Rui Osório, jornalista e cónego, in Jornal de Notícias
A Declaração tem 60 anos e, como herdeira da filosofia grega, do direito romano, da tradição judaico-cristã e da luta pela democracia, é obra inacabada
Como se lia na agência "Ecclesia", quando, no dia 10 de Dezembro de 1948, era aprovada a Declaração Universal dos Direitos do Homem pela Assembleia das Nações Unidas, a Humanidade, através dos seus representantes, proclamava que só pelo reconhecimento da dignidade fundamental de cada pessoa se poderia atingir a realização do sonho vivo no mais profundo do ser humano: a liberdade, a paz e a alegria de viver.
Era o respirar de novo, depois do pesadelo de mortes e atrocidades da 2.ª Guerra Mundial; era a manifestação de uma Humanidade não rendida ao desânimo da sua própria fragilidade; era um passo, não o único nem o primeiro, mas importante nessa caminhada para a civilização que vai ultrapassando a atitude meramente instintiva perante quem está ao lado.
A Declaração é uma aquisição recente na realidade política, jurídica e filosófica, herdeira da filosofia grega, do direito romano, da tradição judaico-cristã, do humanismo e da luta pela democracia.
A efeméride dos 60 anos da Declaração, no próximo dia 10, deve ser celebrada para lhe dar um novo alento. A Declaração Universal não é um sinal perfeito e definitivo a marcar em cada momento o passo que se segue; é apenas um sinal que aponta a direcção, mas constantemente exigindo o esforço do discernimento.
Questões relacionadas com a acção humanitária e com as necessidades básicas de gente desprotegida têm de forçar a abertura de portas não previstas, mas exigidas pela fidelidade ao seu espírito. O pesadelo dos "actos de barbárie que revoltam a consciência da Humanidade", referido no preâmbulo, continuou a visitar-nos na última década com o recrudescer do terrorismo, com as guerras no Afeganistão, no Iraque, nos territórios do ex-bloco soviético, com os conflitos étnicos na região dos Grandes Lagos, com o actual drama no Darfur e na República Democrática do Congo. Em tais cenários, os direitos fundamentais e as liberdades são esquecidos ou espezinhados.
Mas também ao nível local há que estar atento. As ofensas aos direitos podem ser discretas; mas não deixam de ser ofensa. É o que se passa no âmbito da pobreza. Um em cada cinco portugueses vive em situação de pobreza, o que impede o desabrochar das condições mínimas de dignidade e de bem-estar.
A cada cidadão e a todos os cidadãos portugueses cumpre-lhes estar alerta e tornar os direitos humanos vivos e sempre actuais.