José Sá Reis, in O Primeiro de Janeiro
João Goulão, presidente do Instituto da Droga e Toxicodependência, conta ao JANEIRO que a Câmara Municipal do Porto sempre se mostrou indisponível para falar sobre o programa camarário «Porto Feliz» e preferiu partir para o insulto. Goulão diz ainda que é necessário apostar em programas camarários deste género, até porque as situações de exclusão social geradas são muito preocupantes.
Das drogas mais consumidas pelos arrumadores toxicodependentes figuram, à cabeça, a heroína e a cocaína, “aquelas que mais contribuem para a desorganização das pessoas”. A convicção é de João Goulão, presidente do Conselho Directivo do Instituto da Droga e Toxicodependência (IDT), em entrevista ao O PRIMEIRO DE JANEIRO. Para o especialista, “o fenómeno dos arrumadores é uma das expressões com mais visibilidade de entre as situações de exclusão social”. Apesar de grande parte dos arrumadores ser toxicodependente, “a grande maioria dos toxicodependentes não é de arrumadores”. A frase, algo confusa, evidencia os pontos críticos existentes no município do Porto, como “o Bairro do Aleixo, de São João de Deus, do Aldoar, do Lagarteiro e do Cerco, este último com um crescimento enorme e levantando sérias preocupações”.
“O IDT nunca pretendeu o encerramento do programa ‘Porto Feliz’, que suportou financeiramente desde a sua criação”, admite João Goulão, desmarca-se, assim, das críticas feitas pelo actual executivo camarário, acrescentado que “o que o organismo pretendia, de acordo com as orientações decorrentes do Plano Nacional contra a Droga e as Toxicodependências Horizonte 2001 […] era que esse programa fosse encarado pelos parceiros como uma componente de um projecto mais vasto e abrangente de intervenção” na cidade do Porto. “Penso que algumas afirmações, nomeadamente a de que se trata de uma ‘guerra’ político - partidária, são totalmente desprovidas de fundamento”.
Goulão admite a existência de divergências técnicas e processuais entre a autarquia e o organismo que dirige, mas assenta que “o Ministro da Saúde, que tutela o IDT, sempre insistiu para que tentássemos chegar a plataformas de entendimento que assegurassem a continuidade da intervenção, nomeadamente no que diz respeito à atribuição de financiamento por parte deste ministério”.
Mobilizar vários parceiros
O IDT apresentou várias propostas para adaptação do programa à legislação em vigor, salvaguardando sempre o apoio aos toxicodependentes. “Propostas estas que nunca tiveram aceitação por parte da Câmara Municipal”.
Aliás, todo o programa se colocou “fechado sobre si próprio nos seus circuitos de referenciação e valências”, dispensando, desse modo, as articulações e esforços de optimização dos recursos dos vários organismos da cidade. Por isso refere que “um programa deste tipo pode ter alguma utilidade, se integrado em intervenções mais globais na área da exclusão social em geral” e da toxicodependência em particular.
João Goulão, antes mesmo de ter tomado posse como presidente do IDT, esteve à frente do Serviço de Prevenção e Tratamento da Toxicodependência (SPTT) e contactou directamente com programas de reabilitação de adictos nacionais. Por isso, “é necessário dar resposta ao vazio criado pela cessação do programa Porto Feliz”. “Foi aberto um concurso público para atribuição de financiamento para o funcionamento de duas equipas de rua e um Gabinete de apoio e existe uma convenção com o Hospital Conde Ferreira para assegurar a desabituação física de utentes mais fragilizados e que por isso carecem de uma resposta mais ágil”. Enquanto este processo decorre, Goulão refere que “toda a intervenção tem vindo a ser assegurada por técnicos do IDT”.
Este é, portanto, o momento ideal para “mobilizar vários parceiros, quer públicos ou privados, no sentido de permitir uma resposta mais abrangente e integrada ao fenómeno da exclusão social” e em particular “aos toxicodependentes sem enquadramento sócio familiar”. E gostaria que “a Câmara colaborasse” nessa pretensão.