1.5.09

"O mercado laboral é como uma cebola"

in Jornal Público

Em Espanha, um de cada quatro trabalhadores tem contrato a prazo. Por isso, são as primeiras vítimas da crise. Uma realidade que criou uma teoria: a da "cebola". "O mercado laboral é como uma cebola, vamos tirando as várias capas até chegar aos trabalhadores com contrato indefinido", afirma Octávio Granado, secretário de Estado da Segurança Social de Espanha. As capas que caem são aos temporários.

No primeiro trimestre deste ano, quando o PIB desceu em taxa inter-anual de 2,9 por cento, a teoria da "cebola" cumpriu-se. De forma dramática: dos mais de 802 mil novos desempregados, 528.500 foram trabalhadores com contratos a prazo. Em Espanha há, actualmente, quatro milhões de desempregados.

A análise dos sectores mais afectados reforça o dado. A destruição de emprego afecta, agora, o sector de serviços, que concentra cerca de 60 por cento do desemprego. E, nos serviços, a prática comum é a temporalidade: já não a seis meses, mas, como ocorre na hotelaria e restauração, à jornada.

O facto do desemprego se concentrar nos contratos temporários leva a que sejam os jovens menores de 25 anos os mais afectados: 36 por cento desta faixa etária procura emprego sem sucesso, o valor mais alto desde 1998. Uma realidade com consequências. Para que a economia seja mais competitiva há que aumentar o nível de formação da mão-de-obra, especialmente a jovem. Mas a precariedade impede complementar a sua formação no trabalho.

"O excesso de contratação temporal não é prova de flexibilidade do mercado laboral, mas sinal de um mercado inflexivelmente dual", anotava Ramón Marimon, professor da Universidade Pompeu Fabra, no El País de 29 de Abril. Temporários de fácil despedimento - em 2008, mais de 50 por cento dos despedimentos teve origem no fim do contrato -, versus trabalhadores fixos, cujo despedimento é mais caro. Sem justa causa, segundo a lei, o custo é de 45 dias por ano.

"O problema não é apenas que os temporários raramente se transformem em estáveis, mas também que dificilmente levam a um investimento no capital humano necessário para o aumento da produtividade e da realização pessoal", sublinhou Marimon. A teoria da "cebola" conduz à "pescadinha de rabo na boca": não há formação porque o trabalho é precário e este não passa a estável porque não tem especialização. Daí que a descida da temporalidade no primeiro trimestre deste ano para 22,91 por cento, quando há cinco anos era de 33 pontos, não seja boa notícia. É o registo de mais desemprego.

Mudar implicaria alterar a legislação laboral. Tema sem consenso. Daí a importância de um documento de 100 economistas que propõe uma nova fórmula. Que evite o actual funil e não multiplique a facilidade de despedir. Os signatários, cujos propósitos foram apoiados pelo governador do Banco de Espanha, Miguel Ordoñez, querem acabar com a dualidade entre temporários e fixos. Através de um único contrato, indefinido desde o início da relação laboral com uma indemnização crescente em função da antiguidade. Nuno Ribeiro, Madrid

17,3% A taxa de desemprego bateu os 17,3% no 1.º trimestre. Há dois anos
era de 7,95% e há 15 anos estava nos 24,5%