18.3.09

Preservativos "podem aumentar" o problema da sida, diz o Papa

Maria João Guimarães, in Jornal Público

Primeiro dia da visita de sete dias a África ficou marcado por declarações feitas ainda no avião sobre o uso de preservativo e o HIV


A "tragédia da sida não pode ser resolvida só com dinheiro, nem pode ser resolvida com a distribuição de preservativos, que pode até aumentar o problema", afirmou ontem, no avião que o levava à capital dos Camarões, Yaoundé, o Papa Bento XVI.
A solução está antes, defendeu, no continente mais afectado pela doença, "num despertar humano e espiritual" e ainda na "amizade para com aqueles que sofrem" da doença, cita a AFP.

Era já esperado que o pontífice explicasse a jovens por que é que a Igreja Católica aconselha a abstinência como a melhor maneira de prevenir a doença - na verdade, abstinência ou fidelidade são para a Igreja as duas únicas maneiras de prevenir o contágio pelo HIV.

A política da Igreja é conhecida, mas o diário britânico The Telegraph sublinhava que esta teria sido a primeira vez que o Papa referiu directamente a palavra "preservativo" e a oposição da Igreja a este método de prevenção em particular.

Quando foi eleito, lembra o diário britânico The Times, o Papa já tinha dito que a sida era "uma epidemia cruel que não apenas mata mas ameaça gravemente a estabilidade económica e social" do continente africano. Mas "os ensinamentos tradicionais da Igreja" são, afirmou, "o único modo seguro de prevenir a disseminação da doença".

O jornal lembra que há dois anos o antigo arcebispo de Milão, o cardeal Carlo Maria Martini, tinha classificado como "um mal menor" o uso do preservativo por casais em que apenas um dos parceiros estava infectado com o HIV. E o ministro da Saúde do Vaticano, Javier Lozano Barragan, tinha afirmado que excepcionalmente o preservativo podia ser aceite quando uma mulher casada não pudesse recusar os avanços de um marido seropositivo.

Sem excepções

Mas um estudo do Vaticano reiterou posteriormente a proibição total do uso do preservativo, sem excepções.

A afirmação de que o uso do preservativo pode aumentar o risco de transmissão do HIV poderá ter como base uma teoria já referida por responsáveis do Vaticano de que o preservativo pode deixar passar o vírus. O cardeal Afonso Lopez Trujilo, lembra de novo o Times, afirmou que "o vírus da sida é cerca de 450 vezes mais pequeno do que o espermatozóide", por isso poderia passar pela 'rede' que é o preservativo".

A Organização Mundial de Saúde (OMS) reagiu na altura classificando como "perigosas" estas "afirmações incorrectas": O uso "correcto e consistente" do preservativo, diz a OMS, reduz o risco de transmissão do HIV em 90 por cento.

No ano passado, houve 1,9 milhões de novas infecções na África subsariana, que tem um total de 22 milhões de seropositivos. Três quartos das mortes por sida no mundo em 2007 ocorreram na região.

Preservativo é "o caminho"


A directora do Instituto Nacional de Luta contra a Sida (INLS) de Angola, Dulcelina Serrano, afirmou ontem que o preservativo não é a "solução" ideal para combater a sida, mas é o "caminho encontrado". O Papa segue para Angola depois dos Camarões.
"O nosso rebanho é maior do que o Papa (...) estende-se para lá do rebanho do Papa, dos que não aderem aos ensinamentos da Igreja e a esses também temos que oferecer alternativas e uma delas passa pelo conselho para a utilização do preservativo", disse Dulcelina Serrano à agência Lusa.