in Jornal Público
O relatório é da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura e resulta de seis meses de reuniões e visitas dos deputados em 2008, Ano Europeu para o Diálogo Intercultural, para estudar a comunidade cigana em Portugal. E foi apresentado ontem na Assembleia da República, numa sessão seguida de um debate.
O caso de uma escola em Barqueiros, em que 17 crianças ciganas estão a ter aulas separadas das outras, pairou nas conversas. Os deputados não fizeram propostas - trata-se apenas de um relatório - mas apontam algumas estratégias possíveis. A começar pela educação, "como factor de integração social". "Pôr educação a rimar com inclusão", nas palavras de Carlos Soares Miguel, cigano e presidente da Câmara de Torres Vedras.
Mas para combater a discriminação é preciso também tentar resolver os problemas da habitação, importante para a "integração da comunidade cigana", ou do trabalho, agora que a crise também chegou às feiras. No total, são mais de 50 páginas. Aqui fica o essencial desse relatório dos deputados.
Os números: quantos são?
Não há um recenseamento da comunidade cigana em Portugal. Vários estudos apontam para 50 mil, como a comissão europeia contra o racismo e a intolerância. Outros para 100 mil ciganos.
As conclusões da comissão, segundo a deputada do PS e relatora Maria do Rosário Carneiro, apontam para um número "entre 60 mil e os 100 mil", sendo Setúbal e Lisboa os dois distritos com maior número de ciganos identificados.
Entrar nas escolas mais cedo
O relatório da comissão identificou um obstáculo a ultrapassar para a integração das crianças ciganas, além das questões culturais, por exemplo - "entrar o mais cedo possível para a escola". Escola que serviria para dar "competências sociais" e compensar a "fragilidade material" das famílias. Por isso, deve "fornecer às crianças comida, roupa, proporcionar-lhes condições de higiene". De acordo com o relatório, que cita dados do Instituto da Segurança Social de 2009, cerca de 38 por cento da comunidade cigana tem menos 15 anos. Os números relativos ao ano lectivo 2003/2004 revelam que 8324 crianças e jovens ciganos estão matriculados, 86,7 por cento dos quais no primeiro ciclo. O que leva a concluir que o seu peso no ensino secundário é reduzido.
Formação de professores
Os deputados concluíram que os professores deveriam ter uma "formação inicial" sobre questões de interculturalidade. Não só para que estejam "preparados para trabalhar com as crianças ciganas" mas também para ter "uma escola preparada para a diversidade". É preciso criar "equipas alargadas com garantia de apoios para que possa haver uma intervenção efectiva" do Estado. Por isso, "é fundamental o empenho por parte do Ministério da Educação".
Mediador, a ponte família-escola
Eles existem e têm "papel-chave" nas "pontes entre a família e a escola", na "clarificação das diferenças, na tradução dos códigos" da comunidade cigana. Os mediadores já existem, mas também há queixas quanto às condições que exercem funções. Bruno Gonçalves, do Centro de Estudos Ciganos, em Coimbra, fez um curso há dez anos, teve "dois ou três" empregos, precários, mas agora voltou à venda ambulante. "O Estado gastou milhares de euros connosco. Para quê?", questiona. Existem, segundo diz, "60 a 70 mediadores ciganos formados e no desemprego".
Turmas separadas ou não?
O relatório não aponta nenhuma solução para a integração ou separação das crianças ciganas nas escolas. Não há "uma oferta de modelo educativo". E dá exemplos de escolas que as distribuem pelas turmas, por várias escolas ou ainda a organização de turmas só para crianças da comunidade. Esta última solução é, por vezes, "desejada por muitos pais que sentem os seus filhos mais seguros".
Quotas para ciganos?
Os deputados concluem ser necessárias medidas políticas específicas para combater a discriminação. Fazendo, por exemplo, com que se cumpra a lei contra a discriminação racial e se adoptem medidas de "discriminação positiva", "incluindo eventualmente o recurso a quotas". Nuno Simas