30.11.07

Padre Jardim denuncia pressão imobiliária no Centro Histórico

Manuel Vitorino, in Jornal de Notícias

O título da UNESCO foi honroso e, em 1996, houve champanhe e foguetório. Onze anos depois, muitos portuenses lamentam a "oportunidade perdida" e a "apressada extinção" do Comissariado para a Renovação da Área Urbana da Ribeira-Barredo (CRUARB) e da Fundação para o Desenvolvimento da Zona Histórica do Porto (FDZHP). "As casas estão muito degradadas. Está tudo ao deus-dará", lamentou, ao JN, o padre Jardim Moreira, da paróquia de S. Nicolau e Vitória, duas das freguesias mais atingidas pela desertificação do Centro Histórico.

"A extinção das duas fundações foi uma machadada nas aspirações das pessoas. O organismo criado pela Câmara [Sociedade de Reabilitação Urbana] é outra coisa está mais empenhada no centro da cidade e menos no núcleo antigo. Na Rua do Infante, já só vivem dez pessoas e os mais velhos estão a ser assediadas para vender as casas. A pressão das imobiliárias é enorme", confessa o também presidente da Rede Europeia Antipobreza.

Especulação imobiliária

O socialista Miguel von Haffe prefere aludir à "mudança de paradigma" para manifestar as diferenças políticas entre o passado (nomeadamente os executivos socialistas de Fernando Gomes) e a chegada de Rui Rio à Câmara "O CRUARB e a FDZHP tinham, por missão, a reabilitação e a melhoria das condições sociais das pessoas. Mas todo o trabalho desenvolvido até agora está em causa. A SRU está assente num modelo onde são mais fortes os valores da especulação imobiliária", disse.

Rui Sá, da CDU, corrobora a ideia de que a cidade "não soube" aproveitar a distinção da UNESCO "Em vez da Câmara reforçar os investimentos no Centro Histórico, diminui a sua intervenção. Desde 2001 até agora, só houve confusão entre organismos e fundações. O Centro Histórico está abandonado", considerou, sem antes traçar um diagnóstico "bastante sombrio" sobre as condições de habitabilidade em S. Nicolau, Sé, Miragaia e Vitória. "O processo de desertificação está em marcha e não existe uma política destinada a fixar as pessoas", considerou.

O presidente da Junta da Sé (PS) corrobora a tese de "abandono" por parte do Executivo de Rui Rio e dá como exemplo o facto de ter solicitado um apoio de 2500 euros para equipar a cozinha do centro de idosos da freguesia e não ter obtido resposta "É inadmissível. A Câmara desprezou o Centro Histórico", aludiu.

Já o presidente da Comissão Executiva da SRU, Joaquim Branco, tem uma visão optimista e acredita que, "a partir de 2008 e durante três anos", vão existir várias obras em diferentes locais da cidade. "Estamos a trabalhar em cerca de 500 edifícios espalhados em diferentes quarteirões da cidade. Na maioria dos casos, temos sido bem sucedidos nas negociações com os donos dos prédios. Já só resta arrancar com as obras", concluiu.

Aumenta a escolaridade e os gastos com o Ensino

in Jornal de Notícias

Ao nível dos gastos com a Educação, Portugal está bem classificado


Os progressos na escolarização das crianças e a persistência do analfabetismo nos adultos são duas das conclusões do relatório anual da UNESCO sobre educação, ontem apresentado. Sobre Portugal, o relatório, baseado em números de 2005, foca o facto de a taxa de repetência nos seis primeiros anos de escolaridade em Portugal ser a mais alta da generalidade dos países europeus 10,2%.

Um número que a ministra da Educação, em artigo de opinião publicado no JN, e baseada em dados provisórios para os três ciclos do Ensino Básico, havia contestado. Segundo dados que apresentou, o panorama melhorou significativamente nos dois últimos anos lectivos, tendo a taxa de reprovações baixado de 10% para 5,5% (ver caixa).

Como aspectos positivos, o relatório da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura assinala que desde 2000, o número de crianças que inicia a escolaridade aumentou nitidamente, há cada vez mais raparigas na escola e aumentaram os gastos com educação e apoio.

As más notícias são que a baixa qualidade e o alto custo da educação, assim como a persistência de altos níveis de analfabetismo, põem em risco as hipóteses de cumprir os objectivos estabelecidos em 2000.

O relatório da UNESCO tem por base dados de há dois anos, em que Portugal figura em 40.º lugar entre os 164 países, numa listagem elaborada de acordo com o desenvolvimento dos objectivos pretendidos, a qual é liderada pela Noruega.

A comparação estabelecida com outros países demonstra como a situação é preocupante em Portugal. Da análise das estatísticas sobre taxas de repetição - em que são considerados os seis primeiros anos de escolaridade -, é difícil não reparar na desproporção que o nível português apresenta quando comparado com os países europeus. Com efeito, na Europa, a taxa de 10,2% de alunos repetentes naquele nível de ensino (que baixou para os 5,5% segundo a ministra) tem apenas como mais próxima os 4,4% do Luxemburgo, 3% da Turquia, 2,6% de Malta e 2,3% de Espanha. Na Grécia e em Itália, por exemplo, os valores não atingem 1%. Valores muito elevados de repetência são encontrados em Cabo Verde (15,4%), Brasil (21,2%) e República Centro Africana (30%), entre outros.

Quanto aos gastos com Educação, os números portugueses - também referentes a 2005 - apontam para 5,8% do Produto Interno Bruto (PIB). A Dinamarca está no topo da lista entre os países europeus, com 8,6%, seguida da Islândia (8,3%). Há 10 países europeus com investimentos inferiores a Portugal, como é o caso de Espanha, com 4,4% do PIB.

Sobre o rácio aluno/professor nos ensinos Básico e Secundário, os números apresentados são favoráveis a Portugal em comparação com os restantes países europeus. No Ensino Básico, o rácio português é de 11/1, enquanto na Finlândia é de 15/1. No Ensino Secundário, Portugal apresenta uma relação de 7/1, abaixo dos rácios da Finlândia, Espanha e Reino Unido, que são, respectivamente de 10/1, 11/1 e 15/1.

O relatório da UNESCO - que, anualmente, pretende demonstrar como os 164 governos estão a atingir um conjunto de objectivos delineados na educação para as crianças, jovens e adultos até 2015 - observa a persistência de desigualdades profundas no acesso à educação, entre zonas urbanas e rurais, entre categorias sociais e em relação às crianças com deficiência.

41 milhões de crianças a frequentar o Ensino Básico constitui o aumento registado entre 1999 e 2005 em todo o mundo, um número realçado com satisfação pela UNESCO.

774 milhões de adultos continuam analfabetos (um em cada cinco ou um em quatro no caso das mulheres). A UNESCO lamenta a pouca atenção dada ao analfabetismo no que se refere às políticas de educação.

Resultados melhoram

A ministra da Educação considerou que as taxas de reprovação nas escolas básicas e secundárias estão a diminuir "de forma significativa e consistente" e que os resultados alcançados em 2005/06 e 2006/07 apresentam já uma melhoria da situação. Em artigo de opinião publicado no JN na passada terça-feira, a propósito de uma reportagem sobre o tema inserida na nossa edição do dia anterior, Maria de Lurdes Rodrigues salientou que uma comparação dos resultados obtidos entre 1995/96 e 2004/05 permite verificar uma "melhoria dos resultados no conjunto do Ensino Básico, considerando os três ciclos de ensino". Por outro lado, a governante realçou uma melhoria "muito significativa dos resultados escolares ao nível do primeiro ciclo do Ensino Básico o insucesso passa de 10% para 5,5%". Maria de Lurdes Rodrigues confirmou que os dados estatísticos mais recentes no Ensino Básico ainda não foram divulgados. Contudo, os dados provisórios fazem a ministra realçar a tendência para a melhoria dos resultados. Por outro lado, concordou que Portugal ainda está longe das metas que se propôs alcançar. "Mas não podemos descansar sobre estes resultados", concluiu a ministra.

29.11.07

Banco Alimentar promove nova recolha de alimentos

Marisa Soares, in Jornal de Notícias

Recolha tem aumentado ao longo dos 15 anos do Banco Alimentar


O Banco Alimentar Contra a Fome promove, no próximo fim-de-semana, uma campanha de recolha de alimentos em mais de 950 estabelecimentos comerciais espalhados pelo país. Cerca de 17700 voluntários vão receber os produtos alimentares que devem depois ser distribuídos a pessoas com carências alimentares.

A recolha vai ser feita em estabelecimentos das zonas de Lisboa, Porto, Coimbra, Évora, Aveiro, Abrantes, S. Miguel, Setúbal, Cova da Beira, Leiria-Fátima, Oeste, Algarve e Portalegre. Os voluntários dos 13 Bancos Alimentares existentes em Portugal, devidamente identificados, vão convidar as pessoas a participar, oferecendo sacos de plástico, onde os consumidores deverão colocar os bens alimentares que entenderem. Leite, óleo, conservas, azeite, açucar, farinha, bolachas, massa e outros alimentos não perecíveis são os produtos privilegiados.

Os géneros alimentares recolhidos serão distribuídos, a partir da próxima semana, a pessoas com dificuldades financeiras, sinalizadas por 1332 Instituições de Solidariedade Social. Nas pequenas superfícies, decorrerá a campanha "Ajuda Vale". Até 9 de Dezembro, os consumidores podem adquirir um cupão-vale, que representa uma unidade de um dos cinco produtos seleccionados (azeite, óleo, leite, salsichas e atum). Ao efectuar o pagamento, o dador entrega o cupão e o respectivo código de barras é lido, sendo somado à conta a pagar.

As expectativas em relação à quantidade de produtos recolhidos são "sempre muito favoráveis", explicou ao JN Isabel Jonet, do Banco Alimentar Contra a Fome. A responsável não faz previsões sobre o sucesso da campanha, mas espera que haja um aumento em relação ao ano passado. Em 2006, os bancos alimentares distribuíram 18014 toneladas de alimentos, que ajudaram a alimentar mais de 216 mil pessoas carenciadas.

Apesar de ter consciência das dificuldades que afectam a população em geral, Isabel Jonet considera que "mesmo em altura de crise, os portugueses são muito solidários". Prova disso é o aumento registado ao longo dos 15 anos de existência do Banco Alimentar, ao nível da tonelagem de produtos recolhidos e de pessoas assistidas.

Portugal tem uma "nova classe" de pobres!

Jovita Ladeira, in Jornal do Algarve

A existência de 2 milhões de pessoas que vivem em situação de pobreza em Portugal, representa uma injustiça e constitui uma ofensa à dignidade pessoal que só nos pode incitar ao mais profundo inconformismo. A pobreza e a exclusão social constituem um dos maiores desafios do nosso século, na medida em que colidem com o exercício dos direitos fundamentais dos seres humanos. No nosso país, os indicadores inerentes à pobreza e à exclusão social deixam-nos sérias preocupações. Os últimos indicadores colocam-nos no topo dos países da UE em maior risco de pobreza ao mesmo tempo que o fosso entre ricos e pobres continua a aumentar. A taxa de pobreza atinge cerca de 20% da população, o que equivale a dizer que 1 em cada 5 Portugueses vive em situação de pobreza, este valor é significativamente superior ao da média europeia. Estima-se que estes 20% passariam para 41% se o Estado deixasse de pagar os subsídios sociais, o que mostra que a pobreza é um problema estrutural. Adultos e crianças vivendo em agregados em que nenhum dos elementos tem emprego, representa em Portugal 13.5% contra os 9.8% da média da UE. Os idosos e as famílias mais numerosas constituem os principais grupos de risco de pobreza em Portugal. Se até há anos atrás ter um emprego representava a estabilidade económica, hoje ter um emprego nem sempre protege as pessoas do risco de pobreza. A taxa de risco de pobreza para aqueles que têm um trabalho é de 8% na União Europeia e de 14% em Portugal. Há muitos portugueses que, apesar de trabalharem a tempo inteiro, continuam a viver abaixo do limiar da pobreza (360 euros mensais de acordo com a bitola europeia) e, demasiados não têm no final do mês todos os rendimentos para fazer face às necessidades do seu agregado familiar. Esta é a “nova pobreza” portuguesa. Portugal combina a “velha pobreza” que já vem de trás, característica de uma população mais idosa e rural, com uma “nova pobreza” que são aquelas pessoas com emprego, mas sem rendimentos suficiente para acudir a todas as necessidades da família. Apesar de o Estado gastar milhões para combater a pobreza verificamos que ela é persistente e indiferente aos ciclos económicos. O Orçamento de Estado para 2008 vem alargar o seu apoio aos portugueses que mais sofrem, refira-se o alargamento do complemento solidário para idosos aos maiores de 65 anos, a reposição do poder de compra a todos os pensionistas com pensões inferiores a 600 euros, o apoio directo às famílias com um abono pré-natal às grávidas, aumento do abono de família para as crianças até aos três anos e a duplicação da dedução fiscal. Naturalmente que estas medidas terão o condão de aliviar o sofrimento mas não de o resolver. Destas circunstâncias queria referir duas medidas que, do meu ponto de vista, poderiam ser mais uma ferramenta no combate à pobreza: primeiro, a prioridade em conhecer e permanentemente diagnosticar os problemas e avaliar das medidas implementadas; segundo, a necessidade de estimular a escuta e a dinamização da participação activa dos cidadãos, particularmente dos que enfrentam situações de pobreza e de exclusão social. O primeiro aspecto concretiza-se com a criação de um Observatório Regional de Combate à Pobreza. Esse Observatório, com a necessária expressão a nível local, não deveria ser uma simples ferramenta de conhecimento académico mas um reservatório de conhecimentos, para ajustar politicas e modelo de intervenção, e de participação activa de todos aqueles que intervêm nesta área. Quanto ao segundo aspecto seria uma boa prática ouvir aqueles que enfrentam situações de pobreza e de exclusão social de forma a encontrar as dinâmicas adequadas para recuperarem desse estado de pobreza, proporcionando apoio à reformulação de projectos de vida. Esta seria uma forma de romper com situações de desvantagem cumulativa e de herança de pobreza. A entrega à sociedade civil desta tarefa, através de organizações não governamentais, seria uma aposta correcta. Para isso seria importante que fosse canalizada uma parte dos fundos comunitários para essas organizações, no sentido de experimentar a sua gestão autónoma. Esta é uma boa prática implementada com sucesso em vários países e que poderia produzir efeitos de grande amadurecimento da própria sociedade civil no que se refere ao grau de co-responsabilização no combate à pobreza, para além de garantir uma maior proximidade dos recursos financeiros em relação aos problemas diagnosticados. A luta contra a pobreza é uma luta de pobres e não pobres, é um desígnio de todos os cidadãos.

28.11.07

Mais pobres vão sofrer os piores danos do clima

Rita Carvalho, in Diário de Notícias

As alterações climáticas ameaçam provocar um retrocesso no desenvolvimento em África e nos países mais pobres. Mais 600 milhões de pessoas subnutridas, mais 1,8 mil milhões afectados pela falta de água e mais 400 milhões expostos à malária são algumas consequências do aquecimento global previstas para o final do século. Um alerta deixado ontem pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) cujo relatório anual expõe uma realidade crua e injusta: são os que menos poluem que mais vão sofrer os efeitos drásticos da poluição.

O timing deste alerta do PNUD é pertinente. A uma semana da reunião que juntará em Bali mais de 200 países para traçar um novo regime climático pós Quioto, o relatório intitulado "Combater as alterações climáticas: solidariedade humana num mundo dividido" ex- pressa a urgência deste combate e os impactos que poderão daí advir, não só ambientais mas também ao nível do desenvolvimento humano. E prevê um acentuar ainda maior das desigualdades que distanciam ricos de pobres, comprometendo assim os objectivos de desenvolvimento do milénio. Em África o drama é duplo: são os mais afectados porque vivem em zonas ambientalmente mais sensíveis e são os que menos capacidade têm para se defender.

"As alterações climáticas constituem uma ameaça à humanidade. Mas são os pobres, cidadãos sem responsabilidade pela dívida ecológica que estamos a acumular, que enfrentam os custos humanos mais graves e imediatos", afirmou ontem Kemal Dervis, administrador do PNUD.

A mensagem do PNUD para a cimeira da Convenção das Nações Unidas é clara: é preciso apostar na mitigação do problema, invertendo o crescimento exponencial das emissões de gases com efeito de estufa, nomeadamente nos países desenvolvidos. Mas é urgente investir também na adaptação, pois alguns efeitos da mudança são já inevitáveis e têm de ser atenuados.

Adaptação

Adaptar o mundo às mudanças do clima exigirá gastar, em média, cerca de 86 mil milhões de dólares todos os anos, segundo prevê o PNUD. O mesmo é dizer 0,2 % do produto interno bruto dos países do hemisfério norte. Investir 44 mil milhões no desenvolvimento de infra-estruturas que ajudem a prever e controlar épocas de cheias e secas ou a adequar as técnicas agrícolas, dispor de 40 mil milhões para pagar seguros sociais em tempos de catástrofes e investir mais dois mil milhões em informação e alerta, que é ainda muito incipiente em África.

Mas o dinheiro disponível para ajudar as populações a prepararem-se para o que já não podem evitar é ainda escasso. A própria gestão deste fundo mundial, que vive exclusivamente de doações voluntárias ainda não está definida, como explicou Pedro Conceição, do PNUD. O debate sobre esta questão correrá também em Bali.

Nos países desenvolvidos, prevenir também será sempre melhor do que remediar, considera Isabel Pereira, do PNUD. Na Europa, estima-se que, em 2020, os danos causados pela não adaptação a esta realidade custarão quatro vezes mais do que a aplicação hoje de acções preventivas.

Recomendações

O PNUD recomenda a definição de um orçamento de carbono, ou seja, um limite de emissões de dióxido de carbono que permita evitar que a temperatura suba acima dos dois graus centígrados. Esse limiar - 15 mil milhões de toneladas de CO2 por ano - implicaria atingir o máximo de poluição em 2020. A partir dessa data, as emissões teriam de diminuir, sendo que em 2050 teria de haver uma redução de 50% em comparação com 1990.

Neste esforço, que a ONU considera que tem de ser partilhado, os países desenvolvidos teriam de dar o exemplo. Estagnariam a sua poluição já em 2012 ou 2015, deixando às economias emergentes a possibilidade de se expandirem até 2020, invertendo depois a tendência de subida do CO2. O mundo teria de reduzir 50% as emissões em 2050. Mas esta será uma inversão difícil, pois hoje já se emitem o dobro das emissões que o PNUD considera aconselháveis por ano.

Nas recomendações que produziu, o relatório sugere ainda que seja atribuído um preço ao carbono, como forma de penalizar a poluição e promover o investimento em tecnologia limpa.

Abandono e solidão

Gomes Fernandes, Arquitecto, in Jornal de Notícias

As cidades de hoje escondem algumas situações de injusta relação de cidadania que são chocantes. Há uma nova pobreza urbana que, muitas vezes escondida, não disfarça esta crescente doença da cidade, tanto maior quanto mais envelhecida e debilitada esta se apresenta.

Porque estamos numa cidade marcada por estes sinais bem visíveis de envelhecimento patrimonial e debilidade socioeconómica, o problema das injustiças sociais e das fragilidades no exercício da cidadania deve ser motivo de atenção, pois, doutro modo, estaremos a "varrer para debaixo do tapete" da indiferença um assunto muito sério.

Aparente contradição, poderá dizer-se, quando os avanços tecnológicos e as facilidades de comunicação e acesso ao conhecimento deveriam contribuir para uma construção de vivência urbana mais justa e equilibrada; mas tal paradigma de avaliação não se verifica, constatando-se até um agravamento de sinais de exclusão e perda de auto-estima por parte de franjas de população que seria impensável ocorrer há algumas décadas atrás.

É a cidade que fica mais frágil e exposta a predações várias quando estes sintomas críticos se acentuam, e é também o seu futuro colectivo que está em causa quando a inversão do caminho se não verifica, pois a consciente independência de espírito e o estado de alma para o exercício da cidadania passa pelo equilíbrio de vida do cidadão, que só pode ocorrer acima de patamares de subsistência e segurança hoje em muitos casos postos em risco. O Porto é uma cidade envelhecida no seu património construtivo e habitacional, mas é-o também no seu potencial de resistência às doenças que a afligem, pois as maleitas do corpo atingem de tal modo o espírito e a alma cidadã que o futuro da cidade não lhes pode ficar indiferente.

Abandono e indiferença geram solidão e perda de auto-estima, e as crises sociais e económicas são fermentos contaminantes de quem se deixa, ou é arrastado, para este avesso da cidade, por vezes muito mais lúgubre e dramático do que o abandono a que estão votados muitos prédios em ruínas do corpo essencial da cidade. Em bastantes casos este avesso comporta outros em simultâneo com o pavio de vida que está prestes a extinguir-se no corpo arruinado dos velhos prédios. Fragilidades físicas profundas do património que arrastam e precipitam debilidades sociais e económicas dos cidadãos e das famílias, num somatório de velhices que se tornam preocupantes.

Cumpre ao Estado, ao Governo e às instituições públicas várias, incluindo autarquias, estarem atentos e ocorrer às situações, mas a doença compromete todos, daí a importância da denominada "sociedade civil", pelas redes de solidariedade social e apoio que podem organizar e em que cada um se pode comprometer.

Não se trata de fazer apelo ou lembrar valores caritativos, por respeitáveis que sejam para alguns, trata-se de apelar ao sentido solidário e de compromisso de uma cidadania marcada por valores de ética e responsabilidade, capazes de lembrar ao poder e aos seus representantes os deveres que assumem quando eleitos, mas de o fazer com elevado sentido de empenho próprio e de compromisso cívico. "Ser cidadão", como diria o saudoso Nuno Teixeira Neves, é um exercício permanente de atenção e responsabilidade, e ninguém pode ficar indiferente a tanto abandono e solidão que crescem todos os dias nesta que é a maior criação física do homem e uma das maiores do seu espírito - a cidade, como dizia mestre Fernando Távora.

A lembrar os mestres, todos nós aprendemos e a olhar os avessos da nossa cidade todos contribuiremos para melhor iluminar o seu futuro, que é também o nosso projecto colectivo.

Criminosos sexuais devem ser impedidos de lidar com crianças

in Jornal de Notícias

Organização britânica quer um sistema seguro de recrutamento para trabalhar com crianças


É necessário criar mecanismos que impeçam os condenados por crimes sexuais de trabalhar com crianças. Essa é uma das recomendações do relatório que a "National Society for the Prevention of Cruelty to Children" (NSPCC) apresenta hoje, em Bruxelas, num seminário subordinado ao tema "Proteger as crianças ao longo das fronteiras", no qual está presente também o secretário de Estado da Justiça português, Conde Rodrigues.

No documento, a organização não governamental britânica defende a criação, em todos os países da União Europeia, de uma base de dados com o registo dos condenados por crimes sexuais. Depois, deverá ser feita uma base de dados partilhada da UE para usar na investigação criminal e na contratação de empregados.

A NSPCC considera que os Estados-membros devem criar um sistema seguro de recrutamento de pessoas, para permitir que os empregadores detectem, entre os candidatos a um emprego, pessoas condenadas por crimes violentos, de cariz sexual (como pedofilia) ou relacionados com droga. O facto de mudarem de país não deve, segundo o relatório, facilitar a obtenção de empregos que os coloquem em contacto com crianças, para os quais estão incapacitados.

Portugal está já a cooperar a nível internacional no combate ao abuso sexual de crianças. As recentes alterações legislativas, nomeadamente do código penal, vieram proibir o exercício de profissão ligada a crianças por indivíduos condenados por abuso de menores.

A Convenção do Conselho da Europa contra a Exploração e Abuso Sexual de Crianças, assinada em Outubro por Portugal e mais 23 países, 14 dos quais da UE, visa criminalizar práticas como a pornografia infantil e a exploração sexual na Internet.

A convenção deverá entrar em vigor em Portugal em 2008, contribuindo para o aperfeiçoamento do direito à luz do padrão internacional.

Crimes contra crianças e jovens triplicaram

Nos últimos cinco anos, a Polícia Judiciária registou um aumento de casos. Foram 1300 em 2006, contra menos de 400 em 2001.

Principais agressores são familiares e vizinhos

Em 2006, quatro em cada cinco casos de abuso sexual contra menores (81%) foram cometidos por familiares próximos, e 28% por vizinhos.

Maioria das vítimas é do sexo feminino

Em 96% dos casos registados, o agressor era do sexo masculino, na sua maioria com mais de 70 anos. As vítimas eram, 75% das vezes, mulheres. As mais atingidas têm entre oito e 13 anos.

É na habitação que são registados mais crimes

A maioria dos crimes aconteceu em casa (60,45%) e os restantes deram-se em locais ermos (7,69%), escolas ou colégios (4,46 %) ou meios de transporte (4,22%).

Integração exige acesso de crianças ao pré-escolar

in Jornal de Notícias

Melhorar o ensino da língua portuguesa consta das recomendações


Reforçar o acesso de filhos de imigrantes ao ensino pré-escolar é uma prioridade se Portugal quiser melhorar a integração. O alerta integra as conclusões de um estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), centrado na integração no mercado laboral. Sendo a primeira infância "uma idade crítica para o sucesso da segunda geração", Thomas Liebig, um dos autores do estudo, salientou ser o nível de ensino em que os filhos de imigrantes estão mais subrepresentados.

Desenvolvido desde meados de 2006, o relatório aponta "resultados favoráveis", mas identifica vários desafios. Um deles é eliminar a total falta de correspondência entre os níveis de qualificação e o trabalho, particularmente gritante no caso de estrangeiros vindos de países de Leste cerca de 80% têm qualifcações superiores, mas desempenham tarefas de baixa qualificação. Penalizados, sublinha o documento, por não falarem português.

Melhorar a oferta do ensino de português é por isso outra recomendação da OCDE. Princípio que vale também para programas como o "Novas Oportunidades". "Seria de esperar que os imigrantes estivessem muito representados nestes programas de reconhecimento de competências, mas acontece precisamente o contrário", alertou Thomas Liebig. IC

Pobres não colhem qualquer benefício

in Jornal de Notícias

São já os pobres que suportam o maior fardo causado pelas alterações climáticas, afirma o relatório, que anota também o facto de tais impactos passarem despercebidos nos mercados financeiros e nos valores de riqueza expressos pelo Produto Interno Bruto dos países desenvolvidos. As vítimas de secas, inundações e outros fenómenos indutores de mais pobreza, e até de conflitos armados, são também as que menos contribuem para as emissões de gases com efeito de estufa.

Se se desenhar um mapa-Mundo relacionando as emissões com a população, veríamos a desproporção da América do Norte e da Europa face a outras regiões. África, nessa comparação, ficaria reduzida a um continente diminuto. Esta região é que menos acesso tem à electricidade (550 milhões não a têm). Em todo o Mundo, há 1,6 mil milhões de pessoas que nem sequer uma lâmpada podem acender nas suas casas. Só na Índia elas são 500 milhões.

É esta parte da Humanidade já desprovida de bens, comida e conforto que mais sentirá as consequências do aquecimento global. Defende o PNUD que às economias pobres os países ricos devem ajudar com tecnologias limpas, que permitam o seu desenvolvimento. Seu dever será também contribuir para o fim da desflorestação, dado que as florestas ajudam à captura do CO .

Minoria defende-se dos danos que causa

in Jornal de Notícias

Críticas aos maiores poluidores atingem sobretudo os Estados Unidos, pelo esbanjamento energético, e a Europa, por seguir um sistema de comércio de emissões que, até agora, só terá dado lucro a "alguns poucos".

"O comércio de carbono, durante os três primeiros anos(de vigência na UE), pouco contribuiu para diminuir o conjunto de emissões, mas gerou enormes lucros para alguns", refere o documento, citando os ganhos de milhares de milhões por companhias de electricidade europeias. Os EUA também não são poupados não ratificaram o Protocolo de Quioto e aumentaram as suas emissões em 16% desde 1990.

A diferença entre ricos e pobres é estabelecida não só quanto ao acesso a bens e conforto. Ela será cada vez mais acentuada nos meios de sobrevivência face às catástrofes induzidas pelo aumento de temperatura. Por exemplo, enquanto os habitantes do Delta do Mekong, na Ásia, terão, quando muito, um colete de salvação e umas lições para aprenderem a nadar, na Holanda os residentes recebem subsídios para que os alicerces das suas casas funcionem como o casco de um navio capaz de flutuar. Instala-se, assim, um apartheid na adaptação às mudanças climáticas. Os ricos, quase todos situados a Norte, irão também beneficiar de temperaturas menos rigorosas e de colheitas mais pródigas.

Cooperação "à prova de clima"

in Jornal de Notícias

A questão das alterações climáticas já influencia a ajuda ao desenvolvimento?

Trata-se de uma perspectiva recente.Começou a quebrar-se a barreira entre as organizações de defesa do ambiente e as de promoção do desenvolvimento. A colaboração entre estas duas valências pode ser muito positiva.

A Oikos já adoptou essa perspectiva?

Lançámos há pouco tempo, com a empresa Ecoprogresso, a iniciativa "Carbono contra a Pobreza", que visa a sensibilização para os problemas de regiões que mais podem ser afectadas.Tentamos também que Portugal, no âmbito das compensações de carbono, canalize fundos para a luta contra a pobreza energética. Uma empresa ou uma autarquia pode contribuir para projectos menos dependentes do petróleo ou para planeamento urbano com técnicas de maior resistência ao clima adverso.

A comunidade internacional está a adaptar-se a este critério nas suas ajudas?

Cerca de metade das infra-estruturas públicas com base na cooperação para o desenvolvimento é vulnerável aos rigores climáticos. Pela nossa parte, procuramos influenciar o Governo e a Comissão Europeia para que todas as ajudas sejam "à prova de clima".

As alterações climáticas devem fazer parte das finalidades de ajuda ao desenvolvimento?

Claro. Mas defendo que o investimento seja adicional. De outro modo, corre-se o risco de se ir repartindo o bolo até que não fica nada para o próprio desenvolvimento. O comissário europeu Louis Michel já defendeu a constituição de fundos internacionais com esse fim exclusivo.

Este relatório propõe a transferência de tecnologias limpas e de monitorização meteorológica. Acho isso fundamental, bem como a instalação de sistemas de alerta rápido. Mas preocupa-nos o facto de ter vindo a baixar a ajuda pública ao desenvolvimento. Em Portugal esta cifra-se agora em 0,21% do Rendimento Nacional Bruto, quando o compromisso estabelecia 0,7%.

Estamos a gastar nove planetas Terra só a bem dos ricos

Eduarda Ferreira, in Jornal de Notícias

Se toda a população mundial gastasse energia ao nível do que o fazem os Estados Unidos e o Canadá, seriam precisos nove planetas Terra para amortizar os efeitos climáticos que tal desperdício desencadeia através das emissões de gases com efeito de estufa.No todo, e até agora, a população mundial já sobrecarregou a atmosfera duas vezes mais do que o sustentável. Os cálculos surgem no Relatório de Desenvolvimento Humano 2007/ /08, que chama a atenção para o facto de serem os mais pobres a arcar já com as consequências do aumento da temperatura quando são pouco ou nada beneficiários do consumo energético. Milhões e milhões nem sequer têm o "luxo" de uma lâmpada acesa em suas casas.

O combate às alterações climáticas, neste Mundo dividido pela desigualdade, só se pode fazer através da solidariedade humana, advoga o relatório anual do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Nesta edição relativa a 2007/08, a análise não vai para as questões habituais da infância, saúde, escola, situação da mulher. Em vésperas da conferência internacional que irá rever o Protocolo de Quioto nas metas de redução de emissões e outras intervenções ambientais, este departamento da ONU diz claramente querer influenciar o rumo e a intensidade das medidas que combatam o aumento das temperaturas.

São já evidentes os estragos causados pelas mudanças climáticas e eles vão ser ainda mais intensos, traduzindo-se em mais doenças, mais fome, mais desalojados, mais vidas perdidas, menos acesso à água e a meios de vida como a agricultura. Outra evidência para o PNUD é que são os pobres a pagar a maior factura das cheias, secas e tempestades, quando o grande contributo para este estado do planeta não lhe pode ser assacado. E essa factura será tanto maior quanto, precisamente pela sua condição de pobres, têm poucos ou nenhuns meios de defesa. Entre 2000 e 2004, cerca de 262 milhões de pessoas foram afectadas por catástrofes com origem climática; apenas 2% delas viviam em países desenvolvidos.

A potencialidade de maiores desastres está assinalada e coincide com o retrato da pobreza África, Ásia, América do Sul e Central. A África subsariana, que tem a pegada de carbono mais leve do Mundo, será a região mais afectada. Na América Central e Caraíbas, os rendimentos do turismo ficarão afogados numa subida de 50 centímetros do nível das águas. No Perú, a dependência dos glaciares para o fornecimento de água potável torna-se problemática.

Os cenários traçados pelo PNUD para alertar os decisores que vão estar a negociar em Bali até 12 de Dezembro nem são os mais pessimistas. Partem de um aquecimento considerado "o limiar do perigo", no valor de dois graus acima dos valores existentes quando a industrialização começou. Mesmo assim, com graves consequências. Na perspectiva do PNUD, as mudanças climáticas põem em causa as expectativas de desenvolvimento e vão mesmo contrariá-lo. Isso acontecerá com a agricultura as colheitas, já fracas, diminuirão, levando à fome e ao êxodo. Com outras consequências: sabe-se que em regiões afectadas pela seca aumenta a desistência dos bancos escolares, o que vai afectar também o desenvolvimento dos países. A herança criada pelos países ricos tem de ser emendada por eles, defende o relatório.

Quioto pós-2012

O relatório deste ano assume-se como instrumento de pressão para que os países mais desenvolvidos e poluidores decidam metas mais exigentes no corte de emissões na conferência que tem lugar em em Bali, a partir do próximo dia 3.

Mais limites propostos

Em 2020, as emissões de gases com efeito de estufa pelos países desenvolvidos devem ser reduzidas em 30% e, em 2050, em pelo menos 80%. Os países em desenvolvimento devem fazer um corte de 20% até 2050. Mas os próximos dez anos são tidos como decisivos para não se atingir um ponto de não-retorno.

Margem já reduzida

As propostas avançadas admitem já como cenário inevitável um aumento de dois graus face à época pré-industrial que, se for excedido, dará lugar a "alterações climáticas perigosas".
Bolsa de carbono gasta

Se as emissões globais de CO ficassem estáveis ao nível de agora (29 gigatoneladas anuais) precisaríamos já, mesmo assim, de dois planetas para que essas emissões não mudassem o clima.

Ajuda e cooperação antes que seja tarde

in Jornal de Notícias

O relatório do PNUD chama a atenção para o facto de os países em desenvolvimento, por essa mesma característica, precisarem ainda de ter a sua quota parte de industrialização e, por isso, tenderem a aumentar as suas emissões. Mas isso, adverte-se no documento, deverá ser feito com maior recurso a energias limpas e a tecnologias que os países ricos têm obrigação de lhes facilitar. O canal terá de ser o da cooperação.

O modelo de desenvolvimento dos países ricos "é ecologicamente insustentável", segundo os peritos do PNUD, que referem a produção energética com base em centrais de carvão como dos exemplos mais graves de falta de eficiência e de contribuição para as emissões. E isto, quando a China em crescimento ainda não duplicou ainda a sua produção, o que deverá ocorrer em 2015.

Os doadores deveriam fazer com que os seus contributos fossem canalizados para a diminuição da pobreza (reduzindo assim a vulnerabilidade aos desastres) e proporcionar programas de adaptação das infra-estruturas às alterações climáticas, ajudando também com equipamento e saber na previsão meteorológica. A antecipação do risco é importante a ajuda humanitária numa catástrofe custa sete vezes mais que a sua prevenção.

Um em cada cinco alunos do secundário já consumiu droga

Catarina Gomes, in Jornal Público

Um em cada cinco alunos do ensino secundário admite que já consumiu droga alguma vez na vida, 88 por cento já beberam álcool e 55 por cento já fumaram, revelam dados preliminares do Inquérito Nacional em Meio Escolar de 2006 ontem divulgados no Parlamento por responsáveis do Instituto da Droga e Toxicodependência (IDT).

Os resultados finais do estudo serão divulgados em Dezembro mas Manuel Cardoso, membro do conselho de administração do IDT, avançou com alguns dados que indicam que o consumo de álcool, tabaco e droga tem vindo a diminuir desde 2003, tanto no terceiro ciclo (7.º, 8.º e 9.º anos) como no secundário (10.º ao 12.º anos).

Por exemplo, o número de jovens do secundário que consumiu bebidas alcoólicas pelo menos uma vez caiu de 92 para 88 por cento entre 2003 e 2006, enquanto o consumo de drogas desceu sete por cento, rondando os 20 por cento, escreve a Lusa. Também o tabaco regista uma diminuição entre os estudantes do secundário, passando de 68 para 56 por cento.

No terceiro ciclo, 60 por cento dos alunos já experimentaram bebidas alcoólicas, um valor que atingia os 68 por cento em 2003, enquanto o consumo de tabaco caiu dos 49 para os cerca de 35 por cento. No entanto, o consumo de drogas entre os alunos deste nível de escolaridade manteve-se praticamente inalterado, pouco acima dos dez por cento. A cannabis continua a ser a substância mais experimentada.

Analisando também alguns dados preliminares sobre um estudo sobre consumo de drogas na população em geral, Manuel Cardoso referiu que é dos 15 aos 24 anos que o aumento de consumo de drogas mais se verifica. Mas esse aumento não se reflecte, por exemplo, nas mortes por overdose em Portugal, grupo onde quase não há jovens, notou o presidente do IDT, João Goulão. Das 216 mortes relacionadas com droga (que não foi necessariamente a sua causa) no ano passado, cerca de metade resultaram de overdose, sendo o grupo mais representado o dos 35 aos 39 anos. com Lusa

Transmissão do vírus da sida de mãe para filho é cada vez mais residual em Portugal

Bárbara Simões e Catarina Gomes, in Jornal Público

Nos primeiros nove meses deste ano, o laboratório de referência registou um único caso de infecção por esta via

Portugal é dos países da Europa Ocidental com maior número de novo casos de HIV: 1418foram notificados entre Janeiro e Junho


É uma boa notícia num cenário que continua pouco animador. A queda drástica dos valores da transmissão do HIV de mãe para filho é hoje apontada como "um dos maiores sucessos" do combate à doença no país.

A transmissão vertical chegou a ser superior a 25 por cento - no início da década de 1990, mais de um quarto dos filhos de mães infectadas pelo vírus da imunodeficiência humana/sida eram também infectados. Em 2000, os valores situavam-se nos 3,8 por cento e, nos primeiros nove meses deste ano, não iam além de 0,5 por cento (um único caso em 195 recém-nascidos de mães portadoras de HIV analisados), uma percentagem que fora já alcançada em 2005.

Os números foram ontem apresentados pela investigadora Elizabeth Pádua, do Centro de Vigilância Epidemiológica das Doenças Transmissíveis (Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge), num workshop para jornalistas em Lisboa. Dizem respeito a 28 instituições de saúde nacionais, do continente e da Madeira, que aderiram a um protocolo laboratorial para estudo e diagnóstico da transmissão do HIV de mãe para filho.

O médico especialista em Medicina Interna Eugénio Teófilo (do Hospital dos Capuchos, em Lisboa) trabalha com a Maternidade Alfredo da Costa, também na capital, e confirma que não tem havido qualquer caso destes. "Estamos com zero por cento de transmissão [vertical]."

A regra é todas as grávidas serem testadas para o HIV/sida. Em caso de infecção, a forma de evitar a transmissão do vírus passa pelo tratamento com anti-retrovirais, o parto por cesariana e o aleitamento artificial.

Foi este procedimento preventivo sistemático que tornou possível aquilo que os especialistas não hesitam em classificar como "um dos maiores sucessos" do combate à doença, nas palavras de Elizabeth Pádua.

Mas Portugal continua a ser um dos países com maior número de declarações de novos casos de HIV/sida na Europa Ocidental. Entre Janeiro e Junho deste ano foram recebidas 1418 notificações.

Eugénio Teófilo justifica os números portugueses com "um défice de prevenção" e aproveita para criticar as campanhas que têm sido feitas, por "não serem apetecíveis em termos visuais", acrescentando que "muitos desdobráveis [sobre HIV/sida] usam português erudito que as pessoas não vão ler".

O médico lembra ainda que o aumento de doenças sexualmente transmissíveis, como a sífilis, indicia "o ressurgimento de comportamentos sexuais de risco".
Desde 2002, a população heterossexual infectada ultrapassou a de toxicodependentes nas notificações, sublinhou Elizabeth Pádua. No primeiro semestre deste ano, 54,7 por cento dos casos são heterossexuais que referem como forma provável de infecção a transmissão sexual.

Um dos problemas de Portugal "são os valores muito altos de casos de sida", o que significa que muitas pessoas são diagnosticadas quando já têm a doença depois de anos de evolução sem sintomas, diz Eugénio Teófilo. Como exemplo, aponta o caso de "homens que se infectaram nos anos 1980, nunca fizerem teste, e aparecem já com sida".

OCDE quer que Portugal aproveite as qualificações dos imigrantes

Bárbara Simões, in Jornal Público

Relatório sobre integração de estrangeiros no mercado de trabalho sublinha também necessidade de investir mais na educação das crianças


A Portugal dá muito emprego aos imigrantes. Paga-lhes é menos e ocupa-os em actividades que, em muitos casos, ficam bastante aquém das suas habilitações e competências. E este é um dos aspectos que a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) quer ver melhorados, como fica claro num relatório ontem apresentado em Lisboa.

O panorama pode ser traduzido para números. As taxas de actividade dos imigrantes são, no país, superiores às dos cidadãos nacionais. Dados relativos a 2005/2006 mostram que três quartos (75,4 por cento) dos homens estrangeiros estavam a trabalhar, quando os nascidos no país nessa situação não iam além de 73,6 por cento.
Em relação às mulheres, os valores eram de 63,1 (trabalhadoras imigrantes, com aquela que é a percentagem mais alta dos países da OCDE) e 61,8 (nacionais).

Mas, "muito embora grande parte dos imigrantes dos fluxos mais recentes possua qualificações elevadas, o mercado de trabalho português tem proporcionado a inserção laboral em ocupações de baixa qualificação, sobretudo no sector da construção civil", constata a OCDE.

Mais de 80 por cento dos imigrantes da Europa de Leste com habilitações superiores têm trabalhos para os quais estão sobrequalificados, por exemplo. E os estrangeiros ganham, em média, menos 20 por cento do que os portugueses, "que já de si têm salários baixos". Os imigrantes dos PALOP - sobretudo os de Cabo Verde - são particularmente afectados por esta discrepância.

O trabalho da OCDE sobre a integração dos imigrantes no mercado de trabalho em Portugal foi ontem apresentado pelo redactor principal do relatório, Thomas Liebig.
Em termos gerais, e atendendo a que a imigração (especialmente a qualificada e de cidadãos que não falam português) é recente no país, os técnicos da OCDE depararam-se com "resultados favoráveis", que em muitos aspectos ficam bem na comparação internacional.

Acolhimento "exemplar"

São elogiados, entre outros, o enfoque no acolhimento, a cooperação entre organismos e instituições, o papel do Alto-Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural e os Centros Nacionais de Apoio ao Imigrante.

Para o futuro, Thomas Liebig apontou vários desafios: aproveitar melhor as qualificações dos imigrantes e combater a imigração ilegal, mas também, por exemplo, investir mais na educação dos imigrantes de segunda geração, sub-representados no ensino pré-escolar e a exigir reforço do ensino da língua portuguesa.

O alto-comissário para a Imigração e Diálogo Intercultural, Rui Marques, tinha já resumido, no início da sessão, as recomendações a reter. E o ensino da língua portuguesa para quem não a tem como língua materna foi confirmado como uma das prioridades para os próximos anos. "Portugal quer ser exemplar no acolhimento aos imigrantes", disse no fim.

O trabalho sobre Portugal insere-se num conjunto de relatórios da OCDE para vários países. Austrália, Bélgica, Dinamarca, França, Alemanha e Suécia foram os primeiros.
A Associação dos Imigrantes dos Açores (AIPA) vai realizar um estudo para diagnosticar a situação laboral e apurar as necessidades de formação dos cerca de 5500 estrangeiros que residem no arquipélago. O trabalho será feito no próximo ano, ao abrigo de um protocolo, ontem assinado, entre a AIPA e a Direcção Regional do Trabalho e Qualificação Profissional.

O presidente da associação, Paulo Mendes, adianta que os imigrantes a viver nos Açores trabalham, na sua maioria, em "áreas muito instáveis" como a construção civil, a restauração e a pesca. Para o sociólogo, o conhecimento da realidade da comunidade imigrante nas ilhas irá contribuir para ultrapassar dificuldades, como vínculos laborais frágeis, incumprimento dos descontos para a Segurança Social pelas entidades empregadoras e necessidades de formação desta população. Lusa

Problema da produtividade portuguesa está nos serviços

Rui Mendonça, Ana Rita Faria, in Jornal Público

“Os serviços são maus e não têm a boa educação por regra”, defende Álvaro Santos Pereira, autor do livro “Os mitos da economia portuguesa”, lançado hoje em Lisboa. O grande problema da produtividade não é na indústria, mas nos serviços, uma área competitiva para Portugal, nomeadamente no turismo.

Por outro lado, em comparação com os restantes países europeus, o economista defende que o mito da baixa produtividade nacional é falso, visto que os seus índices se encontram num nível médio.

O também professor da Universidade de York destaca ainda a ideia errada de que Portugal está a viver a maior crise da sua história e de que Espanha é uma ameaça invasora.

Segundo Álvaro Santos Pereira, “Portugal está a viver uma crise, mas não está em recessão” e o principal desafio que enfrenta hoje é a concorrência da Europa de Leste, da China e da Índia.

Em relação ao “mito do perigo espanhol”, o economista desmonta-o afirmando que a Espanha é a quinta ou sexta investidora estrangeira em Portugal e que Portugal só beneficia em ter uma relação económica com o país vizinho.

Ao desmontar os 16 mitos que apresenta no seu livro, Álvaro Santos Pereira pretende “alertar o público para as ideias erradas que existem sobre a economia portuguesa, traduzindo o ‘economês’ numa linguagem corrente e crítica”.

Depois do lançamento de “Os mitos da economia portuguesa”, Álvaro Santos Pereira pretende regressar à Simon Fraser University, no Canadá, onde fez o seu doutoramento, para leccionar Economia e Desenvolvimento Económico.

Os mitos da economia portuguesa são:

1 – O mito das receitas mágicas

2 - O mito dos brancos costumes

3 - O mito da maior crise da história

4 - O mito dos salários baixos

5 - O mito do euro

6 - O mito da produtividade

7 - O mito da paixão educativa

8 - O mito das universidades

9 - O mito da Europa

10 - O mito do perigo espanhol

11 - O mito dos imigrantes

12 - O mito do país pobre

13 - O mito do “Mezzogiorno” português

14 - O mito da Califórnia da Europa

15 - O mito da independência madeirense

16 - O mito do país sem futuro

27.11.07

Programa para a inclusão já beneficia 40 mil

in Diário de Notícias

O Programa Escolhas Terceira Geração, que visa a inclusão social de crianças e jovens mais desfavorecidos, abrange já 40 mil beneficiários espalhados por 71 concelhos do país, anunciou ontem o ministro da Presidência, Pedro Silva Pereira. "A terceira geração do programa Escolhas é uma fase com maior ambição, tem mais investimentos. Passamos de cerca de 12 milhões de euros para 20 milhões de euros de investimentos."

Igreja Católica propõe "rede social da saúde"

in Jornal de Notícias

Saúde é áre ade intervenção social dos católicos


A Igreja Católica quer criar uma "rede social da saúde", que, com a cooperação entre organismos religiosos, públicos e privados, consiga dar um apoio à pessoa ao longo de toda a sua vida. A ideia foi lançada ontem, em Fátima, na abertura do 20.º Encontro Nacional da Pastoral da Saúde, partindo da constatação de que as limitações das várias instituições que trabalham no terreno podem ser compensadas com um reforço da colaboração, criando "pontes entre as comunidades cristãs e os centros de saúde ou outras unidades de serviço às pessoas".

"Não se pretende interferir nas decisões das pessoas, mas, consoante as suas decisões de vida, procuramos levá-las a um quadro de felicidade", explicou o padre Vítor Feytor Pinto, coordenador da Comissão Nacional da Pastoral da Saúde. Lembrou, a propósito, as experiências dos Centros de Apoio à Vida, que acompanham famílias e oferecem apoio à maternidade, trabalho para o qual é necessário "uma maior cooperação com o Estado e outras organizações não governamentais no terreno". Tal como acontece com a "Rede Social".

Prometendo a definição de linhas orientadoras de boas práticas sem juízo moral preconcebido, Feytor Pinto defendeu a aposta das instituições católicas numa "relação ecuménica e inter-religiosa" com a sociedade. "Não temos uma nova evangelização se não tivermos um espírito de abertura a toda a gente".

O encontro permitiu ainda abordar a necessidade de reforçar o apoio à família e a mães em dificuldade para evitar o aumento de abortos. Em defesa da ideia, o presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social, D. José Alves, avançou o argumento do envelhecimento da população. "Se não houver natalidade em Portugal, os problemas que daí sobrevêm são muito grandes".

Esta determinação inscreve-se na defesa de "novas práticas de intervenção pastoral no que à saúde diz respeito, quer no início da vida, quer no seu termo, sem deixar de criar laços com todas as estruturas" no terreno.

Quase 500 jovens foram vítimas de abusos até Junho deste ano

Alexandra Marques, in Jornal de Notícias

A violência sobre os mais novos continua a assumir proporções preocupantes


No primeiro semestre de 2007, 474 crianças e jovens foram atendidos pela Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) por terem sido submetidos a várias formas de violência. Em casa, na rua ou na escola. Destes, 56% foram alvo de maus tratos psicológicos e físicos e quase 10% submetidos a ameaças e coacção.

Segundo a listagem da APAV, até ao final de Junho, cerca de 8% das crianças e jovens atendidos nos gabinetes da organização, foram vítimas de agressões e de abuso sexual.

Os números tornam-se ainda mais assustadores ao somar-se o total de crimes concretizados contra crianças e jovens desde 2001. Cerca de 5.850 situações assinaladas, a esmagadora maioria dentro da casa onde vivem.

"O ambiente familiar que deveria ser o mais seguro para qualquer criança ou jovem revela-se frequentemente muito perigoso", diz a nota emitida ontem à tarde.

"As crianças e jovens atendidos e apoiados pela APAV foram, na sua maioria, vítimas de crimes no âmbito da violência doméstica (cerca de 5.367 crimes)", refere o texto de suporte às estatísticas.

Preocupante e um dos alertas deixados a pais e educadores em geral é também o fenómeno de crescente expansão dos locais em que os crimes de intimidação ou violência sobre os menores de idade ocorrem.

"Nos últimos anos, tem-se revelado a existência de outras formas de vtimação infantil e juvenil em contextos como a escola, a rua e a Internet", adverte a APAV.

Numa tentativa de diminuir as ocorrências, a APAV lança hoje, numa escola básica de Lisboa, um website que tem por objectivo explicar e prevenir que estas formas de violência.

Site escalonado por idades

O site www.apav.pt/apavj estará disponível a partir de hoje e nele é explicado aos mais novos como devem reagir perante situações constrangedoras e como se podem proteger de ameaças que recebam através da Internet ou através mensagens escritas no telemóvel.

O portal está concebido e a informação é disponibilizada para crianças com menos de oito anos, entre os oito e os 13 e mais idade, aconselhando a melhor forma de denúncia da situação junto de um professor, um amigo mais velho, um familiar ou quem esteja por perto e possa ajudar.

Para o jovem entender se está a ser alvo de chantagem ou de qualquer forma de violência, são relatadas histórias verídicas, já ocorridas, para que seja mais se identificar com a situação.

Também é referida a maneira de procurar ajuda junto dos serviços da APAV - por exemplo pela Internet - sendo por isso um meio interactivo que permite pedir apoio em tempo útil.

O portal, realizado no âmbito do projecto MUSAS II, co-financiado pela Comissão Europeia, contém igualmente uma área dirigida especialmente a pais e educadores, em que se adverte para as consequências da vitimação e se sensibiliza os adultos para esta problemática.

A maioria das vítimas é do sexo feminino


Os dados relativos ao género demonstram que 58% (202) dos menores que foram vítimas de crimes no primeiro semestre de 2007, pertencem ao sexo feminino.

85 vítimas tinham menos de cinco anos de idade Na tabela referente à idade das vítimas, 35 tinham entre zero e três anos e 50 entre quatro e cinco anos. Num total de 346 casos, 100 eram crianças entre os seis e os dez anos e 161 foram jovens entre 11 e 17 anos.

Ligeiro aumento entre 2005 e 2006

A comparação dos números totais de crimes cometidos contra crianças e jovens são elucidativos quanto a um ligeiro aumento ocorrido nos casos atendidos. Registaram-se 522 em 2005 e 560 em 2006.

Violência doméstica encabeça crimes

Os crimes de violência doméstica continuam a ser os que mais vítimas provocam entre os menores. Além dos maus tratos psíquicos e físicos, desta tabela constam os crimes de ameaças e coacção, abuso sexual e violação e outras agressões em meio familiar.

"Bullying" lidera crimes fora de casa da vítima

Até Junho, as ofensas à integridade física e intimidação em meio escolar ou na rua foram os crimes contra menores mais ocorridos fora de casa.

Aumento dos salários em Portugal será de 3,5%

in Jornal de Notícias

Os salários médios, em Portugal, devem aumentar 3,5% no próximo ano, uma décima acima do aumento médio salarial estimado para a Europa Ocidental (3,4%), conclui um relatório da consultora internacional Mercer.

O estudo da Mercer, sobre as tendências salariais a nível mundial prevê, ainda, que a inflação no nosso país se situe nos 2,3%, em 2008, algumas décimas acima da previsão de 2,1% do Governo. Se assim for, o país falha a meta de inflação definida no Orçamento do Executivo para o próximo ano, uma tendência que se tem mantido, pelo menos, nos últimos dez anos. Uma análise da agência Lusa, com base em dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), conclui que, desde 1998, a taxa de inflação estimada nunca foi a realmente verificada. Caso isso se volte a verificar em 2007, o Governo falhará as previsões da taxa de inflação pelo décimo ano consecutivo.

Pelas contas da Lusa, se os preços se mantiverem constantes nos últimos dois meses do ano, a taxa de inflação será de 2,4%, quando a previsão no OE para este ano é de 2,1%. A estimativa é que a inflação real fique 0,3 pontos percentuais acima do valor calculado pelo Governo.

Por outro lado, com base na conclusão do estudo da Mercer, de que a inflação será de 2,3%, em 2008, e que a subida salarial média será de 3,5%, o aumento real dos salários no próximo ano, será 1,2 pontos percentuais acima da inflação.

A Mercer analisou 62 países e estima que nos 19 países da Europa Ocidental, entre os quais Portugal, os salários cresçam em média 3,4%, 1,3 pontos percentuais acima da inflação prevista para esta a região da Europa. O aumento salarial médio previsto para Portugal é superior ao de Itália e Reino Unido (3,1%), França e Holanda (3%) e Alemanha (2,7%). A Irlanda é o país da Europa Ocidental com o maior aumento salarial (4,7%).

Matosinhos adere hoje a projecto-piloto de combate ao insucesso escolar

Samuel Silva, in Jornal Público
Câmara e Empresários pela Inclusão Social assinam protocolo esta manhã. Rede de mediadores começa a trabalhar em Janeiro com os alunos em risco


A Câmara de Matosinhos assina hoje um protocolo de colaboração com a associação de Empresários pela Inclusão Social (EIS) com o objectivo de combater o insucesso e o abandono escolar no concelho. A parceria tem em vista a implementação de um projecto-piloto nas escolas locais que pretende criar uma rede de mediadores profissionais capaz de intervir junto dos alunos em risco.

A rede será constituída por professores, sociólogos e psicólogos, que vão intervir junto dos alunos em risco e das suas famílias, apostando em prevenir e corrigir situações potencias de abandono e de insucesso académico. O projecto-piloto vai ser realizado este ano lectivo e destina-se aos alunos do 3.º ciclo do Ensino Básico (7.º, 8.º e 9.º anos).

Matosinhos é um concelho com forte incidência de abandono escolar. Em 2006, 2,7 por cento dos alunos do 3.º ciclo abandonaram os estudos e quase metade desses fê-lo ainda no 7.º ano. No que toca ao sucesso escolar, os números concelhios também não são animadores: 22 por cento dos estudantes do último ciclo do ensino obrigatório não transitaram de ano em 2005/2006. A EIS estima que 10 por cento dos estudantes de Matosinhos venham a ser integrados no programa hoje apresentado.

A EIS compromete-se a financiar 50 por cento dos custos operacionais da rede de mediadores, cabendo à autarquia assegurar a outra metade do orçamento da iniciativa. A partir de Janeiro, o projecto entra em fase de execução, sendo apresentado às escolas, começando também a formação dos mediadores.

Noutro âmbito, a autarquia e as escolas de Matosinhos assinaram ontem um protocolo de colaboração que prevê a atribuição, por parte do município, de 1,7 milhões de euros para contratação de tarefeiras, apoio às actividades de enriquecimento pedagógico e funcionamento das bibliotecas escolares. O presidente da câmara, Guilherme Pinto, sublinha "a importância que é dada à Educação" em Matosinhos e a preocupação de reunir "todas as condições para que as crianças tenham um bom ano lectivo".

No ano passado as mortes relacionadas com droga mantinham-se acima de 200

Ana Cristina Pereira, in Jornal Público

Cannabis permanece a substância ilícita mais consumida e mais apreendida. Como sucede em toda a Europa, com a valorização do euro face ao dólar, a cocaína manteve a sua escalada


Depois da subida acentuada de 2005, Portugal não conseguiu recuar nas mortes relacionadas com substâncias ilícitas. No ano passado, tal como no ano anterior, dia sim, dia não, o Instituto Nacional de Medicina Legal registou uma morte desta natureza, indica o Relatório sobre a Situação do País em Matéria de Drogas e Toxicodependências, que é hoje à tarde apresentado na Assembleia da República.

Por haver mais hipóteses de tratamento, mas também por se terem multiplicado os programas de redução de danos, à semelhança de outros países europeus, Portugal iniciou uma tendência decrescente em 2000 - 369 casos em 1999, 318 em 2000, 280 em 2001, 156 casos em 2002, 153 em 2003, 156 casos em 2004. Depois do disparo ocorrido em 2005 (219), a diminuição de 2006 (216) soa tão ligeira que o presidente do Instituto da Droga e da Toxicodependência (IDT), João Goulão, a qualifica de insignificante. Fala em consolidação.

O médico considera o número de mortes "muito elevado". Salienta, todavia, que esta estatística inclui todos os exames toxicológicos que deram positivo, isto é, todas as mortes com testes que indicam vestígio de consumo de substâncias psicoactivas. As mortes por overdose representam 52 por cento deste universo.

O reparo de João Goulão serve para relativizar a posição de Portugal no ranking europeu. Segundo o relatório anual do Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência (OEDT), que foi apresentado a semana passada em Bruxelas e hoje é dado a conhecer em versão resumida no Parlamento, só o Reino Unido (3161), a Alemanha (1329), a Itália (603), a Grécia (284) e a Dinamarca (275) apresentam mais mortes do que Portugal em 2005. "Alguns países só reportam as mortes por overdose, não as outras", sublinha.

Cocaína ainda sobe

O relatório anual não tratá grandes surpresas em matéria de tráfico e consumo. A cannabis permanece a substância ilícita mais consumida em Portugal, sem que se tenha verificado "uma subida significativa dos consumos" como em anos anteriores, adianta João Goulão. Esta é, também, pelo quinto ano consecutivo, a droga mais apreendida.
A cocaína prossegue a sua escalada, como acontece um pouco por toda a Europa. Até pela valorização do euro face ao dólar - como a semana passada explicava Paul Griffiths, coordenador científico do OEDT, em Bruxelas - a Europa converteu-se no mercado mais apetecível para quem negoceia a venda desta substância a partir da América do Sul. E Portugal numa das suas principais portas de entrada.

De resto, apesar do aumento da produção de ópio no Afeganistão, e de heroína no mercado nacional, o consumo desta droga está estabilizado em Portugal. Esta é ainda a substância de uso mais referida como principal pelos toxicodependentes em tratamento. E é também a mais associada aos casos de morte registados no país (133).

Portugal em 29º no índice de desenvolvimento humano da ONU

in Diário Digital

Portugal caiu uma posição no índice de desenvolvimento humano das Nações Unidas, situando-se na 29ª posição, atrás de países como a Eslovénia, Grécia ou Singapura, revela o relatório 2007/2008 da organização.

Portugal consegue 0,89 pontos num ranking que analisa dados relativos a 2005 em 177 países e regiões especiais e que é liderado pela Islândia com 0,96 pontos, revela o relatório de Desenvolvimento Humano de 2007 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) hoje publicado.

Entre os estados-membros da União Europeia, Portugal ocupa a 17ª posição no índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que avalia o estado do desenvolvimento através da esperança média de vida, da alfabetização dos adultos e da escolarização, bem como indicadores de rendimento.

Irlanda (5º), Grécia (24º), Eslovénia (27º) e Chipre (28º) são países da União Europeia à frente de Portugal, para além dos países nórdicos e das potências europeias Espanha, França, Alemanha, Itália e Reino Unido.

Atrás de Portugal, que integra a lista dos 70 países com desenvolvimento humano «elevado» contam-se estados-membros da UE como a Polónia, a Húngria ou a Bulgária e países do resto do mundo como os Emirados Arabes Unidos, México, Rússia ou Brasil (o último da lista dos países com desenvolvimento elevado).

A taxa de escolarização bruta combinada dos ensinos primário, secundário e superior atinge os 89,8 por cento em Portugal, que viu aumentar de 92 por cento em 2004 para 93,8 por cento em 2005 a taxa de alfabetização de adultos.

A esperança de vida em Portugal situava-se em 2005 nos 77,7 anos e o valor do Produto Interno Bruto era de 20,4 dólares PPC (paridade poder de compra) per capita.

Em termos gerais, a Islândia, com 0,96 pontos, ultrapassou a Noruega que foi número um no ranking nos últimos seis anos.

Vinte e dois países, todos da África Subsahariana, estão classificados na categoria de países com «desenvolvimento humano baixo», sendo que em dez destes países, duas em cada dez crianças não atingirão os 40 anos, revela o relatório.

Pelo contrário, entre os 20 países de topo da lista, apenas a Dinamarca e os Estados Unidos terão menos de 9 crianças em 10 a atingir a idade de 60.

Na maior parte dos países, incluindo a China, a Índia, e o Brasil, o IDH subiu nos últimos 30 anos, mas alguns países apresentam retrocessos neste âmbito.

Ao todo, 16 países têm hoje um IDH menor do que em 1990 e três destes países - a República Democrática do Congo, a Zâmbia, e o Zimbabué- têm um IDH mais baixo do que tinham em 1975.

O índice analisa as estatísticas de 2005 de 175 países membros das Nações Unidas, juntamente com Hong Kong (Região Administrativa Especial da China), e os Territórios Ocupados da Palestina.

Este ano não estão incluídos 17 estados membros das Nações Unidas, entre os quais o Afeganistão, o Iraque e a Somália, devido à insuficiência de dados fidedignos.

Diário Digital / Lusa

26.11.07

Sócrates diz-se campeão das políticas sociais

Nelson Morais, in Jornal de Notícias

Líder do PS confessou "saudades de ser tratado por camarada"


Oprimeiro-ministro, José Sócrates, afirmou, ontem, que não se recorda de um Governo que, nos últimos 30 anos, "tivesse desenvolvido tanto as políticas sociais como este Governo do PS".

No dia em que o histórico socialista Mário Soares manifestou o desejo de que o PS se volte "agora um bocadinho mais para a esquerda", Sócrates foi a Coimbra defender que a política social de-senvolvida pelo Governo posicionam-no "à altura daquilo que é a tradição do Partido Socialista".

Sem alusões directas ao recado de Soares, o discurso do actual secretário-geral do PS começou com um curioso comentário à forma como acabara de ser tratado pelo presidente federação socialista de Coimbra, Vítor Baptista. "Tinha saudades de ser tratado por camarada", confessou Sócrates, perante cerca de três de centenas de militantes de Coimbra.

O primeiro-ministro passou em revista a actuação do Governo, mas introduzindo, constantemente, o tema das preocupações sociais. "Baixámos a despesa corrente primária (...). Não é uma perspectiva de esquerda?", questionou, ao aludir à redução do défice público de 6,1% para 2%, em menos de três anos.

Sobre a "nova geração de políticas sociais", Sócrates destacou o complemento solidário para idosos, que beneficiará cerca de 50 mil portugueses com mais de 65 anos, a partir de 2008. "Será a maior operação de combate à pobreza feita em Portugal, depois do rendimento mínimo garantido", afiançou, acerca do complemento que garantirá um rendimento mínimo de 380 euros aos idosos mais carenciados.

O abono pré-natal (100 euros) para jovens grávidas, a duplicação das deduções (IRS) por pais de filhos com menos de três anos, a cobertura de 33% do território com creches e a reforma da segurança social foram as outras medidas de índole social que Sócrates invocou, para se dizer orientado por "uma concepção de esquerda democrática, reformista, de progresso".

Chegaram a Tenerife mais 230 imigrantes

in Jornal de Notícias

Fluxo da imigração está em deslocação para este do Mediterrâneo


Chegaram às costas de Tenerife, Espanha, mais 230 imigrantes clandestinos em duas frágeis embarcações. Aumentam as operações de vigilância da Agência Europeia de Fronteiras, mas nada parece impedir que os imigrantes procurem o seu eldorado, mesmo quando as condições meteorológicas são já, nesta altura do ano, muito adversas.

Primeiro foi um "cayuco" com 170 ilegais a bordo que aportou, pelos seus próprios meios, em Los Abrigos. De acordo com as autoridades 15 dos passageiros poderão ser menores de idade. Um dos adultos foi transferido para um centro hospitalar, enquanto os restantes foram conduzidos para a esquadra da Polícia em Playa de las Américas, no município de Arona.

Já de madrugada, um segundo "cayuco", com 50 pessoas bordo, alcançou a costa canária. O barco navegou sob vigilância da embarcação "Conde de Gondomar", do Salvamento Marítimo, e uma patrulha da Guarda Civil. Os ocupantes deste "cayuco" tiveram de ser transferidos para a embarcação do Salvamento Marítimo, devido às más condições do mar, de acordo com fontes da Delegação do Governo nas Canárias. As mesmas fontes adiantam que a embarcação foi avistada por um veleiro francês na sexta-feira passada, a cerca de 300 milhas a sul da ilha de Hierro.

Estes números escapam aos revelados na passada terça-feira, dia em que o Frontex, a Agência Europeia de Fronteiras, deu por concluída a sua primeira missão em águas mediterrâneas espanholas, depois de interceptar, em apenas um mês, 305 imigrantes e 28 embarcações nas costas de Granda, Almeria e Murcia. A "Operação Indalo", que se desenvolveu em colaboração com sete países europeus, Portugal incluído, é a primeira em águas mediterrâneas espanholas, já que as anteriores tiveram lugar no Atlântico, frente às costas da Mauritânia e do Senegal.

A missão do Frontex, um órgão financiado pela União Europeia, começou a 30 de Outubro e terminou no passado dia 29 e tinha por objectivo controlar as fronteiras marítimas desde o sudeste peninsular.

Ikka Laitinen, director da agência, reconhece, que desde que o Frontex entrou em acção, os fluxos da imigração estão a deslocar-se de oeste para este do Mediterrâneo. Daí que centenas de imigrantes que antes tentavam a sua sorte num "cayuco "na Mauritânia ou no Senegal rumo às ilhas Canárias, prefiram agora deslocar-se por terra até à Líbia e ao Egipto e daí dar o salto para a Europa.

"Salário mínimo nos 500 euros pode gerar mais desemprego"

Natália Faria, in Jornal Público

O responsável associativo do sector têxtil quer alteração do regime de horários e de pagamentos para facilitar a vida das empresas


A O desemprego vai aumentar, caso o Governo insista em aumentar o salário mínimo nacional até aos 500 euros em 2011 sem avançar com contrapartidas para as empresas. Quem o diz é Paulo Nunes de Almeida, vice-presidente da Confederação da Indústria Portuguesa e presidente da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal.

PÚBLICO - Numa altura em que todos parecem concordar que Portugal não deve continuar a competir com base no argumento da mão-de-obra barata, que sentido faz que a ATP queira que o Governo ponha travão às expectativas de aumento do salário mínimo até aos 500 euros em 2011?

PAULO NUNES DE ALMEIDA - A ATP não quer colocar um travão relativamente à questão do aumento do salário mínimo. Em princípio, o Governo vai decidir em Dezembro o que fazer em relação ao salário mínimo e já disse que quer que essa decisão, por um lado, obtenha o acordo dos parceiros sociais e, por outro, siga o acordo celebrado o ano passado e que coloca os 450 euros como montante a atingir em 2009. Parte-se de um valor de 403 euros em 2007 para os 450 euros em 2009, ou seja, dois anos depois. Isso faz com que os aumentos anuais sejam superiores a cinco por cento, quando o Governo propõe para os funcionários públicos 2,1 por cento e para as pensões, inclusivamente para as mais baixas, um aumento que não passa dos 2,4 por cento. Ora, no referido acordo estava dito - e foi por isso que a CIP o assinou - que teriam que ser introduzidos mecanismos que, nos sectores e nas regiões mais expostas à concorrência internacional, permitissem às empresas ganhos de produtividade para poderem incorporar esses aumentos superiores à inflação e aos aumentos que o próprio Governo definiu para a função pública.

É nesses mecanismos que incluem a proposta de supressão de alguns feriados?

Sim. Portugal tem dois feriados a mais do que a média da União Europeia, portanto justifica-se reduzir o número de feriados. Também defendemos que deve ser colocado um tecto nas indemnizações por despedimento. O despedimento em Portugal é caro. Pretendíamos também que aquela regra dos 20 por cento de redução de efectivos para que as pessoas tenham direito ao subsídio de desemprego se tratasse não de redução de 20 por cento em termos brutos mas em termos líquidos. Porquê? Porque, na maior parte das vezes, as empresas não querem despedir pessoas, querem é reconverter os seus recursos humanos.

Mas não faria mais sentido facilitar a reconversão profissional da mão-de-obra?

Por isso é que uma das propostas que fizemos - e que foi a única que até hoje teve vencimento, porque dependia apenas de duas das maiores associações do sector têxtil - foi a fusão dos dois centros de formação têxtil. Mas temos que partir do princípio que há pessoas que, por muito que se invista na sua formação, já não conseguem entrar no comboio do século XXI onde as nossas empresas estão posicionadas.

O que se faz a estas pessoas?

Outra das propostas que defendemos é a criação para a região do Vale do Ave e do Vale do Cávado de um fundo de ajustamento à globalização. É um fundo financiado por capitais comunitários que, em França, foi há dois ou três meses aplicado ao sector automóvel, precisamente para amortecer o impacto social que a globalização tem nas empresas. Não podemos aceitar a globalização como a Europa, aceita abrindo as suas fronteiras, e depois não perceber que os fundos comunitários têm que ter uma componente de apoio social às pessoas com menos formação que caiam no desemprego.

Mas esse apoio assumiria a forma de subsídio?

A ideia seria que este fundo de ajustamento apoie as pessoas que em processos de reestruturação caiam no desemprego, não numa óptica assistencialista, mas tentando reconverter essas pessoas de modo a que elas possam inserir-se noutras actividades onde o nível de qualificações exigido não é tão grande. Ao mesmo tempo, o fundo poderia permitir que alguns pudessem inclusive criar o seu próprio emprego. Obviamente que, no limite, se houver pessoas que de forma alguma possam reentrar no mercado de trabalho, o Estado tem uma obrigação de as apoiar.

No que toca os horários, qual seria a ideia? Adequar a carga horária às solicitações em termos de encomendas?

Com os limites que têm sempre que existir e que têm a ver com a vida particular e familiar das pessoas.

Não era obrigar as pessoas a trabalharem 15 horas por dia quando é preciso e, no momento seguinte, ficarem em casa?

Não é. Até porque nós empresários sabemos por experiência própria que, a partir de determinado tempo extra, a produtividade acaba por ser extremamente reduzida e, portanto, não compensa. Agora, quando uma encomenda me é colocada e eu tenho que responder de forma rápida, o meu cliente não aceita que eu aumente o meu preço pelo facto de ter que recorrer a horas extraordinárias. As horas extras são caras e, portanto, nós temos que criar um mecanismo em que essas horas a mais possam ser compensadas nos períodos em que a empresa tem menos trabalho. O grande objectivo de um empresário é ter uma empresa com um conjunto de dinâmicas internas e externas que lhe permitam posicionar-se perante um mercado muito competitivo. Não podemos é continuar sujeitos a uma legislação que continua agarrada a tempos que não são os tempos actuais.

É nesse sentido que propõem também o fim dos subsídios de férias e de Natal?

O que propomos é que haja um ordenado anual dividido por 12 meses. Para isso, bastaria ver qual é o rendimento anual da pessoa e, em vez de dividi-lo por 14 meses, dividi-lo por 12. Não há aqui qualquer redução de vencimentos. Quais são as vantagens? Primeiro a gestão da tesouraria das empresas. Em segundo, o próprio planeamento familiar das pessoas ficava muito mais organizado: as pessoas pagam 12 rendas de casa, 12 prestações ao banco...

Mas por que é que, em nome da competitividade das empresas, se tem que sacrificar os trabalhadores, cujos salários são dos mais baixos da Europa?

Não são. Neste momento, o nível do salário mínimo em Portugal está a meio da Europa a 27. O salário mínimo de 403 euros é pouco, mas é pago 14 vezes e não 12, ao contrário do que se passa noutros países da Europa a 27.

Se compararmos com Espanha...

O que é facto é que estamos a meio da tabela e, para podermos ter aumentos salariais acima da taxa de inflação, tem que haver contrapartidas para as empresas. E o que queremos saber é quais são as contrapartidas que o Governo tem em cima da mesa para podermos avançar. Temos em cima da mesa um acordo celebrado em Janeiro do ano passado e, passados dez meses, quero saber quais foram as medidas tomadas para que os sectores e as regiões possam ser apoiadas neste sacrifício de incorporar aumentos superiores à taxa de inflação. Só depois disso é que podemos tomar uma decisão.

Quais seriam as consequências para as empresas de aumentos superiores à taxa de inflação?

Se obrigamos as empresas a aumentar os salários para além daquilo que é possível, sem lhes criar contrapartidas que lhes permitam ser competitivas, vai haver um aumento do desemprego. Isso só não se verifica agora porque a emigração está a compensar esse aumento. Mas também tenho consciência de que, a muito curto prazo, vamos ter dificuldades em encontrar mão-de-obra disponível. Repare: não somos favoráveis a uma política de baixos salários; somos é favoráveis a uma política de salários que as empresas possam incorporar e para isso tem que se reduzir os custos de contexto.

O Governo devia baixar a carga fiscal das empresas?

Sobre as questões fiscais é óbvio que temos que reduzir impostos. Acho que o Governo fez bem em, neste Orçamento, não ter avançado ainda para uma redução de impostos. Já fiquei menos satisfeito quando ouvi o ministro das Finanças dizer que só pensa mexer nos impostos quando o défice atingir um montante próximo do zero. Eu tinha a expectativa que pudesse haver já em 2008 uma redução fundamentalmente a nível de IVA e de IRC. Talvez mais a nível de IVA, porque temos aqui uma grande decalage em relação ao mercado espanhol e estamos a sofrer muito com essa diferença.

Sócrates diz que desemprego é "o problema mais sério"

in Jornal Público

Durante cerca de uma hora, o primeiro-ministro, José Sócrates, fez um balanço de dois anos e meio de mandato. Aconteceu ontem, num plenário com militantes do PS, num hotel de Coimbra. Sócrates disse que o desemprego é o "problema mais sério que o país enfrenta". Mas lembrou que desde 2005 foram criados 105,9 mil novos postos de trabalho.

"Desde 1998 que não tínhamos tantos portugueses a trabalhar. A economia está a gerar empregos", sublinhou o secretário-geral socialista. José Sócrates considerou que os quatro pontos principais da sua acção governativa têm sido o esforço na contenção do défice orçamental, na retoma do crescimento económico, na Educação e a aposta numa nova geração de políticas sociais.

"Não me recordo de dois anos em que se tenha feito tanto nas políticas sociais, como nestes últimos", referiu.

O governante explicou aos militantes que "ainda este ano, em 2007, o PS no Governo porá as contas públicas em ordem e o défice orçamental estará finalmente contido dentro dos limites dos acordos internacionais do país".

Sócrates defendeu ainda que "as reformas eram indispensáveis em Portugal" e sublinhou que o crescimento económico de 2007, com uma taxa de 1,8 por cento, foi o maior dos últimos cinco anos.

"O crescimento económico ainda não é aquilo que desejamos, mas é um crescimento sustentado. Estamos a melhorar ano após ano e em 2008 esperamos crescer acima dos dois por cento."

O programa Novas Oportunidades, confessou, foi aquele que "mais orgulho" lhe deu.
Há 300 mil portugueses actualmente inscritos para adquirir uma dupla certificação, disse. "Essas pessoas são exemplos de coragem, esforço e dedicação."

Ao nível das políticas sociais, o dirigente socialista destacou a reforma da Segurança Social e o complemento solidário - que abrange 50 mil idosos, alguns dos quais com um apoio de mais 100 euros por mês, a acrescentar à pensão.

25.11.07

Para que é que serveo Plano Tecnológico?

Francisco Jaime Quesado*, in Jornal de Notícias

O Plano Tecnológico cumpre dois anos. Numa altura em que o nosso país se debate com decisões estratégicas em torno do futuro da sua competitividade, a oportunidade para algumas reflexões sobre os novos desafios que mais do que nunca estão em cima da mesa. Um tempo novo suscita novos paradigmas e daí a necessidade de, olhando para trás, para a realidade do que foi feito, formular novas pistas de actuação. Consolidar os bons resultados, desenvolver novas soluções para o que correu menos bem.

O novo ciclo que o Plano Tecnológico, ao fim destes dois anos de implantação, deve protagonizar tem de se assumir acima de tudo como um fórum aberto de clarificação das apostas concretas que a política pública, em articulação com os diferentes actores da sociedade civil, deve definir em sede do modelo de desenvolvimento económico e social para o território. Não se pode ter mais do mesmo e o tempo é de mudança, ao nível da definição dos pólos de competitividade que devem ser seleccionados e dos recursos efectivos que devem ser alocados a uma estratégia voltada para a criação de valor centrada na inovação e conhecimento.

O diagnóstico é claro. Não há outro caminho a seguir. Neste sentido, a análise atenta do que se tem passado no nosso país suscita conclusões muito claras

- O modelo de criação de valor na maior parte dos sectores económicos do país continua a enfermar da falta de "leitura" estratégica dos novos drivers do crescimento - a "mecânica" de Porter e de outros discípulos da competitividade ainda não está suficientemente internalizada na prática da maior parte das empresas que a montante (utilização de recursos) e jusante (integração nos circuitos comerciais internacionais) patenteiam ainda falhas estruturais incompreensíveis;

- A dimensão social do paradigma nacional está esgotada. Novos desafios exigem soluções pragmáticas e claramente que a integração social e fomento da empregabilidade, próprios duma sociedade justa e equilibrada, têm de assentar na sustentabilidade do mercado económico e não (apenas) em dinâmicas artificiais de política pública meramente conjunturais. A justiça social potenciada pelo emprego tem que assentar na capacidade dos actores sociais criarem aquilo que recebem, para que o sistema funcione de forma sustentada;

- A aposta na Inovação Tecnológica tem de ser lida a partir do mercado e da fase final da cadeia de valor. Criar novos produtos e serviços, melhorar processos, qualificar a utilização dos circuitos internacionais, dando-lhes dimensão e escala, é o caminho exigido por quem procura. Continua a haver uma utilização inadequada de recursos e esforço em I&D a partir da oferta, quando o pragmatismo da Economia Global o que exige é respostas claras, atempadas e marcadas pela criatividade.

- A relação dos cidadãos com o Estado tem de, duma vez por todas, ser clara, transparente e eficaz. Numa sociedade sem tempo, exigem-se respostas rápidas, simples e sobretudo potenciadoras do "valor" mais importante que é a noção da qualidade de vida no exercício do direito da cidadania. Por isso, importa qualificar e sustentar essa relação, cabendo ao Estado o papel central de criação das condições de salvaguarda dessa relação.

A prioridade está claramente na execução. Importa agora, mais do que nunca, criar as condições de efectiva implantação em cada um dos países dos objectivos propostos e sobretudo dar aos diferentes protagonistas da sociedade civil (empresas, universidades, centros de inovação) as condições práticas de efectiva operacionalização das suas diferentes acções.

Há um tempo novo para o "Plano Tecnológico". Um desafio global de todos os que ainda acreditam num Portugal para o futuro. Uma oportunidade, única e decisiva, de construir uma rede global que faça deste país um admirável mundo novo onde vale a pena viver.

* Gestor do Programa Operacional Sociedade do Conhecimento

País assimétrico precisa de uma reforma social

Alexandra Serôdio, in Jornal de Notícias

Ao longo de vários meses uma equipa de cerca de 100 pessoas inventariou todos os equipamentos


O desenvolvimento de Portugal "não foi acompanhado do apoio às populações", e por isso o país apresenta hoje "assimetrias muitíssimo acentuadas". O rendimento per capita "é muito baixo" e a desertificação "tende a aumentar".

Estas são algumas conclusões resultantes de um estudo que faz a caracterização social, económica e cultural das freguesias de Portugal. O livro, lançado ontem em Fátima, à margem da Assembleia Geral da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS), analisa 900 freguesias de Norte a Sul e aponta para "a necessidade urgente de uma reforma do serviço social".

Isabel Monteiro, que liderou a equipa de mais de 100 pessoas que esteve no terreno, garante que este estudo "é uma ferramenta muito importante" colocada "à disposição de todos". Apesar do trabalho ter sido concluído entre 2003 e 2004, a vogal do conselho directivo da CNIS garante que "está cada vez mais actual".

O alcoolismo, o analfabetismo - "é muito evidente" - a saúde e o envelhecimento da população, são alguns dos problemas detectados nas freguesias estudadas. Isabel Monteiro alerta ainda para o problema da solidão "que é transversal, atingindo todas as camadas etárias, desde as crianças até aos mais velhos".

No elencar dos vastos problemas detectados pelos técnicos, a responsável realça ainda o insucesso escolar. "Foi possível verificar que este assunto está bastante ligado à violência familiar e à desestruturação das próprias famílias", explicou realçando que "hoje em dia as pessoas já falam abertamente deste assunto".

A pobreza "é também acentuada" e quando se fala de habitação, a diferença entre as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto e o interior do país "não é muito grande". "Há muita gente a viver em barracas, nas grandes cidades, mas há no interior quem viva em casas sem água, luz ou rede de esgotos", realçou.

O livro apresenta também proposta de actuação. "É necessários que as instituições intervenham mais na família e no meio", admite Isabel Monteiro.

Lino Maia, presidente da CNIS, está preocupado com a desertificação do interior e admite que o sector social pode ajudar a minorar o problema, dando trabalho aos desempregados.

Ministério estuda propostas para travar "fecho" de ATL

O presidente da CNIS defendeu ontem que "uma boa articulação" entre as várias instituições de solidariedade e o Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social "pode ajudar a resolver o problema" dos 850 espaços de tempos livres das crianças (ATL), dos 1079 que pertencem à CNIS. Dando conta de uma reunião, que teve com o ministro Vieira da Silva, Lino Maia garante que a direcção da confederação "não pode fazer mais do que tem feito". "É importante por as uniões a funcionar para resolver este problema", afirmou o responsável, admitindo que a reunião com Vieira da Silva "ajudou a minorar os estragos causados. "Vai haver engenho e arte para resolver" os problemas causados com a diminuição de crianças nos ATL, que passaram a ter nas escolas as actividades extra-curriculares. Lino Maia revelou que o ministério "está a estudar as propostas", provando desta forma que "está interessado na cooperação".

Primeiro-ministro desafia Norte

Paulo Ferreira*, in Jornal de Notícias

Sócrates aproveitou passagem pelo Porto para discutir os problemas do país e da região Norte com uma série de figuras públicas


O primeiro-ministro, José Sócrates, lançou, anteontem à noite, no Palácio da Bolsa, no Porto, um sério aviso ao Norte a região tem que "andar mais depressa" e aproveitar os fundos comunitários do Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) para sair da rota de declínio económico em que se encontra.

Sócrates reuniu num jantar informal, que se prolongou até às 3 horas da manhã, um conjunto de figuras públicas do Norte. De acordo com fontes contactadas pelo JN, o repasto "correu muito bem, num ambiente marcado por uma conversa franca".

Acompanhado pelo ministro das Finanças (Teixeira dos Santos é do Porto), José Sócrates fez uma exposição sobre os temas nacionais da actualidade, explicou as medidas até agora tomadas em várias áreas sensíveis e projectou o futuro próximo do país, sempre sem se furtar a alguns dos temas quentes que afectam a região Norte.

Ao juntar alguma da nata finaceira da região, Sócrates quis dar um sinal da necessidade de união entre os actores da mesma. "Aquilo que ficou claro foi que o primeiro-ministro entende que depende de nós, no Norte, tirar a região do estado em que se encontra", resumiu uma das fontes ouvidas pelo JN. O primeiro-ministro lembrou a existência de um conjunto de instituições de referência no Norte, para sublinhar que o queixume não chega para ultrapassar os problemas - é preciso juntar forças e "andar mais".

Aeroporto e regionalização

O aeroporto do Porto foi outro dos temas abordados. A recente polémica gerada pelo facto de a ANA (entidade que gere os aeroportos nacionais) recusar apoiar a Ryanair (operadora com viagens a preços reduzidos) tendo em vista a criação de uma base no Sá Carneiro serviu de pano de fundo. Sócrates terá prometido estudar uma solução, assinalando embora que "os interesses nacionais e das regiões têm que estar acima dos interesses das empresas). O novo aeroporto de Lisboa esteve também na ementa.

As questões nacionais abordadas foram muito centradas no controlo do défice e do crescimento da economia. Mas houve ainda tempo para discutir as políticas de educação e de saúde, bem como a regionalização e a polémica legislação laboral.

Ao JN, o gabinete do primeiro-ministro salientou que "o encontro que teve no Porto com as "forças vivas" do Norte se insere num conjunto de encontros que Sócrates vem mantendo com a "sociedade civil" um pouco por todo o país". As fontes de São Bento garantem que "não se tratou de um encontro político", mas de uma conversa "com pessoas ligadas ao Norte" para "debater as reformas que estão em curso e as mudanças que é preciso fazer". "Tratou-se de uma troca de opiniões sobre o que já foi feito e o que falta fazer", sintetizou um dos assessores do primeiro-ministro.

O gabinete de Sócrates não quis confirmar se já recebeu da Associação Comercial do Porto o estudo sobre o novo aeroporto de Lisboa. "Foi o país todo que esteve em debate e não o Norte", salientou a fonte contactada pelo JN, que admitiu, no entanto, que as questões relativas à região estiveram em discussão.

* Com Augusto Correia, Paulo Baldaia e Pedro Ivo Carvalho

"A polícia, as escolas, a comunidade, todos têm de se envolver na protecção das crianças"

Bárbara Wong (PÚBLICO) e Raquel Abecasis (Rádio Renascença), in Jornal Público

O Instituto de Apoio à Criança, pela voz da presidente executiva, a magistrada Dulce Rocha, propõe mudanças legislativas para salvaguardar direitos dos menores


Esteve à frente da presidência da Comissão Nacional de Protecção de Menores e Jovens em Risco na anterior legislatura. Actualmente presidente executiva do Instituto de Apoio à Criança, Dulce Rocha mantém na ordem do dia reivindicações já antigas: mais formação para juízes, magistrados e técnicos que lidam com os direitos das crianças; valorização das carreiras dos que se dedicam ao assunto. Dulce Rocha contesta uma alteração ao Código Penal que retira "dignidade humana" às crianças abusadas e considera-a inconstitucional.

PÚBLICO/RR - Passaram cinco anos sobre a vinda a público do escândalo das crianças abusadas na Casa Pia. Três anos depois, o julgamento promete arrastar-se no tribunal, enquanto surgem novas suspeitas de abusos na instituição. Esperava que isto acontecesse?

DULCE ROCHA - A Casa Pia não está na mesma. Houve uma evolução no sentido de explicar às crianças os seus direitos; muitas reuniões com os professores; uma maior consciencialização sobre o que se pode fazer; uma vigilância mais apertada...
Mas há rumores de situações de abuso...

Será sempre importante estar vigilante e queremos sempre proteger cada vez mais as nossas crianças. Nunca são de mais os cuidados a ter em grandes instituições, mas houve esforço para reduzir o tamanho dos lares, uma aposta na formação do pessoal técnico - não estamos na mesma. Esse movimento gerou uma consciencialização nas outras instituições e um conjunto de medidas para evitar maus tratos, um fenómeno que estava bastante escondido. Houve também grande preocupação em transmitir a todas as famílias os perigos que existem.

Mas não a preocupa o julgamento estar ainda a decorrer e não haver perspectiva de que se resolva e, por outro lado, surgirem novas suspeitas numa instituição que devia estar muito vigiada?

Sem dúvida que é preocupante, e, realmente, isso deve ser um motivo para nos inquietarmos ao ponto de não fazermos apenas uma reflexão, porque são necessárias medidas muito específicas. É sempre um desafio a protecção das crianças. Talvez não tenham sido suficientes as medidas tomadas, mas não podemos culpabilizarmo-nos porque os criminosos têm mentes perversas e, às vezes, não conseguimos penetrar nessas mentes, por forma a evitar os abusos.

Como foi a sua experiência à frente da Comissão Nacional de Protecção de Menores e Jovens em Risco?

Foram dois anos muito intensos, que coincidiram com muitas situações dramáticas de mortes de crianças. A menina que foi morta pelo pai e pela avó e que apareceu no rio Douro, que, antes disso, vivia com uma madrinha... Na altura, fiz uma circular aconselhando as comissões a entender o alargamento do conceito de perigo na lei, por forma a que não fosse entendido que situações como esta mereciam um processo de regulação do poder paternal, porque não se devia regular o exercício de quem não o exerceu.

Foi também uma altura em que houve muitas críticas à comissão. Os técnicos queixavam-se de não ter formação nem apoio jurídico. O que mudou?

Há um avanço. O sistema tem fragilidades, mas mostra o desejo de envolver a comunidade na protecção das crianças. É um desafio muito grande não serem envolvidos só os tribunais e os técnicos. As comissões alargadas são constituídas por várias instituições e representantes de várias ciências. Pretende-se ainda que a comissão esteja próxima da população, tenha a participação da autarquia. O actual presidente nacional da comissão, Armando Leandro, diz que as crianças também têm direito à comunidade.

Houve mais formação?

Há um esforço de formação. No meu mandato, iniciaram-se alguns cursos, dos técnicos que estavam nas comissões, mas, actualmente, está-se na fase de formação de formadores. Mas não chega. A polícia, as escolas, a comunidade civil, os centros de saúde, todos têm de se envolver.

Mas o que é facto é que há casos que estão sinalizados, como o da menina de Viseu, que a educadora de infância avisou a comissão e, tanto quanto se percebe, nada foi feito. A criança morreu vítima de maus tratos infligidos pela mãe. Como é que isso acontece?

Há uma falha no diagnóstico que, por vezes, surge depois da vitimização da criança. No entanto, a formação, a troca de experiências, ajuda. Além disso, a lei também não favorece a situação. O que me parece é que não há sempre um responsável pela comissão e, na minha opinião, o presidente devia ser o representante da Segurança Social e o vice-presidente do município, que são duas das instituições mais envolvidas. O actual sistema é de rotatividade e de grandes mudanças, pois as pessoas não podem estar mais de dois mandatos, o que me leva a dizer que há ainda uma cultura de não considerar este um serviço prioritário. É importante valorizar este trabalho como trabalho social de grande qualidade e importante para as crianças.

Armando Leandro diz que, em Portugal, o direito das crianças é um direito menor e que é preciso que isto seja alterado. Concorda?

Penso que ainda é um direito menor. Para já, os direitos das crianças são muito recentes, a Convenção sobre os Direitos das Crianças fez 18 anos, e na Constituição da República Portuguesa o artigo que trata da protecção das crianças é o 69.º, ao passo que o que consagra as tarefas fundamentais do Estado é o 9.º, onde não estão contempladas as crianças vítimas de abuso e de maus tratos.

Essa é uma reclamação que fará numa futura revisão constitucional?

Sim, a Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, de que faço parte, propôs a introdução de uma alínea nova no artigo 9.º. Na altura, conseguimos introduzir uma alínea que consagra a promoção da igualdade entre homens e mulheres, mas não conseguimos o mesmo para a protecção das crianças.

No que diz respeito às crianças em risco, que efeitos poderão ter as alterações feitas ao Código Penal?

A alteração que diz que pode haver diminuição da culpa num crime continuado. Se a infracção for praticada várias vezes, [a lei] vem dizer que pode atenuar-se a pena caso haja violação reiterada, desde que se trate da mesma vítima. Isto é absolutamente inadmissível. Sobretudo relativamente aos casos de abuso sexual de crianças, esta possibilidade está consagrada e é indigna.

Concorda com a tese de que essa alteração foi feita à medida do caso Casa Pia?

Eu não quero crer que seja assim. Acho que é inconstitucional e não deve ser aplicada em crimes desta natureza. Não é concebível que uma criança de cinco anos que é violada, à quinta, à sétima, à décima vez, não seja tratada como pessoa. A determinada altura, deixa de ter dignidade humana e a dignidade da pessoa humana é inerente à nossa República. É uma desvalorização da vítima, e particularmente da criança enquanto vítima. E isso é inconstitucional.

IAC defende afecto em detrimento da biologia

É por causa do caso Esmeralda, a menina que vai ser entregue ao pai biológico, que o Instituto de Apoio à Criança (IAC) vai propor uma alteração à lei que preveja "o direito das crianças às relações de afecto profundas"?

O IAC pediu uma audiência ao procurador-geral [depois de amanhã], para apresentar a nossa preocupação, que não é só com essa menina, mas com todos os casos que têm na génese o conflito de alguém que cuidou da criança desde o nascimento e o facto de os pais terem ido buscar a criança. Temos visto casos trágicos. O que se verifica é que a criança não corresponde às expectativas dos pais, porque fica doente ou tem comportamentos disruptivos, a criança sofre tanto na sua estabilidade emocional que os pais não conseguem lidar com a situação.

Porque não têm preparação?

Pois. O que é certo é que, nesse documento, vamos defender que o superior interesse da criança deve ser clarificado legalmente. Parece-nos importante que o direito à preservação de relações afectivas profundas fique na lei.

Mas quando a lei diz que se deve "atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem", esse princípio não está já consagrado?

Claro que podemos considerar que já resulta da lei, mas não está expresso. O documento do IAC ainda está em preparação, mas tem três ideias fortes: o superior interesse da criança, o direito às relações afectivas, o direito da criança a ser ouvida.

Que leitura faz do caso Esmeralda?

Como magistrada, gostava de me pronunciar em termos gerais. Evidentemente que não se pode ignorar este caso, mas o que move o IAC são todas as crianças.

"Quando se decide pela institucionalização, não se deve voltar atrás"

Tem-se manifestado pela existência de mais formação para os magistrados. Já existe?

Ainda não há formação. Tem havido um esforço para fazer cursos de qualificação e pós-graduação, mas, mesmo na formação inicial, não existe a cadeira de Direitos das Crianças. Penso que será inevitável chegarmos à conclusão de que temos de chegar à democracia cognitiva. Não temos o direito de decidir sem a qualidade exigível, que resulta dos conhecimentos científicos actuais.

Mas se continua a não haver formação...

Mas vai chegar o tempo em que vai haver! E há formação, o que se entende é que é necessário mais.

No que diz respeito à lei da adopção, a jurisprudência tem como valor quase absoluto o direito dos pais biológicos, não é assim?

Pois, e os pais não são donos das crianças... O que acontece é que há duas interpretações. Por isso digo que é preciso clarificar a lei, para que não haja tantas dúvidas. A responsabilidade é também de quem legisla. Temos deputados e Governo com poder legislativo e a lei deve ser mais clara do que era no século XX.
O caminho da adopção ainda é penoso?

Há um tempo útil para a adopção e vemos que ainda há dificuldade em decidir de acordo com esses princípios importantes que são o do tempo útil para a criança. Um ano na vida de uma criança é muito tempo.

O que é facto é que ainda há muitas crianças institucionalizadas. O Governo diz que são mais de 12.400 e que o objectivo é reduzir esse número em 25 por cento. O que é preciso fazer?

É necessário pensar que a institucionalização por tempo prolongado não deve ser a solução, só quando as outras falham. Também é importante que cada criança tenha um processo individual, porque pode haver casos de entrega a família de acolhimento...

... Ou aos pais biológicos?

Quando se decide pela institucionalização, já não se deve voltar atrás. Os bebés não devem ficar com famílias de acolhimento, porque criam-se laços fortíssimos e depois há ruptura. Uma criança de tenra idade deve ir para um centro de acolhimento e privilegiar-se a adopção. A família de acolhimento deve ser alternativa à institucionalização prolongada [para crianças mais velhas]. É muito útil reflectir acerca da lei de protecção de crianças e jovens e na introdução de uma alínea que favoreça decisões mais de acordo com a realidade.

12.400
É o número de crianças institucionalizadas que é apontado pelo Governo. O objectivo é reduzir esse número em 25%