por Duarte Ladeiras, in Diário de Notícias
José Sócrates anunciou esta tarde um aumento generalizado de impostos e redução equivalente nas despesas, até 2011, para reduzir o défice do Estado para 4,6%.
No anúncio oficial, o primeiro-ministro disse que a meta é diminuir o défice já este ano para 7,3%, em vez dos 8,3 previstos no Programa de Estabilidade e Crescimento, e para 4,6% em 2011.
"O esforço tem de ser feito por todos", afirmou Sócrates na habitual conferência de imprensa realizada após o Conselho de Ministros, que hoje discutiu e aprovou o plano de combate ao défice, negociado previamente com o PSD. O primeiro-ministro (PM) vincou que o programa será dividido em duas partes iguais: “esforço do Estado, com redução da despesa, e a outra metade distribuída pela sociedade, com aumento de impostos”.
Sócrates confirmou a antecipação de alterações no subsídio de desemprego e no fim das SCUT (autoestradas sem custos para o utilizador) em várias zonas do país, cujo rendimento não justifica a manutenção deste sistema, considera o governante.
Também confirmou a redução em cinco por cento dos salários dos titulares de cargos públicos e dos gestores das empresas públicas. E salientou que os esforço de redução da despesa será partilhado com as autarquias e as regiões autónomas (menos 100 milhões de euros para autarquias). Sócrates disse que já falou com o presidente da Associação Nacional de Municípios Portugueses, Fernando Ruas, e com os presidentes das regiões autónomas doa Açores, Carlos César, e da Madeira, Alberto João Jardim, que, “apesar de poderem contribuir simbolicamente”, vão fazê-lo.
A principal exigência do presidente do PSD, Pedro Passos Coelho, para aprovar na Assembleia da República (AR) o programa de combate ao défice era de que ao aumento da receita, de 1050 milhões de euros, correspondesse um corte na despesa, incluindo corte de 150 milhões para empresas públicas como RTP e de transportes.
Foi do PSD a proposta de cortar nos salários de políticos e gestores públicos o aumento obtido no ano passado (2,9%), mas o Governo subiu para 5%, apesar de Sócrates admitir que não simpatiza com a medida e de no passado ter classificado este tipo de proposta como populistas. “Não é uma medida que tenha efeito financeiro, mas tem carácter simbólico e resulta de um acordo com outro partido. Não gosto de medidas que tenham apenas valor simbólico, prefiro medidas que tenham resultados, mas compreendo a posição de outros partidos e não é por isso que vai haver desacordo e que o país vai deixar de ter um compromisso ´com vista à sua estabilidade financeira”, disse o PM.
Aumento generalizado de impostos
Tal como noticiado hoje pelo DN, todos os impostos aumentam. O primeiro-ministro começou por confirmar o aumento de um por cento em todos os escalões do IVA (Imposto sobre Valor Acrescentado), pois, diz, só desta forma é possível alcançar as metas desenhadas para o défice. "Espero que compreendam que temos apenas seis meses para reduzir o défice e que é preciso tomar medidas que tenham impacto imediato”, vincou.
O escalão mais baixo (alimentação, medicamentos, energia, água, gás, transportes) sobe para seis por cento, o intermédio (restauração) para 13% e o mais elevado para 21%. Questionado pelo facto de aumentar a tributação do escalão mais baixo, Sócrates salientou que esta categoria não inclui apenas bens essenciais. “Estamos a falar de pão, leite, água, Coca-Cola, Pepsi-Cola, e muitos outros produtos que normalmente não são referidos. Há muitas famílias, como a minha, que compra produtos como a Coca-Cola. Infelizmente nunca conseguiremos um sistema completamente justo. Tentámos ser o mais equitativos e justos. Não cortámos em salários da função pública. Não cortámos no 13º mês. Trata-se de um esforço patriótico, nacional, distribuído entre despesa e receita, e que, nunca conseguindo um plano completamente justo, dá um sinal relativamente aos que têm maiores rendimentos”, vincou.
Para o PM, “há três meses a posição do governo era de que não seria preciso, e seria indesejável, tomar estas medidas, mas, com o que aconteceu nos últimos meses, era preciso defender a credibilidade do euro e da nossa economia”.
“O governo deu o seu melhor para que esse ajuste fosse feito sem aumento de impostos. E batalhámos para isso. O PEC foi bem recebido pela Comissão Europeia, pela OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico] pelo FMI [Fundo Monetário Internacional], mas a verdade é que o mundo mudou, e de que forma, nos últimos quinze dias, com um ataque sobre as economias da zona euro. No último conselho europeu, o que fizemos foi tomar medidas para combater a mais séria ameaça de sempre à zona euro, com a criação de um fundo de 750 mil milhões de euros e um pedido aos estados membros que façam um pouco mais para reduzir os défices”, explicou.
Além do IVA, haverá sobretaxas no IRS (Imposto sobre Rendimento Singular) e no IRC (Imposto sobre Rendimento Colectivo). No primeiro caso, será cobrado mais 1% até ao terceiro escalão, mais 1,5% a partir do quarto escalão e um aumento igual nas taxas liberatórias.
“O esforço adicional para combater os ataques especulativos ao país e ao euro será pedido às empresas que tenham lucros tributáveis acima dos dois milhões de euros [2,5%]. Deixaremos assim de fora as pequenas e médias empresas, para assegurar a recuperação da nossa economia. Não seria justo deixar de fora deste esforço as grandes empresas”, salientou Sócrates, confirmando também a criação de uma sobretaxa sobre o crédito ao consumo, “um sinal claro para apelar à poupança e taxar mais aqueles que recorrem ao endividamento apenas com vista ao consumo.
O PM garantiu ainda que haverá reformas estruturais na energia, saúde, na simplificação administrativa e no desenvolvimento tecnológico. E agradeceu “ao PSD e ao seu líder por estar disponível a assumir um compromisso para responder aos superiores interesses do país”.
Medidas prolongadas até 2011
Na conferência de imprensa, Sócrates explicou que haverá uma “aceleração das medidas em 2010 e execução em 2011”. “Para além destas medidas não estamos a pensar em outras”, garantiu, negando desta forma a hipótese de taxar extraordinariamente o subsídio de férias ou de Natal.
A decisão de não tomar mais medidas aplica-se a um eventual imposto especial sobre o sector financeira, mas Sócrates lembrou que a banca não está excluída do aumento de impostos, pois a sobretaxa de IRC aplica-se a todas as grandes empresas.
Ontem, o Instituto Nacional de Estatística anunciou que a economia portuguesa cresceu um por cento no primeiro trimestre deste ano, o valor mais alto na União Europeia. Sócrates não teme os efeitos negativos que o combate ao défice terão no crescimento económico. “Foram tomadas medidas em França, a Alemanha já não vai não reduzir os impostos, foram anunciados cortes em Espanha... Se não tomássemos estas medidas isso sim teria efeitos recessivos. Não teríamos assegurado financiamento à nossa economia. Não fazer teria muito mais efeitos recessivos”, vincou, dizendo que não espera tensão social: “Os portugueses sabem que o governo tem conduzido bem a reacção à maior crise em décadas. Fomos dos primeiros a sair da recessão técnica, a sair da crise, e em 2010 somos o país que mais cresce. Agora temos de fazer face à crise das dívidas soberanas.”
A conferência de imprensa após o Conselho de Ministros foi invulgarmente limitada a três perguntas, o que, segundo o repórter da SIC no local, levou jornalistas a abandonarem o local.