Por Paula Torres de Carvalho, João d´Espiney, in Jornal Público
Simplegis foi apresentado ontem pelo Governo. Idêntico programa tinha sido lançado em 2003, a que se seguiu o chamado "Teste Kafka", em 2006.
O secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, João Tiago Silveira, apresentou ontem o Simplegis, um programa que visa "simplificar a legislação", possibilitar um melhor "acesso das pessoas e das empresas às leis", bem como a sua "melhor aplicação", o que permitá poupar cerca de 200 milhões de euros por ano. "Este ano comprometemo-nos a revogar 300 leis desnecessárias. São leis que só baralham, só complicam, representam custos para as empresas e não trazem nem transparência nem segurança", disse Tiago Silveira, garantindo que deixará de haver atrasos, a partir de 2011, no que respeita à transposição das directivas europeias.
O Simplegis surge sete anos depois de ter sido anunciado o Programa Estratégico para a Qualidade e Eficiência dos Actos Normativos (Despacho nº 12017/2003, de 25 de Junho), que visava a "simplificação e melhoria da qualidade e eficiência" dos actos normativos do Governo, bem como "a avaliação prévia e sucessiva" dos mesmos actos. Um programa que já não aproveitava o trabalho que a Comissão para a Simplificação Legislativa apresentou em 2002 ao Governo de António Guterres com os mesmos objectivos.
Em 2006, o actual Governo, no âmbito do Programa Simplex, aprovou o chamado "Teste Kafka", um instrumento para avaliar "de forma preventiva" não só os encargos administrativos das normas jurídicas, mas também o peso das formalidades e obrigações de origem legal e regulamentar numa relação custo/benefício. Este teste, inspirado numa prática usada na Bélgica desde Outubro de 2004, e nas linhas directrizes da própria Comissão Europeia, visava em última análise prevenir "o labirinto que pode criar-se com uma produção legislativa muito intensa, sem preocupações de sistematização e racionalização".
Pura propaganda. É como o bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho Pinto, e o presidente da Associação Sindical dos Juízes, António Martins, definem o anúncio de ontem do Governo.
"As coisas devem fazer-se e não anunciar-se, considera o bastonário da Ordem dos Advogados, Marinho Pinto. Apontando como exemplo a investigação criminal, o bastonário nota como muitas vezes se anunciam resultados que não se concretizam e suspeitos que se revelam inocentes. "Há muita propaganda, muito espectáculo", afirma.
"Não passa de um anúncio propagandístico", diz o juiz António Martins. "Se no dia-a-dia o Governo cumprisse, não precisaria de anunciar estas medidas", nota, interrogando-se sobre o que tem custado "simplificar o que se complicou", bem como pagar às equipas de advogados e de juristas que se têm ocupado dessa tarefa. "Show off completo", critica.
Apesar da reserva com que recebe a notícia desta medida do Governo, Marinho Pinto reconhece que pode ser positiva, já que "há muito lixo legislativo" que "serve de refúgio a muita coisa".