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Em Portugal, 31,4% dos menores de 18 anos estão em risco de pobreza e exclusão social. Segundo os dados revelados num estudo universitário, há milhares de crianças e jovens com "muita dificuldade no desempenho de funções essenciais à sua vida”
A investigadora Sónia Mairos Ferreira afirmou, esta terça-feira, que a pobreza pode agravar as situações de deficiência, perturbação e atraso do desenvolvimento por privar as crianças e jovens de recursos necessários para o seu crescimento.
Numa intervenção na conferência parlamentar "Necessidades Educativas Especiais, Deficiência e Escolaridade Obrigatória - Quais os Desafios?", a professora da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade de Coimbra contou o caso de uma aluna que teve de esperar sete meses para ter uns óculos para uma miopia de quatro dioptrias.
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Isto significa que a aprendizagem da leitura, da escrita, do cálculo e as outras aprendizagens ficaram severamente comprometidas pelo facto de a criança não ter a prótese que lhe iria garantir o acesso à informação nas mesmas condições que os seus pares”, disse Sónia Ferreira.
A investigadora observou que este é “um exemplo mínimo” daquelas que são “as dificuldades reais que podem fazer com que as questões da aprendizagem sejam dificultadas” e limitem o desenvolvimento dos menores.
As situações de pobreza causam “circunstâncias de privação múltipla”, vulnerabilidade e podem agravar “os quadros de deficiência, de perturbação e de atraso do desenvolvimento”, sustentou.
Traçando um retrato da pobreza e exclusão social em Portugal, Sónia Ferreira adiantou que afeta cerca de 2.863.000 pessoas, enquanto a privação material severa atinge quase 11% da população.
Relativamente aos menores de 18 anos, 31,4% estão em risco de pobreza e exclusão social. Há ainda 93.566 famílias beneficiárias do Rendimento Social de Inserção.
Analisando estes dados com as necessidades educativas especiais (NEE) verifica-se que há um conjunto de crianças e jovens que precisa de “uma aprendizagem e de uma estrutura na escola distinta” da educação regular “para potenciar o seu pleno desenvolvimento”, defendeu.
E “não são pequenas” as percentagens de alunos já sinalizados nas escolas e a ser alvo de intervenção especializada no âmbito das NEE.
Segundo a investigadora, há 2.081 alunos em unidades de apoio especializado e unidades para a educação de alunos com multideficiência, quase 2.000 em unidades de ensino estruturado para alunos com perturbação do espetro de autismo e 10.331 com currículo específico individual.
Há ainda cerca de 153 mil alunos que “têm muita dificuldade no desempenho de funções essenciais à sua vida” e 12.118 que foram sinalizados como tendo “dificuldades totais”.
Sónia Ferreira advertiu que “a pobreza e a exclusão social são potenciadoras da existência de dificuldades ao longo da trajetória de vida”.
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Se tivermos uma criança com necessidades educativas especiais no seio de uma família que se debate com as questões da pobreza e de exclusão social a probabilidade de saída deste ciclo de pobreza é muito baixa”, disse, salientando que os níveis de escolaridade e literacia ligados a estas situações “são, em regra, inferiores aos seus pares”.
Também contribuem negativamente para o desenvolvimento destas crianças, as experiências de racismo, discriminação e de estigmatização que são alvo, as desigualdades no acesso a bens e serviços, “a inadequação de alguns apoios sociais” e a dificuldade de compreender a linguagem dos serviços que muitas vezes impede estas famílias de aceder a um conjunto de apoios a que têm direito.