António Marujo, in Jornal Público
O presidente da Cáritas Internacional, o cardeal hondurenho Óscar Rodríguez Maradiaga, anunciou que as crianças portadoras de VIH serão a prioridade daquela organização católica internacional, durante o próximo ano. A propósito do Dia de Luta contra a Sida, ontem assinalado, o cardeal afirma que é necessário um compromisso maior em favor das crianças que vivem aquela situação.
"Actualmente, cerca de 30 por cento dos adultos que precisam dos medicamentos antibióticos para prolongar a vida e melhorar as condições da mesma recebem esses medicamentos", o que não sucede com as crianças. Neste caso, apenas 15 por cento têm esse tipo de medicação. "Muitas morrem antes do seu segundo aniversário", afirma o arcebispo de Tegucigalpa.
Na mensagem, citada pela Zenit, agência oficiosa do Vaticano, o cardeal diz que, apesar de se ter celebrado ontem o 20º dia mundial contra a sida, a doença é ainda "o maior obstáculo para alcançar os Objectivos de Desenvolvimento do Milénio".
Num tom crítico, o cardeal afirma que "as empresas farmacêuticas e os governos devem demonstrar liderança desenvolvendo fórmulas pediátricas para o VIH e melhorando a realização de testes". A Cáritas, por sua vez, lançará uma campanha para "evitar que se percam mais vidas de crianças vulneráveis", ao mesmo tempo que continuará a insistir no fim da discriminação dos doentes e na elaboração de políticas que ajudem "os mais vulneráveis".
No documento, o cardeal Maradiaga enaltece o trabalho das organizações católicas de apoio a portadores de VIH-sida: em todo o mundo, 27 por cento das instituições de assistência a doentes de sida são de grupos ou congregações católicas. Estas estão empenhadas no tratamento médico, prevenção geral, prevenção da transmissão mãe-filho, cuidados de órfãos e famílias, assistência espiritual, educação sexual e pesquisa científica.
Em Agosto, o director executivo da ONUSida, Peter Piot, elogiou também o trabalho dessas instituições, dizendo ter mudado de opinião desde que dirige a organização internacional. "Quando comecei esta tarefa, via a religião como um dos maiores obstáculos ao nosso trabalho, particularmente na área da prevenção", afirmou na conferência internacional sobre a sida, na Cidade do México. "Mas vi grandes exemplos de tratamento e cuidado que vêm das comunidades religiosas, e também na área da prevenção."
A questão da doutrina católica oficial sobre o preservativo é que continua objecto de debate. O movimento Nós Somos Igreja divulgou sábado um comunicado em que defende o fim da condenação oficial.
Há duas semanas, o padre alemão Stefan Hippler, que trabalha com órfãos de sida na África do Sul, afirmou, ao receber um prémio na Alemanha, que a Igreja Católica deve repensar a doutrina. E acrescentou que muitos religiosos distribuem preservativos.
Em Maio, numa reunião de responsáveis de instituições católicas, em Roma, a missionária comboniana Maria Martinelli confirmou-o. Coordenadora de um projecto conjunto de apoio a doentes, Martinelli afirmou que, em muitas situações, "o preservativo é necessário".