4.12.07

Ricos e pobres

in Jornal Regional

A extrema pobreza e riqueza assombram o país de norte a sul. O trabalho precário, os inúmeros aumentos das prestações de compra imobiliária, a pouca interactividade entre os apoios estaduais e os cidadãos mais carenciados são algumas das causas mais debatidas no estado actual da nação. O Vale do Sousa é considerado num estudo recente, o PRASD (Programa Áreas e Sectores Deprimidos), uma área deprimida onde o rendimento per capita fica pelos 50 por cento da média nacional. Uma das regiões portuguesas com mais cidadãos necessitados de apoios laborais, financeiros e educacionais. O forte número de casos de extrema pobreza na região em paradoxo com a extrema riqueza levou o NOVAS a inteirar-se da situação e contar algumas histórias de vida.

Casos de vida

António (nome fictício), residente em Penafiel, playboy - sua única profissão, ocupa os dias no ginásio com os amigos e a comprar roupa. A riqueza é do pai, no entanto, gasta uma média mensal de 15 mil euros em roupa, acessórios…de uma determinada marca, cujas roupas usa uma única vez. Isaura Lopes, responsável por seis filhos, cinco menores e um que foi vítima de um acidente de trabalho. Isaura Lopes foi congratulada por uma casa camarário no lugar da Parteira em Lordelo, Paredes, “a casa está em bom estado, mas vejo-me incapacitada para conseguir pagar a renda”, desabafou”. Encontra-se aterrorizada pela possibilidade de “ser posta na rua. Para onde vou com os meus filhos? Para o meio do monte?” Esta mãe conseguiu combater uma dívida, “que nem sabia que existia”, com a Câmara Municipal. “Apesar do pai dos meus filhos não estar connosco, sempre pensei que a renda estava a ser paga por eles, afinal enganei-me. Mas com muito esforço consegui pagar uma dívida que ultrapassava os 500 euros”, confessou orgulhosa Isaura Lopes, ao NOVAS. Mas as preocupações voltam, quando Isaura se vê impossibilitada de pagar as duas últimas prestações da renda, “a Câmara Municipal informou-nos de que se não regularizássemos esta situação, até Janeiro podemos ser despejados”. “O que vou fazer? Roubar? Está fora de questão. Vou levar os meus filhos para o meio do monte?”, questiona a arrendatária de um dos apartamentos cedidos pela autarquia.

“O meu filho não pode trabalhar”

O filho mais velho de Isaura teve há algum tempo um acidente de trabalho, mas devido a falhas contratuais e porque “não fazia descontos”, é mais um dependente daquela casa. “Ele não se pode inscrever no centro de emprego porque não está em condições para trabalhar e não tem direito a baixa porque não fazia descontos”, esta é mais uma grande preocupação de Isaura. Enquanto esta incapacidade laboral resistir, o rendimento nesta casa passa de escasso a miserável. Os únicos olhos que ainda brilham naquela casa, são os do filho mais novo, com cerca de 4 anos, nas filhas adolescentes, no filho desempregado e em Isaura a preocupação é facilmente notada. Isaura mostra- se amedrontada com a proximidade do início de 2008 e com a incapacidade de regularizar as suas contas com a Câmara Municipal de Paredes. Manuel (nome fictício), residente em Lousada, fez 10 anos, o pai alugou um jacto e levou-o a ele e a todos os seus amigos a uma festa de três dias na DisneyWorld. Aos 75 anos, Guilhermina Jorge mora sozinha, numa casa com dois quartos, uma cozinha e meio telhado. Sem condições, Guilhermina Jorge “só queria a possibilidade de ter uma casa das da Câmara”. Vizinha do prédio camarário da Parteira, Guilhermina vive com uma reforma de 230 euros “e gasto 100 euros em medicamentos”. Operada 6 vezes e a preparar-se para uma nova operação, a senhora de 75 anos, receia o que lhe possa acontecer numa casa em que o sol entra pelas frinchas do telhado, “com as últimas chuvas fiquei sem protecção no telhado, tenho bronquite, estou sempre à espera do pior”. Viúva desde cedo, criou onze filhos dentro daquele cubículo, mas nenhum deles está em melhor situação que ela, desabafou “eles têm tentado fazer pela vida mas tenho um filho que está em piores condições que eu”. Depois do desabamento do telhado, Guilhermina entrou em contacto com a Câmara Municipal de Paredes e espera pela visita da vereadora da Acção Social “queria que vissem em que condições vivo”. Candidatou-se a um dos apartamentos camarários do lugar da Parteira, mas sem saber porquê, não conseguiu que lhe fosse entregue um dos apartamentos, “não sei porque não consegui, ao entrarem cá em casa vêem bem as condições que tenho… sozinha não consigo melhor”. “Fui assaltada na semana passada, tinha a casa toda remexida, não me faltava nada porque não tenho”, contou Guilhermina Jorge receando que da próxima vez possa estar lá dentro. Com graves problemas de saúde, sem condições sanitárias e com o avanço da idade, Guilhermina Lopes só pede para deixar de ser vizinha do “Kosovo”, como é conhecido o prédio camarário na Parteira, e passar a fazer parte dele. Jorge (nome fictício), residente em Felgueiras, organizou a festa de aniversário da esposa e sem contar com os presentes que lhe deu, gastou 250 mil euros.

Sobreira

Mas este lugar em Lordelo, não é o único no concelho de Paredes que merece especial atenção. A freguesia da Sobreira, em Paredes depara-se também com inúmeros casos de pobreza extrema. Os pedidos de ajuda já não são tão frequentes, como nos casos anteriores. Pessoas a viverem em condições desumanas, muitas as vezes rejeitam a ajuda que lhes é proporcionada. Em conversa com a presidente, Manuela Jorge, da Associação São Pedro, destinada ao apoio social a crianças e terceira idade, o Novas soube que existem vários casos de pobreza extrema na freguesia. Fonte da mesma associação alertou para o facto de “existirem cães a viver em melhores condições do que alguns cidadãos da Sobreira”. Se pensarmos que muitas vezes, o grave problema é a falta de apoio social (devido a inúmeras razões) por parte das entidades competentes, nesta freguesia debatemo-nos com outro tipo de problema “as pessoas não querem ser ajudadas”. A presidente da Associação S. Pedro conta que “alguns funcionários já foram agredidos quando tentam dar apoio a algumas pessoas carenciadas”, incrédula acrescenta que “ arranjamos um quarto com todas as condições para uma senhora de idade, que vive sozinha num “barraco”, mas ela recusasse a sair do seu cantinho”. Para a presidente há de facto muita pobreza e ela não se reporta só a freguesia da Sobreira, “neste momento apoiamos famílias de Recarei e de Aguiar de Sousa, mas mais não podemos fazer, não temos condições”.

Associação S. Pedro

Em funcionamento desde 28 de Maio de 2000, a Associação S. Pedro, uma Instituição Privada de Solidariedade Social (IPSS), tem como objectivo dar apoio social à infância e à terceira idade.Com 15 funcionários, tenta dar vazão aos casos mais graves da freguesia, estando neste momento a apoiar famílias de mais duas freguesias. Até hoje, já passaram pela associação mais de 200 crianças e 80 idosos. A presidente, Manuela Jorge conta que “é no sector da terceira idade que se encontram os maiores casos de pobreza”. Actuando no apoio domiciliário a estas pessoas carenciadas, Manuela Jorge diz que “há casos de pobreza extrema, mas não é só na Sobreira” e acrescenta que “muitos recusam a ajuda das associações”. A Associação trabalha em protocolo com a Segurança Social, “mas infelizmente isso não chega”. Manuela Jorge explica que o apoio vindo da Segurança Social restringe-se a 20 pessoas e “neste momento temos 40 pessoas ao nosso cuidado”. Para além deste crescente número de pedidos de ajuda, a Associação S. Pedro trabalha “de sábado a sábado, fazemos um enorme esforço para pagar horas extras, mas não vamos deixar os carenciados sem comer ao domingo”. Quando questionada acerca de planos futuros para a instituição, Manuela Jorge mostrou-se reticente “não há grandes apoios, a rede social apoiou dois projectos de associações que nunca fizeram nada, para além de passeios com velhinhos, e quem realmente tenta fazer alguma coisa, não consegue esses mesmos apoios”.