29.1.08

Mais trabalho, menos família

José Manuel Rocha, in Jornal Público

O inquérito realizado pelo Instituto de Ciências Sociais da UL e mais nove entidades de investigação europeias abordou também o quotidiano dos trabalhadores e concluiu que os alemães, os portugueses e os húngaros gostariam de passar mais tempo no trabalho, ao contrário dos suecos, que veriam com bons olhos uma diminuição do tempo de trabalho. Britânicos e franceses dizem que queriam mais tempo para estar com a família, campo de análise onde os portugueses surgem na cauda da tabela, a par com os espanhóis e os eslovenos. Numa verificação global, constata-se que quer trabalhar mais quem se "fartou" da família, dos amigos e dos tempos livres.

a A formação profissional, assumida num ritmo contínuo ao longo da vida, é considerada um instrumento fundamental para o desenvolvimento económico. Mas Portugal continua, a esse nível, muito distante do desempenho dos seus principais parceiros. Um estudo que vai ser hoje divulgado - e a que o PÚBLICO teve acesso - mostra que, nos últimos 12 meses, apenas 22 por cento dos portugueses inquiridos receberam alguma formação para melhorar as suas competências profissionais. A média dos dez países europeus analisados é de 43 por cento.

Esta conclusão é uma das mais fortes evidências do programa de pesquisa Atitudes Sociais dos Portugueses, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-UL). Para ele contribuíram vários investigadores, sob a coordenação de João Freire. Integrado numa rede europeia de pesquisa em ciências sociais, este trabalho partiu de uma consulta de campo que decorreu nos últimos cinco meses e que envolveu 1873 entrevistas (feitas a partir de uma mostra aleatória).

Em matéria de formação profissional, Portugal está muito distante dos níveis atingidos pelas economias mais pujantes da União Europeia. O inquérito conduzido no Reino Unido mostra que 61 por cento de respostas positivas, quando se pergunta se os entrevistados em causa tiveram formação no último ano. E na Dinamarca a percentagem apurada é de 60 por cento, acima dos 53 por cento da Eslovénia e dos 50 por cento da Suécia. Abaixo dos 30 por cento, como Portugal, apenas a Espanha (24 por cento).
Decompondo as respostas, os investigadores do instituto concluem que os principais beneficiários dos programas de formação são as mulheres e os que detêm graus de escolaridade mais elevados. Curiosamente, é na administração pública e nas empresas do Estado que a prática da formação profissional está mais disseminada (36 e 39 por cento, respectivamente). Nas empresas privadas, a percentagem desce para 19 por cento do universo de inquiridos, o que lhes poderá retirar competitividade face às congéneres europeias, onde a média é o dobro.

Outras conclusões significativas do estudo são que o desemprego atinge sobretudo as camadas mais idosas da população; e que o subsídio estatal não é a base de sustentação dos desempregados, que têm de recorrer ao apoio de familiares - o que parece ser uma conclusão generalizada aos países onde o chamado "Estado providência" é menos forte. Inquiridos sobre em que políticas deveria haver mais esforço financeiro do Estado, a de subsídio de desemprego surge em quarto lugar - a seguir à saúde, pensões e reformas e educação.

O trabalho, que será hoje divulgado num seminário no ICS, em Lisboa, mostra que dois terços dos inquiridos nunca estiveram sindicalizados. E acrescenta que a análise recolhida aponta traços de "unilateralismo patronal" e "individualização das relações laborais a vários níveis - salário, horário, categoria profissional".
"Apenas uma minoria dos respondentes se considera numa posição "forte" num mercado de trabalho regulado principalmente pelo poder patronal", assinala o estudo.