31.5.23

Há advogados a atender clientes em cafés e centros comerciais

 Olímpia Mairos, in RR


Denúncia parte do Conselho Regional do Porto da Ordem dos Advogados. Este é um fenómeno crescente desde a pandemia - que levou muitos advogados a perder clientes, com a consequente perda de capacidade económica para alugar um escritório.


Há advogados a atender clientes em cafés e centros comerciais. A maioria por falta de condições económicas para pagar a renda de um escritório. Só este ano, já chegaram cerca 15 queixas nesse sentido ao Conselho Regional do Porto (CRP) da Ordem dos Advogados (OA). O ano passado foram mais de 40.

“Temos cerca de 15 reclamações de clientes que foram atendidos quer em centros comerciais, quer em cafés. Estamos a falar de Porto cidade e de Braga”, diz à Renascença o presidente do CRP da OA, Jorge Barros Mendes, acrescentando que o ano passado tiveram “mais de 40 queixas”.

Barros Mendes explica que esta é uma situação que viola o sigilo profissional a que estes profissionais estão sujeitos. Todos os casos são analisados pelo conselho de deontologia.

“Nós temos que atender os clientes e falar com os clientes no recato”, diz o advogado, alertando que não se pode “estar a atender clientes em estabelecimentos comerciais, correndo o risco de na mesa ao lado a estar toda a gente a ouvir aquilo que o cliente está a dizer”.
“Violação flagrante do estatuto”

Nestas declarações à Renascença, Jorge Barros Mendes diz que o que está a acontecer é “uma violação flagrante do estatuto, porque põe em causa a regra principal da profissão, que é o sigilo profissional”.

“Nós aqui temos uma infração disciplinar e, portanto, aquilo que tem acontecido quando as queixas chegam ao Conselho Regional do Porto, nós remetemos inevitavelmente as queixas para o Conselho de Deontologia que há de apreciar a infração disciplinar”, acrescenta.

Este é um fenómeno crescente desde a pandemia - que levou muitos advogados a perder clientes, com a consequente perda de capacidade económica para alugar um escritório.

Para além de quem não consegue pagar uma renda, entre os advogados que estão a atender clientes em mesas de cafés e centros comerciais estão profissionais de nacionalidade brasileira que desconhecem as regras nacionais.

“Primeiro temos um conjunto de colegas que infelizmente, não têm condições económicas para custear um escritório”, destaca, referindo, ainda, que muitos colegas brasileiros que vêm para o nosso país “não conhecem as regras deontológicas da profissão em Portugal.
Urgente regulamentar escritórios de advogados e domicílio profissional

Por isso, Jorge Barros Mendes considera que “é urgente que o Conselho Geral regulamente a questão dos escritórios de advogados e do domicílio profissional” e que encontre “alternativas para conseguir ajudar estes colegas”.

Jorge Barros Mendes admite que os números possam ser mais elevados, até porque muitos clientes desconhecem que o facto de serem atendidos numa mesa de café viola o sigilo profissional. No entanto, há também desconhecimento dos próprios profissionais que podem recorrer à Ordem dos Advogados - que está disponível para ceder espaços para reunirem com os clientes.

“Há de haver mais casos do que aqueles que nos estão reportados. Os que nos estão reportados são sempre num sentido de indignação”, diz, destacando que “a pessoa também não se sente à vontade verdadeiramente para estar a falar do assunto que a leva a procurar um advogado num espaço público”.

O presidente do Conselho Regional do Porto da Ordem dos Advogados admite que “haverá desconhecimento de grande parte das pessoas efetivamente, mas às vezes também há desconhecimento por parte dos colegas”.

Isto porque - diz - no Conselho Regional do Porto, “se houver um pedido de cedência de instalações de uma sala de reuniões para reunir”, é disponibilizada a sala, referindo que há “alguns colegas nestas condições”.