9.5.16

9 de Maio de 2016, a celebração de uma uma Europa (Des)Unida?

Texto de Carolina Correia de Sousa, in Público on-line

Alguns argumentam que a União Europeia sempre foi construída numa "dança ansiosa de avanços e recuos". Dizem que esta é "só mais uma crise". Porém, é uma crise grave, porque é uma crise de valores, é uma crise de (des)união e é uma crise que pode ser fatal

Neste dia em que se celebra o Dia da Europa, comemorando-se o aniversário da Declaração Schuman de 1950, urge mais do que nunca relembrar o mote que lançou este projecto de integração europeia a que hoje chamamos de União Europeia.

O propósito de acabar com a guerra, animosidade e isolamento parcial que caracterizou o continente europeu durante séculos e tantos estragos irreparáveis causou, materializou-se progressivamente — na dança ansiosa dos seus avanços e recuos — numa ideia de cooperação, de solidariedade e, a seu tempo, de livre circulação. Nesta ideia de Europa, somos Um. Mas será que assim o é?

Com base na ideia de "crise europeia", desta "etiqueta" perpetuada pelos media e demais actores estatais, não estatais e internacionais, o ideal europeu tem inegavelmente tremido na última década. Tal é evidente a começar na crise da Zona Euro, passando pelos ataques terroristas em pleno coração da Europa, pela reascenção dos nacionalismos de extrema-direita e pela questão do Brexit, e prolongando-se na intitulada "crise dos refugiados" (termo com o qual discordo), que facilmente se tornou num bode expiatório e, por isso, não está a ter a resposta que merece. Mas não vou por aí.

De facto, é muito mais conveniente atribuir um problema interno — atrevo-me a dizer estrutural — e latente a causas externas; contudo, este deve ser exposto sem tabus, para que possa ser encarado com sensatez e eficácia — a "crise dos refugiados" é, na verdade, a crise da própria União Europeia, numa tentativa vã de disfarce.

Recuperando o que escrevi inicialmente, alguns argumentarão que a União Europeia sempre foi construída numa "dança ansiosa de avanços e recuos" — não o nego, a história assim o dita; dirão inclusive que esta é "só mais uma crise". Porém, é uma crise grave, porque é uma crise de valores, é uma crise de (des)união e é uma crise que pode revelar-se fatal e auto-destrutiva.

Na verdade, a "crise dos refugiados" só veio expor a instabilidade dos pilares que deveriam sustentar esta União. Volto assim a questionar-me: será que somos Um?

Infelizmente, nem todos se apercebem. Nem todos se dão à paixão (ou desilusão, pois não há outros modos que não estes dois de sentir o projecto europeu) de viver a Europa; nem todos têm esse interesse, o que é compreensível. Mas não podemos de todo ignorar que vivemos tempos conturbados, arriscados e assustadoramente imprevisíveis, que afectarão não só a UE, mas cada Estado europeu.

Quanto a mim, continuarei a (querer) acreditar que este projecto tem futuro, e que saberá dar a volta de uma forma sábia e sensata, respeitando os valores tácitos que o fundaram, naquele dia, em 1950. Citando Robert Schuman, "Europe will not be made all at once, or according to a single plan. It will be built through concrete achievements which first create a de facto solidarity." (9 de Maio de 1950)