5.12.14

"Pobreza não é um acidente, é o resultado de uma escolha política"

in RR

Presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza/Portugal defende que "o declínio dos direitos não resulta de uma simples distorção dos mesmos. Acima de tudo, é uma consequência directa da lógica do mercado".

O presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza/Portugal defendeu a ideia de que "a pobreza não é um acidente, nem uma fatalidade, é o resultado de uma escolha política e económica" e alertou para o impressionante aumento do número de pessoas a viver em risco de pobreza. Mas "porque é que os ricos estão ainda mais ricos?"

Numa conferência sobre "O mercado: a necessidade de regulamentação para uma Europa mais social, sustentável e democrática", no Porto, Agostinho Jardim considerou que "o objectivo de redução da pobreza definido pela Estratégia Europa 2020 não está a ser levado a sério".

"O impressionante aumento do número de pessoas a viver em risco de pobreza, 125 milhões (25% da população europeia) é um escândalo e um sinal irrefutável e muito preocupante de que a UE não está a conseguir oferecer nenhum sinal de esperança de uma solução abrangente para a crise, com a maioria dos países a priorizar a austeridade como principal solução, predominantemente neoliberal, liderada pelos mercados e por soluções macroeconómicas".

Especialmente em países sob programas da “troika”, como é o caso de Portugal, "os efeitos perversos das prioridades macroeconómicas focalizadas na austeridade tiveram um impacto na queda do limiar de pobreza num aumento dos trabalhadores pobres associados ao aumento do desemprego, no crescimento da pobreza infantil, no progressivo desmantelamento do estado social e no aumento das desigualdades sociais", disse.

O presidente da Rede Europeia Anti-Pobreza/Portugal defende que "o declínio dos direitos não resulta de uma simples distorção dos mesmos. Acima de tudo, é uma consequência directa da lógica do mercado". Os credores e as entidades que emprestam, através de programas de assistência aos países intervencionados, não têm nenhum tipo de preocupação com os direitos humanos.

Por que é que os ricos estão ainda mais ricos?
Em muitos casos, frisou, "as condições impostas por estes programas impedem os governos de continuarem a assegurar acesso a serviços essenciais como a educação, a protecção social e a saúde, tendo pois responsabilidade sobre o impacto destes programas, particularmente quando estes coincidem com o aumento do desemprego e do número de famílias em que nenhum dos membros trabalha".

Por outro lado, salientou Agostinho Jardim, "as medidas que restringem ou reduzem as prestações socais e os direitos naturalizam a situação e remetem para os indivíduos a responsabilidade pela procura de soluções, desresponsabilizando a sociedade - e a isto, ironicamente, chamam empreendedorismo e outros eufemismos como inovação social".

Na sua opinião, a crise veio legitimar uma maior desregulamentação das relações laborais, uma ainda maior precarização do mercado de trabalho (sobretudo para os jovens) e uma naturalização do fim do modelo social europeu sob o lema não temos dinheiro. "A questão é: onde foi parar o dinheiro? Porque é que os ricos estão ainda mais ricos? Nos sabemos onde foi parar o dinheiro".

Agostinho Jardim considerou ainda que "existe hoje um sentimento generalizado de que as lideranças políticas e as instituições governamentais já não são capazes de lidar com assuntos como a distribuição da riqueza num contexto de crescente globalização e de movimento de capitais através das fronteiras nacionais".