de direitos na redação da proposta de lei", frisou Harman, tendo Zoe Gardner, conselheira política da comissão afirmado que todos os cidadãos de países da UE que vivem no Reino Unido devem ter direito automático a permanecer no Reino Unido. A comissão questiona, por exemplo, a falta de emissão de uma prova física do estatuto de residente, lembrando as dificuldades que cidadãos extracomunitários da Commonwealth e pertencentes à chamada "Geração Windrush" tiveram em provar o direito a viver no Reino Unido devido à falta de documentação.

O esquema de regularização do estatuto migratório obrigatório para os cidadãos europeus residentes no Reino Unido vai estar em pleno funcionamento a partir do próximo sábado, dia 30 de março, apesar de a data do Brexit ir ser adiada de 29 de março para 12 de abril. Os deputados britânicos votam, esta quarta-feira, sobre a alteração da data.

O estatuto de residente permanente será atribuído aos cidadãos que levam cinco anos consecutivos a viver no Reino Unido. Os que estão há menos de cinco anos no país terão um título provisório até completarem o tempo necessário. As autoridades estimam que cerca de 3,5 milhões de cidadãos europeus residentes no Reino Unido necessitem de se registar até pelo menos ao final do ano de 2020, dos quais 200 mil já o fizeram durante as fases experimentais, indica o correspondente da agência Lusa em Londres Bruno Manteigas.

O sistema de candidatura, criado pelo Ministério do Interior britânico, é inteiramente digital, tendo sido criada uma App para verificar a identidade do candidato, o que faz lendo a informação pessoal contida no chip do passaporte biométrico. A resposta é depois dada por correio eletrónico e não através da emissão de um documento, ao contrário do que acontecia até agora com os cidadãos europeus com estatuto de residente, aos quais era atribuído um cartão de papel azul. Daí, o alerta da comissão conjunta dos direitos humanos do Parlamento britânico para a ausência de uma prova física.

Em janeiro deste ano, o ministro do Interior, Sajid Javid, declarou naquela comissão: "Nós demos garantias unilaterais aos cidadãos de países da União Europeia e aos seus familiares residentes no Reino Unido que podem ficar mesmo que o Reino Unido sai da UE sem um acordo. Apesar de a futura política sobre coordenação na segurança social ainda ter que ser decidida, o governo deixou claro que os cidadãos europeus e os seus familiares, na altura da saída, terão exatamente o mesmo acesso aos serviços de que gozam hoje em dia".

Nas várias preparações para um cenário de No Deal Brexit, a Comissão Europeia sempre colocou o enfoque na necessidade de proteger os direitos dos cidadãos europeus que vivem no Reino Unido e dos britânicos que vivem na UE27. Portugal é dos Estados membros que considera prioritário este dossiê até porque vivem em território britânico cerca de 400 mil portugueses. Por isso, o governo de António Costa deu grande importância à questão dos cidadãos no plano de contingência português para um cenário de saída desordenada do Reino Unido da UE. Seja porque não houve acordo. Ou seja de forma acidental.

"A primeira-ministra [britânica Theresa] May assumiu o compromisso de garantir, mesmo no cenário de uma saída sem Acordo, uma proteção dos direitos dos cidadãos da UE no RU similar à que está prevista no Acordo. Na sequência da publicação, em 6 de dezembro de 2018, do Policy Paper do governo britânico sobre os direitos dos cidadãos no cenário eventual de uma saída sem Acordo, aguarda-se a formalização desse compromisso de forma a garantir segurança jurídica aos cidadãos", lê-se no plano de contingência português, apresentado a 11 de janeiro pelos ministros dos Negócios Estrangeiros e da Administração Interna, Augusto Santos Silva e Eduardo Cabrita, respetivamente, no Palácio das Necessidades.

Segundo dados divulgados pela secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas havia, em junho, 309 mil portugueses detentores do National Insurance Number (necessário para poder trabalhar em território britânico). Nos anos da crise, emigraram para o Reino Unido, entre 2011 e 2015, 129 mil portugueses. Em 2017 houve 32 mil emigrantes, uma quebra de 26% em relação ao ano anterior, de 2016, quando 52% dos britânicos votaram em referendo a favor do Brexit.

Os portugueses que estejam já ou entrem no Reino Unido até 29 de março (data prevista para o Brexit) poderão regularizar a sua situação até 31 de dezembro de 2020. "Em caso de saída sem Acordo, os portugueses que tenham entrado no Reino Unido até 29.03.2019 poderão regularizar a sua situação até 31.12.2020", refere o plano de contingência português, relativo à área dos direitos dos cidadãos.
"É preciso acautelar direitos até 29 de março", frisou Santos Silva, na conferência de imprensa de janeiro, sublinhando que "os direitos dos portugueses que entrem no Reino Unido ou aí residam até 29 março de 2019 serão respeitados" e o respetivo "registo pode fazer-se até 31 dezembro de 2020".

Ou seja, insistiu o governante, mesmo sem acordo, os portugueses dispõem "de mais de um ano e meio para completar todos os passos para que cidadãos residentes no Reino Unido a 29 de março, se quiserem continuar a residir, o possam fazer com cartão de residência ou o pré-registo, nos termos definidos autoridades britânicas".

Além do direito de residência, as disposições concretizadas contemplam outros direitos como o reconhecimento de habilitações e qualificações profissionais ou direitos sociais, circulação, cuidados de saúde, entre outros.
Se o Reino Unido saísse da UE com acordo, o prazo para os portugueses em território britânico regularizarem a sua situação seria até 30 de junho de 2021. Mas isso era se o acordo do Brexit fosse aprovado e houvesse, de facto, um período de transição, conforme acordado. Como é sabido, o acordo de May já foi rejeitado duas vezes na câmara dos Comuns, uma a 15 de janeiro, outra a 12 de março e ontem a primeira-ministra, do Partido Conservador, assumiu não ter apoio para uma terceira votação ao seu acordo. Na segunda-feira à noite, May viu os deputados aprovarem uma emenda que dá o controlo do processo do Brexit ao Parlamento, em vez do governo, pelo menos durante o debate e votação desta quarta-feira em Westmister. A UE concedeu, entretanto, uma extensão do Artigo 50º, mas o desfecho final de toda a problemática à volta do Brexit está longe de ficar claro.

Segundo disse naquela conferência de imprensa do início de janeiro o ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, estão registados atualmente em Portugal 22 431 cidadãos britânicos. Num cenário de saída do Reino Unido sem acordo, em que não haverá o tal período de transição, o direito a adquirir estatuto de residência permanente aplicar-se-á a todos os cidadãos britânicos que cheguem a Portugal - ou possam provar que já estavam em Portugal - a 29 de março. Estes terão até ao dia 31 de dezembro de 2020 para solicitar a emissão de registo (ou pedido de estatuto de residente, no caso de serem familiares nacionais de um país que não seja da UE).

No passado dia 21 de fevereiro, o Conselho de Ministros em Portugal aprovou a proposta de lei que entregou agora na Assembleia da República prevendo medidas de proteção aos cidadãos britânicos caso o Reino Unido formalize a saída da União Europeia sem acordo.

As medidas já tinham sido anunciadas em Conselho de Ministros no passado dia 17 de janeiro e foram aprovadas nessa quinta-feira em proposta de lei já submetida ao Parlamento, prevendo uma "lógica de reciprocidade" em relação aos portugueses a residir no Reino Unido. O diploma contém uma "cláusula de suspensão" caso o tratamento equivalente não se verifique, disse então o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, em conferência de imprensa no final daquela reunião do governo.

O PSD, por sua vez, quer deixar mais claro que caso o Reino Unido não trate os portugueses lá como Portugal tratar os britânicos cá que a lei fique sem efeito. "O incumprimento do princípio da reciprocidade, não sendo conferido aos cidadãos portugueses residentes no Reino Unido tratamento equivalente ao disposto no presente diploma, determina a suspensão da aplicação da presente lei", diz o novo ponto que o PSD propõe, para alteração ao documento. Esta e outras propostas do grupo parlamentar para alterar o texto do governo socialista vão ser discutidas esta quarta-feira e votadas no mesmo dia. O objetivo é aprovar tudo, para que o presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, promulgue tudo também rapidamente. Até dia 29, o dia inicialmente previsto para a saída do Reino Unido da UE, em virtude do resultado do referendo de 23 de junho de 2016 (52% a favor do Brexit, 48% contra).

"No caso de ter de ser aprovada, [a lei] naturalmente será promulgada imediatamente", referiu esta manhã o chefe do Estado português, falando em Guimarães, à margem de uma visita à empresa Farfetch. Lembrando que o plano de contingência "pode não ser exatamente necessário", o presidente assegurou que Portugal está preparado para "bilateralmente acertar o que é preciso acertar" com o Reino Unido, de forma a que os portugueses que lá vivem não percam direitos com o Brexit.

"Portugal está preparado para acertar o que é preciso acertar com os britânicos, para os nossos concidadãos não perderem os seus direitos e os britânicos que residem em Portugal não perderem os seus direitos", referiu Marcelo Rebelo de Sousa, em declarações citadas pela agência Lusa, vincando ainda que "Portugal está a fazer tudo para que haja uma solução com acordo" sobre a saída do Reino Unido da UE.
O DN pediu esta terça-feira de manhã ao Ministério dos Negócios Estrangeiros um comentário aos alertas contidos no relatório da comissão conjunta dos direitos humanos do Parlamento britânico e aguarda uma reação do mesmo. Está prevista para esta tarde a comparência de Augusto Santos Silva na comissão de Assuntos Europeus da Assembleia da República para discutir, precisamente, o tema do Brexit e a situação dos cidadãos nacionais no Reino Unido.

Complemento Solidário para Idosos chega a mais de 165 mil em fevereiro

in Jornal de Notícias

Mais de 165 mil pessoas receberam o Complemento Solidário para Idosos (CSI) em fevereiro, uma ligeira redução em relação a janeiro e na comparação com o período homólogo de 2018, segundo os dados mais recentes da Segurança Social.

Os dados estatísticos do Instituto de Segurança Social mostram que em fevereiro o CSI foi pago a 165137 idosos, menos 911 do que no mês de janeiro e menos 261 do que em fevereiro de 2018.

Esta prestação social é sobretudo paga a mulheres (116163) e, no geral, a distribuição geográfica mostra que o CSI é sobretudo pago nos distritos do Porto (28576), Lisboa (24104) e Braga (12400).

No que diz respeito a pensões, o Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP), do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, refere que as pensões de velhice são as que têm maior peso no total de pensões processadas (69,7%), sendo que foram atribuídas menos 1949 pensões do que em janeiro, no total de 2037298 pensões.

"No total de pensões processadas, o peso das pensões de sobrevivência é de 24,2%. Em fevereiro de 2019 foi registado um decréscimo de 0,1% (menos 365 pensões) relativamente ao mês anterior, totalizando 709581 pensões. Face ao mês homólogo de 2018, observou-se um decréscimo de 5530 pensões, representando uma descida de 0,8%. São os pensionistas do sexo feminino que detêm a maioria das pensões de sobrevivência (81,6% do total)", lê-se no boletim estatístico.

Por outro lado, foram pagas 177498 pensões de invalidez, mais 715 do que em janeiro, mas menos 1127 do que em fevereiro do ano passado, o que representou uma redução de 0,6%.

Arrendar casa em Lisboa é 65% mais caro que comprar

in Expresso

No segundo semestre de 2018, o valor mediano dos novos contratos de arrendamento aumentou 9,3%, a nível nacional, revelou o Instituto Nacional de Estatística (INE) na quarta-feira

Comprar casa, tradicionalmente, traz mais encargos (nem que sejam mentais) do que arrendar, mas, tendo em conta a evolução do mercado imobiliário nos últimos anos, tudo indica que a primeira opção fica hoje mais em conta que a segunda. De acordo com o “Jornal de Negócios” esta quinta-feira, arrendar casa em Lisboa, neste momento, fica em média 65% mais caro do que o valor da prestação a entregar ao banco, caso tivessem adquirido a mesma habitação.

No Porto, esta diferença é ainda mais expressiva: considerando as sete freguesias da Invicta, as rendas são, em média, 100,5% mais elevadas do que a aquisição. Campanhã é a freguesia onde a diferença é maior (141,5%), com a renda a ascender a 619 euros e a prestação a rondar os 256,3 euros.

Para esta comparação, o “Negócios” fez a simulação da aquisição de um imóvel com uma dimensão de 100 metros quadrados. Quanto ao financiamento, foi considerado um montante equivalente a 80% do valor do imóvel, Euribor a 12 meses, com um "spread" de 1,74% e um prazo de 33,3 anos.

No segundo semestre de 2018, o valor mediano dos novos contratos de arrendamento aumentou 9,3%, a nível nacional, revelou o Instituto Nacional de Estatística (INE) na quarta-feira. A maior subida registou-se na área metropolitana de Lisboa, onde as novas rendas cresceram mais de 15% face ao ano anterior.

Há famílias a perder a casa por dívidas de telecomunicações

Elisabete Tavares, in DN

A Deco diz que a lei não está a ser cumprida e pede maior proteção legal da casa de família.

Por uma dívida de mil euros a um operador de telecomunicações, a família Costa (nome fictício) perdeu a sua casa e não tem onde viver. Este é um dos casos que têm chegado ao Gabinete de Proteção Financeira da Deco de famílias que perdem a casa por dívidas, algumas de montante reduzido quando comparado com o valor da habitação.

Num outro caso, Manuela necessitou de alugar um determinado equipamento para realizar um tratamento médico, ficando a liquidar um valor fixo mensal durante dois anos. Com o divórcio e o facto de ganhar o salário mínimo deixou de cumprir o pagamento do aluguer do equipamento. Mas manteve em dia o crédito à habitação. Acabou por ser notificada da penhora do imóvel - com um valor patrimonial de 106 600 euros - para pagar a dívida de 3500 euros.

"Situações como esta ocorrem com demasiada frequência. São muitas as famílias que se veem privadas da casa - a morada de família - na sequência de processos de execução e de insolvência", disse Natália Nunes, coordenadora do Gabinete de Proteção Financeira da Deco. "Todos os dias nos chegam casos de portugueses que perdem as casas devido a penhoras. Há cada vez mais pedidos de ajuda", garante.

As penhoras são relativas a dívidas - excluindo as fiscais -, desde faturas de telecomunicações que ficam por pagar, a contas ligadas a tratamentos de saúde ou a cartões de crédito, por exemplo. Desde 2016, a lei impede o fisco de vender as casas penhoradas que sejam usadas como habitação própria permanente. Mas esta lei não se aplica a situações de execução judicial de créditos.

Muitas destas casas penhoradas são relativas a devedores que têm um salário igual ou inferior ao salário mínimo nacional
"É muito injusto o que está a acontecer com muitas famílias. Há uma enorme desproporcionalidade entre o valor em dívida e o valor da casa penhorada", indicou Natália Nunes. "Este ano são mais frequentes os casos que nos surgem. É uma realidade também muito presente no norte."

A Deco tem feito diligências junto do governo e dos partidos com assento parlamentar no sentido de ser criada legislação que impeça que mais casos destes aconteçam. "O direito à habitação está consagrado na Constituição. Não deve ser permitido deixar famílias sem casa por dívidas não relacionadas com o crédito à habitação", sublinhou.

Para a Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor, a lei não está a ser cumprida. "A lei implica, por um lado, que a proporcionalidade seja limitada a bens no valor necessário e suficiente para assegurar o pagamento da quantia exequenda, e, ainda, que a escolha dos bens a penhorar seja adequada para que o executado sofra o mínimo de prejuízo", lembrou Natália Nunes.

Acresce que muitas destas casas penhoradas são relativas a devedores que têm um salário igual ou inferior ao salário mínimo nacional - o qual não pode ser alvo de penhora. Há igualmente casos de pensionistas que ficam sem o único bem que possuem: a sua habitação. Seja por dívidas, inclusive ligadas a gastos com saúde, seja até porque foram fiadores de um empréstimo.

Desemprego, precariedade no trabalho ou divórcio são as principais situações que levam algumas famílias a não conseguir pagar todas as despesas. "É uma injustiça social. Estamos a atirar pessoas para a exclusão social", salientou Natália Nunes.



Funchal associa-se a campanha de doação de bens para Moçambique

Ruben Pires, in Económico

A recolha de bens será realizada no armazém do município localizado em São Martinho.

A autarquia do Funchal decidiu-se associar-se à campanha de doação de bens intitulada ‘A Caminho de Moçambique’ promovida pelas associações Monte de Amigos, CASA, EAPN Madeira, madeirense emergência e OLHO.TE.

Esta campanha visa a doações de bens para Moçambique tais como: alimentos não perecíveis secos, medicamentos antipiréticos, analgésicos, anti-malária, anti-cólera, e também produtos de limpeza.

Quem estiver interessado na doação deste tipo de bens pode deslocar-se ao armazém da autarquia do Funchal, em São Martinho, no Caminho do Arieiro, nº 92, em todos os dias úteis entre as 9h e as 12h30 e entre as 14h e as 17h30.
O município do Funchal apelou ainda a que a sociedade civil e as várias entidades participem nesta campanha de apoio a moçambique de modo a apoiar um povo em “extrema necessidade”.

Esta angariação de bens está ainda a ser coordenada em conjunto com a União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA), a Câmara Municipal de Lisboa e a Embaixada de Moçambique em Lisboa.

De referir que entidades como a Cruz Vermelha, os CTT, a Ong SIM, a Mota-Engil, foram outras entidades que já prestam auxílio a moçambique depois do país ter sido assolado pelo ciclone Idai.
O Parlamento da Madeira aprovou esta terça-feira um voto de pesar de solidariedade para com os países afectados pelo ciclone.

Movimento regional “A caminho de Moçambique”

Francisco José Cardoso, in DNoticias

Medicamentos, alimentos e produtos de limpeza pedidos aos madeirenses

A Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN) na Madeira, o Centro de Apoio ao Sem Abrigo (CASA) e a IPSS ‘Monte de Amigos’, estão a ultimar os preparativos de uma campanha de angariação de bens essenciais de ajuda a Moçambique.
Segundo nota desta última instituição de solidariedade, a organização procura sensibilizar os madeirenses para a doação de alimentos não perecíveis secos, tais como...

Cáritas defende “direitos dos migrantes e refugiados”

in Rádio
Pax


A Cáritas Diocesana de Beja organiza, esta tarde, pelas 17h30, nas Portas de Mértola o terceiro “Circulo de Silêncio” de 2019.

Subordinado ao tema os “direitos dos migrantes e refugiados”, a iniciativa “há muito que está na ordem do dia (…) dada a sua reflexão, mas também a intervenção humanista, tendo em conta a extensão dos fluxos migratórios e as transformações sociopolíticas que têm surgido devido a este fenómeno que acontece em muitos países”, refere a Cáritas Diocesana de Beja.

Márcio Guerra, técnico da Cáritas de Beja explica que este circulo de silêncio pretende “consciencializar e desmistificar alguns mitos e medos que foram surgindo em zonas onde os migrantes se foram fixando”, tal como acontece no Alentejo.
A Cáritas de Beja refere que, na Diocese de Beja, “todos os dias chegam novos rostos”. Actualmente 28 mil imigrantes estarão no distrito, “grande parte na apanha da azeitona. (…). Emigraram do Senegal, da Guiné-Conacri, do Paquistão, da Índia, do Nepal, entre outras nacionalidades, porque procuram melhores condições de vida uma vez que em Beja, faltam braços para a agricultura”.

O “Circulo de Silêncio” desta tarde resulta da parceria com a Câmara Municipal de Beja, Rede Social, Núcleo de Beja da Rede Europeia Anti-Pobreza, Santa Casa da Misericórdia de Beja e a associação Aris da Planicie, Associação Para Apoio A Integração dos Imigrantes de Beja e a Associação Solidariedade Imigrante SOLIM de Beja.

Uma em cada dez crianças é vítima de violência grave

Inês Schreck, in JN

Desde 2007 que os castigos corporais às crianças são proibidos por lei em Portugal, mas a violência exercida pelos pais sobre os menores continua a ser muito comum.
O mais preocupante é que a ciência acaba de provar que os maus-tratos físicos podem causar graves problemas de saúde a longo prazo.

Um estudo realizado pelo Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), no âmbito do projeto Geração XXI, que acompanha milhares de crianças da Área Metropolitana do Porto desde o nascimento, indica que cerca de 75% dos menores com sete anos de idade são vítimas de agressão psicológica e de castigos corporais, nomeadamente uma bofetada ou uma palmada no rabo.
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27.3.19

Idanha-a-Nova cria equipa de mediadores para integrar comunidades vulneráveis

in DN

A Câmara de Idanha-a-Nova anunciou hoje a criação uma equipa de Mediadores Municipais Interculturais, que vai começar a operar no concelho para reforçar a integração de comunidades especialmente vulneráveis.

"Durante os próximos 36 meses, uma equipa formada por quatro elementos estará no terreno a criar pontes com a comunidade cigana residente neste concelho, mas também a indiana e a oriunda de Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP)", explica, em comunicado, este município do distrito de Castelo Branco.

O projeto é desenvolvido pela Câmara de Idanha-a-Nova em parceria com o Centro Municipal de Cultura e Desenvolvimento, no âmbito de uma candidatura aprovada pelo Alto Comissariado para as Migrações.
"Queremos que todas as comunidades se sintam em casa em Idanha-a-Nova, para que as famílias estejam devidamente integradas na sociedade e no mercado de trabalho, e que as crianças e jovens tenham sucesso escolar", refere o presidente da câmara local, Armindo Jacinto.

A equipa de Mediadores Municipais Interculturais vai começar a operar no concelho para reforçar a integração de populações especialmente vulneráveis, designadamente comunidades ciganas e comunidades migrantes.
"Os objetivos gerais do projeto incidem no aprofundamento do diálogo intercultural entre as várias comunidades e a sociedade de acolhimento, a promoção da coesão social e a melhoria da qualidade de vida de todos os habitantes no concelho de Idanha-a-Nova", lê-se na nota.

O trabalho dos Mediadores Municipais Interculturais inclui áreas estratégicas como a educação, nomeadamente na ligação entre estudantes, escolas e famílias, de forma a combater o insucesso, o absentismo e o abandono escolar.

A sua ação vai ser também determinante em áreas como a ação social e a saúde, em particular na componente do planeamento familiar.
Para reforçar a implementação do projeto, está ainda prevista a realização de ações de formação com vista à capacitação contínua dos quatro mediadores, todos eles oriundos da comunidade idanhense e três dos quais já em funções.

O projeto é cofinanciado pelo Programa Operacional Inclusão Social e Emprego (POISE), Portugal 2020 e União Europeia, através do Fundo Social Europeu.

Este país ainda há de ser para ciganos

Por Ana Tulha, in Notícias Magazine

Piménio, investigador, teve uma professora que lhe disse que ia acabar a vender na feira. Cátia, finalista de Educação Social, foi despedida de um café porque os clientes recusaram ser atendidos por ela. São dois de seis casos de sucesso e superação. Com muita discriminação pelo meio.

Piménio ainda andava longe de perceber o que queria fazer da vida quando uma professora lhe quis traçar o destino. “Não sei o que estão aqui a fazer. Tu [apontando para a colega de carteira de Piménio] vais limpar casas de banho e tu [dirigindo-se a ele] vais andar a vender nas feiras.”

O inapropriado exercício de futurologia da docente, a feder a preconceito e racismo, tinha apenas uma premissa: o facto de Piménio ser cigano, de pai e mãe, e de a colega de carteira ser filha de uma peixeira. A dada altura, o estigma quase levou a melhor sobre ele. A partir do 7.º ano, passou a ser o único cigano da escola. “Havia um ambiente algo tóxico. Fazerem piadas estúpidas era o prato do dia”, recorda.

A desmotivação era tal que no 8.º ano chumbou e esteve para ir embora. Mas não foi. E tudo mudou. Entrou numa turma mais pequena, que o recebeu “super bem”, e os resultados não tardaram. Passou a ter quatros e cincos e depressa saltou para o Quadro de Honra da escola. Pelo meio, teve uma professora de Físico-Química que o fez perceber que era apaixonado pela Física.

E assim ganhou alento para o que estava para vir: fez o Secundário com bolsa de mérito e, mais tarde, com o apoio de uma bolsa atribuída pela Junta de Freguesia da Ericeira, ingressou na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, em Engenharia Física. Sem nunca esconder as origens. “Olá, eu sou o Piménio e sou cigano.” Foi assim que se apresentou aos colegas de turma, no primeiro dia de aulas na faculdade.

E não, não acabou a vender na feira. Fez a licenciatura com quinzes e dezasseis, seguiu para o mestrado, teve uma bolsa de investigação no Campus Tecnológico e Nuclear do Instituto Superior Técnico e é hoje, aos 32 anos, investigador no Instituto de Biofísica e Engenharia Biomédica.

Bem-sucedido nos estudos, e perfeitamente inserido no mercado de trabalho, ativista e fiel às tradições e à herança da cultura cigana, é um dos rostos mais visíveis de um leque de jovens que, pelo exemplo e pela capacidade de resiliência, lutam diariamente para derrubar barreiras e estereótipos de toda a espécie.

Mais do que reclamar mérito próprio, o jovem investigador lembra todos os outros jovens ciganos que, ao contrário dele, desistiram da escola e continuam à margem do mercado de trabalho. “Circunstâncias ditadas por forças externas”, garante. A começar pelo sistema de ensino.

Segundo um estudo do Ministério da Educação, havia, em 2016/17, mais de 11 mil crianças e jovens de etnia cigana matriculados no ensino obrigatório, o que representa um aumento próximo dos 100%, relativamente aos dados de há 20 anos. O cenário anda longe de ser risonho, ainda assim. Desde logo porque o número de alunos ciganos diminui consideravelmente à medida que avançamos no ciclo de estudos – ao ponto de, no Secundário, se terem contabilizado apenas 256 estudantes ciganos.

De resto, aponta Piménio Ferreira, os números mascaram outros problemas. “Não há uma escolaridade de qualidade. Na Primária, muitas crianças ciganas vão passando sem saber ler ou escrever. Muitas são empurradas para turmas especiais, com dificuldades cognitivas”, aponta Piménio. Um cenário que fomenta a autoexclusão das comunidades ciganas, defende.

Maria José Casa-Nova, professora do Departamento de Ciências Sociais da Educação da Universidade do Minho e coordenadora do Observatório das Comunidades Ciganas, invoca também razões históricas. “Só há quatro décadas é que a maior parte da população cigana se sedentarizou e começou a estudar. Daí que haja um estranhamento em relação à escola. Acaba por ser algo hostil, não por tratar mal as crianças, mas porque é um ambiente desconhecido”, refere a investigadora, que se dedica ao estudo das comunidades ciganas desde 1991.

Despedida pelos que sempre lhe sorriram
Os obstáculos não acabam aqui. Até porque os casamentos, muitas vezes celebrados precocemente, e o facto de a virgindade das raparigas ser vista como um ponto de honra que importa preservar a todo o custo, também pesam nos números do abandono escolar. Depois, ainda há os constrangimentos relacionados com a habitação e o orçamento familiar.

Cátia Montes, 32 anos, nascida e criada em São Brás de Alportel (Faro), que o diga. No 9.º ano, teve de mudar de casa, a escola ficou mais distante e viu-se forçada a virar-lhe as costas. Nos anos que se seguiram, foi vivendo de trabalhos precários, na apanha da fruta ou na copa de um restaurante. Pelo meio, juntou-se com um rapaz, também cigano, e conheceu as agruras do nomadismo. “Andei de terra em terra, a ser expulsa pela GNR. Passei dias à chuva e ao frio.”

Desses anos, ficou-lhe também um episódio “chocante”. “Com 20 anos, fui pedir trabalho a um restaurante aqui em São Brás. A dona, que me conhecia desde pequena, aceitou-me, mas passado três dias disse-me que, apesar de gostar do meu trabalho, ia ter de me despedir porque os clientes (fixos) se recusavam a ser servidos por uma cigana. Isto vindo de pessoas que passavam por mim na rua e me sorriam. Aquilo abriu-me os olhos”, recorda.
A este caso seguiram-se outros, igualmente revoltantes. Como quando começou a trabalhar na área de charcutaria de um supermercado e soube, por uma amiga, que havia gente a preferir deslocar-se a outro estabelecimento, mais distante, porque achavam indecente “ter uma cigana a servir-lhes comida”. Estes e outros episódios, mais ou menos subtis, acabaram por germinar numa mudança de rumo: com 27 anos, voltou a estudar.

Hoje, além de ser bombeira voluntária, concilia o trabalho no supermercado com o 3.º ano do curso de Educação Social, que está a fazer na Escola Superior de Educação e Comunicação da Universidade do Algarve, em regime pós-laboral.
“Não esqueço as minhas origens, nem as coisas por que passei, e quero contribuir para que o racismo e a discriminação não travem outros jovens”, vinca, com toda a determinação, antes de deixar uma chamada de atenção: “É preciso que as pessoas percebam que isto não é uma verdadeira meritocracia, que não pensem que, se nós, um número reduzido, conseguimos, toda a gente consegue. Claro que o mérito é importante, mas não basta. Eu continuo a ser a exceção à regra”.

Cátia contou com o empurrão determinante do OPRE, um programa de política pública, com o apoio do Alto Comissariado para as Migrações, que nasceu de um projeto pioneiro da Associação Letras Nómadas e da Plataforma Portuguesa dos Direitos das Mulheres.

Atualmente, o OPRE garante a atribuição de 32 bolsas anuais, no valor de 1 500 euros, a jovens ciganos que pretendam frequentar o Ensino Superior. Para que as dificuldades financeiras não sejam um entrave a quem, como Cátia, quiser apostar na formação.

Pregar a educação com o exemplo
A história da jovem natural de São Brás de Alportel cruza-se com a de Bruno Gonçalves (43 anos), conimbricense cofundador da Letras Nómadas (2013) e mentor do OPRE. Nascido e criado numa comunidade cigana, Bruno estudou até ao 8.º ano, quando teve de ser mais um a levar dinheiro para casa. Mas não se ficou.

Aos 18 anos, inconformado, entra num curso profissional de eletricidade de baixa tensão. Mais tarde, tira o 9.º ano através do programa “Novas Oportunidades”. Entretanto, torna-se ativista e funda a Associação Cigana de Coimbra. Trabalha vários anos como mediador educativo, até se tornar mediador municipal na Câmara de Coimbra.

Conclui o Ensino Secundário já com 35 anos e, com 39, uma surpresa da esposa ajuda-o a dar o passo que faltava. “Sem eu saber, inscreveu-me num curso de Animação Sociocultural, para maiores de 23 anos. Como é que eu podia ser apologista da educação se não dava o exemplo?”

Por essa altura, Bruno tinha já lançado as bases do OPRE (inicialmente designado Opré Chavalé – “erguei-vos, jovens”). “A intenção é encorajar as pessoas, mostrar-lhes que é possível. É um trabalho muito difícil, porque vivemos numa sociedade racista e as pessoas têm uma autoestima muito baixa. Acaba por haver uma censura interna dentro da comunidade. Poucas são as pessoas que vão para a universidade e isso gera uma incredulidade entre as pessoas mais velhas.”

Bruno Gonçalves lançou as bases do OPRE, o programa que concede bolsas aos jovens ciganos que queiram ir para a faculdade (Gonçalo Villaverde/Global Imagens)
Antes do OPRE, Bruno tinha já mergulhado a fundo no associativismo quando, em 2013, se tornou delegado nacional do ROMED, um projeto criado no âmbito do Programa Europeu de Formação de Mediadores, para estimular a participação ativa das comunidades ciganas.

“É um programa de apoio ao mediador, que passa pela organização de grupos ativos comunitários, numa lógica de relação mais próxima com as entidades públicas locais”, descodifica Bruno Gonçalves, sublinhando a importância de criar líderes a nível local, que possam depois fomentar a mudança a nível nacional. Por isso, também o ROMED, atualmente na terceira edição, é hoje uma política pública, financiada pela Secretaria de Estado para a Cidadania e a Igualdade.

Dentro dos apoios estatais, há ainda a destacar o Programa Escolhas, que vai já na sétima edição (e que só na última edição contou com cinco mil participantes de comunidades ciganas), o Programa de Apoio ao Associativismo Cigano (PAAC), que visa robustecer as associações ciganas, e o Fundo de Apoio à Estratégia Nacional (FAPE), destinado a apoiar projetos que concretizem a Estratégia Nacional para a Integração das Comunidades Ciganas, revista e aprovada em novembro do ano passado. Entre as medidas previstas, está a atribuição de cem bolsas, agora também a alunos do Ensino Secundário.

São pequenos passos que vão contribuindo para uma mudança que se faz devagar, devagarinho. Atualmente, há perto de 60 jovens ciganos no Ensino Superior, com uma taxa de aproveitamento que ronda os 75%.
“Enquanto antes a população cigana dizia que a escola não era para eles, hoje já há a consciência do ‘eu sou capaz, isto também é para mim’. É preciso perceber que a questão não é os ciganos não gostarem da escola, é precisarem de ser ajudados para conseguirem construir um percurso de sucesso”, reforça Maria José Casa-Nova, também coordenadora do Núcleo de Educação para os Direitos Humanos do Instituto de Educação da Universidade do Minho.

Sem que isso implique virar costas às origens. “Nunca podemos deixar de ser aquilo que somos: ciganos, portugueses ciganos. Muitas vezes as pessoas dizem que por estudarmos estamos a deixar de ser ciganos. Não: ao estudarmos, há um reforço da nossa identidade”, defende o ativista Bruno Gonçalves.

Mas ainda há muito por fazer. Até porque, se há casos em que a hostilidade já se faz sentir na escola, esta aumenta consideravelmente quando está em causa o acesso ao mercado de trabalho. Em Portugal, o estudo mais completo sobre a relação dos ciganos com o trabalho remonta a 2014. Na altura, 57% dos inquiridos dizia nunca ter trabalhado. Entre os restantes, a venda ambulante era a principal atividade económica. Maria José Casa-Nova testemunhou “in loco” as dificuldades.

“Cheguei a acompanhar um jovem cigano de 17 anos, que tinha o 11.º ano, e que, quando foi candidatar-se a um emprego num café lhe disseram automaticamente que a vaga estava ocupada”, aponta a investigadora. “Isto é proibido perante a lei, mas há formas de o contornar. É a prova de que o mercado se fecha perante a população cigana. Por isso, há muitos jovens a viver na clandestinidade étnica. Se não tiverem uma morfologia que os identifique como sendo ciganos, escondem a sua identidade.”

“Filha, tu não desistas. És o nosso orgulho”
Priscila Sá, 22 anos, licenciada em Direito e atualmente a cumprir o estágio de admissão à Ordem dos Advogados, admite já o ter feito, esporadicamente, na vida pessoal. “Temos de ser cautelosos, estratégicos, para perceber com que tipo de pessoa estamos a lidar. Se sei que o facto de dizer que sou cigana vai condicionar alguém, prefiro não o dizer”, confessa a jovem gaiense.

Já na vida académica, que tem cumprido sem percalços e com belas notas, nunca se viu obrigada a esconder o que quer que fosse. “Sempre fui muito apoiada. As pessoas sempre me adoraram e admiraram por ser pioneira, por não ter exemplos para fazer o que tenho feito”, orgulha-se Priscila. Os pais ficaram-se pelo Ensino Básico e fizeram-se comerciantes, mas ela soube cedo que queria ser uma advogada.

“A minha mãe sempre me incentivou muito. E a minha avó está sempre a dizer: ‘Filha, tu não desistas. És o nosso orgulho.’ Tive o privilégio de nascer numa família com uma mentalidade aberta”, reconhece. A isso, foi juntar alguns apoios – primeiro a bolsa da Direção-Geral do Ensino Superior (DGES), depois a do OPRE – e levar o barco a bom porto. Pelo meio, há cinco meses, casou, mas não por causa da tradição, garante.

“Nunca casaria com um homem que me pusesse um travão. Ele sabe que a minha carreira é a minha prioridade.” Até porque, com 22 anos, já sente que a missão é maior do que ela. “Já tive colegas que me vieram perguntar se não era aquela menina de etnia cigana que tinha aparecido na televisão. Ficam fascinadas. Se calhar vão para casa falar nisso e certos estereótipos vão sendo derrubados. Sinto que tenho essa responsabilidade. E sinto orgulho por isso.”

Além dos pais e do marido, que sempre a apoiaram, Priscila tem ainda uma outra inspiração: Carlos Miguel, advogado de 62 anos que, em 2017, se tornou o primeiro cigano a integrar um Governo. “Fico muito feliz por isto estar a acontecer. Durante muito tempo, eu era uma espécie de gorila na jaula do zoo, um rapazinho muito admirado por ser caso único.

Agora, os ciganos já perceberam que é através da educação que conseguem ter um futuro melhor”, congratula-se o atual secretário de Estado das Autarquias Locais, em conversa com a “Notícias Magazine”. O governante admite que o caminho na política não se fez sem uma certa “resistência”.

“Quando concorri a número dois da Câmara de Torres Vedras, serviram-se do facto de eu ter defendido homicidas como argumento para eu não desempenhar um cargo público. Teoricamente, estavam em causa razões éticas, mas no fundo eram razões étnicas, porque o que se dizia nos bastidores era: ‘Mas vocês vão querer um cigano como presidente da Câmara?’”

De resto, assume que, por ter uma profissão liberal, nunca sentiu necessidade de esconder as origens, mas reconhece que o acesso ao mercado de trabalho (em que um cigano tem de ser “duas ou três vezes melhor”) e à habitação continuam a ser obstáculos de vulto.

Os números comprovam-no: um estudo conduzido pelo Instituto de Habitação e Reabilitação Urbana, divulgado em 2017, concluía que 32% da população cigana ainda vivia em barracas, tendas, autocaravanas ou rulotes. Culpa das dificuldades financeiras, mas também do estigma.

Guiomar Sousa, ativista cigana de 37 anos, natural da Figueira da Foz, sabe do que fala. Quando vivia em Espinho, passou anos a tentar alugar uma casa, mas levou negas sucessivas. “Ligava, as pessoas diziam que sim e quando me viam vinham logo com o discurso de que afinal a casa já estava alugada. Cheguei a pagar dois meses de entrada para uma casa para depois me ligarem a dizer que a casa não estava em condições e que íamos ter de anular.” A história sai-lhe a meias com a revolta.

“Acabaram por me dizer que as vizinhas souberam que ia para lá uma cigana e fizeram um ultimato à senhoria: ‘Ou elas ou nós.’ A própria senhoria chegou a dizer-me que já devia saber que alguém com a minha condição não devia conviver com aquelas pessoas. Foi um episódio muito doloroso.”

Ainda mais porque a vida nunca foi um mar de rosas. Aos nove anos, o pai tirou-a da escola, para ficar a tomar conta da casa. Aos 18, casou e começou a ir às feiras. Aos 21, foi mãe. Só cinco anos depois voltou a estudar, completando o 6.º ano através de um curso EFA. Ainda assim, sem formação e face ao preconceito que teimava em fechar-lhe portas, passou anos sem conseguir trabalho.
Até que, em 2014, foi contratada pelo Alto Comissariado para as Migrações, para ser dinamizadora do programa Escolhas, durante ano e meio. Depois, enquanto tratava de concluir o 9.º ano, no Sistema RVCC (Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências), foi auxiliar numa escola e até nas limpezas trabalhou. Tirou tantos cursos no Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) que já nem os sabe listar. Hoje, trabalha como mediadora do IEFP, num projeto-piloto, na Figueira da Foz.

Mas o papel de Guiomar na transformação que ainda agora começou é maior do que isso. Tem sido também uma das grandes dinamizadoras de uma espécie de revolução silenciosa das mulheres ciganas em Portugal, um grupo que luta por mais reconhecimento e uma vida mais ativa. “Começámos a falar entre nós e a perceber que sentíamos as mesmas necessidades. Fomos sensibilizando outras mulheres e começámos a participar em encontros feministas e manifestações.”

Além da luta pela igualdade de género, a batalha contra a discriminação está sempre presente. Até porque o racismo não dá tréguas. “Se vir os comentários numa notícia sobre ciganos, aquilo é muito mau. Há pessoas a dizer que deviam morrer todos, que devíamos ir para uma ilha e lançarem-nos uma bomba ou que nos deviam mandar a todos para uma vala comum. É preciso ter muito sangue frio.”

Da pulseira eletrónica à fama
Nem só com o associativismo e os estudos se mudam mentalidades. A arte e a música em particular também podem dar uma ajuda. Avelino, conhecido no mundo artístico por Nininho Maia, tem mostrado isso mesmo. Criado no antigo Bairro da Curraleira, nas Olaias (Lisboa), filho de pai cigano, deixou a escola aos 16 anos. “Comecei a sentir que já era homem. Aquelas coisas parvas.” Começou por trabalhar em negócios de família, depois passou pelo IKEA, até se dedicar aos automóveis.

Pelo meio, numa noite de copos, meteu-se numa cena feia de pancadaria e acabou com pulseira eletrónica, durante um ano e 15 dias. A reclusão teve tanto de calvário como de redenção. Isto porque, durante esse período, decidiu gravar uma música em vídeo para mandar à irmã. Da irmã para a prima. Da prima para o YouTube. E do YouTube para todo o lado, a um ritmo frenético. Hoje, o vídeo superou já os dois milhões de visualizações.
Entretanto, Nininho, 31 anos, tez bem morena, olhos muito azuis, acrescentou ao repertório mais de dez temas, amplamente partilhados na Internet, e várias dezenas de atuações. E já pensa no próximo passo. “Ando a finalizar três músicas para lançar um EP.”

Sempre com a música cigana como premissa, mesmo que também lhe misture outros géneros. “As pessoas começam a respeitar mais a música cigana. Antes não é que não a respeitassem, mas nunca olharam para ela como música. A minha luta é essa.”

Com tudo o que de bom e mau as lutas trazem. Bom pelo sucesso e mediatismo que tem alcançado (até já teve participação numa novela de TVI). Mau pela discriminação que também já sentiu na pele. “Já gravei em estúdios em que, quando cantava uma música com partes mais ciganas, me diziam: ‘Ah, se calhar é melhor não ir por aí.’ E já tive uma atuação agendada para uma discoteca do Porto, em que os bilhetes esgotaram em poucas horas, mas o espetáculo acabou por ser cancelado”, sublinha. Justificação: o medo de que a festa chamasse muitos ciganos e desse mau nome à casa. Ou mais uma prova – a juntar a tantas outras – de que o racismo continua bem vivo em Portugal.

E os discursos populistas, que têm vindo a ganhar força, só o têm feito crescer, alerta Bruno Gonçalves, cofundador da Letras Nómadas. “Temos ouvido coisas terríveis. Que somos parasitas, que só queremos direitos e não queremos deveres. Não vamos escamotear e dizer que não há pessoas na comunidade cigana com maus comportamentos. Existem. Mas existem em todas. Claro que parece que um ato de um cigano traumatiza para cinco gerações. As pessoas dizem o que quer e lhes apetece e saem sempre impunes”, acusa o ativista.

A missão adivinha-se, por isso, longa, dura, penosa. De resto, é a própria secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade a reconhecer que, apesar de todas as medidas e programas (referidos acima) que têm sido lançados pelo Governo, ainda há muito por fazer. “Temos um enorme caminho pela frente. Há jovens pioneiros que são o rosto visível da mudança, mas não podemos assumir que alcançámos a não-discriminação. Mesmo os que têm sucesso não deixam de mencionar quantas barreiras tiveram de vencer”, assinala Rosa Monteiro, à NM.

Piménio, o investigador que no 8.º ano esteve para desistir da escola e acabou a dar a volta por cima, vai mais longe. “Acho que falta mudar tudo. Precisamos de uma mudança estrutural. Às vezes pagam-se propinas, mas falta o resto, porque as pessoas não estão preparadas. É como começar a construir a casa pelo telhado. Falta entender que o racismo em Portugal é sistémico.” Falta, no fundo, uma revolução. A começar pelas mentalidades, dentro e fora das comunidades.

Revolução essa que jovens como Piménio (ou como Cátia, ou como Bruno, ou como Priscila, ou como Guiomar, ou mesmo como Nininho) já começaram. Para que nenhuma criança cigana volte a ter de ouvir uma professora vaticinar que vai acabar a vender na feira. Para que, um dia, este país também possa ser para ciganos.

“Não estamos a estancar a pobreza nas suas origens”

Francisco José Cardoso, in Dnotícias

Presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza, o padre Jardim Moreira, salientou que temos de acabar com a pobreza geracional

A Madeira tinha, no final de 2017, a segunda mais alta taxa de risco de pobreza do país, só ultrapassada pelos Açores, figurando as duas regiões autónomas com percentagens muito distantes da média nacional, 17,3%, mais precisamente 27,4% e 31,2% respectivamente. A esses dados há que referir que um estudo aponta que são precisas cinco gerações para tirar uma fatia da pobreza.

É porque mais do que ajudar os pobres a sobreviver no dia a dia, a Rede Europeia Anti-Pobreza pretende retirar as pessoas desses ciclo vicioso e leva o seu presidente a afirmar que “não estamos a estancar a pobreza nas suas origens”.

O padre Jardim Moreira acredita que no dia que restituirmos a dignidade da pessoa humana, tal como vem escrito no primeiro artigo da Constituição da República Portuguesa, conseguiremos alcançar esse objectivo.

Afirmações na apresentação do núcleo regional da Madeira da Rede Europeia Anti-Pobreza, que decorre no auditório da Reitoria da Universidade da Madeira e junta na mesma sala e almejando os mesmos objectivos a grande maioria das entidades e associações que trabalham nesta área social.

Presente no evento, em representação do Governo Regional da Madeira, está a secretária regional da Inclusão e Assuntos Sociais, Rita Andrade, que afiança o empenho do Governo na procura por este objectivo de retirar da pobreza os milhares de madeirenses que vivem da caridade da sociedade civil.

Rede Europeia diz que mentalidade portuguesa "alimenta" mais a pobreza do que a resolve

in DN

A sociedade portuguesa está mais vocacionada para "alimentar" a pobreza do que para a "combater na origem", disse hoje o presidente da delegação nacional da Rede Europeia Anti-Pobreza, sublinhando as "causas políticas" do fenómeno, que afeta 17,3% da população.

"Vimos de uma mentalidade que mais alimenta, sustenta e provoca ou mantém a pobreza do que a resolve nas causas", disse Agostinho Moreira, no Funchal, durante a apresentação do plano de atividades do núcleo da Madeira da Rede Europeia Anti-Pobreza (EAPN).

O plano decorre de uma parceria com a Secretaria Regional da Inclusão e dos Assuntos Sociais e prevê diversas ações, sobretudo na área da formação, bem como a realização de um congresso na região autónoma em junho.
"A nossa política europeia é de ir atacar a pobreza nas suas causas, nas suas origens, e as suas origens são económicas, são políticas, são sociais", afirmou Agostinho Moreira, realçando que a EAPN ainda está a elaborar o diagnóstico do fenómeno na Madeira, pelo que não dispõe para já de dados concretos.

No entanto, dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), divulgados em novembro de 2018, indicam que a Madeira e os Açores são as regiões do país que registaram os valores mais elevados de risco de pobreza, nomeadamente 27,4% para a Madeira e 31,5% para os Açores.

O inquérito refere-se a 2017 e contém pela primeira vez estimativas regionais, revelando que os residentes na Área Metropolitana de Lisboa foram os menos afetados pelo risco de pobreza (12,3%), tendo em conta a linha de pobreza nacional.

Neste domínio, os valores mais elevados de risco foram registados nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, sendo que em termos gerais o fenómeno afeta 17,3% da população portuguesa.

"A pobreza é o resultado de políticas estruturais que geram injustiça", disse Agostinho Moreira, esclarecendo que "se a pobreza tem causas estruturais, políticas e económicas, quer dizer que na Madeira [e no país] só atingindo essas causas é possível atingir as que geram a pobreza".

O presidente da EAPN-Portugal sublinhou a importância da parceria estabelecida com o executivo regional, considerando que permite "pôr a pobreza em cima da mesa" na região e, deste modo, construir uma "plataforma com todas as instituições que intervêm na constituição da sociedade civil".

A Rede Europeia Anti-Pobreza-Portugal é uma instituição particular de solidariedade social e está integrada na maior rede europeia de combate à pobreza e exclusão social, envolvendo 31 países. Dispõe de 19 núcleos ao nível nacional, sendo o mais recente o da Região Autónoma da Madeira, aberto no dia 3 de dezembro de 2018.

Rendas fazem disparar pedidos de habitação social

Raquel Moleiro, in Expresso

Há 31.651 famílias em lista de espera nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto. Até a classe média já procura ajuda, mas só há casa para 1% dos casos.

A crise da economia acabou mas não a da habitação. O consumo animou-se mas não há desafogo que aproxime o poder de compra da classe média e baixa dos valores imobiliários atuais praticados nas grandes cidades. Os agregados com menos rendimentos aguentam até ao incumprimento, arriscam o despejo e, quando já não restam alternativas que possam pagar, vão, em desespero, pedir às câmaras uma casa com renda social, a única que podem suportar.

De acordo com os dados recolhidos pelo Expresso junto de 30 concelhos das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto — só quatro não responderam —, disparou o número de famílias que procura na habitação social a última resposta, existindo atualmente 31.651 em lista de espera. A subida é tal que se aproxima dos valores atingidos nos anos da crise económica.

Sem abrigo continua na rua em Braga após alerta a Marcelo

in iOnline

Um sem abrigo continua a dormir na rua, em Braga, uma semana depois do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, ter sido alertado, pessoalmente, antes da sua visita às novas instalações da Bosch, além de todo o Executivo da Câmara Municipal de Braga.

Carlos Dobreira, o cidadão que alertou Marcelo Rebelo de Sousa, afirmou esta terça-feira ao i que “o senhor, além da situação em que se encontra, terá problemas psiquiátricos, daí a nossa insistência, porque esta situação já perdura há muitas semanas, temos vindo desde o início já a chamar a atenção para diversas individualidades e junto de várias entidades”.

Aquando desta deslocação de Marcelo Rebelo de Sousa a Braga, “o Senhor Presidente da República tomou conhecimento da situação, dado ter ouvido atentamente o que descrevi, tendo sido informado tratar-se de um cidadão que ali costuma ser visto, tem haveres (sacos, cobertores, cartões) e que necessita de ser apoiado por quem de direito, sendo que um dos cidadãos afirmou que eventualmente seria um cidadão em tempos acompanhado na Especialidade de Psiquiatria do Hospital de Braga, logo este homem precisa de ajuda”.

O homem está a dormir por baixo de um viaduto da Circular de Braga, frente ao Quartel do Regimento de Cavalaria 6, em Braga, onde esta manhã se deslocou Carlos Dobreira, tendo sido informado naquela unidade militar que seria dado conhecimento à Delegação de Braga da Cruz Vermelha Portuguesa, à Câmara Municipal de Braga e ainda à empresa municipal de limpeza, de águas e saneamento, AGERE, o que já se verificou esta manhã.

Esta segunda-feira, Carlos Dobreira deslocou-se igualmente à reunião do Executivo da Câmara Municipal de Braga, onde deu conta da situação, explicando ao i que “o senhor presidente da Câmara, Ricardo Rio, nem qualquer outro dos vereadores camarários, me responderam, no final da reunião o senhor vice-presidente, Firmino Marques, foi o único a interessar-se, comprometendo-se já a diligenciar no sentido de saber o que se passava”.

Número de beneficiários e famílias com rendimento social de inserção sobe em fevereiro

in o Observador

De acordo com os dados divulgados, no final do mês de fevereiro havia registo de 219.367 beneficiários do RS, representando um aumento de 0,4%. Já em relação às famílias, há registo de 100.655.

Relativamente à distribuição geográfica, os dados mostram que a maior parte dos beneficiários está concentrada nos distritos do Porto e em Lisboa

O número de beneficiários e famílias que recebem o Rendimento Social de Inserção (RSI) aumentou ligeiramente em fevereiro, havendo atualmente mais de 219 mil pessoas e 100.655 agregados a receber esta prestação social. De acordo com os dados mais recentes do Instituto de Segurança Social (ISS), no final do mês de fevereiro havia registo de 219.367 beneficiários do RSI, mais 866 do que em janeiro, o que representa um aumento de 0,4%.
Em relação às famílias, os dados mostram que em fevereiro havia 100.655 agregados com direito ao RSI, mais 102 do que no mês anterior. No entanto, tanto no caso das famílias como dos beneficiários individuais, a tendência foi de decréscimo quando comparado com o período homologo de 2018, em que havia mais 1.127 pessoas com direito ao RSI e mais 635 famílias.

Relativamente à distribuição geográfica, os dados mostram que a maior parte dos beneficiários está concentrada nos distritos do Porto (62.800), Lisboa (40.459), Setúbal (20.624) e Região Autónoma dos Açores (17.796).
Igual distribuição têm as famílias, que também estão concentradas nos distritos do Porto (30.277), Lisboa (18.379), Setúbal (9.117) e Região Autónoma dos Açores (6.324).
No mês de fevereiro, o RSI teve um valor médio de 117,78 euros por beneficiário, mais 0,29 euros do que em janeiro, enquanto nas famílias foi de 263,45 euros, mais 0,20 euros do que no mês anterior.

Governo estabelece normas para cálculo de complemento da Prestação Social para a Inclusão

Joana Nabais Ferreira, in Ecoeconomia

O Governo deduziu 11 pontos percentuais aos rendimentos de trabalho, com o objetivo de igualar à isenção de obrigação contributiva por parte de um trabalhador por conta de outrem.

O Governo publicou esta segunda-feira, em Diário da República, as normas de execução do decreto-lei que instituiu, em 2017, a Prestação Social para a Inclusão (PSI), um subsídio que pretende combater as situações de pobreza entre as pessoas com deficiências. O documento dá conta das percentagens de cada parcela a ter em consideração para o cálculo do complemento, cujo valor máximo é de 438,22 euros.

“Por equiparação à isenção de obrigação contributiva por parte de um trabalhador por conta de outrem, entende o Governo deduzir uma parcela correspondente a 11 pontos percentuais aos rendimentos de trabalho, sendo fixada a percentagem de 89%, para efeitos de cálculo do complemento”, lê-se no documento assinado pelos ministros das Finanças, Mário Centeno, e do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Vieira da Silva.
Assim, a percentagem dos rendimentos de trabalho dependente e dos rendimentos empresariais e profissionais, os apurados no domínio das atividades independentes, é fixada em 89%.

Mas, na determinação do rendimento de referência a considerar para o cálculo do complemento são consideradas outras percentagens, quer da componente base da prestação, quer de prestações sociais auferidas pelo titular da PSI. A percentagem do valor da componente base da PSI é fixada em 100%, bem como a percentagem das prestações sociais, no âmbito das eventualidades de doença, desemprego, maternidade e paternidade.
Empregadores, “a deficiência não é um bicho de sete cabeças”

O documento define, ainda, a aplicação de uma escala de equivalência à composição do agregado familiar do titular da PSI, para efeitos de determinação do limiar do complemento. “A presente portaria define uma escala de equivalência similar à que é aplicável no Rendimento Social de Inserção, mas que incorpora um elemento de diferenciação positiva, ao considerar o fator de equivalência de um por cada titular da prestação e não apenas para o primeiro titular, reforçando a proteção dos agregados familiares com vários titulares“, lê-se.

Recorde-se que a Prestação Social para a Inclusão foi instituída a 6 de outubro de 2017 para melhorar a prestação social das pessoas com uma incapacidade igual ou superior a 60% e com insuficiência de recursos económicos. O objetivo é “promover a autonomia e inclusão social da pessoa com deficiência, incentivando a sua participação social e laboral, e também combater as situações de pobreza da pessoa com deficiência, através da atribuição de um complemento de natureza social”, pode ler-se em Diário da República.

Valor do Rendimento Social de Inserção é quase oito vezes superior ao das pensões de invalidez?

in Polígrafo

O que está em causa?
De um lado, uma família de etnia cigana com prestação de Rendimento Social de Inserção no valor de 1.200 euros. Do outro lado, uma criança em cadeira de rodas a ser alimentada pela mãe e com direito a pensão de invalidez no valor de 152 euros. "Esta é a nossa tal justiça social", denuncia o "meme", partilhado por centenas de pessoas e associado a propaganda racista de extrema-direita. Recorrendo a números verdadeiros ou falsos?

O meme tem uma baixa qualidade gráfica. Baseia-se em duas imagens quase distorcidas, mas dá para perceber que se trata de uma família de etnia cigana (à esquerda, com a seguinte legenda: “Rendimento de inserção social: 1.200 euros”), por um lado, e de uma criança ou adolescente em cadeira de rodas (à direita, com a seguinte legenda: “Pensão de invalidez: 152 euros”), por outro lado. No topo do meme destaca-se a principal mensagem: “Esta é a nossa tal justiça social”.

Está a ser difundido por centenas de pessoas nas redes sociais e vários leitores do Polígrafo solicitaram uma verificação de factos. Na publicação do meme a que acedemos, o autor da partilha acrescenta o seguinte comentário: “Este é dedicado a todos aqueles que fazem vida com dinheiro dos nossos impostos e podem trabalhar. Com o PNR isto é tudo para acabar!” Desde logo torna-se clara a associação entre a família de etnia cigana da imagem e o “rendimento de inserção social”, um estereótipo muito comum no discurso político de extrema-direita. É essa a mensagem implícita - e racista - do meme em análise.

Mas foquemo-nos na verificação dos números evocados. No que concerne à pensão de invalidez, o montante é calculado com base na carreira contributiva e nas remunerações registadas em nome do beneficiário, de acordo com a informação disponível na página institucional da Segurança Social (pode aceder aqui).

Relativamente à pensão de invalidez relativa, no regime geral, a partir de 1 de janeiro de 2019, são garantidos os seguintes valores mínimos de acordo com a carreira contributiva do pensionista: 273,39 euros para menos de 15 anos; 286,78 euros para entre 15 a 20 anos; 316,45 euros para entre 21 a 30 anos; e 395,57 euros para 31 e mais anos de carreira contributiva.
De acordo com a informação disponível na referida página, estes valores mínimos aplicam-se, apenas, às pensões de invalidez relativa e às dos regimes especiais de invalidez. No caso de pensão proporcional, o montante mínimo é uma percentagem da pensão mínima aplicável, correspondente à fração do período contributivo cumprido no âmbito do regime geral. Quanto à pensão de invalidez absoluta, o valor mínimo é igual ao da pensão de invalidez relativa e de velhice correspondente a uma carreira contributiva de 40 anos.

Em suma, o número evocado no meme em análise, referente a uma suposta “pensão de invalidez de 152 euros”, é muito inferior aos montantes mínimos em vigor desde o dia 1 de janeiro de 2019. Mesmo para quem tenha uma carreira contributiva de menos de 15 anos, o valor mínimo da pensão de invalidez relativa é de 273,39 euros. Pelo que o meme difunde uma falsidade.

O mesmo se aplica ao valor evocado para o Rendimento Social de Inserção (RSI), erradamente denominado como “rendimento de inserção social”. Ora, o RSI é “um apoio destinado a proteger as pessoas que se encontrem em situação de pobreza extrema, sendo constituído por: uma prestação em dinheiro para assegurar a satisfação das suas necessidades mínimas; e um programa de inserção que integra um contrato (conjunto de ações estabelecido de acordo com as características e condições do agregado familiar do requerente da prestação, visando uma progressiva inserção social, laboral e comunitária dos seus membros”.

Embora seja determinado um valor de referência do RSI, o valor da prestação não é fixo. O apoio mensal resulta da diferença entre o valor do RSI, calculado em função do agregado familiar, e a soma dos seus rendimentos. Ou seja, o valor da prestação depende da composição e dos rendimentos do agregado.

O valor da prestação mensal equivale à diferença entre os rendimentos da família e o valor do RSI. Calcula-se o valor do RSI somando: 188,68 euros por titular; 130,68 euros pelos restantes adultos; e 93,34 euros por cada criança ou jovem menor de 18 anos. Por exemplo, para uma família como a da imagem do meme (com três adultos e duas crianças), o valor do RSI será de 634,72 euros (186,68 + 130,68 + 130,68 + 93,34 + 93,34). Se os rendimentos do agregado familiar totalizarem 500 euros, por exemplo, o valor da prestação de RSI será de 134,72 euros (634,72 euros - 500 euros).

Tendo em atenção as condições de acesso ao RSI (pode conferir aqui), conclui-se com segurança que o valor de 1.200 euros de prestação será impossível de se verificar, mesmo em circunstâncias extraordinárias. É mais uma falsidade difundida pelo meme, com a agravante da implícita mensagem racista.

Nota: Os cálculos referentes ao RSI foram corrigidos às 13h do dia 15 de março de 2019. A avaliação não sofreu alterações.

Sem-abrigo expulsos das imediações do Parlamento britânico

in DN

Os polícias terão evocado a Lei do sem-abrigo de 1824 e referido que era necessário limpar a área "para que os parlamentares possam trabalhar"

Um grupo de sem-abrigos foi expulso de túneis públicos junto ao Parlamento britânico, em Londres. O jornal The Independent conta que as autoridades terão obrigado os cidadãos a sair daquele local depois de uma alegada queixa de um deputado.

Os polícias terão evocado, segundo dois homens que ali dormiam, a Lei do sem-abrigo de 1824, que criminalizava quem dormisse nas ruas. Referiram ainda a necessidade de manter os túneis que ligam a estação de metro de Westminster ao Parlamento limpos "para que os parlamentares possam trabalhar".
"Eu estava no túnel a ler a minha bíblia. Tinha acabado de acordar e ainda estava a tentar aquecer-me. Os polícias mandaram-me levantar e sair. Um deles disse: 'estamos a retirar toda a gente dos túneis para que os parlamentares possam trabalhar'", disse ao jornal inglês Elliot, de 22 anos, que mora na rua desde os 16.


Isto acontece numa altura em que o partido trabalhista está a tentar pôr fim à lei sobre os sem-abrigo, por esta ser "cruel e desatualizada". "A notícia de que a Lei do sem-abrigo ainda está a ser utilizada para dissuadir pessoas vulneráveis perto de Westminster é vergonhosa. Temos de parar de usar essa lei ultrapassada", comentou Layla Moran, deputada liberal democrata.
Vários sem-abrigo indicaram que desde fevereiro que esta lei tem sido citada para os expulsar de locais públicos e até há quem tenha sido multado e preso pela condição de dormir nas ruas inglesas.

Sem-abrigo multados e detidos por pedirem esmola
Já o porta-voz da Polícia Metropolitana afirma em resposta a esta acusação que não foi feita nenhuma detenção desta vez e que as autoridades foram convidadas para trabalhar em conjunto com associações de apoio a sem-abrigo.

No ano passado, foram registados, pela organização de solidariedade Shelter 320 mil sem-abrigo na Grã-Bretanha. Mais 13 mil do que em 2017.

Quase 2 milhões de moçambicanos precisam de ajuda urgente

in SicNotícias

ONU estima que 1,85 milhões de pessoas em Moçambique precisam de assistência após a passagem do ciclone Idai.
A agência da ONU para a ajuda humanitária OCHA calcula, no seu último relatório da situação, que 1,85 milhões de pessoas precisam de assistência urgente em Moçambique após a passagem do ciclone Idai em Moçambique, Zimbabué e Malawi.

"Alguns [afetados] estão em situações de perigo de vida. Alguns infelizmente vão perder os seus meios de subsistência, o que é uma tragédia assustadora mas não é uma ameaça imediata", disse o coordenador da OCHA à Reuters, Sebastian Rhodes Stampa.

Segundo o último balanço, 762 pessoas morreram nos três países à passagem do ciclone a 14 de março, 446 em Moçambique.

Números da ONU relativos a Moçambique

Mortos - 446
Feridos - mais de 1500
Casas destruídas - mais de 58.600
Culturas destruídas - cerca de 500 mil ha
O Governo moçambicano adiantou que estes números ainda são provisórios, já que à medida que o nível da água vai descendo vão aparecendo mais corpos.

Segundo o Instituto Nacional de Gestão de Calamidades (INGC), a população afetada pelo ciclone Idai em Moçambique subiu para 794 mil e o número de mortos para 447.
Em relação a domingo, o instituto acrescenta uma vítima mortal aos dados divulgados e aumenta em 50% o número de pessoas atingidas.
Esta população afetada não significa que esteja "em risco de vida".

"São pessoas que perderam as casas" ou que estão "em zonas isoladas e que precisam de assistência", explicou no domingo o ministro da Terra e Ambiente, Celso Correia.
Por seu lado, o número de salvamentos faz com que os centros de acolhimento continuem a encher e registem já 128.941 entradas (mais 18% que no domingo), das quais 6.500 dizem respeito a pessoas vulneráveis - por exemplo, idosos e grávidas que recebem assistência particular.

Reformado apanha 4 autocarros para ir a marcha contra racismo na Nova Zelândia

por Carolina R. Rodrigues, in Oceânia

O neozelandês de 95 anos, que combateu na Segunda Guerra Mundial, visitou duas mesquitas e participou na marcha contra o racismo realizada em Auckland.

Um pensionista de 95 anos apanhou quatro autocarros para poder juntar-se aos manifestantes de uma marcha contra o racismo e islamofobia em Auckland, na Nova Zelândia.

John Sato, veterano da Segunda Guerra Mundial, explicou ao Radio New Zeland que não conseguiu dormir bem desde o tiroteio em Christchurch, no qual morreram 50 pessoas a 15 de março. Por isso, decidiu começar a visitar mesquitas no país para demonstrar o seu apoio.

"Passei uma grande parte da noite acordado e não tenho dormido muito bem desde então. Pensei que era muito triste: consegue-se sentir o sofrimento das outras pessoas", confessou o neozelandês. "Penso que é uma tragédia, mas mesmo assim tem outro lado. Aproximou as pessoas umas das outras. Não importa a sua nacionalidade ou nada. As pessoas aperceberam que somos só um e que queremos saber uns dos outros", disse.
Pouco depois do ataque, Sato visitou uma mesquita perto da sua casa em Hardwicke para homenagear as vítimas e dar apoio. No fim de semana seguinte apanhou um autocarro para outra mesquita em Pakurange, onde decidiu que queria participar na marcha em Auckland contra o racismo. Para chegar lá, teve de viajar em vários autocarros.

À estação de rádio, contou que um polícia "bondoso" ajudou-o no evento, dando-lhe uma garrafa de água. O agente também o levou a casa depois da marcha.

No dia 15 de março, 41 pessoas foram assassinadas na mesquita Al Noor, sete na de Linwood e duas morreram no hospital na sequência dos seus ferimentos, depois de Brenton Tarrant, um australiano nacionalista, ter disparado contra os fiéis que estavam em oração nos locais religiosos.

Além de ter divulgado um manifesto com 74 páginas contra a imigração, o atirador ainda filmou e transmitiu em direto no Facebook o momento do ataque.

25.3.19

“Eu sei onde estás e quero explicações” — para alguns jovens, a violência no namoro é vivida online

Nuno Rafael Gomes (texto) e Miguel Cabral (ilustração), in Público on-line

Os jovens denunciam mais, mas ainda lhes é difícil sair de relações abusivas. Quando os telemóveis e as redes sociais entram nas relações, descodificam-se as desconfianças através de partilhas de passwords. É preciso “falar destes assuntos na escola”, avisam especialistas.

Bárbara (nome fictício) chegou a Portugal há pouco mais de meio ano. Saiu do Brasil para estudar e trabalhar no Porto, onde o seu namorado de há quatro anos — também ele brasileiro — se tinha estabelecido “poucos meses antes” da sua chegada. Ela tem 23 anos; ele, 40. Descreve-o como “uma pessoa descontrolada”. Já Maria terminou uma relação depois de o então namorado lhe esconder o telemóvel “para ler as mensagens”. “Também queria controlar o que eu vestia e isolou-me dos meus amigos.” Para Carla (nome fictício), alguns dias do Verão de 2017 foram “bastante complicados”. Depois de “acabar” com o namorado, recebeu a mensagem: “Não te esqueças que sei onde trabalhas.” Deixou de colocar a localização nos seus posts.

Estes são apenas três casos que reflectem algumas conclusões apontadas por dois estudos apresentados em Fevereiro: o da associação Plano i, Violência no Namoro em Contexto Universitário: Crenças e Práticas, e o da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR), Violência no Namoro 2019. Há um aumento na taxa de violência psicológica entre os jovens, que cada vez mais adoptam “crenças conservadoras”. Também há uma maior sensibilização para o tema. A ameaça via telemóvel (com mensagens como “eu sei onde estás e quero explicações") ou nas redes sociais preocupa não só as duas organizações, como também a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV).
“O essencial é pedir ajuda à APAV no sentido de podermos informar e apoiar as vítimas”
Daniel Cotrim

Mas vamos por partes. Para Bárbara, “a violência verbal sempre existiu”. “Já existiu violência física e ele já me prendeu num ‘mata-leão’ [golpe de estrangulamento das artes marciais japonesas] até eu desmaiar”, conta. Isso foi no Brasil. Numa viagem a Paris, agrediu-a na rua. “Chutou-me e eu estava jogada no chão. Ninguém fez nada.” Prefere o anonimato porque tem medo que se descubra. Ainda vivem juntos. “Não tenho para onde ir. Não tenho como pagar renda sozinha, tenho de pagar propinas também.” Para Bárbara, a solução seria “morar noutra cidade ou arranjar um emprego longe” para fugir ao companheiro “controlador” que não gosta que ela tenha “uma educação, uma profissão, amigos”. “A situação está mais tranquila porque estou poucas vezes em casa, por causa do trabalho e da faculdade”, acrescenta. Ainda assim, já foi ameaçada pelo companheiro por recusar ter relações sexuais.

Situações como a de Bárbara não são desconhecidas de organizações portuguesas que lidam com a violência doméstica — e não só. “Estes processos são difíceis e não são imediatos, mas têm solução”, garante Daniel Cotrim. O assessor técnico da direcção da APAV, responsável pelas áreas da violência doméstica e de género e da igualdade, ressalva que é importante dizer que não se consegue interromper “o ciclo da violência” rapidamente.

Número de beneficiários e famílias com RSI sobe ligeiramente em fevereiro

in JN

O número de beneficiários e famílias que recebem o Rendimento Social de Inserção (RSI) aumentou ligeiramente em fevereiro, havendo atualmente mais de 219 mil pessoas e 100.655 agregados a receber esta prestação social.
De acordo com os dados mais recentes do Instituto de Segurança Social (ISS), no final do mês de fevereiro havia registo de 219367 beneficiários do RSI, mais 866 do que em janeiro, o que representa um aumento de 0,4%.

Em relação às famílias, os dados mostram que em fevereiro havia 100.655 agregados com direito ao RSI, mais 102 do que no mês anterior.
No entanto, tanto no caso das famílias como dos beneficiários individuais, a tendência foi de decréscimo quando comparado com o período homólogo de 2018, em que havia mais 1.127 pessoas com direito ao RSI e mais 635 famílias.
Relativamente à distribuição geográfica, os dados mostram que a maior parte dos beneficiários está concentrada nos distritos do Porto (62800), Lisboa (40459), Setúbal (20.624) e Região Autónoma dos Açores (17796).
Igual distribuição têm as famílias, que também estão concentradas nos distritos do Porto (30277), Lisboa (18379), Setúbal (9117) e Região Autónoma dos Açores (6324).

No mês de fevereiro, o RSI teve um valor médio de 117,78 euros por beneficiário, mais 0,29 euros do que em janeiro, enquanto nas famílias foi de 263,45 euros, mais 0,20 euros do que no mês anterior.

No caso da Prestação Social para a Inclusão (PSI), criada para diminuir a pobreza entre as pessoas com deficiência, a Segurança Social pagou esta prestação a 90.698 pessoas, ou seja, mais 152 do que em janeiro.
Comparativamente com o período homólogo, houve um crescimento de 19,8%, o que corresponde a mais 14.982 beneficiários da PSI, uma prestação que começou a ser paga em outubro de 2017.

Plano de atividades do núcleo da Madeira da EAPN Portugal – Rede Europeia Anti-Pobreza apresentado amanhã

in Jornadas Madeira

O plano de atividades do núcleo da Madeira da EAPN Portugal – Rede Europeia Anti-Pobreza, ao abrigo do Protocolo de Colaboração com a Secretaria Regional da Inclusão e dos Assuntos Sociais, vai ser apresentado amanhã, segunda-feira, dia 25 de março de 2019, pelas 14h30, no Auditório da Reitoria da Universidade da Madeira - Colégio dos Jesuítas.

Na cerimónia vão estar presentes a secretária regional da Inclusão e Assuntos Sociais, Rita Andrade e o presidente da Direção da EAPN Portugal, padre Agostinho Moreira.

A EAPN - Rede Europeia Anti-Pobreza Portugal, Instituição Particular de Solidariedade Social, é a maior rede europeia de redes nacionais, regionais e locais, de ONG’s, que atua no combate à pobreza e exclusão social, refere a SRIAS em nota de imprensa.

Está representada de norte a sul do país, através de 19 núcleos, sendo o mais recente o da Região Autónoma da Madeira, aberto no dia 3 de dezembro de 2018. Uma realidade que surgiu no decurso da celebração de um protocolo de colaboração com a SRIAS mediante necessidade de maior compreensão do fenómeno da pobreza e exclusão social de forma multifactorial, integral e a longo prazo.

A mesma nota refere que o objetivo é a sua prevenção e erradicação, na qual os vários atores sociais são chamados a intervir de forma ativa e a contribuir para a (re)definição de medidas adequadas e eficazes à realidade regional.

Plano de actividades do núcleo da Madeira da Rede Europeia Anti-Pobreza apresentado esta segunda-feira

Sandra S. Gonçalves, in Dnotícias

A iniciativa irá contar com a presença de Rita Andrade.

O plano de actividades do núcleo da Madeira da EAPN Portugal – Rede Europeia Anti-Pobreza, ao abrigo do protocolo de Colaboração com a Secretaria Regional da Inclusão e dos Assuntos Sociais, vai ser apresentado amanhã, segunda-feira, dia 25 de Março, pelas 14h30, no auditório da Reitoria da Universidade da Madeira - Colégio dos Jesuítas.

Na cerimónia vão estar presentes a secretária regional da Inclusão e Assuntos Sociais, Rita Andrade e o presidente da Direcção da EAPN Portugal, Padre Agostinho Moreira.

A EAPN - Rede Europeia Anti-Pobreza Portugal, Instituição Particular de Solidariedade Social, é a maior rede europeia de redes nacionais, regionais e locais, de ONG’s, que atua no combate à pobreza e exclusão social. Está representada de norte a sul do país, através de 19 núcleos, sendo o mais recente o da Região Autónoma da Madeira, aberto no dia 3 de dezembro de 2018. Uma realidade que surgiu no decurso da celebração de um protocolo de colaboração com a SRIAS mediante necessidade de maior compreensão do fenómeno da pobreza e exclusão social de forma multifactorial, integral e a longo prazo.

O objectivo é a sua prevenção e erradicação, na qual os vários actores sociais são chamados a intervir de forma activa e a contribuir para a (re)definição de medidas adequadas e eficazes à realidade regional.

19.3.19

O que preocupa mais os portugueses? Doenças, deficiência, despesas e desemprego

in RR

É o resultado do inquérito "Riscos que Importam" da OCDE.

Um relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) revela que os portugueses vivem preocupados com a possibilidade de ficar doentes ou com uma deficiência, pagar as despesas ou perder o emprego, e preferiam pagar mais impostos para ter melhores pensões e cuidados de saúde.

De acordo com os resultados do inquérito "Riscos que Importam", na tradução para português, que inclui as preocupações de 22 mil pessoas, entre os 18 e os 70 anos de 21 países, cerca de metade dos inquiridos apontou "ficar doente ou com uma deficiência" como uma das três principais preocupações sociais ou económicas que os afete a eles ou à família próxima no próximo ano ou dois.
Portugal não é exceção e 63% dos portugueses que responderam a este inquérito apontaram "ficar doente ou com uma deficiência" como a principal preocupação no futuro próximo, sendo um dos três países onde esta preocupação é mais elevada, abaixo da Polónia (64%) e da Finlândia (65%).

A segunda maior preocupação é conseguir fazer face a todas as despesas mensais (44,5%), seguida do receio de perder o emprego (39%), às quais se seguem a preocupação com o crime ou a violência (30,3%), o acesso a cuidados de longa duração (30,15%), habitação (25%), acesso a cuidados infantis ou educação.

Há ainda quase 5% de portugueses que diz não ter qualquer uma destas preocupações.

Os cuidados de saúde de longa duração são aqueles onde as pessoas, em geral, estão mais insatisfeitas e, em média, 50% do total de inquiridos acha que não tem acesso a "serviços públicos acessíveis e de boa qualidade na área dos cuidados a longo prazo para os mais idosos" e 45% sente o mesmo em relação às pessoas com deficiência.

Sensação de injustiça generalizada
O inquérito mostrou uma generalizada sensação de injustiça no acesso a benefícios sociais e que os governos não escutam as pessoas, sustentada na crença de que os governos não trabalham para o cidadão comum.
"Em países como França, Grécia, Israel, Lituânia, Portugal e Eslovénia, a percentagem destas pessoas atinge os 70% ou mais. Estes sentimentos estão espalhados por quase todos os grupos sociais e não estão limitados apenas aqueles que se sentem 'postos de parte'", lê-se no relatório.

Aliás, 71% dos portugueses apontam a injustiça como a principal causa para a pobreza e 75% responderam que sim quando questionados sobre se concordavam ou não em aumentar os impostos sobre os mais ricos para ajudar os mais pobres.

De uma maneira geral, as pessoas querem mais investimento nas pensões (54%) e nos cuidados de saúde (48%) de modo a sentirem-se economicamente mais seguros e à sua família, com as pensões a serem a escolha popular em 14 dos 21 países e a saúde noutros cinco, nos quais se inclui Portugal.

Quase metade dos portugueses (49%) dizem mesmo que estão dispostos a pagar mais impostos para financiar melhores pensões e cuidados de saúde.
A OCDE diz que são precisos "maiores esforços" para perceber a razão destas perceções e por que razão tantas pessoas acham que as políticas sociais não vão ao encontro das suas necessidades.

“Pai, quando estiver ao pé de ti, nunca mais vou estar doente.” A história de um pai refugiado

Joana Gonçalves, in RR

Viu morrer, foi feito prisioneiro e acabou por ser salvo por uma criança-soldado. Enganado na hora de pedir o visto para a família na embaixada portuguesa, só se reencontrou com a mulher e os três filhos cinco anos depois. Ben chegou a Portugal em 2013, para escapar ao conflito armado no seu país. Ouça a história, na primeira pessoa, de um pai refugiado em Portugal.

Ben (nome fictício) prefere não ser identificado. O Estado português concedeu-lhe asilo em 2013, depois de ter escapado aos rebeldes na República Democrática do Congo. Escolheu Portugal pelos fortes laços que mantém com Angola, uma das nove nações que fazem fronteira com o seu país-natal.

Como ele, mais de 4.500 pessoas pediram ajuda ao nosso país nos últimos cinco anos. A maioria desses pedidos continua a acontecer de forma espontânea, geralmente logo à chegada a um aeroporto nacional.


I - "Se eles chegarem ao poder, quem é que vão governar?"
Os rebeldes entraram na nossa aldeia em novembro de 2012. Chama-se Rutshuru e fica a 70 quilómetros de Goma, uma capital provincial com um milhão de habitantes, na República Democrática do Congo.
M23 era o nome deste grupo, Movimento 23 de Março. Roubaram as nossas casas, as nossas lojas, mataram homens, violaram mulheres. Tínhamos medo de acordar um dia com toda a aldeia em chamas.
Decidimos pedir ajuda. Na altura já tínhamos soldados das Nações Unidas no nosso país. Eu pensava muitos vezes: “Se eles estão em guerra com o Governo, porque é que atacam o povo? Não compreendo. Se eles conseguirem o que querem, se eles chegarem ao poder, quem é que vão governar? Se matarem toda a gente não vai sobrar ninguém.”
Decidimos denunciar a situação a um grupo de soldados da ONU estacionado fora da aldeia. A pessoa com quem falámos disse-nos que o chefe estava fora, em Goma.
“Quando ele regressar vamos contar-lhe o que se passa”, disse-nos.

E foi isso que aconteceu. Quando o chefe voltou trouxe uma brigada das Nações Unidas que criou um perímetro de segurança à volta da nossa aldeia. Perguntaram-nos a todos, um a um, o que se tinha passado.
Alguns relataram roubos, outros violações. Contámos tudo.

O chefe ficou muito, muito chateado. Disse-nos: “A guerra tem regras, eles não estão a cumprir as regras. Mataram civis, isto não pode ser!”
Uma semana depois os rebeldes regressaram, com o dobro da violência. Mataram soldados da ONU e levaram-nos a todos.

II - Um amigo entre a tormenta e a chegada a Portugal
Levaram-nos para uma floresta. Lá encontrámos um grupo maior, estavam à nossa espera. O líder estava ao centro.

Pensávamos que eles iam fazer o habitual, estávamos à espera que nos roubassem e nos deixassem ir, mas desta vez foi diferente. Disseram-nos que sabiam da denúncia e que não iam deixar ninguém sair de lá, enquanto não acusássemos os denunciantes.

Isto era um enorme problema, nós fomos juntos. Ninguém ia falar. Levaram-nos para um edifício, uma prisão. Disseram-nos que se não falássemos até ao final da noite nos matavam a todos, que ninguém ia sair de lá com vida.
“Deus, porque me deixaste? Porque me deixaste?”, gritei em tetela, a minha língua materna.

Estava muito assustado, aterrorizado. Bateram-me com a coronha de uma arma. À noite, um soldado perguntou: “Ouvi alguém falar tetela há pouco. Quem é?”

Eu não respondi. Tive medo. Então ele falou na minha língua materna, só eu percebi, os restantes falavam francês. “Eu quero ajudar-te. Não te vou fazer mal.”
Perguntou-me se eu tinha família. “Sim, tenho uma mulher e três filhos”, respondi. “Ninguém vai sair daqui. Não quero que fiques aqui”, disse-me.

Lembro-me que ele não queria falar comigo junto ao grupo. Levou-me, explicou-me que tinha sido uma das crianças sequestradas, recrutadas para servir no grupo de rebeldes M23.
Fugimos. Entregou-me em mão a outra pessoa. Disse que tínhamos de andar muito, fugir até muito longe, que eles iam procurar por mim. Foi esta pessoa que me salvou.

Antes de partir, contou-me que também queria fugir, mas que não tinha ainda chegado o momento. A 5 de novembro de 2013, o líder do M23 anunciou o fim das operações militares e ordenou às tropas o desarmamento e a desmobilização. Renderam-se, finalmente. Espero que ele tenha conseguido escapar.

Durante três dias estive escondido, tinha medo de sair. Ao quarto dia fugi, pedi ajuda e apanhei um avião até Lisboa. Cheguei em 2013, consegui asilo. Um mês e meio depois enviaram-me para Portalegre. Eu não sabia falar português, não tinha ainda notícias da minha família.

III - Uma carta sem aviso de receção
Antes de partir escrevi uma carta e pedi à pessoa que me ajudou que a entregasse à minha esposa.

Eu sabia que ela ia fugir, porque eu disse-lhe para o fazer na carta que lhe escrevi. Os rebeldes podiam procurar-me na aldeia e fazer-lhe muito mal. “Aí não estão seguros. Sai, leva os nosso filhos e vende tudo o que conseguires.” Nós tínhamos uma loja. “Guarda o dinheiro e vai. Eles não têm um coração bom, compreendes?”, escrevi.
Tenho duas meninas e um menino. Durante vários meses não soube deles.

Em Portugal procurei na internet, mas não consegui encontrá-los. Só mais tarde, através de uma rádio local, é que cheguei até eles. Um amigo disse-me que conhecia um jornalista de uma agência, confesso que não sei que agência era, mas foi ele quem fez o contacto.

O anúncio de que eu estava vivo e à procura deles circulou nas rádios e jornais, juntamente com as outras notícias. Alguém que conhecia a minha mulher ouviu-o numa rádio local e avisou-a de que eu estava bem, em Portugal.

O meu amigo conseguiu o número dela e nunca mais perdemos o contacto. Ela já estava na capital, falámos sempre ao telefone. Eu enviei-lhe algumas fotografias para ela mostrar aos nossos filhos.
IV - Cinco anos depois, o reencontro
Depois de conseguir o visto de residência, em 2015, fiz o pedido de reagrupamento familiar no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras. Esperei muito.

Paguei a uma pessoa para me ajudar a recolher os documentos necessários à obtenção do visto para a minha família. Em 2016, todos os papéis foram entregues na embaixada de Portugal em Kinshasa. Disseram-lhes que nenhum deles era válido, que tínhamos sido enganados.

Em 2017 recomeçámos todo o processo. A minha família acabaria por chegar em maio de 2018.
Quando fui buscá-los ao aeroporto estava nervoso. Passaram cinco anos desde que fugi do meu país. Sei que a minha filha mais velha ainda me conhece, ela tinha 13 anos na altura. O meu filho também, tinha 11 quando parti, mas a mais nova era ainda um bebé, com apenas 3 anos.

O primeiro a abraçar-me foi o meu filho. Lembrei-me do que me disse uma vez ao telefone, quando lhe perguntei porque é que estava sempre doente. Ele esteve muitas vezes internado antes de cá chegar.
“Pai, quando eu estiver ao pé de ti, nunca mais vou estar doente.”

A promessa foi cumprida, desde que chegou a Portugal nunca mais esteve doente.

Falta de trabalho, educação e habitação digna. "Há discriminação em relação à comunidade cigana"

João Alexandre, in TSF

Parlamento acolhe, esta terça-feira, uma audição pública com membros da comunidade cigana. Relatório sobre racismo, xenofobia e discriminação étnico-racial em Portugal é apresentado pelos deputados em julho.

Depois de, no inicio de fevereiro, ter ouvido representantes de associações ligadas à comunidade brasileira e de afrodescendentes, a Assembleia da República prepara-se para ouvir, esta terça-feira, a comunidade cigana, em mais uma audição pública promovida pela subcomissão para a Igualdade e Não Discriminação, que em julho apresenta um relatório sobre racismo, xenofobia, e discriminação étnico-racial em Portugal.

Ouvida pela TSF, Catarina Marcelino, responsável por redigir este relatório , sublinha que é preciso continuar a ouvir a comunidade e a recolher dados, mas afirma que não há dúvidas de que há "indícios fortíssimos" de discriminação em relação à comunidade cigana.

"Basta olhar para o mercado de trabalho, para a educação, para o Ensino Superior ou para a participação política. As pessoas ciganas não estão lá, a comunidade cigana não está lá", diz a deputada do PS e antiga secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, que refere que há também uma "percentagem muito elevada de pessoas de origem cigana a viver em habitação precária".

Catarina Marcelino, deputada do PS, sublinha que a comunidade cigana é discriminada há séculos

São dados que, defende Catarina Marcelino, apontam para "indícios fortíssimos" de discriminação. "O que este relatório pretende é verificar as situações e torná-las visíveis, mas também apontar caminhos e propostas para erradicar a discriminação", sublinha a deputada, que, baseando-se em informação da Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (CICDR), adianta: "Sabemos que há discriminação em relação à comunidade cigana".

Uma discriminação que existe, mas, com contornos diferentes. "Os grupos mais afetados ou com mais queixas por discriminação são afrodescendentes, brasileiros e ciganos, por isso, este é o nosso público-alvo. Contudo, aquilo que afeta os afrodescendentes e brasileiros é diferente daquilo que afeta as comunidades ciganas. O que fizemos foi dividir as audições em dois grupos, para falar de temas como educação, justiça, habitação, segurança e participação política", explica.

Catarina Marcelino refere que os problemas que afetam os ciganos são diferentes dos que atingem as restantes etnias

Catarina Marcelino, deputada e relatora do relatório sobre racismo, xenofobia, e discriminação étnico-racial em Portugal, no âmbito da Subcomissão para a Igualdade e Não Discriminação

A ex-secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade do Governo liderado por António Costa reconhece que há "muitos séculos de história de separação destas comunidades", mas refere, no entanto, que é preciso avançar para uma maior integração destas comunidades: "Queremos a integração e a inclusão".

Além das audições com as comunidades, estão também previstas audições com altos dirigentes da administração pública de todas as áreas em análise, e, por fim, com o Governo. "Em julho teremos o relatório pronto com recomendações, não é um relatório apenas factual, pretende fazer recomendações", garante Catarina Marcelino.

Quanto à audição pública desta terça-feira, começa pelas 10h30, no Auditório António de Almeida Santos, Assembleia da República, e vai recolher contributos de membros de entidades como a SOS Racismo, a Associação de Mediadores Ciganos de Portugal ou a Rede Europeia Anti-Pobreza.

18.3.19

Racismo: Portugal, um país em negação

by Joana Gorjão Henriques, in Vogue

O vídeo no bairro da Jamaica, Seixal, onde se vê a PSP em confronto com uma família trouxe ao debate a questão sobre se há racismo em Portugal. A pergunta não deve ser se há racismo, mas quão racistas somos. Aquela senhora atirada ao chão pela polícia podia ser a nossa mãe?

Dia 20 de janeiro de 2019, domingo: um vídeo começa a circular no Facebook logo cedo pela manhã, em mensagens e murais de pessoas que não se conhecem. É preciso visioná-lo várias vezes para perceber bem o que mostra dos acontecimentos dessa madrugada no bairro da Jamaica, Seixal. Uma carrinha da PSP estaciona e vários homens fardados saem. Um deles calça umas luvas. Depois, ao longe, vê-se um homem negro mais velho, de camisa azul, trazendo um jovem pelo braço. Mal se aproxima, é abordado de imediato pelo agente da PSP com dois socos e uma joelhada. Não há qualquer sinal de resistência ou de agressão da parte do homem que, saberemos mais tarde, chama-se Fernando Coxi e tem 63 anos. O jovem — seu filho, Hortêncio — terá atirado uma pedra, acusam os polícias, e será depois detido. A família reage: a mulher, Julieta Joia, 52 anos, vai em sua defesa e é empurrada por um polícia, cai ao chão de imediato; a filha também intervém no conflito e fica igualmente deitada, depois de empurrada. As imagens são desoladoras: duas mulheres humilhadas pela polícia, caídas no chão, obviamente indefesas nos seus corpos esguios. Quando no dia seguinte à tarde, 21 de janeiro, centenas de jovens negros vindos de vários concelhos da Grande Lisboa marcharam na Avenida da Liberdade, traziam uma “bandeira” comum: estavam ali porque “podia ser a minha mãe”, disseram.

A revolta com a agressão policial àquelas mulheres, sobretudo a mais velha, fez sair à rua gente de entre 18 e 20 e poucos anos que nunca tinha ido a uma manifestação na vida. Viram-se cartazes contra a “brutalidade policial”, uma bandeira de quem está habituado a ter a PSP a entrar nos bairros da periferia de Lisboa, a encostar jovens contra a parede e a revistá-los ou simplesmente a mandá-los parar à saída da estação de comboios porque os acha suspeitos por uma única razão: são negros. É preciso falar com quem vive às portas de Lisboa em sítios onde o Estado só entra da forma policial e quando o faz é para reprimir para perceber o quanto aquelas imagens soaram familiares a tanta gente.

Alguém acredita que algum agente da PSP abordaria um pai de família branco daquela maneira violenta num bairro no centro de Lisboa? (...) Mas estamos a falar do Jamaica, um território que é classificado pela PSP como “zona urbana sensível”, ou “bairro problemático”, designação que já de si rotula e estigmatiza.

O protesto acabou com a polícia a atirar balas de borracha e a lesionar alguns manifestantes, depois de ter acusado jovens de atirarem pedras e acertarem na PSP. Há neste momento quatro jovens, com mais ou menos 20 anos, a serem julgados por isso. Alguém acredita que algum agente da PSP abordaria um pai de família branco daquela maneira violenta num bairro no centro de Lisboa? Alguém acredita que um agente da PSP se atreveria a empurrar uma mulher branca com tanta força que ela caísse ao chão? Alguém teve dúvidas, em 2015, quando viu as imagens de um adepto do Benfica à porta do estádio de Guimarães a ser agredido pela PSP de que se tratou de abuso? Porque é que depois de o vídeo do Jamaica se ter tornado viral se ouviu tanta gente, da esquerda à direita, dizer que era preciso esperar pela investigação para criticar a polícia? Mas estamos a falar do Jamaica, um território que é classificado pela PSP como “zona urbana sensível”, ou “bairro problemático”, designação que já de si rotula e estigmatiza.

No bairro da Jamaica — ou Vale de Chícharos – vivem dezenas de famílias sobretudo de origem africana e negras há anos. São vários blocos de prédios em tijolo laranja, com o miolo escancarado, edifícios inacabados, fios elétricos à vista mas sem luz no interior. Há prédios em que as caixas de elevador que nunca foram lá postos são autênticos alçapões, buracos onde qualquer criança pode cair. Isto é a Grande Lisboa que não vem no cartão-postal. Só ao fim de 30 anos é que as famílias estão agora a ser realojadas, mas até o processo terminar o Jamaica continua a ser uma espécie de lugar de ninguém. É por isso que ouvimos políticos dizer que desconheciam a sua existência. O Jamaica e quem lá vive foram atirados para a terra da invisibilidade. Não é o único com estas características às portas de Lisboa: há, por exemplo, o 6 de Maio, na Amadora, o bairro da Torre, em Loures, o Terras da Costa, em Almada, estes dois últimos sem saneamento básico nem eletricidade. O que têm em comum? Serem habitados maioritariamente por mulheres e homens negros.

Em Portugal, a segregação tem rosto e tem cor. E não é apenas na habitação. Quantas mulheres negras e ciganas já foram capa desta revista e quantos já escreveram para ela? Quantas mulheres e homens negros e ciganos trabalham no jornal onde eu escrevo, o Público? Quantas mulheres e homens negros e ciganos estão na Assembleia da República e quantos estão a liderar as grandes empresas, os grandes grupos económicos, os projetos de investigação académica, a dar aulas nas universidades? E agora, as perguntas ainda mais difíceis: quantos de nós, mulheres e homens brancos, já desvalorizámos a opinião, o currículo, as competências, a capacidade económica, a possibilidade de crescimento profissional de alguém que não era branco?

Em Portugal, a segregação tem rosto e tem cor. E não é apenas na habitação. (...) Quantas mulheres e homens negros e ciganos estão na Assembleia da República e quantos estão a liderar as grandes empresas, os grandes grupos económicos, os projetos de investigação académica, a dar aulas nas universidades?

Embora Portugal seja um país em negação, preferindo vangloriar-se com o seu passado de descobertas e de colonizador sem ter consciência de que isso implicou a ocupação de territórios e a dizimação de populações inteiras, o manto do racismo vai-se estendendo e tornando cada vez mais visível. Casos como o do bairro da Jamaica servem para escancarar a ferida. Como muitos países, vivemos aquilo que se chama racismo estrutural, ou seja, quando a discriminação não é algo que se circunscreve às relações interpessoais e ao preconceito mas ultrapassa a nossa vontade. O racismo atravessa a sociedade e as instituições que reproduzem comportamentos que favorecem uns (os cidadãos brancos) e discriminam outros (os cidadãos não brancos). Como o machismo, é um polvo com tentáculos que não deixa muitos de fora, inclusivamente aqueles que tão arduamente se batem contra. E é por isso que a única pergunta a fazer não é se em Portugal há racismo — como há machismo —, mas quão racistas são as estruturas que a sociedade criou e que nós cidadãos reproduzimos, voluntária ou involuntariamente. Mas como diz a americana Jane Elliott, autora de inúmeras experiências, se se quer medir o nível de racismo de uma sociedade a primeira coisa a fazer é experimentar ser discriminado — um dos seus exercícios mais didáticos consiste em dividir uma sala de aula entre quem tem olhos castanhos e olhos azuis e exercer discriminação arbitrária.

Certo é que as raças biologicamente não existem, são uma construção social fortíssima criada para hierarquizar. O racismo é acima de tudo uma questão de poder e é por isso tantas vezes confundido com a discriminação social. Se olharmos para a estrutura de classes socioprofissionais, onde estamos habituados a ver as mulheres e homens negros? Em que tipo de trabalhos? Quem são as mulheres que acordam todos os dias de madrugada, se metem em comboios e camionetas a caminho do centro da capital, limpam os escritórios e desaparecem, como se fossem invisíveis, ainda muitas horas antes de o dia de trabalho começar para toda a gente? E quem regressa no fim, já estamos todos em casa, para terminar de limpar? Quem é que atende nas caixas de supermercado, nas cadeias de comida fast-food? Para onde foram os jovens negros colegas dos nossos filhos no secundário? Porque não seguiram para a universidade e ficaram pelas vias profissionais? O que é que está a acontecer a esta geração que nasceu em Portugal, mas que tantas vezes é tratada como imigrante?

Este desequilíbrio de forças no País dos brancos costumes não se deve apenas a uma questão social, mas racial. Foi por isso que, para desconstruir o mito que alguns perpetuam de que em Portugal o racismo afeta sobretudo as pessoas pobres, centrei as reportagens que deram origem ao livro Racismo no País dos Brancos Costumes (Tinta-da-china) em pessoas da classe média. Em 2017 fui à procura de exemplos na habitação, na educação, no emprego, na justiça que ilustrassem a discriminação. E assim descobri as histórias de Amélia Costa Injai, Mamadou Ba, William Fernandes e Inocência Mata, uma pequena amostra de tantas outras que se repetem diariamente em Portugal.
A única pergunta a fazer não é se em Portugal há racismo — como há machismo —, mas quão racistas são as estruturas que a sociedade criou e que nós cidadãos reproduzimos, voluntária ou involuntariamente.

Amélia, na altura com o apelido Costa, enviou o currículo para responder a uma candidatura de emprego numa instituição bancária. Não pôs a fotografia, foi chamada e depois de um processo de seleção acabou por ser contratada. Percebeu na entrevista que o chefe tinha ficado de pé atrás, e um dia tomou coragem e perguntou-lhe diretamente se ele tinha hesitado por ela ser negra. Ele foi frontal e disse que sim, que o banco tinha a política de não contratar nem negros, nem brasileiros, e que se ele tivesse visto a fotografia dela não a teria chamado.

Mamadou Ba tentou durante meses procurar uma casa no centro de Lisboa. Não conseguia. Fizemos um teste: Mamadou Ba, que tem sotaque por causa da sua origem senegalesa, telefonava para o senhorio de uma casa disponível para arrendar e de seguida o repórter de imagem Frederico Batista, com sotaque lisboeta, fazia o mesmo. Três dos cinco supostos senhorios não os trataram de forma igual. A Frederico Batista davam logo a morada, por telefone ou por SMS; a Mamadou Ba ficavam de enviar e não enviavam. Um dos senhorios foi mesmo explícito a dizer-lhe que o apartamento já tinha sido alugado — uns segundos depois Frederico Batista ligou e marcou uma visita para o dia seguinte.

William Fernandes, ex-aluno do colégio Planalto, estudante de Arquitetura em Londres, estava de férias em Lisboa e deixou a mãe à porta de casa antes de estacionar o carro. Sem nada fazer, foi mandado parar por dois polícias, levado para a esquadra por causa de uma carta de condução que os agentes insistiam que não era válida — mais tarde uma juíza deu razão a William. Ele não teve dúvidas sobre a única razão de ter sido considerado suspeito.

Inocência Mata, professora doutorada na Faculdade de Letras de Lisboa, estava no Hospital de Santa Maria e perguntou a uma enfermeira que passava onde era um serviço. Ela respondeu com outra pergunta: “Está ali indicado na placa, sabe ler?”
Isto são histórias do Portugal de hoje. São amostras de um fenómeno muito mais dominante e transversal do que a maioria quer fazer parecer. São também exemplos de quando o racismo não se limita à expressão de ódio de “p... vai para a tua terra”, mas afeta as oportunidades na vida das pessoas. E criam um desequilíbrio entre quem tem acesso ao poder e quem não tem, quem consegue abrir um livro de História, ligar a televisão, ir ao cinema e ver-se representado e quem não tem esse privilégio. É por isso que tanta gente negra ao ver aquele vídeo do bairro da Jamaica apontou: “Podia ser a minha mãe.”
Artigo originalmente publicado na edição março 2019 da Vogue Portugal.