21.11.07

Portugal campeão de novas declarações de HIV/sida na Europa Ocidental

Mariana Oliveira, in Jornal Público

Em termos absolutos, Portugal ocupa o quarto lugar entre os países da Europa Ocidental que mais declararam novos casos de HIV/sida em 2006, segundo o relatório anual do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre a doença divulgado ontem, que faz duas pequenas referências ao país. Mas é o próprio coordenador nacional da infecção, Henrique Barros, a reconhecer que faz mais sentido fazer uma análise que entre em linha de conta com a população de cada país. "E, em termos proporcionais, ocupamos o primeiro lugar da Europa Ocidental", afirma o especialista.

Segundo o relatório, foram notificados em Portugal o ano passado 2162 casos, o que, segundo Henrique Barros, significa uma diminuição face a 2005. Segundo o Centro de Vigilância Epidemiológica das Doenças Transmissíveis, nesse ano foram declarados 2647 casos de HIV/sida e em 2004 reportados 2838. A diminuição de novas infecções é vista com cuidado e optimismo comedido pelo coordenador nacional para a infecção HIV/sida, que lembra os muitos casos que nunca chegam a fazer parte das estatísticas ou são declarados com anos de atraso. "É preciso continuar a aumentar a prevenção, os tratamentos e a detecção precoce da infecção", sublinha Henrique Barros.

O epidemiologista explica que o HIV chegou a Portugal mais tarde do que a outros países, onde já se viu os casos aumentarem, diminuírem e voltarem a aumentar. "Isto aconteceu devido a um certo desleixo em relação à prevenção. Não queremos cometer o mesmo erro", afirma.

Subnotificação

Henrique Barros lembra que, apesar de a doença ser de declaração obrigatória, há uma "má tradição" de subnotificação com muitos anos. Por isso é preciso muita sensibilização e medidas concretas: "Contratua-lizamos com os hospitais que não há pagamentos dos tratamentos feitos aos doentes se as instituições não declararem os casos".

O epidemiologista acredita que o esforço está a dar resultados. "Em 2006, do total de casos declarados, 800 eram de sida, mas, destes, 70 por cento é que são desse ano, os outros já tinham sido diagnosticados em anos anteriores, o que reflecte o esforço de notificação que temos feito", exemplifica o coordenador nacional. E adianta: "Este ano, o número de casos diagnosticados em anos anteriores vai aumentar".

O Reino Unido, com uma população mais do que cinco vezes superior à portuguesa, contabilizou o ano passado 8925 novas infecções de HIV, o maior número absoluto da Europa Ocidental. Entre 2001 e 2006, dobrou o número de notificações de 4152 para as 8925. Isto, segundo o relatório, "deve-se a níveis sustentados de novas infecções entre homossexuais, a um aumento do diagnóstico entre heterossexuais que contraíram o vírus em países com elevados níveis de prevalência da doença e ao melhoramento do reporte devido à expansão do serviço de testes de HIV".

Em termos absolutos, depois da Grã-Bretanha surge a França, que só começou a fazer notificações em 2003. No ano passado, este país registou 5750 novos casos de HIV/sida. A Alemanha, em terceiro, declarou 2718 novas infecções em 2006.
Na Europa Ocidental, o HIV é transmitido sobretudo em relações sexuais desprotegidas e, em muito menor escala, devido ao uso de equipamento contaminado entre consumidores de droga injectável. As Nações Unidas notam, contudo, que esta última causa tem um peso maior em Portugal e em Espanha.

Henrique Barros não nega a realidade, mas afirma que tem havido uma evolução positiva. "Há 15 anos, a proporção das infecções transmitida através de instrumentos de droga infectados era de cerca de dois terços, hoje em dia são cerca de 20 por cento", avalia o coordenador nacional. Com Bárbara Simões

Relações heterossexuais de novo em foco

A transmissão do vírus da imunodeficiência humana/sida através de relações heterossexuais continua a ganhar expressão em Portugal e a chamar a atenção das autoridades de saúde. Os casos notificados que referem como provável esta forma de infecção "apresentam uma tendência evolutiva crescente importante", lê-se no documento do Centro Epidemiológico das Doenças Transmissíveis que resume a situação da doença, no país, no final de Junho passado.

A mesma expressão tinha já sido utilizada em resumos anteriores, incluindo o do último semestre de 2006. Nessa altura, este centro epidemiológico (do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge) constatava que a categoria de transmissão "heterossexual" estava associada a 51,5 por cento dos casos então notificados. Seis meses depois, essa percentagem era de 54,7 por cento.

Entre Janeiro e Junho deste ano foram recebidas notificações de 1418 casos de infecção HIV/sida. O total acumulado era, no final do semestre, de 31.677 (entre os quais 13.935 casos de sida). Os consumidores de droga por via endovenosa concentravam a maior parte (44,4 por cento). Seguia-se a transmissão sexual (heterossexual com 38,3 por cento dos registos e homossexual masculina com 11,9). B.S.