Sofia Rodrigues, in Jornal Público
Chefe de Estado chama a atenção para a relação custo-benefício do investimento público, quando o Governo tem defendido esta solução para enfrentar a crise económica
O Presidente da República, Cavaco Silva, deixou ontem um claro aviso sobre a dívida externa: "Portugal não pode continuar, durante muito mais tempo, a endividar-se no estrangeiro ao ritmo dos últimos anos". Na mensagem de Ano Novo, transmitida na RTP1, o Presidente da República apelou ainda aos agentes políticos para evitarem "divisões inúteis".
No primeiro discurso de 2009, Cavaco Silva elegeu a economia como tema forte, enfatizando em particular a dívida externa.
"Há uma verdade que deve ser dita: Portugal gasta em cada ano muito mais do que aquilo que produz", afirmou, acrescentando logo de seguida que "não pode continuar" a fazê-lo "durante muito mais tempo". E, de uma forma pedagógica, explica as consequências: "Quando a possibilidade de endividamento de um país se esgota, só resta a venda dos bens das empresas nacionais aos estrangeiros".
Para sair da estagnação económica, o chefe de Estado defende como prioridade "o reforço da capacidade competitiva" das empresas portuguesas a nível internacional e "o investimento nos sectores vocacionados para a exportação". Sem as soluções enunciadas, Cavaco diz que "é pura ilusão imaginar que haverá progresso económico e social, criação duradoura de emprego e melhoria do poder de compra". Sem isso, conclui, não se consegue pôr fim ao "crescimento explosivo da dívida externa". "As ilusões pagam-se caras", avisa.
Cavaco Silva sublinha também que se deve dar atenção acrescida à relação custo-benefício dos serviços e investimentos públicos. O investimento público tem sido defendido pelo Governo como solução "absolutamente essencial" para enfrentar a crise económica.
O chefe de Estado chama ainda a atenção para a necessidade de utilizar com "rigor e eficiência" os dinheiros públicos, de reduzir a dependência exterior em matéria de energia, e de melhorar a qualidade e inovação na estrutura de produção nacional.
Os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) indicam que as necessidades líquidas de financiamento da economia portuguesa aumentaram 32 por cento no terceiro trimestre de 2008 face a igual período do ano anterior.
"Evitar divisões inúteis"
Sem esquecer a turbulência nos mercados financeiros, o Presidente afirma que crise financeira internacional "apanhou a economia portuguesa com algumas vulnerabilidades sérias". Uma opinião que diverge da perspectiva do primeiro-ministro na mensagem de Natal quando evidenciou o esforço do Governo em pôr "as contas públicas em ordem", considerando que isso permitiu responder melhor aos efeitos da crise.
Para 2009, Cavaco Silva atribuiu especiais responsabilidades à classe política. "Não é com conflitos desnecessários que se resolvem os problemas das pessoas", afirmou, apelando a que os "agentes políticos deixem de lado as querelas que em nada contribuem" para melhorar a vida das famílias em dificuldades. "Nesta fase da vida do país, devemos evitar divisões inúteis. Vamos precisar muito uns dos outros", rematou.
Com uma mensagem de esperança a todos os que "estão em situações difíceis porque sofreram uma redução inesperada dos seus rendimentos", Cavaco Silva dirigiu-se em especial a três grupos da população: os jovens que "vivem a angústia de não conseguirem o primeiro emprego", os pequenos comerciantes que "travam luta diária pela sobrevivência", e os agricultores "que se sentem penalizados (...) por não beneficiarem da totalidade dos apoios disponibilizados pela União Europeia".