Isabel Arriaga e Cunha, Bruxelas, in Jornal Público
A Carta dos Direitos Fundamentais vai ser hoje solenemente proclamada pelas instituições comunitárias, num gesto destinado a reforçar o seu perfil político depois de ter sido relegada para um anexo ao Tratado de Lisboa. A cerimónia decorrerá em Estrasburgo, na sede do Parlamento Europeu, entre o seu presidente, Hans-Gert Poettering, o presidente em exercício do Conselho da UE, José Sócrates, e o presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso.
Este documento, um dos avanços mais significativos da defunta Constituição Europeia, reúne pela primeira vez todos os direitos - sociais, políticos, económicos, civis - dos cidadãos europeus e de todos os residentes no espaço comunitário. Isto reunindo num só documento as disposições da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, as tradições constitucionais dos Estados membros, a Carta Social Europeia e as restantes convenções subscritas pelos Estados membros.
Redigida em 1999, a Carta dos Direitos Fundamentais foi assinada pelos líderes da UE durante a cimeira de Nice, em 2000.
Inicialmente, sem carácter juridicamente vinculativo, o documento tinha valor meramente político. Esta limitação foi ultrapassada com a sua inclusão na Constituição Europeia, adoptada pelos governos da UE em 2004, passando a constituir o seu segundo capítulo.
Por exigência de ingleses e polacos, a Carta perdeu uma parte do seu estatuto no processo de transferência do essencial da Constituição para o novo Tratado de Lisboa, passando a figurar num anexo. O seu carácter juridicamente vinculativo fica porém salvaguardado num artigo do tratado que estipula isso mesmo.
Sem estabelecer nenhum novo poder nem nenhuma transferência adicional de soberania para a UE, as disposições da Carta aplicam-se às instituições comunitárias e às administrações nacionais apenas quando aplicam a legislação comunitária. Mesmo se os direitos consagrados são reconhecidos em todos os Estados membros, o facto de passarem a estar gravados num texto com valor de tratado facilitará a tarefa do Tribunal de Justiça da UE na sua interpretação. O que significa, por exemplo, explica um perito comunitário, que a legislação comunitária que autoriza os Estados membros a impor condições para o reagrupamento familiar dos filhos com mais de doze anos dos trabalhadores migrantes poderá passar a ser contestada no tribunal à luz dos direitos das crianças.