5.5.09

Europa afunda-se na pior recessão dos últimos 60 anos

Isabel Arriaga e Cunha, Bruxelas, in Jornal Público

PIB português recua 3,7 por cento, o pior valor desde 1975, e o desemprego salta para 9,1 por cento. Economia nacional será uma das mais lentas a sair da crise, juntamente com a Irlanda e Espanha


A economia europeia vai este ano mergulhar na "mais profunda e extensa recessão" desde a Segunda Guerra Mundial, embora alguns sinais recentes de "estabilização" levem a crer que o pior poderá estar perto de ser ultrapassado.

Esta leitura foi ontem feita pela Comissão Europeia na apresentação das previsões económicas trimestrais, que apontam este ano para uma queda de 4 por cento do PIB tanto na União Europeia (UE) a 27 como nos 16 membros da zona euro.

Este valor representa uma forte revisão em baixa da previsão de crescimento negativo de 1,9 por cento avançada em Janeiro, devido ao "agravamento da crise financeira global, forte contracção do comércio mundial e correcção em curso do mercado da habitação" em vários países.

Portugal terá este ano um crescimento negativo de 3,7 por cento - o pior desde 1975, contra um crescimento zero no ano passado (e uma previsão de contracção do PIB de "apenas" 1,6 por cento há menos de quatro meses). A nova previsão é ligeiramente pior que a recessão de 3,5 cento prognosticada em Abril pelo Banco de Portugal, mas inferir aos 4,1 por cento avançados pelo FMI.

No conjunto da UE a 27, só Chipre conseguirá ter este ano um crescimento positivo - 0,3 por cento. Ao invés, os países mais duramente afectados pela crise serão a Irlanda, com uma contracção do PIB de 9 por cento, a par dos países bálticos (Letónia, Estónia e Lituânia), com quedas do PIB entre 10,3 e 13,1 por cento.
Os principais parceiros de Portugal também serão afectados, sobretudo Alemanha, Espanha (ver gráfico) e Reino Unido - 3,8 por cento.

As previsões de ontem deixam claro que a recessão europeia será mais longa do que o previsto, já que a retoma moderada para 2010 esperada em Janeiro (0,4 por cento) é agora substituída por um crescimento negativo de 0,1 por cento.

Mais lentos a sair da crise

Portugal (em conjunto com a Espanha e a Irlanda) terá uma saída da crise mais lenta que o conjunto da zona euro, já que o PIB deverá voltar a recuar em 0,8 por cento em 2010. Segundo Bruxelas, aliás, a economia portuguesa só voltará a terreno muito ligeiramente positivo no quarto trimestre de 2010 - 0,1 por cento - depois de nove trimestres consecutivos de crescimento negativo. Os próximos anos anunciam-se, aliás, particularmente difíceis em Portugal, refere a Comissão, devido à limitação do rendimento disponível resultante do efeito penalizador do aumento inevitável das taxas de juro (face aos valores actuais) num país fortemente endividado, consolidação financeira das empresas e endurecimento das condições de crédito.

Apesar da gravidade da crise na UE, Joaquín Almunia, comissário europeu responsável pelos assuntos económicos e financeiros, deixou algumas notas de optimismo ao apontar para alguns "sinais de estabilização", sobretudo no que se refere a uma melhoria da situação dos mercados financeiros e subida das expectativas e dos indicadores de confiança dos empresários. A economia europeia "já não está em queda livre", afirmou, embora salvaguardando que não dispõe "da massa crítica de estatísticas suficiente" para poder dizer que o pior já passou.

Desemprego bate recordes

A forte degradação da conjuntura terá como consequência uma derrapagem do desemprego para 9,9 por cento da população activa na zona euro este ano e para 11,5 por cento em 2010, valores inéditos deste a Segunda Guerra Mundial, afirma Bruxelas.
Em Portugal, a taxa de desemprego atingirá os "níveis históricos", segundo a Comissão, de 9,1 por cento este ano e 9,8 por cento no próximo. Em pior situação estarão no entanto a Espanha, que contará no próximo ano com 20,5 por cento de desempregos, a Irlanda, com 16, ou a Alemanha, com 10,4 por cento.

Na frente das finanças públicas, o conjunto da zona euro terá uma derrapagem do défice orçamental para 5,3 por cento do PIB (contra 1,9 por cento no ano passado). Com excepção do Luxemburgo, Finlândia e Chipre, os restantes treze países da eurolândia ultrapassarão este ano o limite máximo autorizado de 3 por cento do PIB (contra cinco países no ano passado). No conjunto da UE, serão 20 os países em situação de "défice excessivo".

Portugal terá este ano um dos défices mais elevados da eurolândia no valor de 6,5 por cento, a pior derrapagem desde 1994. Esta previsão contrasta com o resultado de 2,6 por cento do PIB registado nos dois últimos anos. Pior que Portugal, entre os 16 do euro, só a Irlanda (12 por cento), Espanha (8,6 por cento) e França (6,6 por cento).

Finalmente, a inflação da zona euro será este ano de 0,4 por cento, sendo Portugal um dos quatro países da eurolândia que registarão uma queda dos preços - 0,3 por cento.

Segundo Almunia, no entanto, "a inflação poderá ser negativa durante alguns meses" nalguns países, "mas deverá ser uma situação temporária: não estamos à espera de qualquer risco de deflação na UE ou na zona euro".