Isabel Gorjão Santos, in Jornal Público
Protestos nos Camarões causaram mortos, houve ataques a imigrantes na África do Sul. Há restrições à liberdade de expressão em pelo menos 81 países
Há uma crise dos direitos humanos a acontecer a par da crise económica, denuncia a Amnistia Internacional. "O aumento da pobreza e das condições económicas e sociais desesperantes podem levar à instabilidade política e ao aumento da violência", sublinha a secretária-geral da AI, Irene Khan.
No relatório anual que a AI divulga hoje sobre as violações de direitos humanos em 157 países há denúncias de tortura, execuções extrajudiciais ou detenções arbitrárias em todos os continentes, mas há também uma preocupação com o modo como a crise agrava as violações de direitos humanos. Resume Irene Khan: "Em nome da segurança, os direitos humanos foram espezinhados. Agora, em nome da recuperação económica, estão a ser relegados para segundo plano".
Os exemplos enchem as 400 páginas do relatório. Na Tunísia morreram manifestantes que protestavam pelo aumento do preço da comida e nos Camarões uma centena de pessoas foram mortas pelas forças de segurança que reprimiram manifestações. Na África do Sul morreram 56 imigrantes, vítimas de ataques xenófobos impulsionados pelo desemprego.
O facto de existirem mil milhões de pessoas sem acesso a comida suficiente levou a que se agravassem as situações de discriminação e manipulação política associada à distribuição de alimentos, diz a AI. Isso aconteceu no Zimbabwe, onde cinco milhões precisaram de ajuda alimentar em 2008 e o Governo usou a comida como arma contra os opositores, recorda Khan. Ou na Coreia do Norte, onde a restrição de alimentos foi usada como forma de opressão, como na Birmânia.
Rússia, imigração e Obama
"De Gaza ao Darfur e do Leste da República Democrática do Congo ao Norte do Sri Lanka o prejuízo humano dos conflitos tem sido horrendo e a resposta frouxa da comunidade internacional chocante", diz Khan. O director da AI em Portugal, Pedro Krupenski, adianta que "nunca houve tanta fome no mundo e associada a isso virá uma cascata de problemas".
Na Europa, a Amnistia denuncia o uso de bombas de fragmentação no conflito entre a Rússia e a Geórgia, "uma guerra que mostra que a ideia de segurança definitivamente adquirida na Europa após a Guerra Fria é um pressuposto frágil". E denuncia também as medidas mais restritivas para impedir a entrada de imigrantes, "com a UE a liderar o processo em conivência com Governos como o da Mauritânia, Marrocos e Líbia".
E apesar de se congratular "com a boa vontade da nova Casa Branca ", a Amnistia considera que a Administração tem tido um registo "confuso" nas políticas de combate ao terrorismo. "As promessas iniciais e as primeiras decisões importantes para pôr fim a abusos foram seguidas de poucos actos para assegurar que as políticas de detenção estão em conformidade com as obrigações internacionais".
O relatório destaca o número de violações de direitos em países do G20 e denuncia que em 47 por cento destes houve julgamentos injustos e em 79 por cento torturas. Em 50 países há prisioneiros de consciência.