Alfredo Maia, in Jornal de Notícias
Em 2007, a percentagem da população abaixo do limiar de pobreza passara de 19% para 18%. Mas o desemprego aumentou e o endividamento das famílias agravou-se nos últimos anos. A anunciada redução nos subsídios de desemprego pode piorar a situação.
"Houve, de facto, uma redução de 1% na taxa de pobreza, mas os dados são de 2007 e não representam os últimos três anos", observa a coordenadora técnica da Rede Europeia Anti-Pobreza/ /Portugal (REAPN).
Ouvida pelo "Jornal de Notícias" a propósito do tema de Maio do Ano Europeu contra a Pobreza e a Exclusão - "Emprego/Desemprego: Direito a um Trabalho Digno" -, Sandra Araújo adverte que a eventual redução nos montantes de subsídio de desemprego "vai piorar a situação".
O contexto social e económico do país explica o risco: "Não há emprego para todos, temos uma população muito desqualificada, há empresas a deslocalizar-se e a encerrar, os níveis de desemprego já atingiram os dois dígitos e as pessoas estão em piores condições - há muita gente que não consegue pagar as prestações do carro e da casa e estão a entregá-los".
"Há, de facto, uma relação entre desemprego e pobreza, mas atenção: ter emprego não é condição suficiente para se sair da pobreza", afirma a socióloga Cláudia Albergaria, do Gabinete de Investigação e Projectos da REAPN, notando que boa parte dos beneficiários do rendimento social de inserção nem está desempregada.
O estudo sobre a relação entre o desemprego e a pobreza na região do Tâmega, que Cláudia Albergaria dirigiu (ver "caixa"), "mostra que ter emprego não é garantia suficiente para não se ser pobre, devido aos baixos salários e à precariedade", sendo esta traduzida também na rotatividade emprego/desemprego.
O estudo nacional feito em 2008 pelo sociólogo Alfredo Bruto da Costa indica que 35% dos pobres são pessoas que trabalham. E Sandra Araújo chama a atenção para os dados da agência europeia de estatística - Eurostat - sobre as taxas de risco de pobreza da população empregada na Europa a 27 países: em 2007, 8% dos trabalhadores europeus eram pobres.
Em Portugal, segundo o mesmo estudo, a percentagem da população empregada com rendimento mensal inferior ao limiar de pobreza (406 euros mensais per capita, após transferências sociais como o subsídio de desemprego ou o rendimento social de inserção) era de 10%. Os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística, relativos a 2008, apontam para 12%. Aumentou e teme-se que continue a aumentar.
"O problema de quem trabalha mas é pobre, tem emprego mas não passa a barreira do limiar de pobreza, é que ocupa empregos pouco qualificados, mal pagos e precários", explica a coordenadora técnica da REAPN. Trata-se "de uma característica de Portugal, face à política de baixos salários, porque noutros países as mesmas funções desqualificadas têm salários suficientes para que as pessoas vivam acima do limiar de pobreza".
Para a especialista, "não basta o esforço do Estado nas transferências sociais nem responsabilizar apenas o Ministério do Trabalho e da Segurança Social". É necessário reorientar as políticas públicas, da educação à saúde, passando pela habitação e pelo emprego, bem como um crescimento sustentável da sociedade e não gerador de desigualdades salariais e na distribuição do rendimento.