8.12.08

"Preferia ter um trabalho, mendigar custa-me muito"

João Fonseca, Carlos Jorge Monteiro, in Diário de Notícias

Solidariedade. Cabazes só chegaram para metade dos pedidos

"Preferia ter um trabalho, mendigar custa-me muito"


Mário Júlio, 44 anos, pintor da construção civil, está desempregado há dois anos e vive, com a companheira, na Baixa de Coimbra. E era, ontem à tarde, um dos representantes da centena de famílias que, em "situação de risco social", recebeu um cabaz de Natal, distribuído pela Legião da Boa Vontade (LBV), no âmbito da campanha Solidariedade sem Fronteiras (e que este Natal distribuirá mais 900 cabazes, em Lisboa, Porto e Braga).

"É a primeira vez que cá venho e custa-me muito". Por vergonha? "Preferia ter trabalho, mendigar custa-me muito", responde Mário Júlio. "Mas que hei-de fazer?" O casal vive com o seu Rendimento de Inserção Social e com uma pensão de invalidez (230 euros), da companheira, e "só pela renda da casa" paga 125 euros. "Temos de poupar na alimentação e em tudo, mas pedir é muito difícil. Sou pintor, mas faço qualquer coisa, quero é trabalho".

Mário é um das pessoas mais novas que, ontem à tarde, esteve nas instalações do Instituto da Juventude, em Coimbra, para receber o cabaz de Natal - cerca de 23 quilos de produtos alimentícios (bacalhau, arroz, açúcar, farinhas, azeite, óleo, entre outros, e, naturalmente, bolo-rei), avaliados em perto 50 euros, diz ao DN Maria José Pereira, brasileira residente em Portugal há 17 anos, sempre ao serviço da LBV. Mais de metade dos carenciados tem mais de 65 anos de idade, calcula Pinto dos Santos, presidente da Junta de Freguesia de Santa Cruz, envolvida na campanha, designadamente na elaboração da lista de famílias contempladas com o cabaz (a maior parte das quais residentes nesta freguesia da zona histórica da cidade).

Daqueles idosos, metade vive sozinha e a maior parte são mulheres, diz ainda o autarca, sublinhando que estes casos também correspondem, em regra, às situações mais graves. Nos últimos anos têm aumentado os pedidos de apoio, mas isso não significa apenas que a pobreza tem crescido, também se deve à divulgação da campanha, diz Pinto dos Santos, lamentando que só tenha sido possível oferecer cabazes a metade dos pedidos. "A pobreza em Portugal, tem realmente aumentado nos últimos tempos", diz Maria José Pereira.