7.5.09

É dada razão a 15 por cento dos desempregados anulados

João Ramos de Almeida, in Jornal Público

CTT continuam a ser a principal razão por que a comissão concorda com queixosos. Em 2008, o IEFP enviou 430 mil postais


Foram 218 os desempregados que no primeiro trimestre de 2009 apresentaram queixa à comissão de recursos porque os centros de emprego anularam a sua inscrição como desempregado. Em 2008, houve 893 pedidos. A comissão acabou por dar razão a uma percentagem semelhante à verificada em 2008, ou seja, a 15 por cento dos casos analisados nas duas instâncias de apelo.

Às queixas deferidas, há que juntar ainda 10 por cento dos processos (tanto em 2008 como em 2009) que foram devolvidos aos centros de emprego para completar o processo. Mas a comissão desconhece em que sentido evoluiu a decisão.

A manter-se em 2009 a taxa de deferimento de 2008, três quartos dos pedidos serão chumbados na primeira instância de recurso, ou seja, dos vice-coordenadores regionais do IEFP. Mas um décimo desses desempregados não se contentará com a decisão e reclamará para a comissão de recursos. E um terço desses pedidos será finalmente deferido.

Falta de comparência

A principal causa de anulação da inscrição pelos centros de emprego em 2008 manteve-se no primeiro trimestre de 2009. Foi a falta de comparência à convocatória dos centros de emprego. Mas manteve-se igualmente o principal motivo por que a comissão deu razão aos desempregados anulados - a admissão pelos CTT do deficiente trabalho na distribuição dos postais dos centros de emprego.

"Guiamo-nos pelo que nos dizem os CTT", afirma a coordenadora-central da comissão de recursos, Cristina Rodrigues. "Só aceitamos desde que os CTT reconheçam".

A questão não é nova. Em 2008, uma equipa da Provedoria da Justiça analisou o trabalho da comissão de recurso. De uma forma geral, concordou com as anulações feitas e com as decisões da comissão de recursos. Mas chamou a atenção para a anulação da inscrição dos desempregados por via postal. É aos centros de emprego que cabe convocar os desempregados e em 2007 foram enviados 450 mil postais; e em 2008, foram 430 mil, dos quais 270 mil obtiveram resposta.

Àqueles que não se apresentam ou não respondem, os centros de emprego avisam que irão cortar o subsídio. O IEFP garante que apenas o faz após duas cartas registadas sem resposta. Ora, os desempregados queixosos protestam que nunca receberam a notificações. E os centros de emprego alegam que "o beneficiário pode sempre fazer prova da não recepção das cartas, designadamente através de documento dos correios onde haja clara assunção de responsabilidades por deficiente serviço prestado". Mas não é fácil provar aos CTT que funcionaram mal.

A questão foi objecto de encontros entre o IEFP e os CTT, ao nível da administração. Segundo o presidente do IEFP, Francisco Madelino, foi estabelecida uma "linha aberta entre os responsáveis locais".

185 mil não podem protestar

O número de queixas não é muito elevado, sobretudo quando se compara com as anulações que o IEFP tem feito ao longo desta década - cerca de 500 mil por ano.
Mas os números dos recursos permitem duas leituras. Uma delas satisfaz a coordenadora-geral da comissão. "Tranquiliza-me" , afirma Cristina Rodrigues. Porquê? Porque mostram uma objectividade na análise das reclamações ao longo do tempo. Há todavia outra leitura possível: manteve-se uma percentagem considerável de casos que não deveriam ter sido anulados e que apenas foram impedidos porque os desempregados se queixaram.

Apesar da fraca expressão dos pedidos de recurso, é de admitir que, mesmo informados pelos serviços, os desempregados desconheçam como podem reclamar (ver caixa).

A comissão de recursos ficou prevista no novo diploma que alterou as regras de atribuição do subsídio do desemprego (Decreto-Lei 220/2006). O diploma previu formas mais expeditas de anulação das inscrições (como forma de combate mais célere à fraude) e, consequentemente, do corte do subsídio de desemprego. Passou a ser possível sempre que o desempregado faltasse ao dever de procura activa de emprego ou ao cumprimento do plano de emprego traçado pelo centro de emprego. Mas acontece igualmente por falta de comparência a convocatória, à apresentação quinzenal, às entidades empregadoras de um emprego, recusa por trabalho conveniente, trabalho socialmente necessário ou recusa de formação profissional.

Antevendo o eventual efeito perverso da medida, o Governo criou a nova instância de recurso, como "reforço das garantias dos beneficiários". Assim é explicada a sua criação na portaria regulamentadora (portaria 1301/2007) e que acabou por ser publicada apenas um ano depois do diploma que a previu.

Inicialmente, a intenção era criar um provedor dos desempregados. Mas a versão final encaminhou-se para uma comissão de recurso das decisões administrativas. Mas apenas podem recorrer os desempregados que recebam subsídio de desemprego.

Ou seja, uma grande parcela de desempregados não se pode queixar. Entre 2006 e 2008, os desempregados inscritos sem direito a subsídio de desemprego chegavam a 35 por cento do total. Em Março passado, havia 185 mil desempregados nessa situação (38 por cento do total) e que, por isso, não podiam aceder à comissão de recursos. Isso mesmo que um acto administrativo os lesasse.

Essa possibilidade é efectiva, porque - mesmo que um desempregado não receba subsídio de desemprego - a anulação de inscrição pode, por exemplo, impedir um desemprego de longa duração de ser abrangido pelas iniciativas de apoio a esse grupo. A sua situação pode ser ainda mais gravosa porque esses desempregados não têm meio atempado de saber se foram riscados das listas.