Helena Teixeira da Silva, in Jornal de Notícias
Sem apoios à natalidade, a sustentabilidade da população correrá riscos
Daqui a 50 anos, Portugal até poderá conseguir manter os cerca de 10 milhões de residentes. Mas será uma população maioritariamente envelhecida. E com a redução drástica da população activa será difícil assegurar as prestações sociais.
A projecção de população residente no país no período entre 2008 e 2060, realizada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), indica que, no próximo meio século, haverá uma diminuição da percentagem de jovens (com menos de 15 anos) de 3,4%. A população activa (entre os 15 e os 64 anos) terá uma queda maior: 11,5%. Só a população com mais de 65 anos quase duplica: cresce de 17,4% em 2008 para 32,3%.
Isto significa que, em 2060, e se a tendência não for contrariada, haverá três idosos por cada jovem. Em Portugal residirão, nessa altura, 271 idosos por cada 100 jovens - mais do dobro dos valores projectados para este ano: 116 idosos por cada 100 jovens.
Apesar de o cenário parecer grave, o socialista e ex-ministro da Segurança Social Paulo Pedroso afirmou ao JN que encontra aqui o que diz ser uma "boa notícia": "As pessoas vivem mais anos com mais saúde, sobrevivem mais às doenças, e isso é bom". Por outro lado, reconhece, "o perigo de as novas gerações não serem substituídas representa um enorme desafio político, sobretudo em termos de medidas para a protecção social aos idosos e às famílias".
A solução, defende, não passa por mais apoios financeiros à natalidade, "que não vão produzir mais efeitos", mas "pela promoção de serviços". E explica: "A igualdade entre homens e mulheres não pode reflectir-se na demografia. Para que as mulheres possam ter ao mesmo tempo vida laboral e familiar- e Portugal é dos países da União Europeia com taxa mais alta de desemprego feminino - é preciso criar serviços de apoio à família: na primeira infância e na educação a tempo inteiro. Serviços próximos, comportáveis do ponto de vista financeiro e de qualidade". O deputado garante que "foi desta forma que os países nórdicos conseguiram reverter o cenário".
De acordo com a projecção do INE - considera as variáveis da fecundidade, mortalidade e migração -, a população aumentará até 2034, ano a partir do qual começará a diminuir, atingindo, em 2053, valores abaixo de 2008.
Os saldos migratórios positivos não deverão ser suficientes para atenuar o envelhecimento demográfico, indica o estudo. Mas Pedroso é mais optimista. "Portugal recebe mais pessoas do que envia para fora. Esta tendência deverá manter-se no futuro, uma vez que o país é cada vez mais atractivo para mais gente. Para isso, é preciso modernizar a economia e continuar a investir em capital humano".
Fátima Matos, demógrafa, Faculdade de Letras da Univ. do Porto: 'É preciso fixar no país as pessoas"
Uma projecção do Instituto Nacional de Estatística indica que, daqui a 50 anos, Portugal será um país maioritariamente idoso. Que consequências terá este cenário?
Existe o risco da sustentabilidade da própria população. Se existe uma redução drástica da população activa, num sistema como o nosso, em que a Segurança Social é assegurada pelos iimpostos de quem trabalha, essa área fica seriamente afectada. E se as pessoas vivem mais tempo, também vão precisar de mais apoio. Vão ser um peso para o Estado.
É possível reverter a curto prazo a tendência demográfica, que aponta para a existência de três idosos por cada jovem em 2060?
A tendência é contínua desde os anos 80. Houve uma recuperação no pós-25 de Abril, devido ao regresso das pessoas das ex-colónias, que provocou alguma estabilização. Mas depois voltou a decair. E progressivamente tem vindo a afectar também o litoral e as zonas mais urbanas. É comum a todos os países da Europa. Daí que as medidas a tomar pela União Europeia sejam tão importantes para Portugal.
Essas medidas passam essencialmente pelo apoio à natalidade?
Também, mas não só. É preciso contrariar a taxa de fecundidade da população através de apoio financeiro e de assistência materno-infantil. Mas também é preciso promover o emprego, a escolarização, a formação profissional, a emancipação dos jovens, a habitação. É um apoio transversal e não apenas financeiro. Numa altura de crise, é difícil. Mas não se pode pedir às pessoas que tenham mais filhos se não houver contrapartidas fortes.
E o fluxo migratório, que contributo poderá dar para a reversão ?
É outra variável fundamental. O saldo migratório não tem conseguido compensar a queda demográfica, porque a migração, hoje, é flutuante; não é permanente. As pessoas ficam cá algum tempo, mas depois tornam aos países de origem. É preciso conseguir fixar cá quem vem de fora.