12.12.14

Sem-abrigo querem processar Estado por violação dos Direitos Humanos

por DN.pt

No mês de fevereiro do ano de 2012, vaga de frio leva a Proteção Civil e a Polícia Municipal do Porto a visitarem sem-abrigos na baixa do Porto. Agentes abordam sem abrigo na rua de Camões junto ao viaduto de Gonçalo Cristovão.

No mês de fevereiro do ano de 2012, vaga de frio leva a Proteção Civil e a Polícia Municipal do Porto a visitarem sem-abrigos na baixa do Porto. Agentes abordam sem abrigo na rua de Camões junto ao viaduto de Gonçalo Cristovão.

Sem-abrigo do Porto formam movimento chamado "Uma Vida como a Arte", para intentar uma ação contra o Estado.

Uma associação de sem-abrigo do Porto quer processar o Estado português por "violação dos Direitos Humanos". O movimento, chamado "Uma Vida como a Arte", vai intentar essa ação juntos dos tribunais portugueses e, se for caso disso, "fazê-la chegar ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos", uma decisão tomada numa reunião a 28 de novembro, conforme se pode ler na página de Facebook do grupo.

"O movimento é formado por um grupo de pessoas que já viveram ou vivem do que a rua lhes dá e que lutam para melhorar as condições das pessoas em situação extrema de pobreza, que vivem ao relento, ao frio, à fome e em alguns casos em pensões", conta o porta-voz da iniciativa. Ainda estão no início: "Neste momento contamos com 15 pessoas ativas. Mas o consenso é de todos. O assunto é nosso, o problema é nosso, e somos nós, pessoas, que temos de ter a iniciativa de lembrar ao Estado que também temos dignidade e direito à vida. Temos caído em esquecimento", diz o homem de 64 anos.

O grupo queixa-se da falta de apoios às pessoas sem-abrigo, dos cortes no rendimento social de inserção e da dificuldade de acederem aos serviços, mas também da invisibilidade dos sem-abrigo na sociedade. "Pretendemos que o Estado cumpra com as suas obrigações porque nós também cumprimos as nossas. Se não cumprirmos com a data de renovação do rendimento social, no mês seguinte não temos rendimento; temos de cumprir rigorosamente com os horários das pensões, nem livres para isso somos, entre outros exemplos. Portanto, se nós o fazemos, o Estado tem de fazê-lo também. Cumprir com as devidas obrigações", diz António Ribeiro.

Dos 178,15 euros que o António recebe, 150 gasta-os no quarto arrendado, com as despesas incluídas e os 28,15 euros que lhe sobram têm de ser esticados para o mês inteiro. Valor este, que António Ribeiro, diz que nem o melhor gestor consegue gerir. "Convido o melhor economista do país a gerir estes 28,15 euros que sobram. Não tenho como. Se ele com conhecimentos não consegue, eu, que sou uma pessoa frágil, muito menos. Alguém conseguiria?", pergunta. No silêncio da resposta, suspira, confrontado com a realidade, e diz "pois".

Quando questionado sobre a possibilidade de alargar a iniciativa a outras cidades do país, António diz que por enquanto estão "centrados na cidade do Porto. Talvez no futuro o movimento chegue a outras cidades. Ainda não pensámos muito sobre esta questão".

O movimento "Uma Vida como a Arte" tem sido divulgado pelo Facebook, "pelos voluntários da cidade do Porto que nos fornecem contactos necessários para expandirmos o conhecimento desta causa e agora pelos meios de comunicação". Neste momento fazem reuniões semanais, geralmente às terças-feiras, em que falam das dificuldades por que passam. "Da habitação, da alimentação, do emprego e da saúde. Há tratamentos de saúde interrompidos por falta de verbas. Como o meu...", conta António, criticando o facto de se ter de pedir esmola para questões como estas.

Estima-se que existam mais de quatro mil pessoas sem-abrigo em Portugal. Em 2013 foram acompanhadas pelo menos 4 420 pessoas no âmbito da Estratégia Nacional para a Integração das Pessoas em situação de sem-abrigo, incluindo pessoas a viver na rua mas também em abrigos de emergência.