in Dinheiro Vivo
As vantagens e os desafios de ter equipas compostas por várias vozes e visões do mundo esteve no centro do debate que juntou a Randstad Portugal, o BPI, a Airbus Portugal e a Associação Salvador "À Mesa do Trabalho", iniciativa da Randstad Portugal em parceria com o Dinheiro Vivo e a TSF.
1de fevereiro de 2023 poderia ser uma data como outra qualquer, não fosse o facto de marcar um grande avanço na diversidade e inclusão do setor privado. A partir dessa data, as empresas com mais de 100 trabalhadores passaram a ter de respeitar a lei das quotas para pessoas com deficiência. Quer isto dizer na prática que essas organizações têm de cumprir as quotas para a contratação de pessoas portadoras de deficiência, mas estarão preparadas?
No BPI, onde trabalham "cerca de 4.400 empregados", a quota é de 2% e já foi ultrapassada, afirma Ana Vasconcelos, Diretora da Área de Seleção, Aprendizagem e Gestão de Talentos do banco. E por detrás das percentagens estão vários casos de sucesso "de integração de pessoas com capacidades diferentes, às vezes até em funções que parecem improváveis", diz. Um deles é o de "um colaborador num balcão no Algarve que é surdo", que "está a fazer tesouraria-caixa há muitos anos e interage com os clientes de forma naturalíssima".
Porém, nada se conquista sem trabalho. O BPI criou um "curso obrigatório para todos os colaboradores", para aprenderem a "interagir com pessoas com capacidades diferentes", e tem "cursos de enviesamento inconsciente para líderes". Além disso, está a trabalhar com a Associação Pais21 - Down Portugal com o objetivo de formar jovens para trabalharem na nova loja BPI All in One Lisboa.
Uma mudança na direção certa
O caso do BPI é exemplo de uma mudança cada vez mais visível por quem trabalha no terreno. A Associação Salvador, que se dedica há vários anos a integrar pessoas portadoras de deficiência motora no mercado de trabalho, tem somado parcerias no setor privado. Além de colaborar desde 2014 com a Randstad Portugal, trabalha com o banco Santander, onde já tem cinco candidatos colocados, afirma Joana Frederico, Gestora do Projeto de Apoio à Empregabilidade.
Mais do que apenas contratar estes candidatos, as empresas devem saber acolhê-los. Foi o que aconteceu na Marcelo Design, que, para receber um candidato portador de deficiência da Associação Salvador, decidiu procurar um local de trabalho mais acessível. Um passo significativo tendo em conta que a "falta de acessibilidades" continua a "ser um grande obstáculo" para a contratação e para a mobilidade de pessoas portadoras de deficiência, garante Joana Frederico.
A partir de 1 de fevereiro, as empresas com mais de 100 trabalhadores passaram a ter de respeitar a lei das quotas para pessoas com deficiência
O problema, porém, não são só as "acessibilidades a nível arquitetónico e dos transportes", embora não deixem de ser um obstáculo. A ausência de ferramentas e de software, que muitas vezes facilitam o trabalho de pessoas, por exemplo, com deficiência visual, é uma questão ainda por resolver em muitas empresas, aponta.
E será que os desafios se ficam pelos obstáculos materiais? Na opinião da Gestora do Projeto de Apoio à Empregabilidade da Associação Salvador, não podemos esquecer "o preconceito que ainda existe de que as pessoas com deficiência não são qualificadas". "Temos pessoas com muito boas qualificações a todo o nível".
Quando a diferença é abraçada, todos ganham
Vários estudos demonstram que empresas que apostam realmente na diversidade e na inclusão são mais competitivas no mercado. Um deles é o Randstad Employer Brand e os seus dados não enganam: 39% dos trabalhadores inquiridos valorizam a diversidade e a inclusão na hora de aceitar uma oferta de trabalho. "A geração Z é a que dá mais valor a este tema, com 47%" e "os baby boomers estão logo a seguir, com 45%", afirma Marlene Fernandes, Diretora Comercial e Operações da Randstad Portugal.
Na opinião de Marlene Fernandes, "num mundo cada vez mais volátil e em constante mudança, as empresas percebem o benefício de ter esta diversidade nos seus próprios quadros". Desde já, equipas inclusivas ajudam a enfrentar um dos maiores desafios atuais do mercado de trabalho. "A escassez de talento está a crescer a olhos vistos e claramente há aqui um potencial de pessoas [portadoras de deficiência] que estão disponíveis para agarrar estas oportunidades", explica.
Com equipas cada vez mais compostas por vozes e visões diferentes do mundo, as empresas mostram-se atrativas para futuros candidatos. E, enquanto se tornam mais competitivas, tornam-se mais humanas.
Exemplo disso é a Airbus Portugal, onde as iniciativas promotoras da diversidade e da inclusão também partem dos próprios colaboradores, conta Ana Soares, Diretora de Recursos Humanos da organização. Uma dessas iniciativas chama-se Grow Airbus e trata-se de um espaço onde os trabalhadores ouvem e debatem temas que vão desde a identidade à igualdade de género.
Vários estudos demonstram que empresas que apostam realmente na diversidade e na inclusão são mais competitivas no mercado
Esta proatividade prova que a diversidade já faz parte do âmago da Airbus Portugal. "Temos mais de 500 colaboradores, com 37 nacionalidades diferentes representadas", explica Ana Soares. Além disso, a nível de igualdade de género, "estamos neste momento com 52% de mulheres" contratadas.
Para chegarem ao patamar de empresas como a Airbus Portugal, o BPI e a Randstad Portugal, os líderes e profissionais de recursos humanos têm de começar por fazer um exercício muito simples: colocar-se no lugar do outro, tratando-o como gostaria de ser tratado. Como resume Joana Frederico, da Associação Salvador: "Se queremos contratar uma pessoa e se essa pessoa tem qualificações, temos de pensar em nós. Quando foi a nossa primeira oportunidade, o que é que precisávamos?".