Mariana Oliveira, in Jornal Público
Para muitos, não há alternativas. Delegação do Porto tenta renegociar acordo com centro distrital da Segurança Social
Há 18 anos que a delegação do Porto da Cruz Vermelha Portuguesa (CVP) assegura o transporte de deficientes motores e mentais através de um acordo com o centro distrital da Segurança Social. Mas a situação "ruinosa" da delegação da Cruz Vermelha, fruto de anos e anos de prejuízos acumulados, está a pôr em risco a continuidade deste transporte personalizado, que leva diariamente os deficientes às suas instituições de acolhimento e outros aos seus locais de trabalho. Chegam a ser 500 transportes mensais.
Maria Otília Novais, presidente da delegação, está muito preocupada, explicando que neste momento existem três viaturas adaptadas para fazer este transporte. Uma delas avariou e o arranjo é muito caro. "Se mais algum veículo pára, uma daquelas crianças poderá não ser levada para a escola", diz. Mas, sabendo que todos têm o direito constitucional à educação e ao trabalho, não baixa os braços. Tenta encontrar soluções com o Estado. "Temos um acordo de cooperação com a Segurança Social que estamos a tentar renegociar", esclarece. José Pinto Leite, o director da delegação que tem o pelouro das contas, assegura: "As receitas não cobrem os custos de funcionamento, quanto mais o investimento que é necessário fazer em novos veículos".
Novo acordo encalhado
O director do centro distrital da Segurança Social, Luís Cunha, confirma as reuniões no sentido de rever o acordo e explica que o anterior foi assinado em 1991, tendo a Cruz Vermelha igualmente uma parceria com a Sociedade de Transportes Colectivos do Porto (STCP) que lhe permitia assegurar as viaturas necessárias, a sua manutenção, o combustível e os respectivos seguros. Contudo, este protocolo foi denunciado em Março de 2002, tendo a STCP concedido 150 mil euros à Cruz Vermelha para esta adquirir três viaturas.
"Desde então, a CVP tem assegurado o referido transporte, com o apoio do Instituto de Segurança Social, que se traduz numa comparticipação financeira regular", adianta Luís Cunha, que não quis precisar o montante. Quanto à revisão do acordo, diz que está dependente da entrega de alguns documentos por parte da CVP. "Logo que o processo para a revisão do acordo se encontre completamente instruído, estará o mesmo em condições de poder vir a ser objecto de análise e financiamento", alega o director do centro distrital da Segurança Social. Maria Otília Novais afirma que já enviou todos os documentos a esta entidade, nomeadamente um estudo económico-financeiro sobre o serviço.
"Gravíssimo", diz APD
Adão Costa, da delegação do Porto da Associação Portuguesa de Deficientes (APD), considera "gravíssimo" que este serviço possa deixar de existir. "Se isso acontecer, vamos contestá-lo", garante. Até porque para muitos não há alternativas. "Se o dinheiro não chega, devem pedir-se mais comparticipações ao poder central e distrital, sem lesar os mais débeis." Em causa estão as mudanças nas comparticipações dos particulares que utilizavam o serviço e que, em Dezembro, viram, em alguns casos, essa contribuição subir 400 por cento.
É o caso de Álvaro Costa. O utente pagava 25 euros e passou a pagar 95. "Foi um aumento repentino. Como o valor tem em conta o rendimento das pessoas, só se reflecte assim num número pequeno de utilizadores. E não me parece que vão ser essas quatro ou cinco pessoas que salvarão o serviço", argumenta. Mas, sem alternativas, paga. Maria Otília Novais justifica-se, argumentando que esta é uma tentativa de manter o serviço, enquanto não se encontram outras soluções. "Há muito tempo que não fazíamos actualizações ao salário dos trabalhadores", assinala.
500
Número de transportes de deficientes que a CVP faz por mês, tendo que levar em média duas ou três vezes as mesmas pessoas