22.5.23

Turismo à espera de um Verão de recordes em receitas e dormidas

Luís Villalobos, in Público


Crescimento incide mais no preço, mas deverá haver também subidas ao nível do número de turistas. Banco de Portugal prevê uma subida de 14%, superando os 24 mil milhões de euros de receitas.


Para o sector do turismo, o Verão que se aproxima deverá ser “excelente”, prevendo-se que sejam batidos novos recordes em receitas e, provavelmente, também em número de turistas e dormidas, depois de o ano passado ter sido já superior em receitas face a 2019 (quando tinham sido batidos novos máximos em vários indicadores).

Os primeiros dados oficiais deste ano sinalizam já a manutenção da tendência de crescimento , com uma subida de dois dígitos entre Janeiro e Março tanto em hóspedes como em dormidas nos alojamentos turísticos contabilizados pelo INE face a idêntico período de 2019.


O maior crescimento, no entanto, registou-se nas receitas totais, que subiram 35%, para perto dos 800 milhões de euros, com todas as regiões a registar melhorias face ao período pré-pandemia.

Os números do trimestre, diz a secretária-geral da Associação de Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (Ahresp), Ana Jacinto, “dão algum alento para o que se perspectiva ser um ano turístico de novos recordes, tal como foi 2022, que superou os resultados de 2019, aquele que foi o melhor ano turístico de sempre”.


A Páscoa (em Abril), diz, foi um “sucesso” e tudo indica que haverá novos máximos no Verão, o que “é o reconhecimento do trabalho árduo de todos os agentes económicos ligados à actividade turística”.


A vice-presidente da Associação de Hotelaria de Portugal (AHP), Cristina Siza Vieira, cita o inquérito feito por esta entidade, o qual revelou que os hoteleiros antevêem que todos os trimestres deste ano sejam melhores face a 2019 e a 2022 nos principais indicadores (como taxa de ocupação e receitas).

Eduardo Miranda, presidente da Associação do Alojamento Local em Portugal (Alep), nota que o Verão “tem boas perspectivas”, mas que “o aumento do número de turistas não deverá ser a variável principal”, apontando antes para a subida “das receitas por noite, em especial no segmento médio alto dos turistas estrangeiros, reflexo que Portugal está a conquistar o mercado pela qualidade e não pelo preço”.

No entanto, defende, “toda a estratégia e bom desempenho do turismo vai ter os seus dias contados se estas medidas desproporcionais do Mais Habitação” em relação ao alojamento local “avançarem”.


Este será o último Verão antes de serem aplicadas as novas leis propostas pelo Governo, que implicam medidas como uma contribuição extraordinária, a suspensão de novas licenças (e revisão das actuais em 2030) e poderes para os condomínios encerrarem os AL existentes.
Sector a puxar pela economia

O presidente da Confederação do Turismo de Portugal (CTP), Francisco Calheiros, afirma também esperar um crescimento do turismo em geral neste Verão, que se antevê como “excelente”.

“Ainda que continuemos infelizmente em situação de guerra, Portugal continua a ser visto como um país seguro, reconhecido pela sua diversidade de oferta e pelo serviço de qualidade, pelo que os turistas nos continuam a escolher”, acrescenta.

Do lado do Governo, o secretário de Estado do Turismo, Comércio e Serviços, Nuno Fazenda, diz que, “considerando os resultados já conhecidos, o aumento do indicador de confiança dos consumidores e do clima económico e, sobretudo, as perspectivas positivas dos empresários baseadas nas reservas turísticas”, tudo aponta “para um ano francamente positivo, que se traduzirá, muito provavelmente, num novo recorde turístico nacional”. “Estes resultados”, acrescenta, “têm impacto na economia real do país: criação de riqueza, emprego e salários para as pessoas”.

De acordo com Nuno Fazenda, “a expectativa é que este Verão seja um dos melhores de sempre”, seguindo a tendência observada neste primeiro trimestre do ano. A Jornada Mundial de Juventude (JMJ) será “um ponto alto deste Verão, que contribuirá para a projecção internacional de Portugal”, assegurando que o Governo “está atento e a monitorizar a potencial pressão aeroportuária e no sector dos transportes”.


A perspectiva positiva dos agentes do sector é acompanhada por análises de instituições como a Comissão Europeia, FMI e Banco de Portugal, que reviram em alta o crescimento da economia para este ano devido ao forte impulso do turismo.

No caso do Banco de Portugal, a instituição liderada por Mário Centeno subiu, no boletim económico de Março, a previsão de receitas (exportações) para o sector este ano. Assim, estas “deverão aumentar 14,5% em 2023, desacelerando posteriormente, num quadro de dissipação dos efeitos da procura adiada durante a pandemia”.

Com esta taxa de crescimento, as receitas deverão chegar aos 24.252 milhões de euros este ano. Para se ter uma ideia de como a recuperação foi mais rápida do que o esperado, em Maio de 2021 a previsão apontava para 18.291 milhões em 2023, ou seja, menos seis mil milhões de euros.

Para este ano, o Banco de Portugal destaca o contributo extraordinário da JMJ, que se realiza em Agosto na região de Lisboa. Também uma análise do departamento de estudos económicos do BPI feita este mês refere que, tendo por base a JMJ, e “o crescimento do turismo originário dos EUA”, associado ao incremento do número de voos, “2023 deverá reunir condições para superar os anteriores máximos quer ao nível de hóspedes, quer de proveitos”.
“Nem tudo é um mar de rosas”

A secretária-geral da Ahresp, Ana Jacinto, não deixa de destacar que “nem tudo é um mar de rosas” no sector, confirmando que a falta de trabalhadores permanece como “um dos problemas centrais”, embora adiante que tem havido melhorias.

O mesmo é sublinhado pela vice-presidente da (AHP), Cristina Siza Vieira: “A grave escassez de recursos humanos na hotelaria mantém-se como um ponto crítico, apesar de se estar a sentir um regresso, ainda que tímido, de pessoas para trabalharem no nosso sector, e a um volume crescente de trabalhadores estrangeiros, como é notório”.

A capacidade do aeroporto de Lisboa em lidar com o aumento do número dos voos é outro dos receios suscitados pelos agentes do sector.

Questionada sobre se, com o aumento de preços, não há o risco de afastar os turistas portugueses das zonas mais procuradas, nomeadamente do Algarve, Ana Jacinto diz que, apesar dos sinais positivos do sector, é preciso ter “muito cuidado no que à rentabilidade das empresas diz respeito, porque é imprescindível assegurarmos a sustentabilidade dos negócios e da manutenção dos postos de trabalho”. Ana Jacinto diz ainda que, no sector da restauração, as empresas continuam “a absorver custos e a não repercutir no consumidor aumentos em igual proporção”.

No caso da AHP, Cristina Siza Vieira começa por destacar que, tradicionalmente, o mercado interno está sempre muito aquém do internacional na hotelaria. “Não obstante o aumento de preços, no Verão o nosso país é, sem dúvida, destino de excelência para os residentes em Portugal”, acrescenta.

Sobre se se corre o risco de haver novamente demasiada pressão turística em algumas áreas, o secretário de Estado do Turismo, Nuno Fazenda, sublinha que o objectivo é que haja um “turismo mais sustentável, mais inclusivo e mais coeso”.

Nas zonas com maior densidade turística, diz, “importa assegurar um equilíbrio entre a actividade turística e a vida nas cidades/destinos, de modo a garantir qualidade de vida para os residentes e, simultaneamente, uma experiência turística positiva e com autenticidade”.

“Por isso”, acrescenta, “o planeamento, a regulação ou a gestão sustentável e dispersão de fluxos turísticos são alguns dos aspectos que devem ser considerados na gestão de destinos turísticos à escala local”.

Em paralelo, diz, “importa ter mais turismo em todo o território, nomeadamente no interior do país”, que pesa apenas 10% da procura do turismo total e 5% do turismo internacional, destacando a aplicação da Agenda do Turismo para o Interior, que conta com 200 milhões de euros e está agora a chegar ao terreno.