2.2.17

Novo aumento do salário mínimo? “Vamos ver que condições há para avançar”

Vítor Costa PÚBLICO e Raquel Abecasis Rádio Renascença, in Púlbico on-line

Carlos Silva diz que é prematuro pensar já em novo aumento do salário mínimo nacional. O líder da UGT reafirma que só assinará adenda ao acordo de concertação social se CGTP ficar de fora.

O líder da UGT não dá como certo um novo aumento do salário mínimo em 2018. Vai depender das condições económicas, admite, apesar de o acordo do PS com o Bloco de Esquerda prever expressamente uma subida para 580 euros em 2018 e 600 euros em 2019. Carlos Silva reconhece que foi apanhado de surpresa com a decisão de o PSD votar contra a descida da taxa social única (TSU), não esconde o desconforto provocado na UGT pelo facto de o primeiro-ministro ter recebido a CGTP em primeiro lugar para anunciar a descida do pagamento especial por conta (PEC) e diz que o Governo, a partir de agora, tem de acautelar com os seus parceiros de esquerda todos os compromissos que levar à Concertação.

Que palavra utilizaria?
O PSD jogou politicamente em relação à concertação social. E os jogos políticos em relação aos parceiros não foram bem entendidos pela UGT, que sempre teve uma relação muito próxima com o PS, com o PSD e o CDS, partidos que governaram Portugal e têm governado Portugal desde o 25 de Abril, com excepção de 1975, e com que temos uma relação de confiança, de seriedade e que sempre valorizamos, mesmo quando não estamos de acordo. E não estivemos de acordo em muitas matérias. Acima de tudo fomos surpreendidos com a decisão do PSD com que, naturalmente, não concordamos, mas respeitamos.

O Governo fica isento de culpas neste processo? Já sabia de antemão que o PCP e o Bloco de Esquerda estavam contra a redução da TSU e votariam contra?
Não digo que seja responsabilidade única do PSD. Nestas coisas praticamente ninguém fica isento, à excepção dos parceiros sociais. O PSD fez uma opção, sabendo que era uma opção política que tinha riscos. E o risco foi desapoiar aqueles que sempre apoiou. O Governo, e não estou a desculpar ninguém, talvez se tenha refugiado na mesma convicção dos parceiros sociais que da parte do PSD viria uma eventual abstenção que, como sabem, foi defendida pelos Trabalhadores Social Democratas (TSD). Naturalmente que a partir de agora caberá ao Governo noutras posições e noutras negociações acautelar o que neste momento não acautelou.

E isso não esvazia a Concertação? Vai estar sempre condicionada a um acordo prévio do Governo com os parceiros de coligação?
Tínhamos um acordo de princípio que foi contrariado no Parlamento e, naturalmente, isso abre um precedente. Não esvazia a Concertação, mas põe a Concertação condicionada. É uma condição que temos de aceitar. É assim, é democracia. Vivemos num quadro político atípico na sociedade portuguesa nos últimos 43 anos.
Pôr fim à precariedade? “É uma utopia”, mas “é importante por um travão”

O líder da UGT, Carlos Silva, admite que é utópico pôr fim à precariedade, mas é imprescindível colocar um travão à situação que se vive em Portugal.

“Espero que o Governo agilize o mais depressa possível um conjunto de medidas, que as proponha em Concertação Social [para se dar] um sinal ao país que é necessário combater a precariedade. É uma chaga”, sublinha o sindicalista.

O líder da UGT lembra que a maior parte dos contratos celebrados em 2016 eram precários e que os trabalhadores não têm estabilidade. “É importante pôr um travão à precariedade, pôr um fim é uma utopia”, admite Carlos Silva.

E como é que se faz esse combate? “Com um conjunto de medidas que penalizem as empresas, retirando-lhes benefícios. Quando se diz penalizar é não haver benefícios para empresas que continuem a apostar na precariedade”, explica o dirigente.

O líder da UGT sublinha, aliás, que na solução que o Governo está prestes a apresentar para os precários do Estado e que está a discutir com os parceiros à esquerda “é preciso ver quanto é que isto custa”.

“Tem de haver pedagogia e tem de se saber quanto é que isto custa. É preciso haver dinheiro”, salienta, acrescentando que aguarda as propostas do Governo nesta matéria. “Aguardamos que o Governo nos apresente um plano para podermos perceber quais são, qual é a margem de manobra do Estado português em relação à assunção de compromissos, nomeadamente para a admissão de trabalhadores.” Carlos Silva diz que há “quem não queira fazer essas contas”, mas no caso da UGT as pessoas são “responsáveis” e precisam de perceber se num cenário de entrada da totalidade dos precários para os quadros da administração pública não haveria problemas de desemprego. “Não queremos problemas de falências do Estado. Não queremos novos resgates. Isto custa dinheiro”, sublinha.

Assim que a TSU foi chumbada no Parlamento, o primeiro-ministro chamou a S. Bento os parceiros sociais, mas recebeu a CGTP em primeiro lugar para lhe dar conta do plano B do executivo, a redução do pagamento especial por conta (PEC). A UGT não gostou.
A UGT reagiu. A posição do Governo foi, no mínimo, pouco cuidada. Teria sido de bom-tom e até de algum cuidado e respeito institucional que tivessem sido recebidos os subscritores [do acordo de concertação] primeiro e quem não subscreveu pudesse ser recebido à posterior. Entendeu o primeiro-ministro que não devia ter sido assim e também há sinais que temos de perceber o que significam.

E o que significou este sinal?
Significa que o PS terá de ter algum cuidado em relação aos seus parceiros à esquerda no Parlamento, porque, havendo uma ligação fortíssima, quase vinculativa, entre a CGTP e o PCP, é bom que se agrade aos parceiros ou pelo menos não se tente desagradar. Há aqui um sinal dito ao PCP, vamos receber a CGTP, não vai ficar de fora, não queremos que fique de fora, vamos dar-lhes algum respaldo. Sabe que agradar a gregos e a troianos é sempre uma situação muito incómoda. É um risco que o primeiro-ministro quis correr. Não sei qual é a posição dos patrões, das entidades empregadoras, mas para a UGT houve algum desconforto.

E depois desse desconforto o primeiro-ministro deu-lhe alguma justificação que o fez mudar de ideias em relação ao que disse na sexta-feira passada, quando admitiu não assinar a adenda que prevê a descida do PEC?
Não mudei de ideias. Perguntaram-me: e se a CGTP quisesse assinar a adenda? O que disse foi que, para assinar a adenda, tem de subscrever primeiro o acordo tripartido. Se assinar a adenda e houver aceitação por parte do Governo que a adenda seja assinada sem se vincular ao acordo tripartido, naturalmente a UGT não estará nessa.

Se a CGTP assinar, a UGT não assina.
Não nos passa pela cabeça que isso venha a acontecer. O acordo tripartido foi subscrito por cinco parceiros sociais e pelo Governo. É um contrato. Se houver aditamentos ao contrato, os outorgantes é que têm de assinar. Quem não assinou o anterior não tem de assinar agora. Agora, seria de bom-tom e até seria muito bem-vindo, como um reforço da concertação social, que todos os seis parceiros pudessem assinar.

Esta politização não fragiliza a Concertação?
A politização existe, somos todos políticos, a política faz parte da vida. A partidarização é que é diferente. Acabámos por ser empurrados para o jogo partidário sem querermos. Houve um bruá em relação a esta partidarização, porque desde que este Governo foi empossado, com o acordo à esquerda, nem o PCP, nem o BE viram com bons olhos, e temos de assumir isso, nunca viram com bons olhos que um conjunto de matérias muito importantes para os portugueses, nomeadamente na área do trabalho, fossem discutidas em Concertação Social. Queriam desviar para o Parlamento, sempre foi essa a vontade manifestada por estes partidos, e aqui a CGTP, verdade seja dita, nunca enganou ninguém. A CGTP defendeu sempre que um conjunto de matérias deveriam ser discutidas no Parlamento. Porquê? Porque se nunca está disponível para acordos, se não cultiva o espírito do compromisso, porque é que a Concertação Social é que vai discutir um conjunto de situações em que a CGTP sempre defendeu que há um desequilíbrio nos parceiros?

E não há?
Esse desequilíbrio depende de uma forma ideológica de entender a Concertação Social: "Eles é que são os patrões, eles é que levam sempre a melhor."

A verdade é que há um governo, que é do PS, que tem apoios à esquerda no Parlamento e está condicionado na sua vontade de fazer política e de aplicar política. Portanto, quem tem de ter alguma atenção a partir de agora, independentemente de os parceiros já estarem prevenidos, é o Governo. O Governo é que terá de cuidar a priori, quando tiver de garantir compromissos na Concertação, se esses compromissos estão ou não estão validados no Parlamento. É isso com que estamos confrontados.
O melhor do Público no email

Mas era incomportável para as empresas este aumento do salário mínimo sem terem uma compensação?
Esta é uma matéria que se discute muito. Preferia colocar as coisas de outra forma. Será ou não será justo para os trabalhadores que a actualização do salário mínimo seja colocada? Em vez de me perguntar se as empresas o suportam, a pergunta é importante também do ponto de vista de quem trabalha. O salário mínimo tem uma componente social e durante muitos anos esteve suspenso [o aumento]. Em 2016 houve um acordo do salário mínimo de médio prazo. Foi suspenso. Em 2011 suspendeu-se. É importante dar um sinal ao país de que estamos de novo a alavancar algum crescimento económico, ainda que tímido.

E as empresas?
Há empresas que aguentam e outras que não aguentam. Agora, a maioria das empresas tem condições de fazer a actualização. Para as que não tiverem tem de haver essa compensação. E é por entendermos que era importante a compensação que não nos opusemos à medida. Em nome da fragilidade, sobretudo das micro e pequenas empresas.

E há condições para continuar a aumentar o salário mínimo, tal como previsto no acordo do PS com o Bloco de Esquerda: para 580 euros em 2018 e 600 em 2019?
É uma pergunta que fica. Vamos aguardar até ao final do ano para ver que condições é que há para avançar com o acordo que o PS sufragou com o Bloco de Esquerda para passar para os 580 euros. Vamos aguardar. Não sabemos. Mas isso é naturalmente uma decisão política que terá de responder à realidade da economia. Isso só vamos ver no final do ano.