Luís Garcia, in Jornal de Notícias
Projecto "Juntos construímos mais" já envolveu 800 crianças que receberam formação de cidadania
As rixas do Verão passado quase deitaram a perder os projectos de inclusão social na Quinta da Fonte, em Loures. Cinco meses depois, tudo voltou à normalidade: as ruas estão mais calmas mas continua muito trabalho por fazer.
Os tiroteios em plena via pública que chocaram o país, em Julho, fizeram com que se questionasse a política social seguida na Quinta da Fonte e, de um modo geral, nos bairros sociais. O ambiente de suspeição quase destruiu alguns anos de trabalho das associações na urbanização.
"Se o nosso trabalho não fosse bem cimentado, poderia ter sido posto em causa nessa altura", explica António Embaló, coordenador do Juntos Construímos Mais, um projecto iniciado há dois anos e inserido no Programa Escolhas. Aqueles acontecimentos não são a "realidade do bairro", garante o responsável. "De vez em quando há questões sérias, mas não naquele nível", assegura.
O projecto Juntos Construímos Mais procura prevenir a ocorrência de fenómenos de exclusão social e de abandono escolar e já envolveu mais de 800 crianças e jovens, que, mais tarde, em muitos casos, vêm eles próprios a integrar os grupos que dinamizam as actividades.
Uma das grandes apostas do programa é fazer com que os alunos se identifiquem mais com o ambiente escolar. Para isso, os responsáveis disponibilizam aos professores, técnicos e auxiliares da Escola Básica Integrada da Apelação formação em áreas como gestão emocional e mediação de conflitos.
"Se um aluno chega à escola e não faz absolutamente nada ou se começa num pranto sem se perceber porquê, o que é o que o professor faz? É este tipo de coisas que eles aprendem na formação", explica António Embaló
Os alunos recebem formação de cidadania, apoiada em jogos didácticos que fogem ao conceito de aula tradicional e são incentivados a expressarem-se da forma que mais gostarem. Alguns gostam de gravar hip-hop no estúdio do bairro, outros preferem aprender a fazer cinema de animação ou produções fotográficas. Há ainda cinco grupos de dança, actividades desportivas e aulas de informática.
Ontem, o Juntos Construímos Mais iniciou o primeiro de quatro dias de portas abertas à comunidade, com várias actividades. No torneio de futsal, que decorreu no pavilhão da EBI da Apelação, os mais novos, com respeito profundo pelas regras, deram uma lição de cidadania e camaradagem aos adultos.
No meio de muitas brincadeiras em comum, os pequenos João Rosa, Rui Miguel e João Paulo, entre os nove e dez anos de idade, explicaram ao JN que não conseguem perceber os episódios violentos de Julho, que chegaram a ser descritos como um confronto étnico. Se um deles é cigano, o outro branco, o terceiro é negro e são os melhores amigos, porque será que as pessoas não percebem que "muda a cor da pele mas por dentro somos todos iguais"?